Recebi há pouco um mail com revelações atrozes: andam canibais chineses a comer cidadãos angolanos! E lá vinha um ror de fotografias (clicar com cautela) de corpos desmembrados por uma sorridente turba de asiáticos. Bastante esfomeados, como se comprovava pelas imagens dos ogres, de prato na mão.
Em segundos, uma busca no Google deu-me uma ideia do efeito que estas imagens estão a ter em Angola: «Chineses comem cidadão», «Além da disfarçada profissão profissional, os chineses contratados pelo governo angolano são Kcaníbais. Isto é, não se trata duma farsa mas são acontecimentos reais. Nas áreas de pouca visibilidade, sem o controlo do governo, chineses raptam cidadãos angolanos e cortegem-os afim de servirem como alimento principal dos chineses contratados pelo governo em Angola.» Pois é bom de ver que «os chineses comem tudo fdp. Ser for preciso ate komem merda».
É tão fácil diabolizar o outro. Se “eles” andam por aí, diferentes, opacos, imprevisíveis, roubando-nos empregos, talvez até violando as nossas mulheres, entre as demais atrocidades que os estrangeiros comentem sempre... claro que também devem ser canibais.
Quantas vezes não vimos já esta estratégia de desumanização do inimigo? Pois é só quando ele deixa de ser visto como ser humano que o podemos chacinar sem um tremor. Os Untermenschen que os nazis exterminaram aos milhões. As “baratas” tutsis esquartejadas pelos machetes dos hutus. A “escumalha” que o PNR deseja limpar do Tamariz.
Neste momento, há muita gente em Angola convencida de que os trabalhadores chineses matam africanos para os comerem. E assim cresce mais um monstro colectivo, pronto a acordar num destes dias, ele sim esfaimado de vidas humanas.
E olhem que não foi muito difícil descobrir a verdadeira origem destas imagens: a limpeza de um cemitério na Tailândia, com voluntários que prepararam corpos não identificados para a cremação ritual. Sei bem, no entanto, o pouco que valem estes desmentidos. Quando estamos prontos para odiar o outro, não é uma pequena verdade que o vai impedir.
19/07/10
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2 comentários:
o homo sacer do agamben
Grande, mas grande mesmo, conclusão.
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