23/06/12

A "sociedade urbana industrial"

Nesta discussão, tanto de um lado como do outro, tem-se falado na "sociedade urbana industrial"; é uma chavão há muito repetido (e lembro-me de numa aula de Inglês no 10º ano termos falado na diferença entre as cidades industriais e o campo).

No entanto, pelo menos para quem tenha crescido em Portimão nos anos 70/80, isso acaba por ser um paradoxo: afinal, lá a zona industrial era sobretudo nas aldeias vizinhas (Mexilhoeira da Carregação, Parchal, etc.); e imagino que não seja caso único - penso que em Lisboa, zonas (ex-?)industriais como a Margem Sul ou o concelho de Loures também têm uma grande semi-ruralidade implicita, com bairros operários rodeados por campo que, em muitos aspectos, não diferem muito de aldeias. E o que dizer do Norte de Inglaterra? Ou de grande parte da Rustbelt norte-americana?

Para falar a verdade, até suspeito que seja muito vezes nesse mundo industrial quase aldeão que surgem (ou surgiam) muitas das manifestações mais radicais de combatividade operária, provavelmente porque nesses ambientes pequenos pode ser mais fácil organizar sindicatos, clubes operários, etc.

Isso meu raciocínio pode não ter implicações nenhumas, mas acho boa ideia termos em atenção que "urbano" e "industrial" são conceitos não necessariamente ligados.

3 comentários:

Miguel Serras Pereira disse...

Miguel M, caríssimo: só uma observação - a noção de sociedade urbana industrial descreve uma sociedade marcada pela industrialização e pela urbanização; não implica que as cidades industriais sejam a norma. No entanto, é também claro que, com a industrialização, as cidades sofrem transformações maciças, até mesmo - ou quase sobretudo - quando não são "cidades industriais". O que não invalida, por outro lado, a tua ideia de que não é nos centros urbanos históricos que a "revolução industrial" desponta e arranca, etc. etc.

Abraço


miguel(sp)

Anónimo disse...

" Não existem Estados virtuosos senão os Estados impotentes; e ainda esses são bem criminosos nos seus sonhos", M. Bakounine. Set, 1868. Londres, Paris e S. Paulo, por exemplo, foram deixando de ser cidades industriais, desde os finais dos anos 60, quando a pressão demográfica gerou a especulação fundiária e imobiliária hoje dominante, um pouco por todo o Universo, remetendo os Parques Industriais para os arredores cada vez mais distantes dos quartiers nobres das cidades-capitais de Estado(s). Aquilino Ribeiro bem o dizia: " Ou Paris ou o alto da Serra( Lapa, Beira Alta)"...Salut! Niet

Libertário disse...

A questão central neste tema das cidades (é urgente reler, entre outos, Lewis Mumford) é do desastre ambiental e societário que representam as megalópoles da nossa época. E, principalmente, para os libertários, da impossibilidade de autogerir coisas como as grandes cidades, as grandes unidades produtivas, as grandes instituições etc. Para lá da questão «ecológica» que nos obriga a repensar essa relação cidade - campo, um qualquer projecto comunista libertário, de autogestão generalizada para dizer assim, exige, a meu ver, o pequeno, o próximo e a descentralização e o federalismo. Estas considerações são desprezadas pelos crentes no «progresso», no «desenvolvimento», na «técnica» e na «ciência». Para eles não há limites a colocar ao engenho humano. Mesmo quando se dizem revolucionários anti-capitalistas, são ainda herdeiros dum iluminismo burguês já ultrapassado. Para eles basta a revolução e a mudança do «modo de produção» e dá-se o milagre...