11/03/10

BASTA!

Em política há momentos chave, simbólicos, que se forem correctamente aproveitados podem originar mudanças profundas. Acho que o governo pode ter criado, inadvertidamente, um desses momentos. Através da sua proposta de privatização dos CTT, que entre as que se encontram no PEC, é aquela cuja impopularidade mais tranversalmente atravessará a sociedade portuguesa. Esta proposta é simbólica porque coloca em evidência dois problemas fundamentais do sistema político português: a existência de um partido que se diz de Esquerda, mas cujas acções há muito desmentem tal etiqueta, e que propõe agora destruir um dos pilares que assegura um mínimo de coesão social e territorial em Portugal; o desprezo que os partidos, que têm apoiado os sucessivos governos que temos tido, demonstram perante os eleitores, propondo, sem qualquer pudôr, medidas com um profundo impacto social que não faziam parte do seu programa eleitoral. Aproveitemos então este momento propício para agir. Para mobilizar transversalmente a sociedade portuguesa contra as políticas sócio-económicas deste governo, para incitar os militantes (ocorre-me, em particular, Manuel Alegre) e simpatizantes do PS a se pronunciarem contra esta direcção do PS, para clamar por uma democracia mais participativa que assegure que a vontade dos cidadãos não possa ser ignorada. Culminando numa grande manifestação contra o governo, contra o PEC, contra a privatização dos CTT, que cerque o Parlamento no dia da votação do PEC, e que tenha como oradores os deputados do BE e PCP. Que deixem os seus lugares vazios na altura da votação do PEC, e juntem-se à multidão que grita: BASTA, não foram eleitos para isso!

9 comentários:

josé neves disse...

caro,
O prec e cerco à AdR foi há 36 anos e a grande manifestação foi nesse tempo e na Alameda. Foi aí que se restabeleceu a liberdade. O caro quer uma manifestação para matar a liberdade, senão porquê um cerco à AdR? E logo só com os deputados do blocão(pc+be) para discursar?
Tanbém não me agrada a privatização dos CTT, vivo numa pequena aldeia onde o carteiro é peça importante, contudo parece-me que há outras maneiras de protestar sem ser necessário fazer uma revolução.
Mas para os revolucionários ideológicos a revolução até pode começar se o carteiro não toca sempre duas vezes.

Pedro Viana disse...

Caro José Neves, de que liberdade é que fala exactamente? A liberdade para decidir sobre o nosso próprio destino? Não a vejo. O que vejo é um simulacro de democracia, feito de tempos a tempos, a que chamam eleições. Onde pretensamente se elegem representantes dos cidadãos com base num compromisso a que se habituou designar programa eleitoral. Que de compromisso, afinal, nada tem. Não, caro, não existe liberdade no nosso país. Podemos, claro, falar (mais ou menos) à vontade, fazer até grandes discursos, mas não há liberdade para o mais importante: decidir.

O que está em causa não é apenas, e já é muito, a privatização dos CTT. É também a qualidade da democracia portuguesa. Este momento deve ser aproveitado para dar um sério aviso ao Parlamento.

Joana Lopes disse...

Zé, acerta a cronologia: o PREC começou há 35 anos (faz hoje, exactamente...)e o cerco à AR foi em Nov. de 75.

fernando machado silva disse...

sim a ambos. mas não é só este momento, deveriam ser todos e, obviamente, não encabeçados por qualquer político - porque também o BE e o PCP são profissionais da política. o importante é o qualquer-um que vendo, sabendo, sentindo que está mal, ignora.

sempre cri que o problema não é económico ou político, mas bem próprio do que é ser humano. liberdade nunca houve, mesmo em instantes muito belos da história, liberdade nunca houve. aconteceu foi qualquer coisa a que se chamou erroneamente disso e fez-se desse conceito uma ilusão que nunca chegou a acontecer. um pouco à semelhança da liberdade da internet, que não é liberdade nenhuma - como pode haver liberdade sem rosto, sem o corpo? - e que joga continuamente o jogo do centro e da margem, que promove isso com as listas do "a ler" e "a seguir" e da opinião - como este comentário.

desculpem, não queria entrar em terreno alheio quando eu próprio não me movimento na crítica política. mas há uma certa "educação", ou se quiserem "ética" de respeito e responsabilidade ao rubro que "ensina" a liberdade e que é bastante difícil de seguir ou aplicar sem qualquer falha. essa a razão de me desculpar, porque eu não tenho essa "ética ao rubro" e o primeiro a ser criticado sou eu.

contudo, continuem com o blog.

um abraço a todos os que escrevem no vias de facto

josé neves disse...

Caro P. Viana,
Não vê, nunca viu nem nunca verá essa tal liberdade para decidir o seu próprio destino. Bem pode lutar pelas utopias "socialistas", "anarquistas", ou mais antigas como as de Pitágoras em Crotona, de Empédocles em Agrigento, de Platão em Siracusa e outras, que jamais alguém poderá definir por só do seu destino. Logo porque tem à partida um destino marcado: a velhice que o tornará dependente inevitavelmente e de seguida a morte certa. Segundo, porque devido à necessidade física de existir, o seu destino está intrinsica e imbricadamente ligado à comunidade que o rodeia e que, por sua vez também luta por determinar o seu destino. Quando quero marcar por mim mesmo o meu destino implica mexer com o destino de outros e estes provavelmente pensam para sí um destino diferente do seu.
O seu artigo é uma ladainha velha como o homem. E o que propôe, vivendo-se em democracia(a que existe e nós todos construímos), chama-se "pinochada".
Joana Lopes, apenas quiz referenciar-me à data inaugural do prec, ainda em 74. Sei que a "Alameda" foi em 75, eu estive lá.

Anónimo disse...

Caríssimo Pedro Viana:" A história da Humanidade não é a história da luta de classes mas, acentua Castoriadis, a dos horrores, se bem que ela não seja apenas isso ". Como sabe, o PS, e numa certa medida o PC e o BE, são partidos institucionais, de sistema, que apoiam a economia de mercado e o capitalismo selvagem em fase de mutação infinita. Ora, o sector dos Correios e das Telecomunicações- com a Internete e as linhas de transporte, etc- são nichos de mercado muito cobiçados, quer pelos franceses mas, sobretudos, pelos alemães. Daí o " forcing " lobbista e os falsos alarmes(?) de privatização rampante que sacodem a União Europeia. Aliàs, parece que o sector vai ser liberalizado em 2012 ou 2013. E para ir ao fundo da sua tese principal, bem lhe digo: os partidos institucionais só estão interessados nesse tipo de liberdade controlada ou parcial que V. critica. Niet

Pedro Viana disse...

O José Neves não leu bem o meu comentário. Em nenhum lado exigo ter controlo sob o meu destino. Exigo sim que tenhamos, nós todos, capacidade para decidir colectivamente sobre o nosso destino comum. O josé neves prefere que outros decidam por nós. Confia mais neles para manter a sua vida confortável, sob a sua asa protectora. É a diferença entre quem quer caminhar pelos seus próprios pés, e quem gosta que o levem ao colo.

josé neves disse...

Caro,
É Pedro Viana que fala, logo fala por sí, não pode alegar que fala por "nós". Eu que também sou "nós" não lhe deleguei representação para falar por mim.E penso que todos os outros invocados nesse "nós" também não os consultou.
PV diz que eu não li bem o seu comentário. Mas logo de seguida ajuiza:"O josé Neves prefere que outros decidam por nós. Confia mais neles para manter a sua vida confortável, sob a sua asa protectora", para rematar que gosto mais que me levem ao colo, etc.
Diga lá caro PV que comentário leu meu para tirar essas conclusões? E que sabe de mim e como ajo perante a vida para tirar tais conclusões sobre a minha conduta pessoal?
Eu tenho todo o direito de aceitar ser levado(ao colo ou não) por quem me mereça confiança, não quero é ser levado por qualquer um que me queira levar ao engano.
E termino a conversa.

Pedro Viana disse...

O josé neves realmente tem, como afirma, "(...) todo o direito de aceitar ser levado(ao colo ou não) por quem me mereça confiança(...)". O que não tem é o direito de exigir, para quem lhe merece a confiança, mais poder para decidir que aquele que possui qualquer outra pessoa. Parece não compreender a essência básica da Democracia: igual poder de decisão para qualquer membro duma comunidade. Ou então até "compreende", mas acha perigoso põr demasiado poder decisório nas mãos do povo "ignorante".