Apesar de não ter tido de fazer grande coisa por isso e sem ter feito o que poderia ter tentado fazer para animar um processo de democratização efectiva como resposta à ofensiva oligárquica que tem rentabilizado e extraído toda a espécie de benefícios políticos da "crise"; apesar da eleitoralização e parlamentarização excessivas e da distorção do seu funcionamento e do seu relacionamento com os cidadãos pela adopção tácita por parte dos seus porta-vozes de normas hierárquicas de divisão do trabalho político homólogas da economia política dominante; apesar de tudo isso e muito mais ainda, a verdade é que o BE continua a polarizar em boa medida as aspirações de muitos dos que, animados da vontade de lutar contra o regime político-económico dominante, não aceitam ver recuperada essa luta por forças que continuam a propor como alternativa e a organizar a sua intervenção política baseando-se em modelos que historicamente se revelaram tão expropriadores e opressivos como as piores variantes da ordem estabelecida que se propunham substituir.
Sendo assim, e porque contrariar o reforço do regime através do reforço na cena política estabelecida dos partidos que visam a consolidação e expansão do poder classista da oligarquia governante poderá criar condições mais favoráveis à afirmação de alternativas que ponham uma efectiva democratização das relações de poder na ordem do dia, creio que vale a pena a cartada de um "voto útil" e sem ilusões no BE.
Aqui fica, pois, o apelo.
Mas não sem uma adenda que deveria ser, mas não me parece que seja, desnecessária. O BE, do ponto de vista imediato e táctico, mas não só nem fundamentalmente, terá tudo a ganhar em, não afrouxando a sua oposição óbvia ao "bloco central" alargado e aos interesses que o alimentam e ele promove, deixar de esconder, diluir, dissimular o que o distingue do PCP, das suas propostas e das suas concepções ideológicas e orgânicas. Caso contrário, estará a esconder, diluir e dissimular as suas próprias razões de ser. Ou a diferença conta e é de princípio, meios e fins, ou, se aparentar reduzir-se a uma questão de "sensibilidade", de gosto, de escrúpulo perfeccionista, etc., torna-se insignificante e insignificantes as razões que a poderiam validar, dando argumentos suplementares à agit-prop do PCP, quando diz que, bem vistas as coisas, é na sua coerência, património histórico, superior implantação nas frentes sindicais, e assim por diante, que todos os que se opõem à troika devem votar.
Por fim, nunca será demais insistir em que, se parece indispensável à captação do voto útil, esta "separação das águas" o é também e sobretudo para que efectivamente — no campo político mais decisivo e mais amplo que se abre antes e depois das lutas eleitorais e parlamentares travadas no interior das instituições do regime — o BE possa, e prove que quer, contribuir para potenciar a acção realmente democrática dos que, como ficou dito acima, "animados da vontade de lutar contra o regime político-económico dominante, não aceitam ver recuperada essa luta por forças que continuam a propor como alternativa e a organizar a sua intervenção política baseando-se em modelos que historicamente se revelaram tão expropriadores e opressivos como as piores variantes da ordem estabelecida que se propunham substituir".
30/05/11
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11 comentários:
Com menos espaço, e retórica, que o MSP declaro que continuo abstencionista convicto. Embora já tenha cometido o meu pecado de votar em 1975 e 1976, ou seja na pré-história do regime, enterrando as minhas ilusões, e esperanças, numa urna.
Por isso mesmo penso que hoje, mais que em qualquer outra época, é na crítica do Estado, das elites políticas, e deste falso sistema democrático em que a cada eleição só se decide a facção que se vai locupletar com a riqueza social que os cidadãos mais razões têm para defender a abstenção, mesmo que a abstenção eleitoral não esgote a recusa do Sistema, nem seja um momento decisivo da luta social, não deixa de ser um indicador fundamental das ilusões (ou das desilusões) dos cidadãos em relação aos grupos dominantes.
A opção só pode ser pois recusar a colaboração com os donos do Poder nos seus rituais periódicos de legitimação onde se alimentam muitas das ilusões que dão sustentação a esta ditadura do Capital.
Caro David da Bernarda,
é difícil negar, creio eu, que o direito de voto é uma conquista histórica, se bem que de valor essencialmente "defensivo" e ainda que num sistema que, através da representação, nega a condição fundamental da democracia, que é o exercício do poder e dos direitos governantes pelos cidadãos.
Sendo assim, do meu ponto de vista, a decisão de votar ou não votar releva da avaliação da situação, relações de forças, etc. que num dado momento fazemos. E acontece que eu dei as razões pelas quais pode ser "útil" votar neste momento - aqui e agora - em eleições de representantes.
Outra linha de argumentação seria dizer que quem quer o mais, quer o menos. E que quem quer substituir à economia política dominante e ao seu Estado outra forma de exercício do poder, quer votar mais, multiplicar as ocasiões de voto e deliberação comuns em vista do autogoverno dos cidadãos adultos. Por isso, excepto se pensarmos que a abstenção cria num momento preciso (por exemplo, de duplo poder generalizado e assente em formas alternativas de auto-organização democrática) melhores condições para lutarmos por esses objectivos do que o voto (numa dada força partidária ou em branco) - creio que é preferível votar, ainda que em branco (como muitas vezes tenho feito do 25 de Abril para cá), a não votar.
Bom, o resto vem no post, e não preciso de o repetir.
Saudações libertárias
msp
"Recusar a colaboração com os donos do poder" não seria votar contra eles? Digo eu.
Não só votar, caro Dédé, mas, nas actuais circunstâncias, TAMBÉM votar.
msp
resumindo o Bloco a todo o custo
massacre-se o povo
mas salve-se Trotsky ou apenas Mao?
eu abstencionista por emigração prolongada não votei e quando votei votei em branco
que quer sou racista
ahora há apenas duas soluções
votar a favor do sistema
ou contra
e votar contra tanto faz no Partido recriado ou reconstruido pela igreja Universal do Reino
de Deus
ou num fadista imbecil que quer trazer o rei de volta
ou no BE ou na CDU
ou num Sócrates que perdeu toda a credibilidade externa e 70% da interna
a radioterapia é paga em moeda forte
os anti-virais idem
e a indústria farmacêutica nacional tornou-se vestigial
logo a menos que tenhamos uma ajuda semelhante à do Haiti
que lhes trouxe o vibrião colérico que já não aparecia desde 1910
e a emigração em massa de mão de obra escrava para a república Dominicana ahora sem Trujillo
não temos grande solução
pragmatismo
Estaline tinha muito até fez renascer a igreja ortodoxa que tinha esmagado
gogol de kapote,
pergunto-me se é decente que quem manifestamente não sabe ou não quer ler adopte um pseudónimo tão letrado. Mas isto sou eu, que tenho "a funesta mania de pensar" - ou de tentar fazê-lo - enquanto falo ou escrevo, e, já agora, enquanto ando.
msp
pergunto-me se é decente
500 desgraçados do vale do ave
terem ido para a rua duas vezes em 20 anos
e da 2ª vez arrastando 50 e 60 anos atrás de si
Gogol é muito mais do que um escritor russo morto há muito
Gogol era um enfermeiro russo que morreu de várias maleitas em 1980 e tal
algures nas areias do Sahel
em termos de miséria de certeza que apesar da sua provecta idade
ela lhe deve ter passado ao lado
Gogol é tamém um gato na feira dos imortais de Bilal
Gogol era um enfermeiro que tinha muita fé nas gentes e nas ideologias
....fantasmas percebe?
não? nã faz mal
A participação eleitoral só serve efectivamente para dar uma aparência de «democracia» e «legitimidade» a um sistema onde o Poder é exercido por quem jamais se sujeitará a votos...
O trabalho parlamentar do PCP, Verdes ou BE é-me indiferente, se fosse minimalista então defenderia o voto no PS, o mal menor. E de mal menor em mal menor iremos até ao mal maior, que é a consolidação da ditadura do Capital. A conversa mole do BE é mais social-democrata que o velho PS. E dessa social-democracia já vimos tudo que tínhamos para ver no século XX.
Só as ruas e a luta social poderão retirar o Poder às classes dominantes ou mesmo impor uma barreira às suas ofensivas. O resto é treta ou ilusão.
Miguel Serras Pereira disse...
gogol de kapote,
pergunto-me se é decente que quem manifestamente não sabe ou não quer ler adopte um pseudónimo tão letrado. Mas isto sou eu, que tenho "a funesta mania de pensar" - ou de tentar fazê-lo - enquanto falo ou escrevo, e, já agora, enquanto ando.
e se eu quisesse ser indecente
tamém diria que enquanto durmo também penso em muita parvoíce
mas tenho o bom senso de não a cuspir como verdades inquestionáveis
pensar em parvoeiras é fácil
David da Bernarda e MS. Pereira interpelam-nos a todos e numa dimensão de grande intensidade e responsabilidade. Ambos- D.B. e M.S.P. - lutam pela autonomia politica do proletariado e pela gestão operária.Por certo, sabem muito bem os efeitos perniciosos e deliquescentes que a transformação burocrática hodierna gera no espectáculo inofensivo do cretinismo parlamentar mais sofisticado." Um socialismo realizado " por conta do proletariado ", mesmo pelo partido mais revolucionário, é um completo nonsens... Como favorecer, por isso, a supremacia desses dois objectivos determinantes? Castoriadis pode-nos também ajudar nesse trabalho de libertação: " A exploração traduz-se cada vez mais através da estrutura hierarquica do trabalho e dos salários, e pela atomização introduzida no proletariado através da escala vertical do salário. Devemos denunciar sem falhas as concepções hierárquicas do trabalho e da organização social; devemos apoiar as reivindicações de salário que tendem a abolir ou a reduzir as diferenciações.Dessa forma, ajudamos a desenvolver, a longo prazo, o sentimento de solidariedade entre os trabalhadores, desmascaramos a burocracia, atacamos directamente a filosoia e os valores do capitalismo e construimos uma ponte para as concepções fundamentais do socialismo,que visam implementar a transformação das relações de produção- o problema central da revolução". Niet
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