"By contrast, a no vote would at least open the possibility that Greece, with its strong democratic tradition, might grasp its destiny in its own hands. Greeks might gain the opportunity to shape a future that, though perhaps not as prosperous as the past, is far more hopeful than the unconscionable torture of the present."
As razões pelas quais Stiglitz defende esta posição estão muito claramente explicadas no artigo.
But, again, it’s not about the money. It’s about using “deadlines” to force Greece to knuckle under, and to accept the unacceptable – not only austerity measures, but other regressive and punitive policies.(,,,) In January, Greece’s citizens voted for a government committed to ending austerity. If the government were simply fulfilling its campaign promises, it would already have rejected the proposal. But it wanted to give Greeks a chance to weigh in on this issue, so critical for their country’s future wellbeing."
O Governo grego, pelo contrário, defende a posição de que um voto maioritário no não reforça a posição negocial do Governo e reforça a sua decisão de não sair do euro. Uma posição que me agrada.
Outro economista nobelizado, Krugman, defende igualmente o voto no não e parece considerar a saída do euro como a consequência inevitável. Acusando a Troika de ter oferecido aos gregos a mesma política que os conduziu ao abismo, Krugman escreveu que " But the troika was having none of it. It’s easy to get lost in the details, but the essential point now is that Greece has been presented with a take-it-or-leave-it offer that is effectively indistinguishable from the policies of the past five years." indicando as três razões pelas quais eles devem votar no não. "First, we now know that ever-harsher austerity is a dead end: after five years Greece is in worse shape than ever. Second, much and perhaps most of the feared chaos from Grexit has already happened. With banks closed and capital controls imposed, there’s not that much more damage to be done.
Finally, acceding to the troika’s ultimatum would represent the final abandonment of any pretense of Greek independence,"
No momento em que os príncipais países do Euro entram na campanha apelando ao voto no sim, a dúvida que se instala é a de saber como é que estas almas penadas que desgovernam a Europa reagirão a um voto no não do povo Grego.
Há um dado que esta situação evidencia e que não pode deixar de ser salientado. A Troika forçou os gregos, ao longo de cinco penosos meses, à capitulação. Construíu uma narrativa sobre a sustentabilidade do euro no contexto de um Grexit. O Governo grego no último minuto recusou ceder e capitular e devolveu ao povo a decisão sobre o seu futuro. Criou assim um pânico inusitado no poder que estrangula a Europa. Mostrou que a dignidade de um povo não se pode negociar e não pode ser desrespeitada. A democracia europeia está de parabéns com a atitude dos Gregos. São atitudes destas que podem ainda salvar a Europa dos seus carrascos.
19 comentários:
Um amigo e sócio de cartório de H.Kissinger, Robert Horms, sublinhou numa cadeia de TV USA que a Alemanha quase que apostou tudo em fazer sair a Grécia do Euro. Quando se sabe a especial atenção dos USA ao que se está a passar no Mediterrâneo Oriental, as declarações do antigo vice da Goldman Sachs sinalizam uma preocupação muito grande pelo que se está a desenrolar no epicentro da crise económica e politica grega; ele assegurou mesmo que a vitória do " Não" no referendo do próximo Domingo na Grécia poderá criar e aprofundar uma situação incontrolável a todos os niveis. Niet
Caro José Guinote,
como tu, acho que é necessário resistir à austeridade, impor limites aos poderes discricionários da burocracia e dos tecnocratas da UE, mas aprofundar a integração desta a todos os níveis (orçamental, fiscal e político) num processo que deveria ser acompanhado pela defesa e conquista das liberdades e direitos dos cidadãos.
Mas o referendo imposto pelo Syriza, nos termos em que foi feito, parece-me a pior maneira de o fazer. Aliás, a confusão instaurada é tanta que, segundo parece, nem o próprio Tsipras sabe ao certo o que quer. Se defender o Não, como tem dito que fará, ainda que com ressalvas, e o Sim ganhar, a posição do governo grego sairá enfranquecida para as negociações que, seja como for, prosseguirão, ao mesmo tempo que será difícil para o Syriza permanecer no governo; se defender o Sim, mudando de posição, o resultado não será muito melhor, e o governo grego ficará igualmente enfraquecido ao negociar a concretização das promessas que lhe foram feitas, além de que (mas isso não será forçosamente mau), nesse caso, será decerto necessário ao Syriza mudar de parceiros de coligação.
Cf. para documentar a inconsistência da política adoptada por Tsipras e Varufakis os dois textos seguintes: http://expresso.sapo.pt/internacional/2015-06-30-Nem-nao-nem-sim-ultima-proposta-de-Bruxelas-ainda-sem-resposta-da-Grecia — e http://expresso.sapo.pt/internacional/2015-06-30-Gregos-pedem-novo-programa —. É absurdo recorrer a um referendo sobre questões em aberto e enquanto se abrem novas questões, apelando ao voto num sentido ao mesmo tempo que se diz que ainda se pode vir a recomendar o voto no sentido contrário, etc., etc.
Abraço
miguel (sp)
Ola,
Estamos todos em suspenso, mas tal como o Miguel (SP) não estou muito optimista. Ha uma confusão sobre os referendos e a democracia que me lembra um debate que tive ha semanas atras com o Miguel (M) noutro blogue de que agora não me recordo.
Com efeito, o apelo à soberania popular no caso da construção europeia é como aqueles espelhos das feiras que deformam a realidade. Como é obvio, é inteiramente legitimo o povo grego decidir de forma soberana que quer desligar-se da União europeia. Nesta medida, o referendo sera a expressão do direito de auto-determinação, tal como poderia (deveria) poder ser exercido por qualquer região europeia, seja ela um Estado (ainda) soberano, ou não.
Mas a ideia segundo a qual poderia sair do referendo um "não construtivo", como se sugere no post, não faz grande sentido. Assumindo que o "não" grego significa que eles rejeitam o compromisso sobre a gestão da divida, como falar de uma decisão democratica se os outros povos europeus, directamente interessados na questão, não são chamados a pronunciar-se ao mesmo tempo ? Na verdade, uma alternativa europeia ao que esta na mesa nunca podera vir de um referendo feito apenas na Grécia. Tera de resultar de um processo de maturação politico europeu, encontrado em nome dos outros povos europeus que, até ver, também são "democracias" (tal como a Grécia) e também têm voto na matéria...
Portanto, tenho muita pena, mas o referendo, neste caso, é uma birra. E o caracter completamente improvisado (numa semana ? sobre que questão ao certo ?) apenas confirma este ponto. Trata-se de uma birra : "vocês não querem ir até onde eu quero, então não brinco mais convosco !".
Mais uma vez, não quero que me compreendam mal : o direito a um Estado deixar de brincar com os outros, nesta fase do campeonato, é perfeitamente inquestionavel e seria impensavel restringi-lo. Mas dai a dar a ideia que exercer este direito é contribuir para mudar as regras do jogo, vai um passo que julgo bastante problematico.
Aquando do referendo sobre o tratado europeu, algumas pessoas disseram, com razão, que se tratava de uma forma de chantagem, pois não existia verdadeira alternativa. Pois aqui estamos no caso simétrico inverso : também ha uma forma de chantagem, e também não ha verdadeira alternativa (europeia).
As razões que podemos encontrar de criticar o referendo como modo de consulta da vontade dos povos estão perfeitamente à vista neste caso : corre-se sempre o risco de recurso populista a uma medida que é apresentada de forma simples, ocultando alternativas e responsabilidades. Sobre o tratado europeu, lembro que maior parte dos que votaram "não", na altura, fizeram-no em nome de "outra Europa". Pois bem, onde esta ela ?
Não digo, no caso de hoje, que a posição grega não tenha méritos, que os tem. Mas o referendo, temo, apenas vai tornar mais dificil aproximar os partidos de esquerda europeus (minoritarios, pois é, vamos continuar a esconder a cabeça na areia quanto tempo a este respeito ?) e po-los a construir uma alternativa com pernas para andar.
Espero que não estejamos a assistir ao desperdicio de uma bela oportunidade de organizar a esquerda europeia. Mas, como disse, não estou optimista...
Abraços
Caros,
Neste momento, parece-me que o Tsipras começa a dar-se conta da poça onde meteu a pata. Creio que ele e outros — embora não todo o Syriza — estão, de facto, mais assustados com a perspectiva da ruptura do que interessados nela. Fizeram uma jogada absurda, um bluff ou feitiço que se virou contra o feiticeiro, e estão aterrados com os efritos obtidos. O pior, para eles, é que a outra parte parece saber disso e tenta adiar para para depois do referendo as negociações das últimas ofertas feitas, apostando na hipótese de o Sim enfraquecer a posição do governo grego ou acarretar a sua queda. O perigo é que, então, os tecnocratas mais conservadores e austeritários — que são também favoráveis ao “concerto de Estados” por oposição à federação — saiam reforçados.
A desorientação é total: organizar um referendo sobre um acordo hipotético, propor outro, apelar ao Não e declarar a seguir que se querem "propostas viáveis" que permitam apelar ao Sim, etc. — tudo isso faz com que eu partilhe, agravado, o pessimismo do João Viegas. Em relação tanto à Grécia como ao futuro da Europa.
Abraços
miguel(sp)
Miguel, reconheço, para responder ao teu primeiro comentário, que a evolução das posições ao longo do dia parecem dar mostras de alguma falta de "planeamento" por parte do Governo Grego. A posição de defender o não e ao mesmo tempo pretender continuar no euro e na UE, é dificil de defender face à chantagem europeia, que Rajoy sintetizou muito bem. As pessoas que querem permanecer no euro e na UE vão tender a aproximar-se do sim. A questão que não me parece tão clara é a avaliação que fazes do impacto da marcação do referendo na evolução da posição da Troika. Hoje de manhã, numa síntese na rádio, a proposta dos credores tinha evoluído significativamente. Iva na restauração a 13%, fim da redução das pensões mais baixas e um conjunto de medidas que pareciam muito próximas das posições defendidas pelo Syriza. A evolução posterior para um novo resgate - sem o FMI - e com a condição de ser perdoada parte da dívida -pareceu-me ser essa a proposta - relevaria de uma posição de força, ou pode significar um acto de desespero. A reacção do Europgrupo, esta noite, pode significar que a avaliação que fazem da situação política na Grécia, aponta para uma derrota do Governo no próximo referendo. Julgo que nessa situação o Syriza sairá de cena, e a Troika e a austeridade terão uma enorme vitória.
João Viegas não concordo com a tese de que o recurso a um referendo apenas pode ser utilizado, neste caso, para cada estado decidir se sai ou se dica -na UE ou no Euro, nestecaso. Quem defendeu a ideia de um não construtivo foi o Governo grego e eu percebo-os e acho que essa posição é legitima. A menos que aceitemos como boa a chantagem dos credores - e não dos povos europeus - de que a austeridade - por eles imposta - não se discute, nem se questiona. A versão objectiva do famoso "as regras são para cumprir. Reconheço que este caminho pode ter representado um risco maior do que parecia à primeira cista. Mas, pergunto, aquilo que os Gregos estão a fazer à cinco meses é ou não, um "não construtivo"?
Caro J. Guinote,
o que eu quis dizer é que o preço a pagar por esta jogada dos "europeístas" do Syriza, chamemos assim à linha de Tsipras, pode ser a sua derrota na cena política grega e o reforço do bloco mais austeritário e conservador dos tecnocratas da UE. De resto, apresentar uma nova proposta antes do referendo, tentando evitá-lo, depois de se ter apelado a votar no Não, ou admitindo votar Sim, seo referendo for por diante, parece-me absolutamente inconsequente (ou o que vem a dar no mesmo: põe a nu a inconsequência do referendo).
Creio que, neste momento, Tsipras e Varufakis já se deram conta de que a solução mais favorável seria a não realização do referendo, mas não sabem como fazê-lo — a menos que consigam persuadir o outro lado — os tecnocratas federalistas, falando grosso modo — de que é do seu interesse permitir-lhes uma saída minimamente airosa.
Abraço para ti
miguel (sp)
Meu caro José Guinote,
Que a solução justa e aceitavel para todos possa/deva ser outra do que o que esta na mesa, aceito perfeitamente. Agora o referendo, que de facto é apresentado como um recurso "ao povo contra os tecnocratas" é, tenho pena, uma medida populista que não resiste à analise. Senão vejamos :
- Estamos numa negociação que não é sobre uma questão de politica interna grega, mas sobre uma questão de interesse comum. A ideia de que a ultima palavra cabe ao povo grego tem necessariamente de ser refinada : cabe ao povo grego decidir soberanamente que não quer mais negociar e que prefere sair. OK. Mas qualquer outra solução não pode depender apenas daquilo que o povo grego quer. Ocultar este ponto é demagogico, a meu ver.
- Os representantes dos outros Estados são os governos eleitos. Não gostamos da ideia de que a Maria Luis Albuquerque nos representa, mas acontece que ela faz parte de um governo eleito. Portanto apresentar a situação como um combate entre David-o-bravo-povo-grego contra Golias-o-horrivel-monstro-da-tecnocracia-sem-rosto é também, julgo eu, um bocado demagogico.
- Qualquer alternativa ao que esta na mesa (outra do que uma secessão da Grécia), passa necessariamente pela aprovação por todos. Isto é insofismavel. Ha um erro, e um erro grave (aos meus olhos), naqueles que querem mais Europa, mas não aceitam o que existe hoje. Não é assim que se mudam as coisas. As coisas mudam-se compreendendo como se atingiram os equilibrios actuais, como funcionam por dentro, e como podemos usar as suas contradições para levar a coisa mais adiante, no sentido da plena e substancial realização dos objectivos democraticos e sociais proclamados à partida.
- Finalmente, o discurso do referendo, do deitar tudo a perder, acaba por ocultar o essencial : contrariamente ao que dizes, ha debate politico e existem margens. Ninguém diz, as regras são para cumprir e agora pagas tudo ou fazes timtim por tintim aquilo que mandamos. Esta posição não seria compreendida, nem aceite, pela esmagadora maioria dos povos europeus. Não digo que seja facil construir uma alternativa. Mas reacções como o golpe do referendo, a meu ver, apenas tornam as coisas mais dificeis...
Portanto quanto a mim, o referendo não tem outras virtudes do que as de um murro na mesa. Ora acontece, ou pelo menos podemos temer que, neste momento, um murro na mesa não seja a posição negocial mais esperta. Mais construtiva não é com certeza.
Repara que percebo perfeitamente o que dizes e julgo essencial ganharmos consciência de que é urgente haver uma verdadeira alternativa ao dogma do realismo-liberalismo que criticas. Mas, quanto a mim, não é por ai...
Abraço
Oh, João Viegas: O Referendo foi o recurso in-extremis do governo do Syriza para aliviar o peso das imposições da célula ilegal da Comissão Europeia,o Eurogrupo, que alterou ao sabor de um cruel oportunismo todas as propostas de resolução avançadas pelos gregos e discutidas pelos " experts " do famigerado " Eurogrupo". Tudo isto só e possivel porque não existe-verdadeiramente e sem sofismas- uma " gouvernance " minima no interior dos 19 membros da Zona Euro, onde o peso dos ordo-liberal-monetaristas é quase ditatorial e sádico. Michel Rocard - que sinalizou há bem pouco tempo - que Draghi concordava com as analises de Krugman e Stieglitz - mas não o podia dizer em público- para lá de censurar a paralizia do funcionamento dos tratados europeus, frisa que o que divide e ameaça a Europa é um " problema de doutrina económica ", com o diktat das teorias monetaristas instiladas a todos os niveis em Bruxelas...Três grandes economistas- Maxime Parodi, Thomas Piketty e Xavier Timbeau- publicaram no Le Monde, de 29 de Maio último, um texto curto e sucinto de grande impacto: " Salvemos a Grécia pela Democracia ". Que alvitra a constituição de uma câmara de resoluções, embrião de uma verdadeira câmara parlamentar da zona euro para a resolução da divida grega.O que preconizam nesse sentido para esse orgão consultivo essencial, portanto: evitar acordos-à-força, suspender o reembolso sine die da divida, criar um fundo comum das dívidas, elaborar a sua reestruturação e " fixar as regras democráticas enquadrando a escolha do nivel comum de déficite e investimento na zona euro ", combatendo o bricolage politico amador e antidemocrático actual...Niet
Caros J. Guinote e João Viegas,
"Em carta aos líderes das instituições, Grécia aceita proposta técnica do fim de semana. Propõe algumas "emendas e clarificações". Teleconferência do Eurogrupo foi adiada para as 16h30. Euro dispara" (cf. http://observador.pt/2015/07/01/decida-se-sr-tsipras-o-povo-esta-em-agonia-escreve-o-to-vima-em-editorial/ ).
Se isto se confirmar, mostra que, como eu supus ontem, Tsipras procura evitar o referendo a todo o custo, contanto que lhe permitam uma capitulação minimamnte (não muito…) airosa. Para já, o Eurogrupo fá-lo esperar (adiando a reunião para a tarde, como se o assunto não fosse urgente), provavelmente para o fazer sentir com mais força a posição enfraquecida em que o colocou o bluff. Ao contrário de outros membros destacados do Syriza, Tsipras talvez seja mais nabo ou inconsistente, por força da inconsistência da esquerda sem alternativa a que pertence, do que um porta-voz da “esquerda nacionalista” ou “soberanista” — quer dizer, faz-me pensar mais num tipo que saiu do BE com a Ana Drago do que no Francisco Louçã. De momento, tenta desesperadamente que a permanência da Grécia na UE e na zona euro não lhe custe o governo (e/ou a liderança do partido). Mas é difícil crer que, no caso de os termos da sua capitulação virem a ser aceites, possa manter a coligação com os nacionalistas. Para quem se virará, então, ainda que não haja de imediato cisões demasiado pesadas no Syriza? Só uma coisa, de momento, é certa: se a sua cedência for aceite e o referendo ainda puder ser evitado, o governo grego vai negociar a solução que Tsipras propõe numa posição extremamente enfraquecida — tanto na Europa como na própria Grécia.
Abraços
miguel(sp)
João Viegas relativamente ao teu último comentário há um conjunto de coisas com as quais concordo. No entanto mantenho uma divergência: no contexto de uma Europa em que a componente representativa da democracia esmaga a componente participativa - para mim um dos grandes males desta Europa - não me parece muito adequado a tua linha de raciocínio. Em relação a esta questão concreta parece-me fazer todo o sentido a consulta. Querem os gregos ou não aceitar a austeridade imposta pelos credores e ignorar as propostas que aprovaram em eleições gerais?
Reconheço que o caminho era estreito e perigoso mas duvido que, neste contexto, existisse outro. As vantagens que o processo despoletou pareceram-me evidentes numa primeira análise. Mas, as notícias contradizem-se e há posições do Governo grego que aumentam a confusão. Como refere o Miguel a carta de Tsipras pode significar uma capitulação e, de certa forma, o reconhecimento de que a opção tomada é errada.
Recordemos que ontem de manhã do lado das instituições havia uma proposta muito mais generosa do que aquela que tinha sido inicialmente discutida. Parece-me um erro crasso que o Governo grego recue sem forçar a renegociação da dívida e um terceiro resgate com condições muito mais favoráveis. Aliás há mais um documento secreto revelado hoje pelo Guardian que mostra o que a austeridade irá fazer à Grécia a longo prazo. (http://www.theguardian.com/business/2015/jun/30/greek-debt-troika-analysis-says-significant-concessions-still-needed) Chamo a atenção para o facto de sondagens hoje divulgadas darem uma vitória ao Não - veja-se o post do Miguel Madeira - ao contrário do que se noticiava ontem à noite. Quem sabe se ao fim da tarde as posições da Merkel e do Eurogrupo se amaciam em função desta tendência eleitoral?
Caro J. Guinote,
ao que parece, agora que o governo grego transige ou está disposto a aceitar as condições dos federalistas mais conciliadores do Eurogrupo, é, como seria de esperar, a "ala dura" do austeritarismo que o quer impedir de desconvocar o referendo e declara que o acordo inicialmente recusado por Tsipras caducou. Schnäuble, por exemplo, já veio dizer que as circunstâncias mudaram e que posteriores negociações devem ser feitas tendo em conta essa mudança. Vamos ver até que ponto a reacção consegue aproveitar o balanço para avançar e tentar prevalecer sobre os "conciliadores".
Abraço
miguel(sp)
Caros,
Percebo perfeitamente o que dizem. Vou tentar resumir o unico ponto em que discordo do José Guinote, unico mas importante : admitindo que é inteiramente legitimo que os Gregos queiram resistir a uma solução que lhes é imposta em nome de um "realismo" contabilistico de inspiração marcadamente liberal, a iniciativa do referendo foi, a meu ver, a pior maneira de o fazer. Isso essencialmente por duas razões :
- E' completamente ineficaz na medida em que se presta a criticas obvias, e fundadas, por ser demagogico. Podemos pegar na questão por onde quisermos, mas é inquestionavel que o referendo constitui uma ameaça de secessão, não pode legitimamente ser compreendido de outra forma. Fingir que se trata de outra coisa não faz sentido. Logo, o referendo tem como efeito necessario, cortar as relações com as forças de esquerda europeistas que, dentro da União, têm simpatia pela posição grega.
- E' politicamente errado e da o pior sinal possivel. A construção europeia implica cedências. A Europa nunca podera construir-se com este tipo de intransigências. A esquerda europeia ainda menos. Ora o Syriza devia estar a mostrar que é possivel construir uma politica economica alternativa de esquerda dentro da Europa. O referendo vai no sentido oposto...
Abraços
O que eu vejo como totalmente ineficaz - e próprio de quem responde "nim" - a postura de quem, como vocês, não admite uma ruptura com a União Europeia mas ao mesmo tempo não se reconhecem na maioria social que de Merkel a Hollande, de Renzi a Rajoy. No âmbito de um governo em que estes interlocutores do viasdefacto fossem chamados a decidir, para além de abstracções internacionalistas que políticas económicas é que proporiam? Porque vejamos, quando Miguel Serras Pereira diz, e concordo em abstracto "acho que é necessário resistir à austeridade, impor limites aos poderes discricionários da burocracia e dos tecnocratas da UE, mas aprofundar a integração desta a todos os níveis (orçamental, fiscal e político) num processo que deveria ser acompanhado pela defesa e conquista das liberdades e direitos dos cidadãos.". Pergunta: no quadro de um governo eleito que tem um mandato de quatro anos e face às hegemonias políticas e ideológicas europeias, acha possível no tempo útil de um mandato normal de 4/5 as regras de integração europeia? E neste sentido, a ''divergência'' de João Viegas - "uma alternativa europeia ao que esta na mesa nunca podera vir de um referendo feito apenas na Grécia. Tera de resultar de um processo de maturação politico europeu, encontrado em nome dos outros povos europeus que, até ver, também são "democracias" (tal como a Grécia) e também têm voto na matéria..." - parece colocar o surgimento dessa alternativa num nunca intemporal, e não vejo um mínimo de contacto com a necessidade de combater imediatamente a austeridade que massacra socialmente centenas de milhares de europeus. Sinceramente, não me parece legítimo criticar a estratégia política de Tsipras e do Syriza quando o que se tem para oferecer em troca são os amanhãs que cantam, ou em palavras vossas, ''um processo de integração'' ou ''um processo de maturação político europeu'' que parece vir a longo prazo, nesse longo prazo que como dizia Keynes, nesse longo prazo em que estaremos todos mortos. Rui Costa Santos
Rui Costa santos,
o facto de não se poder fazer imediatamente tudo o que seria melhor, não justifica que se faça mal o que se faz. E a inconsistência da atitude de Tsipras não precisa de outra ilustração para lá das bruscas inflexões contraditórias que ele próprio tem assumido. Leia com atenção os argumentos e pressupostos a que Tsipras e Varufakis têm recorrido desde a ruptura das negociações — que, afinal, não queria ser uma ruptura — e da convocação do referendo — que, afinal, neste momento, estão a fazer tudo por evitar. É quanto basta.
Saudações democráticas
miguel(sp)
Caro Rui Costa Santos,
Sim, pela parte que me toca, é verdade que não acredito numa ruptura com a União Europeia. Melhor dizendo, acredito que a ruptura com as politicas de austeridade tera de ser conseguida dentro do quadro da União Europeia (numa União aprofundada, mais democratica, mais integrada, mas julgo que a evolução deve fazer-se a partir daquilo que temos hoje).
Não acredito na estratégia de ruptura total com a ordem europeia actual, ou melhor, não acredito que esta estratégia seja eficaz para reformar a Europa, e as politicas neo-liberais seguidas hoje nos paises europeus. Em teoria, a ruptura pode ser um ponto de partida, mas na pratica tem de existir uma alternativa. Neste caso, a alternativa não existe. O isolacionismo reivindicado pelos "soberanistas" ? Não tem a minima hipotese, nem na Grécia, nem em Portugal, nem em Estados mais ricos da União. Assim sendo o que resta : um projecto democratico alternativo ? Onde esta ele ? Onde estão as forças politicas organizadas que o podem encarnar ? Se nos limitarmos às forças que se reclamam da esquerda, onde é que existe a primeira vaga sombra de unidade a este respeito ?
A ideia de uma ruptura total, neste momento, é uma fantasmagoria que nasce do desespero. Percebo o desespero, mas não comungo. Não é possivel construir, num quadro democratico (aperfeiçoavel, como é obvio, mas não é assim em todo o lado ?), uma proposta politica de esquerda a nivel europeu ? Porque é que não é ? E, sobretudo, porque razão barroca isso deveria ser mais possivel a nivel nacional ?
Foi mesmo o sentido do meu comentario : o referendo na Grécia situa-se claramente numa perspectiva de desespero, ao revés daquilo que entendo que foi a proposta do Syriza : uma politica para reformar a Grécia dentro da Europa, e para abrir novas perspectivas para uma alternativa de esquerda dentro da União europeia.
Quem não acredita nisso acha que o referendo é bom. Percebo perfeitamente a logica. Discordo, mas percebo a logica.
Saudações democraticas
Por que é que o Sitemeter do Blogue está avariado, não sei há quanto tempo? Gostaria de ver o impacto das evocações das teses que citei, indo de um colega de cartório de Henry Kissinger às fantásticas análises de Parodi, Piketty e Timbeau, que completam excelentemente as posições de Krugman e Stieglitz,que claramente estão do lado do governo do Syrisa, para não falar da sensacional revelação anterior analisada por Jacques Sapir ao denunciar à escala mundial a célula ilegal da Comissão Europeia que é o Eurogrupo. Claro que o Syrisa tem muitos defeitos e reais limites de ordem politica, e quem anda a chuva molha-se numa Europa dominada pela ditadura da economia de mercado, essencialmente..Entendo também que o J. Viegas parece concordar com tudo: é a favor do Sim e do Não, numa curiosa dialéctica dificilima de catalogar...Como afirmou Vaneigem, " a transparência das relações entre os seres humanos e sociais tornada possivel pela ausência de tábus, de preconceitos e de espartilhos, encoraja não a autocritica mas a auto-correcção permanente. O único erro irremediável seria preferir a uma assembleia que se engana um comité que tem sempre razão ".Niet
O juízo do Niet sobre o João Viegas, independentemente de se concordar ou não com o que os seus comentários argumentam, é ditado ou por uma leitura obtusa ou pela má-fé (há ainda a hipótese, que prefiro não considerar, de ser superiormente inspirado por ambas).
Quanto à citação do Vaneigem, que é a reprise de uma frase célebre de Rosa Luxemburgo, se a tomarmos como critério de apreciação da convocação DESTE referendo por Tsipras, o que há a concluir é que o "comité central" ou o "secretário-geral" e os seus próximos não suscitaram qualquer discussão em assembleias organizadas ou sequer por parte da "opinião pública inorgânica" acerca das negociações ou dos acordos a apreciar, limitando-se a propor aos eleitores uma versão simplificada do que está em jogo e não lhes deixando outra possibilidade além de responderem Sim ou Não a uma pergunta viciada. Se é esta a concepção da "democracia directa", "conselhista" ou "participativa" que o Niet advoga, estamos conversados. Se não é, o exemplo que escolheu não podia ser mais absurdo.
msp
O grande poeta e intelectual militante Miguel Serras Pereira nem sempre tem razão e devia, se possivel tentar ( ainda mais) perceber a realidade das coisas. Há anos que o grande Michel Rocard anda a dizer que a União Europeia era um sonho e quase que se transformou numa enorme desilusão.Ultimamente frisou mesmo que estava muito pessimista. A extrema finesse e inteligência de Rocky não engana nem ilude ninguém.Como também Delors explicou muito bem todos os buracos que a integração atabalhoada geraram na eclosão de um monstro burocrático e onde impera a lei do mais forte. Tudo a favor do mercado-rei, da concorrência terrivel e sem alma entre as economias dominantes. A Alemanha foi destruindo por exemplo, a pouco e pouco, toda a concorrência europeia( e não só) na indústria automóvel, da Suécia a França e Itália, com requintes de predador sanguinário como é evidente. E tentam cada vez mais e ainda com mais força e perfidia os outros sectores dito estratégicos... Desde a primeira hora, no anonimato dos meus comentários sempre me mostrei extremamente critico em relação ao projecto Syriza. É inegável.E a fundamentação do projecto autonómico e de libertação do proletariado é a minha tarefa de todos os instantes, como é bem sabido E MSP faz-me o imenso prazer de me levar a imaginar que ando no bom caminho, com mais ou menos audácia e fulgor: " Á força de dividir os vexames e de os multiplicar, é ao átomo de realidade invisivel que nos defrontaremos, mais cedo ou mais tarde, libertando de repente uma energia nuclear que não imaginávamos sobre tanta passividade e morna resignação. O que produz o bem comum, é sempre terrivel ", R. Vaneigem. Salut! Niet
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