18/05/12

E ainda mais outra sondagem grega...

Feita a 15 e 16 de Maio, publicada no semanário To Pontiki (tradução):



Estes valores parecem ser já com distribuição de indecisos e abstencionistas (até porque antes deste quadro há outro que parece ser com valores não distíbuidos).

A sondagem também perguntou a opinião dos inquiridos sobre a permanência no euro. A resposta foi um bocado ambígua:

54% say “stay in Euro with sacrifices up to a certain extend, otherwise back to drachma”

34% say “Euro at any cost”

7% say “return to Drachma now”

5% say “Don’t know/Don’t answer”

Adenda: entretanto saiu mais outra [pdf] sondagem (feita entre 15 e 17 de Maio) com resultados opostos (via Joana Lopes nos comentários e também Keep Talking Greece):
ND 26.1 % 123 seats

SYRIZA 23.7% 66 seats

PASOK 14.9% 41 seats

INDEP GREEKS 8.9% 23 seats

KKE 5.8% 16 seats

DEMOCRATIC LEFT 6.3% 18 seats

CHRYSI AVGI 4.8% 13 seats

Os países inventados da Europa

17/05/12

Lição de grego (8)

Durão Barroso sugere a transformação das eleições gregas num pleibiscito ou referendo sobre o euro. A ideia é substituir a uma escolha entre políticas alternativas a consagração do euro, que, por si só, define a política a seguir e torna, em rigor, dispensáveis as eleições. Mas, na realidade, uma coisa é a moeda única e outra as questões que se levantam a propósito dos programas de governo, das formas institucionais, do regime político e económico da UE.  E é só em função deste conjunto de questões que a questão do euro se pode levantar razoavelmente. Dizer, como o faz Durão Barroso, que a questão é o euro é tentar levantar uma cortina de fumo sobre a grande questão política imediata, que, essa sim, deve ser objecto de deliberação e decisão, tanto por parte dos gregos como de todos os cidadãos da UE: refiro-me, evidentemente, ao pacto austeritário que Durão Barroso e os interesses oligárquicos, de que ele se faz porta-voz e intérprete, pretendem, na Grécia como em toda a UE, impor como novo pacto social.

16/05/12

E mais uma sondagem grega

Sondagem (pdf, em grego) feita entre 10 e 14 de Maio, ainda antes de se saber se ia haver governo ou eleições:


Penso que a esta altura do campeonato já toda a gente saiba identificar cada partido no gráfico.

Estes resultados parecem-se ser sem distribuição de indecisos nem de abstencionistas (os votos dos partidos mais os 9,7% de abstenção - o rectângulozinho azul - mais os 23,3% cinzentos - que me parecem ser os indecisos - dão quase 100%), o que quer dizer que se os mesmos resultados se repetissem numa eleição, as percentagens dos partidos seriam maiores do que aparece ali (p.ex., os nazis, que aqui têm 2,2%, ultrapassariam os 3% necessários para entrar no parlamento).

A respeito da personalidade preferida para primeiro-ministro (página 7):

Alexis Tspipras............16,7%
Fotis Kovelis...............13,6%
Antonis Samaras.........12,1%
Evangelos Venizelos....10,8%

[os outros têm todos menos de 5%, e ainda por cima o tradutor do Google dá nomes muito estranhos para alguns...]

Por outro lado, 59% dos inquiridos queriam que se formasse um governo e apenas 32% queriam eleições (página 6). Como não aconteceu o que queriam, é possivel que um descontentamento com os (ou alguns) partidos por causa disso altere estes resultados todos.

Lição de grego (7)

Concorde-se ou não com outras posições de Tsipras e do Syriza, concorde-se ou não com as bases programáticas gerais do segundo, e por mais que se deva ter presente que nenhum partido — incluindo aquele a que alguns de nós possam pertencer — nos representa ou pode, sem nos subordinar, substituir-se ao exercício directo da cidadania comum, entra pelos olhos dentro que Tsipras se limita a reconhecer sobriamente a realidade dos factos quando, como lemos nos jornais, "acusa a chanceler alemã Angela Merkel de estar 'a brincar com a vida das pessoas'", e acrescenta que "a doença da austeridade está a destruir a Grécia e irá espalhar-se por toda a Europa".

 Resta-nos — tomando nota destas evidências, e recusando-nos a alimentar a fantasia tão inconsistente como impotente de que, quanto mais avançar a doença (a austeridade, a miséria de massa, a eventual ruptura da UE, seguida pelo recrudescimento dos nacionalismos, de eventuais conflitos guerreiros, de ditaduras e regimes militares…), mais próxima estará a "revolução"— concluir, também nisso pelo menos de acordo com Tsipras, que o isolamento da Grécia( no interior da UE ou fora dela, por iniciativa de um seu eventual governo ou por iniciativa das instâncias que governam a UE…) só facilitará a "brincadeira" de Merkel e dos interesses que a sua política veicula, tanto na Grécia como no resto da Europa e do mundo, e que, pelo contrário, será ao nível da UE, e através luta dos seus cidadãos comuns, que se trata, para já, de travar a austeridade, defender os direitos e liberdades fundamentais, sendo essa a única maneira imediata de assegurar, em suma, as condições de possibilidade de uma extensão e aprofundamento dos "muitos" cujas subalternização, exploração e precaridade o poder dos interesses oligárquicos e classistas que o nome de Merkel significa tentam constitucionalizar e instituir como o nosso quadro normal de existência.

Encruzilhadas da UE: via federal e democratização

A UE não é a unidade ou conjunto político organizado dos países e regiões que a compõem. É uma espécie de instância tutelar, não eleita e não responsabilizável extra partes, que se vem somar às unidades pré-existentes, para, em cada vez maior medida, as governar do exterior. Assim, no seu quadro, o Estado-nação (ou coligação de Estados-nação) mais forte, ocupando os postos de comando dos aparelhos de decisão da UE, tende a reduzir os outros à condição de Estados-vassalo, e, dentro destes, os direitos e liberdades dos cidadãos, conquistados contra as prerrogativas das camadas oligárquicas que detinham as alavancas de comando dos aparelhos de Estado propriamente ditos e dos aparelhos de direcção da economia, tendem a esvaziar-se de conteúdo efectivo e a ser reduzidos à insignificância. O resultado é o que a linguagem corrente traduz na perfeição em frases como: "A UE exige de nós…", "A UE impõe aos países da zona euro…", "A UE não permite…", etc., etc. — frases que traduzem a exterioridade que protege e absolutiza as instâncias reais que nos governam. Ora, não se tornariam as coisas mais claras aos olhos dos cidadãos comuns que somos, e não limitaria o poder das oligarquias governantes, uma transformação federalista da UE, que nos permitisse responsabilizar directamente o seu governo como sendo, para cada país, o "nosso"(ainda que este "nosso" designe o inimigo com que temos de nos haver)? Ou, por outras palavras, que, quando nos referíssemos à UE, nos fizesse dizer, por exemplo: "Este governo não serve, é necessário mudá-lo" — ou: "O problema não é só o deste governo, é de regime; é o regime, ou são as instituições e a nossa relação com elas, que temos de mudar, através da instauração de outras formas de poder político, devolvendo as capacidades de deliberar e decidir aos cidadãos que somos, pois que é do nosso governo que se trata, e é a nós que, como cidadãos adultos, compete a tarefa de nos governarmos"? Dizer que a federação por si só, ou em si própria, não basta para desencadear o processo de democratização radical que a sobrevivência da nossa condição de cidadãos activos torna uma necessidade cada vez mais urgente, é, sem dúvida, verdade. Mas é verdade também que tornaria mais favorável abrir-lhe caminho.

15/05/12

Noticias de Singapura

É uma notícia de há 10 anos, mas não deixa de ser interessante:
In the media frenzy, Singapore was depicted as a rigidly authoritarian state where one should not expect to vandalize cars without accepting the punishment — three whacks with a rattan cane — as Fay eventually did.

But Singapore is trying to loosen up, and the government, from no less an authority than founding father Lee Kuan Yew, has appointed a task force to figure out how to do it.

The "Remaking Singapore" committee, ceremoniously unveiled this year and made up of the country's brightest minds, takes social engineering to a new level. Its assigned goal: to create a more soulful society.

"We've been very rigid, very robotic in the way we approach life," said Mohd Haris Manaf, of the Singapore International Foundation, a government-sponsored organization similar in function to the Peace Corps. The foundation itself, some point out, is a sign of a changing ethos.

"We're trying to open up more, to get beyond the five C's (career, condo, club, credit card and car), to loosen up as a people and smell the roses."

Rarely has an authoritarian state attempted a squishier project. If it can be done, however, Singapore may be the republic to do it. The quest would be no more a leap in consciousness than it took to transform this swampy isle at the edge of the South China Sea into one of the most prosperous nations in the world. (...)

A main component in Singapore's spectacular rise has been its tightly controlled populace. It is one of the most micromanaged societies in modern history. (...)

In addition to the "don'ts," the government has pushed a bewildering array of "do's" that, to many Americans, might smack of Orwellian social engineering.


There was the Smile Singapore campaign intended to make tourists feel loved and therefore boost tourist dollars. Immigration officers were given government-issue mirrors to periodically check their grinning quality.

Currently there's the Singapore Kindness campaign, the Speak Good English movement, and the Tribunal for the Maintenance of Parents, requiring people to support their parents in old age.

Alarmed by its declining birth rate, the government formed the Working Committee on Marriage and Procreation, which exhorts Singaporeans, especially those with college degrees, to marry and have sex as often as possible. Toward that end, the government runs an online matchmaking service for college graduates.

A pamphlet on how to date successfully, distributed by the government's Social Development Unit, advises that you "obtain a repository of information" from the Internet and newspapers so that "you will not be caught in a situation where you run out of conversation topics."

The pamphlet also says "oral hygiene cannot be ignored because there's no bigger turn-off than a foul mouth reeking with leftovers from lunch."

The government-controlled press, in unison, recently ran stories on the best places in the city to park and smooch, going as far as suggesting ways to ensure privacy, for example, by covering the car windows with newspapers.

Poking fun at the government's long reach, Asad Latif, a journalist for The Straits Times, announced mockingly at a meeting of the Remaking Singapore committee:

"The Singapore government has decided that the people shall be more spontaneous."

Novas eleições na Grécia

Keep Talking Greece:
04:18 pm

Kouvelis statements “The country is heading towards new elections

13/05/12

Elogio da Esquerda Radical grega


o meu artigo no i da última quinta-feira

Um boi não é um elefante, tal como um tigre não é um elefante, mas estes dois factos não permitem concluir que um boi e um tigre são uma e a mesma coisa. Lamentavelmente, é algo tão elementar como isto que a maioria dos comentadores políticos tem dificuldade em compreender, como mostrou a sua reacção às eleições gregas do último fim-de-semana. Os votos gregos, é sabido, permitiram à chamada Esquerda Radical (Syriza) obter um extraordinário resultado eleitoral e também permitiram a um partido neonazi entrar pela primeira vez no parlamento. Ora, a coincidência entre estes dois factos bastou para que a generalidade dos comentadores políticos viesse a terreiro alertar contra o perigo do extremismo, procurando meter a Esquerda Radical e os neonazis num mesmo saco.

Filiados numa tradição liberal que se tornou hegemónica nos últimos vinte anos e que, do centro-esquerda ao centro-direita, acreditou que o parlamentarismo político e o liberalismo económico norteariam a humanidade até ao fim dos seus dias, os nossos comentadores políticos parecem ter simplesmente perdido o norte. A actual crise mundial e a diminuição da credibilidade das narrativas liberais levam a posições terroristas que deveriam simplesmente envergonhar quem as assume. Porque o que os nossos comentadores nos estão a dizer sobre o extremismo dos gregos é, e traduzindo para a realidade portuguesa, que um Francisco Louçã e um skinhead Mário Machado sãao uma mesma e a mesma coisa.

Peço desculpa aos nossos comentadores, mas eu não compro esta argumentação. Bem sei que o debate em torno do totalitarismo fez o seu caminho durante o século XX. E até acrescentaria que nesse debate existem contributos importantes para quem, à esquerda, pretende travar um combate radical contra o liberalismo reinante e o fascismo emergente. Mas, e dito isto, é para mim claro que depois da queda do Muro de Berlim o debate em torno do totalitarismo acabou por ser cada vez mais reduzido a uma simples vulgata que tem servido quase simplesmente para combater a pluralidade de pontos de vista políticos. Nomeadamente, os pontos de vista de uma Esquerda Radical que os comentadores tentam sistematicamente desautorizar apresentando-a como expressão do tal monstro totalitário. 

Existem, além do mais, efeitos particularmente preocupantes que resultam do sucesso da vulgata anti-totalitária que hoje parece resumir a essência dos liberalismos. Um desses efeitos é a diminuição da capacidade de auto-crítica dos liberais. A tese de que os extremos se tocam tende a impedi-los de ver quão próximo o liberalismo esteve dos próprios extremos que denuncia. A tese não deixa que os liberais vejam a estreita colaboração entre grandes pensadores liberais como o economista Milton Friedman e regimes ditatoriais de extrema-direita como o de Pinochet. Não deixa também que os liberais se lembrem das relações de proximidade entre vários grupos e correntes liberais e as ditaduras de Hitler ou de Salazar. E, last but not the least, não deixa os nossos liberais recordarem que foi muitas vezes sob o signo do liberalismo, fosse ele de índole mais autoritária ou de tonalidade mais democrática, que teve lugar a aventura colonialista que aterrorizou uma grande parte do planeta. Não foram poucas as vezes que os liberais sacrificaram por completo os valores da democracia em nome da salvação do sagrado respeito pela propriedade privada.

Mas a vulgata anti-totalitária produz ainda um outro efeito não menos preocupante. Ao não hesitarem em dar como iguais a Esquerda Radical grega e o partido neonazi grego, mostrando tanto empenho na defesa do liberalismo económico (fortemente atacado pela Esquerda Radical) como na defesa do liberalismo político (fortemente atacado pela extrema-direita), os liberais de hoje não vêem os seus próprios erros actuais. Ávidos de irmanar a Esquerda Radical e a extrema-direita, os nossos liberais ignoram, por exemplo, que um dos pontos mais relevantes para a actual ascensão dos neonazis gregos (ou da extrema-direita francesa) é a crescente popularidade da sua mensagem de ódio aos imigrantes. E esquecem que neste particular aspecto, como em vários outros, as políticas levadas a cabo pelos partidos liberais do centro-esquerda e do centro-direita, na Grécia como na generalidade da Europa, estão bem mais próximas das políticas de repressão da extrema-direita. E se quem desta se demarca claramente é pelos nossos comentadores tido como radical, pois que então sejamos todos radicais. 

Atenção ao Passa Palavra

O Passa Palavra acaba de publicar um importante texto que retoma e precisa os seus propósitos e princípios peculiares. Embora apresentado como resultado de um debate interno, o texto agora publicado está muito longe de interessar apenas ao próprio colectivo que faz o Passa Palavra. Acompanhando a viva recomendação de uma leitura na íntegra, aqui ficam, à laia de prova, os dois parágrafos finais do documento.

Entendemos que, para além de apontarmos as mazelas produzidas pelo capitalismo e nos posicionarmos contra a cobertura das grandes corporações de mídia, num trabalho de desconstrução das mentiras que nos são impostas, devemos também enfatizar a reflexão crítica sobre as limitações e contradições de nossas lutas e organizações e sobre os caminhos que levaram à nossa derrota. Isto exige a coragem de reconhecer que fomos vencidos. Não só de o reconhecer, mas de o afirmar publicamente. E não só de o afirmar, mas de erguer a partir daí as nossas reflexões. Não adianta dizer o quanto somos bons ou o quanto somos injustiçados e o quanto eles são maus, mas importa reconhecer que, se fomos vencidos, é porque fomos fracos. Por isso, a reflexão sobre nossas fraquezas já é, por si mesma, uma proposta política. Essa reflexão implica, mais uma vez, que pensemos sobre nossos limites e procuremos saídas para os desafios com que deparamos. 


Ao iniciarmos debates, ao desenvolvermos o sentido crítico, ao colocarmos em causa lugares-comuns admitidos por preguiça mental ou por oportunismo político, estamos a adiantar propostas, uma vez que a política é, por definição, um campo cujos acontecimentos não podem ser tratados sem ao mesmo intervir nos seus desdobramentos. É esta a nossa proposta política e é com ela que procuramos nos diferenciar de outras propostas políticas. Nesse sentido, entendemos que projetos que tenham a finalidade de estimular a reflexão crítica são capazes de adiantar muito mais propostas do que aqueles que se confinam a receitas ideológicas e a manuais de correta atuação política. Não entender que a reflexão crítica é, por si mesma, propositiva significa cair no dogmatismo, que consiste na escolha de ideias já feitas. Então, ou temos um esforço crítico ou um fast food ideológico, que, se não é paralisante, mobiliza apenas para a produção do consenso.

Lição de grego (6)

Se não é possível calcular em que medida a luta anti-troika na Grécia poderá ter influenciado o desgaste indubitável que o governo de Angela Merkel começa a conhecer na Alemanha, é absolutamente certo, em contrapartida, que a possibilidade de fazer recuar a ofensiva antipopular da economia política governante, que associamos ao nome de Angela Merkel e à hegemonia política do seu governo à escala da Europa, passa pela Grécia e pela maneira como nos outros países da UE soubermos retomar a questão grega — e responder-lhe.

Notas de Amador Fernández-Savater sobre o 15-M: Fazer acontecer de novo a política, "autorizar o futuro"

A  cultura de la transición (CT) foi, em Espanha, o nome corrente e mais expressivo do acordo ou pacto de regime que, um pouco por toda a Europa, as oligarquias neoliberais governantes estabeleceram como quadro — ou "constituição" — que define e fixa as formas e substância da acção política legítima — ou seja,  as questões e magens de escolha que o establishment da UE impõe como as únicas  legítimas. Segundo Amador Fernández-Savater a importância do 15-M está em ter mostrado, contra essa cultura que hoje a oligarquia tenta constitucionalizar oficialmente, através de tratdos e pactos de "estabilidade", a possibilidade e a urgência da interrogação decisiva da política: "Como queremos viver juntos?", enquanto questão que a todos os cidadãos compete levantar.

Conceber e praticar assim a política, fazer assim política e fazer assim a política é, sem dúvida,  a condição primeira de uma democratização instituinte alternativa capaz de resistir à hegemonia global das oligarquias capitalistas governantes. Por isso, aqui fica, transcrito do Público.es, o texto de Amador, apesar do seu diagnóstico excessivamente optimista das "condições subjectivas" presentes.

La CT se presentó siempre como la única alternativa posible al desastre: golpe militar, poder de la Iglesia, ETA. Pero cada vez la percibimos menos como protección de nada y más como una amenaza a todo. Recorta, precariza y privatiza la misma posibilidad de futuro. La política del PP no es una anomalía en la CT, sino el extremo de la misma cadena. Los “demócratas de toda la vida” que se horrorizan ante el desmontaje de los restos del Estado del Bienestar son bienvenidos, pero llegan tarde y mal. Porque lo que permite al PP hacer lo que está haciendo es la subordinación de la política a las necesidades cambiantes de la economía global y la criminalización y el ninguneo de toda posición crítica. Es decir, la CT. Por todo eso me sorprende tanto la pregunta constante por los logros del 15-M. Están a la vista y son determinantes. El clima 15-M ha logrado reabrir masivamente la pregunta política por excelencia: ¿cómo queremos vivir juntos? Es decir, cómo queremos gobernarnos, educarnos, curarnos, repartir la riqueza, etc. Una pregunta que la Cultura de la Transición ha mantenido cerrada durante décadas. “No hay pregunta, porque ya tenemos la respuesta”, nos decía. Representación, expertos, sistema de partidos y neoliberalismo. La CT no nos enseñó a hacer preguntas. Nos enseñó a escuchar a los mayores con miedo, a repetir y conformarnos con lo que decían las voces autorizadas que aparecían en televisión: “esto es lo que hay”. La CT ha tratado de desactivar la cultura como interrogación crítica y autónoma sobre la sociedad. Nos decía quién podía hablar y de qué podía hablarse. Privatizaba la realidad. Hemos tenido que aprender a hacer preguntas por nuestra cuenta y de espaldas a la cultura oficial, en espacios de sombra. Durante años parecía que era cosa de locos, de marginales o antisistema. Pero hoy la realidad se cae a pedazos, las preguntas sobre la vida nos estallan en la cara a todos, casi me atrevería a decir que cualquiera está obligado a pensar críticamente. El 15-M pusimos juntos nuestras preguntas en el centro de todas las ciudades y de todos los debates. De golpe los consensos de la CT se vaciaron de sentido al grito de “lo llaman democracia y no lo es” y “no nos representan”. La CT es hoy una cultura completamente desconectada de la realidad: está de cacería permanente en Botsuana. Gira en torno a sí misma, se ha vuelto loca. Política de tierra quemada y paracaídas de oro. Ignora, desprecia y teme a la gente. La realidad que aún logra configurar tiene cada vez menos legitimidad. Por eso la estrategia del miedo: meter en el cuerpo y la mente social todo el miedo posible, que aceptemos la CT como mal menor y único poder de salvación. Pero hay que leer también la estrategia del miedo como una señal de debilidad: ya no se obtiene nuestra adhesión por otros medios. La CT nos lleva directos al desastre de la devastación económica, social, ecológica y la guerra de todos contra todos. Vaciar la CT y reabrir la pregunta política por la vida en común es lo mismo: nuestra única posibilidad de autorizar el futuro. Para todos.

Lição de grego (5)

Se, na Grécia, depois da reunião que em breve terá com o Presidente da República,  a quem compete tentar formar um governo depois de as iniciativas partidárias nesse sentido terem falhado, o Syriza se disponibilizar — contra todas as expectativas razoáveis e contra tudo o que tem afirmado — a participar nessa solução, haverá boas razões para que se afirme que terá capitulado. E, naturalmente, como muitos outros, será esse o juízo do KKE, na Grécia, e dos seus apoiantes de vanguarda, em Portugal. O que me arrisco a prever, sem grande receio de errar, é que, se o Syriza não aceitar colaborar num governo "pró-troika" e precipitar as novas eleições, que o KKE tem reclamado como única solução, o KKE e os seus apoiantes de vanguarda lusitanos demonstrarão a sua originalidade dizendo que isso será mais uma manobra do Syriza destinada a enganar o povo grego, uma vez que essa posição aparentemente radical se destina a impedir a verdadeira radicalização da luta contra o imperialismo da UE, pois a "nova social-democracia" — mais perigosa, decerto, do que a velha e já desmascarada, e como irmã gémea do fascismo que é — não pode, faça o que fizer, fazer outra coisa. E, assim, até mesmo quando reclama alguma medida que o KKE também reivindica (as novas eleições, na circunstância), é contra o KKE que continua a agir, na vanguarda da contra-revolução.

12/05/12

Lição de grego (4)

É extraordinário — bem mais do que os "porcos com asas" invocados por Lewis Carroll (e imortalizados pela citação em epígrafe que deles faz este blogue). Nos últimos dias, os núcleos de vanguarda dos simpatizantes lusitanos do KKE anteciparam, profetizara, denunciaram que o Syriza se preparava para demonstrar que não tinha princípios e para capitular perante a troika, pelo que se veria, então, que a única alternativa era o próprio KKE e a sua plataforma nacionalista, confiada à direcção exclusiva do próprio KKE. Agora, depois de o Syriza ter recusado como anunciara integrar qualquer governo que não assegurasse a ruptura com o anterior governo adoptando como base os cinco pontos formulados pelos seus porta-vozes assim que foram conhecidos os resultados eleitorais, é acusado de ter traído o veredicto popular e de ser um fantoche social-democrata ao serviço da troika por ter levado a cabo encontros com outras forças políticas para lhes comunicar as suas condições ou reiterar que recusava participar em qualquer governo que não as tomasse por base. Conclusão: como Mário Cesariny escreveu um dia que "há justos e réprobos porque o Senhor / quis vingar-se de nós porque sim", teríamos de admitir que, na Grécia, há os patriotas do KKE e os outros são traidores — porque o KKE assim o diz porque sim.

11/05/12

Lição de grego (3)

Apesar de não ser o voto — e menos ainda o voto eleitoral — a única forma de expressão da "vontade popular", o certo é que, quando há votos — ainda que de uma votação eleitoral se trate —, a "vontade popular" se exprime. Devia ser óbvio, e se a batalha política em curso na Grécia no-lo vem lembrar, como se pode ler na notícia do Público.es abaixo citada, isso, sem dúvida, reitera o nosso dever democrático de, por todas as vias e votos ao nosso alcance, não o esquecermos e agirmos em conformidade.

El partido de izquierdas Syriza ha vuelto a dejar claro que no formará parte de una coalición de gobierno en Grecia junto al socialdemócrata Pasok y los conservadores de Nueva Democracia (ND). Con este nuevo rechazo, crece la dificultad de formar un Ejecutivo y se abre por tanto más la puerta a la convocatoria de nuevas elecciones.

 El jefe de Syriza, Alexis Tsipras, no está dispuesto a participar en el compromiso de austeridad pactado por Pasok y ND, los que hasta ahora habían sido los dos principales partidos griegos. "El memorándum con la UE no lo ha rechazado Syriza, sino el pueblo griego", ha declarado Tsipras tras su reunión con el líder del Pasok, Evangelos Venizelos, según recogió el canal de televisión griego NET.

Sugestão de leitura

Obama, o traidor, por João Vasco.

Lição de grego (2)

As declarações do ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, proclamando que a UE estão em condições de resistir a uma saída da Grécia da zona euro, revelam, na realidade, o temor que o ministro partilha com os seus pares e capatazes perante a perspectiva de uma rebelião grega que aposta em afirmar-se e alargar-se como parada política maior a nível europeu. O que prova, uma vez mais, que a "ruptura da Grécia dacom a zona euro" poderá ser, neste momento, como escrevi há dias, a alternativa que, perante a insubmissão popular, mais convém ao establishment neoliberal da UE, e que aquilo que mais incomoda os seus interesses e ameaça a sua hegemonia "não é que a Grécia possa abandonar a zona euro, regressar ao dracma, proclamar tão formal e solenemente como em vão, a reconquista da 'independência nacional' e da 'soberania plena'; é, sim, o número crescente daqueles que, na Grécia, querem a UE e o euro, ao mesmo tempo que exigem tanto a renegociação da dívida e das condições impostas ao país pela troika como a transformação das regras do jogo do establishment da União, e, na realidade, a redefinição das normas de funcionamento que lhe servem de constituição”.

10/05/12

Chantagem criminosa

Apesar da promessa de pagar os 5,2 mil milhões referentes à primeira parcela do segundo empréstimo, a troika só vai libertar 4,2 mil milhões. A chantagem ao eleitorado grego surge no dia em que a taxa de desemprego subiu para 21,7%, a um ritmo de 900 novos desempregados por dia. E a primeira sondagem pós-eleitoral dá 23.8% para a coligação Syriza, com todos os outros partidos em queda.

Contra esta chantagem criminosa, a tarefa priorirtária de todos os cidadãos europeus, que não estejam dispostos a aceitar a liquidação acelerada das suas liberdades e direitos fundamentais, juntamente com a da própria Europa, é o combate imediato e sem tréguas contra os que visam agora reduzir pela ameaça da fome a "rebelião eleitoral" da Grécia. Perante notícias como esta, é, com efeito, mais do que tempo de compreendermos que é, também, em nossa legítima defesa — na legítima defesa das nossas liberdades e direitos fundamentais, uma vez mais violados — que é urgente, em toda a União e em cada uma das suas partes, traduzirmos na acção a nossa solidariedade com  os "rebeldes".

09/05/12

SYRIZA desiste de formar governor

Via Keep Talking Greece:
09:10 pm
Tsipras: 

about Samaras and Venizelos: they cannot support their commitments (signatures to bailout) AND a left government.

I asked them a declaration of sincerity

on May 6th the country change the page

Today we have a great chance not only for Greece but also for Europe. A chance to overturn the austerity programmes. We have forced the whole Europe to speak about the Greek votes.

Popular vote is for immediate overturn of the austerity programme.

He spoke about freezing of fiscal adjustment implementation “June, July and after…” and blamed Samaras and Venizelos for having signed the bailout not for the shake of the people but for their own shake and their parties.

About Democratic Left: had we jointly come together at the elections, today we would be the first party. (52+19=71 =50 seats bonus = 121

09:20 pm
Tsipras: 

We cannot make our dream of a left-government to come true. We have people’s support but not the parliament parties support.

We tried to avoid fresh elections, but Venizelos put the dilemma in front of us : either bailout programme implementation or fresh elections! He tried to support a SYRIZA-DEM LEFt gov with a vote of tolerance, a government that would perfome his own agenda.

Tomorrow I will return the mandate to the president. We will follow the president’s invitation when he calls political leaders’ council.

Alexis Tsipras will return the mandate 1 pm on Thursday. The president will give the mandate to Venizelos.

Não encontraremos a revolução ao virar da esquina

A Esquerda sempre imaginou a revolução como um movimento de massas, que tem lugar quando a maioria oprimida toma consciência da sua condição e age em consonância. No entanto, não são poucas, quiçá até maioritárias, as vezes em que uma revolução ocorreu não porque a maioria a apoiou activamente, mas sim porque simplesmente desistiu do regime anterior, recusando defende-lo de quem ousou colocá-lo em causa. A razão para que tal aconteça resulta das condições necessárias à revolução, e estas resumem-se a pouco mais do que a uma única palavra: crise. Esta pode ser entendida como uma situação onde a perspectiva de evolução futura é negativa. E testes cognitivos confirmam o que a história nos ensina: quanto maior for a crise que um indivíduo, e portanto também entidades colectivas como uma sociedade, enfrenta maior é a sua predisposição para arriscar, para escolher caminhos que o afastam do "senso-comum" ou paradigma social dominante. Ora, antes duma crise chegar ao ponto de levar a maioria a optar pela via da revolução, já antes terá passado pelo ponto onde o apoio ao regime dominante tornou-se demasiado fraco para este conseguir suster o impacto da ira da minoria já revoltada.

Quando um indivíduo opta por arriscar, pela fuga para a frente em alternativa à resignação, os caminhos que escolhe são predominantemente aqueles que, parecendo diferentes dos até então experimentados, na realidade assentam em narrativas que aproveitam os preconceitos socialmente mais enraizados. Deste ponto de vista, não é de espantar o crescimento da popularidade de movimentos de extrema-direita um pouco por toda a Europa, em contraste com a dificuldade que a esquerda radical encontra em ampliar a sua base de apoio de modo sustentado. Alterar a situação requer necessariamente um trabalho de proximidade, desafiando as pessoas a colocar em causa as verdades que lhe foram inculcadas, a criação de modos alternativos de comunicação social ao aparelho de reprodução da verdade oficial, e a perturbação da mensagem deste último através da inserção de elementos que criem dúvida sobre a sua veracidade (será mesmo verdadeira?) e autenticidade (terá sido mesmo produzida por aqueles que sabem?), ridicularizando-a.

O esforço requerido é enorme, pois equivale à criação duma paradigma ou narrativa que consiga efectivamente rivalizar e destronar aquele que é cultural e socialmente dominante. Pelo menos numa minoria social suficientemente grande e predisposta a arriscar (tanto mais provável quanto mais jovem se for...) em tempo de crise. Mas, o esforço não se esgota no que atrás foi mencionado. Pois requer também o desenvolvimento de estruturas de governação (assembleias locais) e acção colectiva (nomeadamente, a nível social e económicoco, co-geridas por trabalhadores e comunidade local), que possam substituir-se às estruturas dum regime em decomposição. A existência destas estruturas tem ainda a vantagem não só de reforçar a percepção da viabilidade prática da narrativa proposta, mas também de fomentar a criação dos espaços de proximidade atrás mencionados.

A revolução é um processo, não é um acontecimento.

Lição de grego

O que incomoda Angela Merkel, os detentores das posições de comando dos mercados financeiros, as camadas dirigentes da oligarquia da UE, e começa a abalar, um pouco por toda a parte, a arquitectura institucional antidemocrática da sua versão da "construção europeia", não é que a Grécia possa abandonar a zona euro, regressar ao dracma, proclamar tão formal e solenemente como em vão, a reconquista da "independência nacional" e da "soberania plena"; é, sim, o número crescente daqueles que, na Grécia, querem a UE e o euro, ao mesmo tempo que exigem tanto a renegociação da dívida e das condições impostas ao país pela troika como a transformação das regras do jogo do establishment da União, e, na realidade, a redefinição das normas de funcionamento que lhe servem de constituição.

A lição de grego que, a este propósito, nos compete aprender não poderia ser mais transparente: não são o soberanismo nem o nacionalismo, mas a "via europeia" o melhor modo de, em cada país ou região da UE, travar e organizar a luta contra a hegemonia neoliberal, criando condições e abrindo caminho, na Europa e por todo o mundo, a novos movimentos de democratização.

08/05/12

Lider do SYRIZA anuncia as condições para formar governo

Via Keep Talking Greece:
“The popular verdict clearly renders the bailout deal null” Alexis Tsipras, leader of left-wing SYRIZA, said during a press conference shortly after he received the mandate to form the next government of Greece.


Saying that “3 million voters rejected the austerity-bailout”, Tsipras revealed the his party’s conditions for future government coalitions:

1. Immediate annulment of the austerity measures, especially those concerning wages and pensions cuts

2. Annulment of austerity programme provisions that exterminate workers’ rights.

3. Moratorium for the debt repayment.

4. Immediate changes to election law [50-seats bonus] and annulment of the law protecting ministers from being accountable.

5. Public control of the banks and immediate release of the Blackrock report.

6. Establishment of an international committee to audit the public debt.

7. Cooperation in European level.

“The crisis is not Greek, it is European,” he said.

Tsipras urged Venizelos (PASOK) and Samaras (ND) to send letters to EU saying their bailout commitments are not valid anymore.

PS Communist KKE rejected Tsipras’s offer for a coalition government. On the phone… Tsipras will meet Venizelos at 5 pm/Wedn. Democratic Left accepted his coalition gov’ offer.

E para uma outra visão das eleições gregas (e das eleições em geral)

If elections could change things, they'd be illegal, por Nikolas Kosmatopoulos (Al-Jazeera).

Ainda acerca do futuro governo grego

Tsipras Recieved Mandate To Form Greek Government (Keep Talking Greece:):
Alexis Tsipras, leader of left-wing Radical Left Coalition (SYRIZA), the party that emerged second at the Greek elections 2012, received the mandate to hold exploratory talks and form the next coalition government.
«This is a historical moment for the Left” Alexis Tsipras told President Karolos Papoulias.
Tsipras, 38, will seek to primarily meet with the leaders of left parties (Democratic Left, KKE) but also with parties (Eco-Greens, Social Agreement, ANTARSYA) that did not manage to pass the 3% threshold and enter the parliament.
The meetings with the last three parties will be doen with the perspective of future alliances in case there would be a second round of elections (repeat elections). Eco-Greens, Social Agreement and ANTARSYA received together 5+ percent of the votes.
SYRIZA leader will also meet with PASOK, trade unions and social bodies.It is questionable whether he will meet with nationalist Independent Greeks, while a meeting with Chrysi Avgi is excluded from his agenda. Most likely he will not meet with Samaras as ND governance programme is in direct opposition to SYRIZA one, as Tsipras said yesterday.
Communist KKE has so far rejected any offers for coalitions.
Greek media report that top of the government agenda of Tsipras is a coalition of the left and to denounce the Memorandum of Understanding, however with modifications that would enable the country to re-negotiate.
Tsipras is expected to reveal his governance proposal lat about 3:30 pm and to exhaust the three days period of the mandate.
Tactics of “Blame Games”?
PASOK (Venizelos) said openly that it would give a minority government SYRIZA/Democratic Left a “vote of tolerance”. The same has been said by some ND officials.

A 71-seat weak government with the support of 149 MPs? A politically weak PM to re-negotiate with EU bureaucrats and IMF technocrats? It looks like a very tricky if not satanic mousetrap.

Noone would wonder if behind PASOK/ND readiness is the purpose to discredit SYRIZA in front of its voters and have the party suffer a defeat in the next elections, whether in upcoming June or later. PASOK lost more than 25% of its former voters mainly to SYRIZA.

Dangerous paths with dirty games…

"Gregos Independentes" - a boa direita nacionalista?

Entre a míriade de hipoteses que são sugeridas para uma coligação grega, uma que por vezes é apontada é uma aliança entre as várias forças de esquerda e os "Gregos Independentes", um grupo de dissidentes anti-troika da Nova Democracia.

Mas em que consistem exactamente esses Gregos Independentes? Um artigo do Athens News sobre o lançamento desse partido, há uns meses:
Independent MP Panos Kammenos, a former member of New Democracy, presented the founding declaration of his new party "Independent Greeks" from the symbolic location of Distomo (the tragic scene of Nazi atrocities during the Second World War), on Sunday.

"We promise to fight relentlessly and with all the means we have, in order for the dossier on the national tragedy to be opened and judged," Kammenos said during a speech outside the Distomo town hall, referring to the events that led up to Greece's economic crisis.

Kammenos said that only a committee that was above political parties, with emergency powers and authorities and made up of "unblemished Greeks above all suspicion" would be able to bring such a work to pass.

"Justice must be handed out, all those responsible for the tragedy that the Greek people are living and experiencing today must be punished, politically, penally and socially," he stressed, ruling out the possibility that justice might be done by Parliamentary examination committees serving party interests.

Addressing those that came out to Distomo to hear him, Kammenos called for a "national awakening and uprising" and talked about an "effective management of the debt problem".

He also termed the pressure exerted on Greece by the EU-IMF troika as "raw blackmail" and underlined that the Greek tragedy was not just a financial and economic problem but a political problem that was fast turning into an issue of loss of national independence.

"Our country is up against a catastrophe equal to that of Asia Minor, is up against a national humiliation equal to the tragedy on Cyprus," he added.

He was scathing in his criticism of the post-junta period political parties that he said had failed to prepare the country and claimed that Greece had fallen victim to an "international conspiracy designed between the spring of 2009 and the spring of 2010."

A key element of his party's policy platform was to lift the immunity of ministers, MPs and officials against prosecution, seeking out those responsible for the current crisis and making them pay, possibly even impounding their property. He also called for the protection of national sovereignty, seeking payment of German war reparations, cancellation of the "illegal memorandum" and an attempt to rebuild Greece anew.

Kammenos also invited the other independent MPs in Parliament to form a Parliamentary group, so that they could have a presence in the Parliament and the media.
É só a mim que alguns aspectos desse programa (nomeadamente o tal comité com poderes de emergência, acima dos partidos, e composto por "gregos acima de qualquer suspeita") parecem quase fascistas?

07/05/12

Quem entregou o poder a Hitler?

A respeito de quem é irmão de quem, convém recordar quem é que, a 23 de Março de 1933, votou no parlamento alemão para entregar plenos poderes a Adolf Htler.

A favor:
Contra:
  • Partido Social-Democrata
  • Partido Comunista (tecnicamente, não votou contra porque os deputados estavam todos presos)
I rest my case

Partidos-muleta

O Tiago Mota Saraiva escreve, comentando os resultados das eleições gregas, que a Esquerda Democrática "mais não fez do que retirar a possibilidade da esquerda ganhar as eleições. Bastava que 1/3 dos votantes nesta “Esquerda Democrática” tivesse votado no Syriza (130 mil votos) para que estivéssemos, de facto, a discutir a possibilidade de um governo de esquerda".

No entanto, é óbvio que o Tiago esquece que discutir "de facto" a possibilidade de um "governo de esquerda", seja lá o que for que isso signifique, ainda que os tais 130 000 votos tivessem ido para o Syriza, implicaria que o KKE abandonasse a sua intransigente posição de princípio sobre o euro e a sua intrasigente oposição de princípio a qualquer tipo de avanço fedralista na Europa. O que me parece altamente improvável. Com efeito, já depois das eleições e com o escrutínio quase completo, o KKE deixou, uma vez mais, clara a sua opção estratégica: "Em comunicado, o KKE já veio rejeitar a proposta [de plataforma anti-troika] do Syriza, classificando esta força de social-democrata e acusando-a de servir para impedir a radicalização da sociedade grega. Para a secretária-geral Aleka Papariga, o resultado do partido não foi uma surpresa, mas a distribuição dos votos indica que o KKE não conseguiu mobilizar o sentimento antitroika do povo grego desta eleição, nem mesmo nos tradicionais bstiões eleitorais comunistas, perdendo votos nas zonas urbanas, onde disputa deputados com os neonazis" — discutindo com eles a representação legítima e o estatuto de vanguarda da "independência nacional".

É por isso que, assim como assim, e para falarmos de cenários hipotéticos e contra-factuais, seria menos inverosímil sustentar que, se a Esquerda Democrática tivesse obtido uma quantidade mais significativa de votos (em prejuízo do PASOK e do KKE), então, sim, haveria possibilidade efectiva de um governo alternativo ao da coligação ND-PASOK ou ao de qualquer fórmula de "salvação nacional" dentro dos mesmos parâmetros.

 Se deixarmos de parte estes cenários contra-factuais, e considerarmos as ameaças que neste momento pesam sobre a Grécia, torna-se evidente que a linha de "resistência num só país" e as posições ultra-nacionalistas do KKE, em relação à Europa e ao euro, correm o risco de abrir caminho ao pior — quer dizer, o risco de abrir as portas ao fascismo, ou de servir, suicidariamente, de partido-muleta aos neo-nazis.

06/05/12

Eleições gregas

9:39 - Com 99,5% dos votos contados, e com pouco mais de 2 pontos percentuais de diferença entre a ND e o SYRIZA, ND e PASOK elegem 149 deputados (108+41), metade menos um

3:08 - Resultados com 96% dos votos contados (previsível distribuição dos deputados):

Nova Democracia.....................19,03% (109 deputados)
SYRIZA...................................16,68% (51)
PASOK....................................13,29% (41)
Gregos Independentes...............10,55% (33)
KKE...........................................8,44% (26)
Chrysi Avgi..................................6,95% (21)
Esquerda Democrática.................6,09% (19)
Verdes.........................................2,91%
LAOS.........................................2,89%
Aliança Democrática....................2,58%

Os partidos da troika elegem, exactamente, metade dos deputados.

Mapa eleitoral (azul - ND; cor-de-salmão - SYRIZA; verde - PASOK; vermelho - KKE; cinzento - teocracia ortodoxa):


05/05/12

E ainda sobre promoções e feriados

Um dos argumentos a favor da abertura dos supermercados nos feriados, e nomeadamente no 1º de Maio (um dia em que até há pouco tempo era normal fecharem), é de que os trabalhadores são bem pagos para isso - no caso do Pingo Doce, ao que consta, recebem um bónus de 200% e mais um dia de folga.

O paradoxo aqui é que, muito provavelmente, a razão porque os trabalhadores são relativamente bem pagos para trabalhar no 1º de Maio é, exactamente, haver muita oposição na sociedade à ideia dos supermercados abrirem no 1º de Maio. Pondo as coisas de outra maneira - se não houvesse polémica nenhuma sobre a abertura ao 1º de Maio e tal fosse visto como a coisa mais natural do mundo, será que os trabalhadores receberiam o tal triplo do ordenado e mais a folga?

Indo ainda mais longe - quando o trabalho no 1º de Maio for visto como a coisa mais normal deste mundo, está dado o sinal para, num futuro momento de necessidade de aumentar a "competitividade" e "produtividade" (talvez em 2015 a economia esteja ainda pior e o governo conclua que se tem que "reforçar a dose"?), se abolir mais este feriado, e aí é que ninguém recebe mesmo nada a mais por trabalhar nesse dia.

04/05/12

Sobre promoções

Eu estava a pensar escrever um post que iria começar assim:
Não tenho nada contra promoções - na verdade, o meu ciclo de compras mensal é planeado com rigor quase científico a fim de maximizar os descontos conjugados do Continente, da GALP e da EDP (exemplo - hoje a minha despesa no supermercado foi paga em parte com o talão da EDP Continente que chegou ontem no correio e mais com um talão da GALP que acabava a validade no próximo domingo; e ainda comprei 3 quilos e trezentas de maçãs com um desconto de 75%; e há uns dias fui mesmo à bomba da GALP perguntar que promoções é que havia em Maio e a que dias). Também não tenho grandes objecções ao dumping - afinal, a Google Inc. cobra-me, para alojar os blogues onde escrevo, 100% abaixo do custo dos chips de silicio onde estão armazenados os bits deste post. Mas...
Entretanto, o Filipe Mouraescreveu tudo o que eu estava a pensar em dizer.

Uma versão fascista do marxismo

Quando se escreve:"O acontecimento, como realidade abruptamente inédita e inacessível ao discernimento não é, nem pode ser, sufragável. E pede-nos uma de duas coisas: ou a ele aderimos ou o rejeitamos, e nisto a adesão ao indiscernível efectua-se na base de nada", o que se exalta são os direitos superiores da fé e do fanatismo, baseados na revelação, contra o juízo político e a racionalidade democrática, enquanto elementos necessários de qualquer perspectiva de emancipação das relações de poder hierárquicas, entre as quais se contam as relações de produção capitalistas.

Por outro lado, quando se confunde - por ignorância ou cálculo - a democracia com a vigência do princípio aristocrático da eleição dos melhores governantes, faz-se esquecer que o princípio democrático fundamental não é a eleição de alguns magistrados ou delegados, mas a participação igualitária de todos no governo da cidade e na deliberação e decisão das suas leis, tarefas e objectivos comuns. Ou seja, deita-se borda fora qualquer perspectiva dessa democratização radical da economia política fora da qual não se vê — como, honra lhe seja, Marx também não via — o que possa ser o socialismo.

Por mais que se invoque Marx para apresentar a "revolução" como uma reedição política do episódio religioso da Estrada de Damasco, em que razão e a vontade abdicam perante a manifestação de força de uma verdade arbitrária e arbitrariamente imposta e revelada "porque sim", o certo é que a "revolução" em causa parece ter mais a ver com o decisionismo e o violentismo do irracionalismo fascista do que com qualquer outra orientação filosófica ou política. Mas pode ser que algum crítico mais caritativamente relativista venha dizer-nos que uma versão fascista do marxismo é tão legítima como qualquer outra que se queira dar-lhe. Parafraseando Kundera, o relativismo politicamente correcto é, com efeito, o mais brilhante aliado dos seus próprios coveiros.


.

Idealização, apoucamento, juízo político e responsabilidade (uma tentativa de resposta ao Zé Neves)

Zé, julgo que compreendo a tua intenção. E aprovo o que escreves quando dizes que não devemos "apoucar" os consumidores que, de algum modo, responderam positivamente à campanha do Pingo Doce no Primeiro de Maio. Dito isto, creio também que, a pretexto de os não "apoucar", renunciarmos a exprimir um juízo político claro sobre a sua adesão à campanha é, na realidade, apoucarmo-nos a nós, e às nossas convicções, ao mesmo tempo que nos leva a assumir perante os protagonistas da adesão uma atitude paternalista, que os desrespnsabiliza e, por isso mesmo, apouca. Não podemos endereçar-nos, como cidadãos comuns, à (pelo menos potencial) autonomia dos outros cidadãos comuns — sem cuja acção a autonomia democrática que queremos para eles e para nós, e uma coisa porque outra, não poderá abrir caminho que valha a pena — abstendo-nos, ao falar deles, para eles e, sobretudo, com eles, de os julgar e responsabilizar politicamente pelo que dizem e fazem. Ora, a verdade é que a campanha do Primeiro de Maio do Pingo Doce foi uma acção política do "capitalismo no seu melhor", como escreveu a nossa camarada Ana, e que a acção dos que aderiram à campanha funcionou, tanto quanto vejo, em benefício dos que a lançaram, legitimando-os, e deslegitimando e reprimindo a persepctiva de uma alternativa ao seu modo de organizar e governar a vida na cidade. Portanto, se consideramos que a campanha do Pingo Doce foi uma iniciativa de reforço da oligarquia governante e dos seus interesses, temos de considerar do mesmo modo que aqueles que contribuíram para o seu sucesso, contribuíram para uma derrota das perspectivas e interesses da democratização em que apostamos como alternativa. E é isso mesmo que devemos dizer(-lhes), se não os quisermos apoucar e/ou aprovar a sua resignação ao apoucamento que, reduzindo-os à condição de súbditos do governo dos "superiores", os mantém afastados do governo democrático das suas próprias vidas.

03/05/12

Ainda acerca de Maio de 1937 e da Revolução Espanhola

Ali em baixo, um leitor deixou o link para um interessante artigo/entrevista sobre a organização da CNT em Barcelona nos anos 30, nomeadamente dos "Comités de Defesa", no site Passa Palavra. O entrevistado, Augustín Guillamón, é também o autor de "Barricadas em Barcelona - La CNT de la victoria de Julio de 1936 a la necesaria derrota de Mayo de 1937" (pdf).

Nem Idealizar o Oprimido, Nem Apoucar o Consumidor

O ponto 3 deste post do João Rodrigues sobre o affair Pingo Doce é muito importante: "De qualquer forma, as pessoas fazem o melhor de que são capazes nas circunstâncias que são as suas. Esta hipótese não é trivial porque coloca o enfoque nas duas dimensões centrais da actividade política: o que as pessoas podem ser e fazer nas suas vidas, as tais capacidades, e as circunstâncias, já que as pessoas são, em parte, seu produto. Trabalhar em ambas as dimensões, desenvolver e humanizar, exige conhecimento e simpatia prévios, capacidade de se colocar no lugar do outro. Também assim se pode evitar o espectáculo, política e intelectualmente lamentável, dos que apoucaram quem foi ao Pingo Doce no 1º de Maio". Não se trata aqui de idealizar o oprimido (perigo para que o Miguel Serras Pereira já aqui alertou) mas também não se trata de "lamentar" o comportamento do comprador (e a esse respeito não posso se não "lamentar" o post do Sérgio Lavos). 
  

Há 75 anos

George Orwell, Homenagem à Catalunha:
ABOUT midday on 3 May a friend crossing the lounge of the hotel said casually: 'There's been some kind of trouble at the Telephone Exchange, I hear.' For some reason I paid no attention to it at the time.

That afternoon, between three and four, I was half-way down the Ramblas when I heard several rifle-shots behind me. I turned round and saw some youths, with rifles in their hands and the red and black handkerchiefs of the Anarchists round their throats, edging up a side--street that ran off the Ramblas northward. They were evidently exchanging shots with someone in a tall octagonal tower--a church, I think--that commanded the side-street. I thought instantly: 'It's started!' But I thought it without any very great feeling of surprise-- for days past everyone had been expecting 'it' to start at any moment. I realized that I must get back to the hotel at once and see if my wife was all right. But the knot of Anarchists round the opening of the side-street were motioning the people back and shouting to them not to cross the line of fire. More shots rang out. The bullets from the tower were flying across the street and a crowd of panic-stricken people was rushing down the Ramblas, away from the firing; up and down the street you could hear snap--snap--snap as the shopkeepers slammed the steel shutters over their windows. I saw two Popular Army officers retreating cautiously from tree to tree with their hands on their revolvers. In front of me the crowd was surging into the Metro station in the middle of the Ramblas to take cover. I immediately decided not to follow them. It might mean being trapped underground for hours.

At this moment an American doctor who had been with us at the front ran up to me and grabbed me by the arm. He was greatly excited.

'Come on, we must get down to the Hotel Falcon.' (The Hotel Falcon was a sort of boarding-house maintained by the P.O.U.M. and used chiefly by militiamen on leave.) 'The P.O.U.M. chaps will be meeting there. The trouble's starting. We must hang together.'

'But what the devil is it all about?' I said.

The doctor was hauling me along by the arm. He was too excited to give a very clear statement. It appeared that he had been in the Plaza de Cataluna when several lorry-loads of armed Civil Guards had driven up to the Telephone Exchange, which was operated mainly by C.N.T. workers, and made a sudden assault upon it. Then some Anarchists had arrived and there had been a general affray. I gathered that the 'trouble' earlier in the day had been a demand by the Government to hand over the Telephone Exchange, which, of course, was refused.
As we moved down the street a lorry raced past us from the opposite direction. It was full of Anarchists with rifles in their hands. In front a ragged youth was lying on a pile of mattresses behind a light machine-gun. When we got to the Hotel Falcon, which was at the bottom of the Ramblas, a crowd of people was seething in the entrance-hall; there was a great confusion, nobody seemed to know what we were expected to do, and nobody was armed except the handful of Shock Troopers who usually acted as guards for the building. I went across to the Comite Local of the P.O.U.M., which was almost opposite. Upstairs, in the room where militiamen normally went to draw their pay, another crowd was seething. A tall, pale, rather handsome man of about thirty, in civilian clothes, was trying to restore order and handing out belts and cartridge-boxes from a pile in the corner. There seemed to be no rifles as yet. The doctor had disappeared--I believe there had already been casualties and a call for doctors --but another Englishman had arrived. Presently, from an inner office, the tall man and some others began bringing out armfuls of rifles and handing them round. The other Englishman and myself, as foreigners, were slightly under suspicion and at first nobody would give us a rifle. Then a militiaman whom I had known at the front arrived and recognized me, after which we were given rifles and a. few clips of cartridges, somewhat grudgingly.

There was a sound of firing in the distance and the streets were completely empty of people. Everyone said that it was impossible to go up the Ramblas. The Civil Guards had seized buildings in commanding positions and were letting fly at everyone who passed. I would have risked it and gone back to the hotel, but there was a vague idea floating round that the Comite Local was likely to be attacked at any moment and we had better stand by. All over the building, on the stairs, and on the pavement outside, small knots of people were standing and talking excitedly. No one seemed to have a very clear idea of what was happening. All I could gather was that the Civil Guards had attacked the Telephone Exchange and seized various strategic spots that commanded other buildings belonging to the workers. There was a general impression that the Civil Guards were 'after' the C.N.T. and the working class generally. It was noticeable that, at this stage, no one seemed to put the blame on the Government. The poorer classes in Barcelona looked upon the Civil Guards as something rather resembling the Black and Tans, and it seemed to be taken for granted that they had started this attack on their own initiative. Once I heard how things stood I felt easier in my mind. The issue was clear enough. On one side the C.N.T., on the other side the police. I have no particular love for the idealized 'worker' as he appears in the bourgeois Communist's mind, but when I see an actual flesh-and-blood worker in conflict with his natural enemy, the policeman, I do not have to ask myself which side I am on.

Ainda o caso "Pingo Doce"

Quem afinal pagou (ou vai pagar) a promoção? O Pingo Doce ou os seus fornecedores (a respeito disso, ver este comentário - cuja veracidade é impossível de confirmar - no Jugular)?

Multar o Pingo Doce?

Atendendo que o Pingo Doce está, muito provavelmente, envolvido numa batalha ideológica pelas boas graças de opinião pública (não é revelador que tenha feito a tal promoção exactamente num daqueles feriados em que é mais controverso que os estabelecimentos tenham aberto? E Soares dos Santos parece ter prentensões a ser uma especie de Richard Scaife nacional), ir multá-lo, como a Autoridade da Concorrência está a ponderar, seria "ouro sobre azul" para essa estratégia - a mensagem que iria passar seria "Está toda a gente - os sindicatos, os chamados intelectuais, os nossos concorrentes e o Estado - a querer impedir-nos de voz dar preços baixos".

Há duas maneira de derrotar politicamente Soares dos Santos - a ideal seria os seus supermercados terem ficado às moscas; o second best será os clientes encherem os frigorificos nos dias da promoções mas pensando "ninguém dá um chouriço sem estar à espera de ganhar um porco; se julgam que vou para os comentários da net escrever «Obrigado Pingo Doce», tirem o cavalinho da chuva".

02/05/12

Fernando Lopes 1935-2012

Amigos pensados: Belarmino 




Tiveste jeito, como qualquer de nós,
e foste campeão, como qualquer de nós.

Que é a poesia mais que o boxe, não me dizes?
Também na poesia não se janta nada,
mas nem por isso somos infelizes.

Campeões com jeito
é nossa vocação, nosso trejeito.

Esperam de 1 a 10 que a gente, oxalá, não se levante
- e a gente levanta-se, pois pudera, sempre.

Mas do miudame levámos cada soco!
Achas que foi pouco?

Belarmino:
Quando ao tapete nos levar
A mofina,
Tu ficarás sem murro,
Eu ficarei sem rima,
Pugilista e poeta, campeões com jeito
E amadores da má vida.

Alexandre O'Neill

A idealização do oprimido

O que, entre alguns outros, já escreveram a Ana Cristina Leonardo, o Sérgio Lavos, o Miguel Madeira, mas, sobretudo, e sem desprimor para os anteriores, o Luís Rainha, dispensa-me de retomar o comentário directo do episódio do Pingo Doce. Por isso, aqui direi somente,

em primeiro lugar, que, tal como a demagogia nacionalista proliferante, a idealização do oprimido serve somente a opressão, porque agrava a fraqueza, a subordinação e a dependência daqueles que a sofrem;

e, em segundo lugar, que é essa idealização que propagam e exacerbam os que falam dos acontecimentos desencadeados pela iniciativa sui generis do Pingo Doce neste Primeiro de Maio, vendo neles o prenúncio da expropriação dos expropriadores ou uma justa luta dos consumidores contra a exploração.

É caso para dizer e concluir que, por um lado, em adversários como estes e alguns outros, a oligarquia dominante encontra, na circunstância, defensores de primeira qualidade e amplificadores impares do "Não Há Alternativa" que toma por divisa; enquanto, por outro lado, a eventual multiplicação de "vitórias populares" ou de "reivindicações dos consumidores" como as de ontem, seria a derrota derrota final do que nos resta de solidariedade democrática e responsabilidades de cidadania.

Por um prato de lentilhas, mas com 50% de desconto



Os donos do Pingo Doce quiseram esfregar-nos na cara o nosso egoísmo, a nossa venalidade, a tremenda distância que nos separa dos outros, desde que de permeio esteja o nosso umbigo. Quiseram fazer-nos provar a gordura cobarde que temos em vez de músculo; explicar-nos, muito devagar, como se fossemos imbecis, que nada nos custa pisar as vidas dos vizinhos desde que seja para alcançar couratos a metade do preço. E conseguiram. 
Anunciaram primeiro que iam obrigar os seus trabalhadores a laborar no feriado do 1º de Maio. Quando alguma polémica eclodiu, sujeitaram a referendo nacional a solidariedade da manada tuga: “E se vos déssemos um desconto jeitoso, ainda ficariam do lado dos oprimidos, ou correriam por cima deles para agarrar vinho em saldos?” 
O resultado viu-se ontem pelas nossas ruas: milhares a encher bagageiras com os despojos dos direitos dos outros. Nas declarações de rapina, o gáudio cheirava-se à légua: “Podemos registar o entusiasmo e a euforia dos nossos clientes, que precisam de campanhas como esta.” Como precisamos, foi só assobiar para nos pormos de cócoras, orifícios lubrificados pela nossa própria cupidez. 
Pouco depois, quase todas as grandes superfícies comerciais decretavam, à força de intimidação, a morte do Primeiro de Maio. 
Mais um capítulo na história da infâmia em que vamos dando razão ao ditador que nos baptizou como “uma nação de cobardes” – acrescentámos ontem a palavra que faltava: “Glutões.” 


Publicado aqui.

01/05/12

Os descontos de 50% no Pingo Doce

Já pensou bem o que é uma promoção? Já parou para pensar porque é que existem descontos?