29/07/10

Sobre os direitos dos animais

Re-posto (ligeiramente alterado)  um comentário que fiz n'O Insurgente:

A respeito dos "direitos dos animais", eu acho que seria mais correcto falar em “direitos de animais”: há muito mais semelhanças entre um chimpanzé e um humano do que entre um chimpanzé e um sagui; há mais semelhanças entre um touro e um humano do que entre um touro e uma rã-touro. Assim, quer a conversa de “os animais têm direitos” (pondo no mesmo plano seres tão distintos como humanos, chimpanzés, saguis, touros e rãs-touros) quer a que “os animais não têm direitos” (pondo no mesmo plano seres tão distintos como chimpanzés, saguis, touros e rãs-touros) não me parecem fazer grande sentido.

Quanto ao argumento "os animais não têm direitos, porque não têm deveres": realmente, imagino que o meu “Pantufa” seja alheio ao conceito de direitos e deveres, já que ele está instintivamente preparado para ser um caçador solitário, só se relacionando com outros animais da mesma espécie para a procriação; no entanto, o “Rokkie” dos meus primos está instintivamente preparado para funcionar num bando organizado e hierarquizado, cujos membros estão unidos por obrigações reciprocas e por relações de status, sendo a opinião de quase todos os peritos no assunto de que a sua relação com os humanos é simplesmente a ocupação por humanos dos lugares de topo da hierarquia, mas mantendo intacto o aparato social “natural”; ora, nesse caso, qual é a diferença entre isso e ter “direitos e deveres”? Afinal, o instinto do “Rokkie” é seguir aos seus superiores hierárquicos (que neste caso têm a peculiaridade de andar em duas patas) o que é mais ou menos a mesma coisa que ter “deveres”. Logo, tendo deveres, também terá direitos, não?

4 comentários:

Anónimo disse...

Não sei se o argumento de que o Rokkie tem deveres e, por isso, direitos, se afigure cogente aos olhos dos que defendem a indissociabilidade de direitos e deveres.

Para mim, talvez seja mais claro que essa premissa é que é pura e simplesmente falsa. Como é o caso das crianças, que têm direitos mas nenhuns deveres.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Miguel M:

democraticamente, é problemático falar de direitos dos animais ou "de animais".
Com efeito, em democracia, são os cidadãos os autores ou criadores das instituições e das leis que lhes conferem direitos. A participação igualitária no exercício do governo e no funcionamento das instituições é o poder que tutela e garante os direitos de cada um - obra humana, não dado natural.
Assim, em rigor, não participando os outros animais nas deliberaçõess e decisões colectivas, poderão ser objecto de deveres democraticamente fixados, mas não de direitos (democráticos). Mas não se lhes aplica a velha máxima de uma das versões da Internacional: "não mais deveres sem direitos / não mais direitos sem deveres".
Ou engano-me muito, camarada?

Um abraço para ti

miguel sp

agent disse...

Acrescentaria que os animais têm um comportamento amoral e logo, jamais poderão ser titulares de direitos, por nem sequer respeitarem os direitos uns dos outros. Veja-se o caso da predação que faz parte das suas necessidades de sobrevivência.

Miguel Madeira disse...

"Acrescentaria que os animais têm um comportamento amoral"

Não, não têm - leu bem o meu post? Os animais que vivem em bandos não têm um coprtamento amoral; têm regras que regulam a interação entre os membros do bando.

"por nem sequer respeitarem os direitos uns dos outros. "

Como não? Se numa luta entre lobos, um deles fizer o sinal de rendição deitando-se no chão de barriga para cima e exibindo o pescoço, o adversário abstêm-se de continuar a mordê-lo (mesmo podendo matá-lo com uma dentada no pescoço exposto).

E os animais respeitam não apenas direitos "negativos" mas também "postivos" como "assistência social": quando os mabecos ficam velhos e perdem os dentes, por vezes os membros mais novos da matilha mastigam-lhes a comida que depois regurgitam.

Suspeito que o que o "agent" quer dizer é que os animais não respeitam direitos de animais de outra espécie, mas mesmo isso não é totalmente correcto: p.ex., a domesticação consiste em grande parte em o animal domesticado passar a considerar os humanos (ou alguns humanos) como membros honorários da sua matilha/rebanho/etc. (por alguma razão praticamente só houve um caso relevante de sucesso na domesticação de um animal solitário).