No lado da “barricada” em que me coloco, a ascensão surpreendente do Podemos, e aquilo que promete, tem suscitado tantas reservas quanto entusiasmo. E, embora possa parecer o contrário, isto não é de somenos, já que nos últimos anos quase todas as possibilidades que se abriram – mesmo que com menos estrondo do que neste caso – alimentaram sempre mais reservas do que entusiasmo. Temos, portanto, um equilíbrio nas expectativas e, dadas as circunstâncias, esse até parece um bom ponto de partida. Para já, parece prematuro apresentar um diagnóstico definitivo deste fenómeno, ora propondo entendê-lo como uma espécie de estertor final de um sistema ultrapassado, na medida em que mobiliza com sucesso uma série de meios e recursos altamente desacreditados nos últimos anos, ora como o início da ruptura definitiva com esse sistema em direcção a uma transformação radical e emancipatória. Passe a dicotomia básica, que serve para atalhar caminho, não ponho nenhuma destas duas hipóteses de lado.
É certo que me entusiasmaria muito mais com um fenómeno como o Podemos em Portugal. Não só pelas razões óbvias (a urgência em ver surgir qualquer coisa minimamente consequente capaz de desafiar esta modorra), mas porque neste país a solução partidária parece, de facto, a mais plausível no imediato. Não necessariamente a mais desejável, atenção, mas sim a mais provável. Por outras palavras, o meu nível de tolerância e entusiasmo com um partido cresce proporcionalmente ao grau de impossibilidade de outras “saídas”. Em Espanha, a saída partidária desilude-me mais precisamente por me parecer que a força e o enraizamento de alguns dos seus movimentos sociais, ou de outras estruturas sociabilitárias independentes dos partidos e das instituições estatais, permitiria dar (ou pelo menos esboçar) um passo noutra direcção que não a da previsível e convencional criação de um partido em disputa pelo poder dentro das instituições vigentes. Agora, este factor que contribui para a minha (ligeira) desilusão – ou este motivo para a minha apreensão – pode ser, também, um factor a contribuir para o meu relativo entusiasmo.
Vejamos: se cingirmos a nossa leitura do Podemos ao fenómeno partidário e à luta pelo poder estatal, não há qualquer razão para esperar algo de muito positivo ou, na melhor das hipóteses, algo que seja mais do que um travão ao violento ataque anti-democrático em curso. É evidente que em si isso já é muito desejável, mas, convenhamos, não passa de uma solução temporária e, portanto, de uma forma de legitimação do capital e do Estado obrigando-os, “apenas”, a redefinirem-se noutros termos. Para quem acredita que outro mundo é possível, isso, por muito bom que seja, para além de não chegar, pode ter efeitos perversos. Os sinais que nos chegam relativos ao processo da consolidação e institucionalização partidária do Podemos não contribuem para nenhum tipo de optimismo, quer no que concerne à formalização da sua estrutura (um centralismo e hierarquização crescentes, com a adopção de funções comuns nos partidos, como a do secretário-geral), quer no que concerne ao seu programa (grande parte das propostas do seu “programa económico”, por exemplo, remetem mais para respostas à lógica hegemónica, com o intuito de atenuar os seus efeitos mais brutais, sem necessariamente colocar em causa a sua “essência” ou sem remeter para uma transformação mais ampla e profunda – antes pelo contrário, diria).
Mas a verdade é que, independentemente da sua forma e do seu programa, os limites de um partido, pelas regras a que está sujeito, nunca poderia permitir algo de muito diferente nas suas consequências do que o que nos é oferecido pelo Podemos. Se assim fosse, seria outra coisa e estaria excluído do “jogo” nos em termos que se propôs a jogá-lo. O que é que o Podemos tem, então, de potencialmente diferente que nos permita manter alguma expectativa positiva? Para começar, o facto de ser, em certa medida, o resultado de uma enorme movimentação social de contestação e emancipação com alguns traços de radicalidade. Movimentação essa bastante disseminada e com um certo grau de enraizamento e, logo, com uma força própria. Se é verdade que um partido pode ter o efeito de atenuar a dimensão da enorme ruptura desses movimentos e indivíduos com o “sistema” – anulando assim a sua radicalidade e domesticando as suas possibilidades emancipatórias –, não é menos verdade que estando, por enquanto, o partido, muito mais dependente desses movimentos sociais e indivíduos do que o contrário, esse efeito perverso parece-me, para já, relativamente distante. Até porque a ascensão do Podemos foi meteórica e, para além do mediatismo, ainda não teve, creio eu, qualquer efeito significativo nesses sectores sociais. Portanto, meteórica pode ser igualmente a sua queda se incorrer numa sucessão de passos em falso característicos de outros partidos semelhantes. Por outras palavras, o sucesso e a capacidade do Podemos em ir para lá daquilo que propõe por agora – e que, como disse, pode parecer muito nas condições actuais, mas é efectivamente pouco a médio/longo-prazo – depende muito da capacidade de os referidos movimentos sociais manterem a sua autonomia e de se expandirem. Mais do que qualquer programa de governo do Podemos, o que é determinante para o seu sucesso é que este propicie as condições para que essa autonomia se mantenha e para que a força desses movimentos saia reforçada. Nem que seja ficando quietinho, isto é, evitando as tentações para controlá-los ou subjugá-los aos seus fins eleitorais e a um programa político "forte". Para isso é necessário contornar qualquer entendimento vanguardista do seu papel, assumindo-se como apenas mais um elemento de um longo processo, e, igualmente difícil, assegurar uma abertura programática e ideológica permanente. Nada disto é fácil. Sem essa pressão vinda de baixo, não só o Podemos corre o risco de não passar de um simples fogacho ou de se tornar mais um partido sensaborão como todos os outros, como esses movimentos sociais que se estabeleceram nos últimos anos podem sair fragilizados (quando mais não seja pelo tombo que o fracasso das promessas do Podemos pode provocar). Em suma: Podemos, sim, mas fazendo tudo para que esse poder e essa capacidade não fiquem, mais uma vez, entregues a um partido.
12/11/14
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13 comentários:
"os limites de um partido, pelas regras a que está sujeito, nunca poderia permitir algo de muito diferente nas suas consequências"
Exacto. E a sua própria existência depende do que se entende por "partido". Eu creio que não vale a pena alimentar mais ilusões reformistas. Os limites são claros e estão na lei de partidos e na constituição. Um "partido" institucional, ou uma cara institucional, que tem de cumprir a lei de partidos, será um bom instrumento se estiver submetido a uma estratégia revolucionária. Caso contrário, terá sempre que combater a revolução para garantir a sua própria sobrevivência.
Ou seja, não servem "partidos" que só podem existir e actuar dentro das esferas do poder, no quadro da lei (que precisamente queremos derrubar), ou ao alcance das forças repressivas desse mesmo poder. Exemplos não faltam.
A resposta que Pablo Iglesias dá aqui a Pepita não augura nada de bom: https://www.youtube.com/watch?v=Lk-gIpJ4Rm0
Os trabalhadores devem passar a coisas sérias e não deixar que seja o inimigo a definir onde é o teatro das operações. O inimigo não tem o direito de escolher o terreno de jogo nem as regras do jogo.
Cumprimentos
A popularidade de Podemos deve-se, entre outras razões, a sensação de corrupção generalizada dos partidos políticos estabelecidos e a falta de expectativas das novas gerações (dos menores de 40 anos por dar um número). Muitos dos seus apoios não desejam mudar de sistema, apenas limpá-lo. Como em Portugal não há essa sensação de corrupção generalizada um movimento como Podemos tem menos hipóteses de aparecer com força.
Intenções de voto depois das europeias
http://www.eldiario.es/politica/Podemos-tercera-fuerza-politica-pais_0_268773365.html
Intenções de voto em Outubro
http://www.huffingtonpost.es/2014/11/06/quien-vota-a-podemos_n_6113486.html
Grande parte das intenções de voto no Podemos provêem de outros partidos, IU, UPyD ou PSOE, pelo que não me parece correcto achar que é "em certa medida, o resultado de uma enorme movimentação social de contestação e emancipação com alguns traços de radicalidade".
Voto de descontentamento sim. Muito aquém da radicalidade que o 15m e os indignados mostraram, concerteza.
Cumprimentos,
Luis Ferreira
A exposição mediática do líder terá feito mais, numa fase inicial, pela congregação do voto de descontentamento do que a origem, ou pertença, do partido a movimentos sociais. Esta é a parte em que o Podemos se aproxima do fenómeno português do Marinho Pinto, embora um tenha um público ligado aos programas de entertenimento da manhã e o outro a programas com debates políticos. Depois, com o resultado nas europeias, os eleitores passaram a ver o Podemos como o partido capaz de afrontar o bipartidarismo.
O que o Iglesias pensa dos movimentos sociais, do poder a partir da base e do assemblearismo é o que qualquer outro alto quadro de esquerda pensa. É tudo muito bonito, mas é uma imaturidade, é preciso uma resposta tradicional constituída num partido com uma liderança que dê voz e poder às pessoas. Tirando a parte do ser bonito, qualquer partido diz exactamente o mesmo. E é por isso que o argumento de peso para contrariar esta realidade, tal como foi dada pelo número 2, o Monedero, é: os outros estão a mentir.
Neste vídeo o Iglesias diz o que pensa do assemblearismo. Qualquer semelhança com o 15M é pura coincidência.
https://www.youtube.com/watch?v=-pd_15IJFFw
Luis Ferreira
A mudança no discurso político, a atenção e importância crescentes concedidas ao combate às desigualdades, a ênfase no estabelecimento de uma política que supere a alternância bipartidarista que dominou o período democrático da maior parte dos países europeus e a consciência de que a democracia tem que existir noutros termos, a noção crescente da ilegitimidade da dívida e do carácter anti-democrático da UE na sua estruturação actual, entre outras coisas: quer nos agradem mais ou menos os termos em que os discursos sobre estes problemas são formulados, nada disto é alheio a uma enorme movimentação social de contestação, com fins emancipatórios, que se verificou nos últimos anos. Mais do que isso, o Podemos é possível em Espanha - e nada de parecido acontece, por exemplo, em Portugal - porque há efectivamente uma larga "tradição" de base, ligada a múltiplos movimentos sociais, nuns casos activos localmente, noutros em matérias concretas mas mais amplas no seu alcance (o caso da habitação, para dar um exemplo). Posto isto, o Podemos é resultado da conjugação de muitos factores diferentes. A questão do mediatismo do Iglesias conta, mas parece resistir, agora, ao processo inverso e não devemos esquecer que em Portugal também tiveste figuras vindas da dita "esquerda radical" com um nível elevadíssimo de popularidade sem que isso se tenha traduzido em resultados eleitorais expressivos (o caso do Francisco Louçã, por exemplo). O "voto de protesto" também tem, certamente, o seu peso. Mas parece-me bastante errado e simplista reduzir o crescimento do Podemos a isso. Até porque o voto de protesto raramente escolhe partidos com possibilidade de ganhar, ainda por cima quando têm um discurso de ruptura muito mais acentuado do que qualquer coisa que se tenha visto na esfera elegível da democracia dos últimos anos. Tal não significa que não esteja aquém da radicalidade do 15m e dos Indignados. É claro que está. Mas mesmo a radicalidade desses movimentos pode ser relativizada, até porque pelo seu carácter massivo incluía expressões muito distintas e que, em termos discursivos, nem se distinguiam assim tanto de alguns tópicos mais "pobres" do discurso do Podemos: só para dar um exemplo, a importância que se dá a expressões que pouco querem dizer, mas que (talvez por isso) têm uma grande transversalidade, como corrupção. É preciso, porém, perceber o que é que destas transformações no discurso e nos limites da sua radicalidade derivam da mudança na estrutura de acção política (i.e., da passagem de um movimento difuso a um partido com as suas necessidades de institucionalização próprias) e na tentativa que o Podemos leva a cabo de criar um discurso amplo e inclusivo que não sacrifique os seus princípios base ou as suas intenções políticas de partida (e atenção que não digo isto necessariamente em defesa do Podemos, ou seja, não digo que estas consequências, opções ou seja o que for são isentas de críticas profundas).
Quanto ao que o Iglesias pensa, não me preocupo muito, apesar do seu protagonismo. Aquilo a que o Iglesias não conseguirá fugir é da origem e da relação - mesmo que seja um mito mediático ou de marketing - do Podemos com esses múltiplos movimentos sociais ou protestos dos últimos anos. Se o Podemos insistir em comportar-se como todos os partidos tenderam a fazer nos últimos anos, o seu tombo será muito maior, parece-me, do que o desses partidos, pois as expectativas e exigências são diferentes e são bem maiores. Na "melhor" das hipóteses, caso não ceda a esse trambolhão, o Podemos transformar-se-á num partido convencional ou não passará de uma miragem que ocupou uns meses da nossa história. Em suma, não é possível ignorar que neste momento a correlação de forças é distinta e não tem como escapar a um descontentamento generalizado que se reflecte numa transformação das expectativas políticas das pessoas. É, também, por isso que digo que está em aberto perceber se este não é, em grande medida, o estertor final de um sistema em via de desagregação acelerada. Se o Podemos não conseguir contribuir para superar as limitações que este tipo de acção política tem, e que são indissociáveis dum programa de governo, e se não se tiver a consciência de que deve ter um carácter secundário face aos movimentos sociais (na medida em que não deve interferir com a autonomia destes mas que só fará sentido e terá força se se deixar ser condicionado por eles) não representará mais do que esse estertor final. Pois no fim não terá passado de uma tentativa de mudar algo para que fique tudo na mesma, quando já não me parece possível que continue tudo na mesma a médio prazo. De resto, não ouvindo na ascensão do Podemos as trombetas da revolução a soar, como é evidente, perante a ascensão da extrema-direita só posso ficar satisfeito que seja um partido de esquerda com um discurso um pouco mais ambicioso do que é normal a crescer significativamente. Só esperamos que seja minimamente consequente com esse crescimento, dentro daquilo que são as suas competências limitadas. Do mais importante estamos cá nós, espero, para tratar. Abraço
Caro Diogo Duarte,
adoptando a prspectiva do teu lado da barricada — a de autogoverno igualitariamente participado, conquista, contra as formas institucionais classistas e hierárquicas, daquilo a que chamo a "cidadania governante" -, parece-me, contudo, como procurei explicitar numa série de breves notas publicas no Vias durante as últimas semanas (cf. as observações críticas que publiquei sob o título "Encruzilhadas de PODEMOS"), que a nálise das opções em matéria de regime interno do novo partido, o seu "leninismo Mável", etc., é um aspecto fundamental, que, se devidamente tido em conta, dificilmente evitará um juízo mais próximo do que formula o nosso comentador Luís Ferreita, do que do teu optimismo, no qual pouco mais consigo ver do que uma expressão de "pensamento desejante". Enfim, tendo a crer que, de certo modo e até certo ponto, e ainda que com as devidas cautelas, as tuas considerações sobre o papel não despiciendo que um partido, que não seja a solução, mas posso contribuir para potenciar as condições de uma acção orientada no sentido da democratização instituinte, se aplica mais ao Syriza, do que ao PODEMOS.
Vigoroso abraço
miguel(sp)
Olá, Miguel,
Deixa-me começar por te pedir desculpa por não ter remetido para as notas que aqui publicaste e que li com muito interesse. Foi um lapso em que só reparei um dia depois de ter escrito este texto. Partilho, aliás, das preocupações e observações que contêm e, claro, também partilho das preocupações do Luís. Só não partilho, na mesma medida, das conclusões. Acho que é demasiado prematuro - e até um erro, diria - fazer, para já, diagnósticos definitivos e demitirmo-nos de procurar interferir com "coisas" como o Podemos. Infelizmente, o mundo em que vivemos impõe-nos fortes limitações e condicionantes que não nos deixam outro remédio que não seja o de ter, também, um plano "reformista" para que pelo menos consigamos ir respirando (não aceitando nunca, claro está, que nos liguem à máquina para o fazer). E isto independentemente de quão revolucionárias sejam as nossas aspirações. Além disso, urge, de facto, algo que possa colocar um travão a este comboio desgovernado em que nos enfiaram, sob o risco de termos que partir de uma situação ainda mais difícil do que aquela em que já estamos. Posto isto, tal não implica pactuar com ou ceder a estes projectos. O meu lugar é, certamente, do lado de fora dos mesmos, persistindo na crítica e na procura de outras formas de actuação e participação política na sociedade. E nada que possa aparentar uma expectativa mais benevolente naquilo que digo ou faço corresponde a um vínculo; ou seja, neste caso, manter certas expectativas não faz de mim um defensor do Podemos (tal como todas as vezes que votei na vida também não fizeram de mim um apoiante do partido pelo qual optei).
E é por isso que as críticas ao Podemos (críticas essas com as quais concordo, tal como disse, e das quais também não abdico), não devem, para mim, representar um afastamento absoluto. Até pelas particularidades sociais do partido em causa que procurei expressar no texto e nos comentários anteriores. Na verdade, nem vejo isto como uma questão de optimismo ou pessimismo (que representam sempre um mau ponto de partida para fazer ou pensar política). Ainda que não seja incorrecto afirmar que este "optimismo" que me imputam resulte mais dum certo "pessimismo" do que de outra coisa, fruto, talvez, de alguma desesperança a curto prazo e até de uma certa impotência. Um "optimismo" que assenta num "pessimismo", também, porque não consigo esperar muito mais de um partido do que aquilo que este, ou mesmo o Syriza, "prometem". Isto leva-me a outro paradoxo que persiste no nosso lado da barricada e que nem sempre me parece muito consequente: o de reconhecer que nenhum partido poderia corresponder - nem de forma aproximada - aos nossos "desejos" (pois seria sempre incompleto no seu alcance e seria sempre insuficientemente democrático) e, ao mesmo tempo, procurarmos ou exigirmos dele essa promessa emancipatória ou aquilo que nenhum partido pode ser. O Podemos tem todos os defeitos que lhe têm sido apontados, e deve ser motivo de toda a desconfiança da nossa parte, mas isso só pode ser um motivo de "paralização" para nós se não soubermos que o mais importante a fazer está do nosso lado, nas nossas mãos, à margem de qualquer partido ou seja lá o que for que possa padecer do mesmo tipo de constrangimentos. Para mim o partido ideal é o partido suicida, i.e., aquele que luta pela sua inutilidade e pelo seu próprio fim, fortalecendo (ou pelo menos evitando enfraquecer) tudo aquilo que possa fazer com que este deixe de ser uma necessidade temporária.
É basicamente isto que tento expressar neste texto, mais em forma de dúvidas do que tomando uma posição. E tinha noção de que os pessimistas em relação ao Podemos iam ver-me como "optimista" e, por outro lado, que os optimistas - ou pro-Podemos - iam ver-me como um pouco cínico ou pessimista. De resto, que fique claro: não espero nada de revolucionário do Podemos, nem ponho as mãos no fogo por nada daquilo que promete. O mais importante, e o "menos mau" que ele poderá ser, depende, em grande medida, do nosso lado da barricada.
Um grande abraço
Viva, Diogo.
Fazemos análises muito próximas, e há períodos inteiros da tua reflexão que eu subscreveria de bom grado.E, claro, não devemos alhear-nos das origens e da dinâmica potencialmente democratizadoras do novo partido. O problema mais grave, para mim, é o seguinte: reivindicando-se do "poder da gente", da participação da base, etc., etc., o pablismo triunfante no PODEMOS acaba por propor-se como vanguarda governante em nome (e em proveito, teoricamente) dos governados: contesta a "casta", mas reforça e reitera a distinção estrutural e permanente entre governantes e governados — como presta culto à eficácia e "profissionalismo", sacrificando ou suspendendo, em nome das necessidades do "período de transição", todos os restantes objectivos a ganhar as próximas eleições e a ser governo, reproduzindo assim, e relegitimando-a, a divisão do trabalho político existente.
Esquematizando muito, o que creio que podemos e devemos fazer é interpelar os militantes e simpatizantes do PODEMOS, mostrando que, se o que querem, é o autogoverno, o "poder da gente", a questão que se põe não é a de um outro governo super-competente ou a de um bom pastor incomparável, mas sim, a de conseguir desenvolver uma acção e formas de luta cujo regime e organização conteste e ponha em causa em acto a distinção entre governantes e governados, a divisão hierárquica do trabalho político, e a divisão política (classista) do trabalho.
Grande abraço, também para ti
miguel(sp)
Abandonando então o meu papel de advogado do diabo, subscrevo inteiramente o que dizes. Um abraço, Miguel
Muito bem, Diogo. Mas seria mais justo dizer que subscrevemos ambos uma nova posição do problema que não preexistia à conversa que entabulámos.
Obrigado e abraço
miguel(sp)
"o Podemos é possível em Espanha porque há efectivamente uma larga "tradição" de base, ligada a múltiplos movimentos sociais, nuns casos activos localmente, noutros em matérias concretas mas mais amplas no seu alcance (o caso da habitação, para dar um exemplo)". A cidade e a revolução precisam de movimentos sociais e estes têm em algum momento de fazer incursões no controlo do aparelho estatal.Quanto a Portugal foi palco de movimentações importantes mas sem sentido estratégico.Quanto a Louçã apostou na esquerda grande e falhou...aprender sempre!
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