Claro que a vitória eleitoral do racismo e chauvinismo flamengo na Bélgica é uma má notícia mas apenas na medida em que representa o fortalecimento político da “Europa negra”. Mas não deve haver famílias nacionais e culturais com partes contrariadas e a quererem sair de casa. Em democracia, não pode haver misturas étnicas e culturais forçadas. Só as ditaduras de recorte imperial, fascista ou comunista, contiveram os ímpetos nacionalistas por via repressiva, com preços de crimes horríveis e sem resolverem os problemas, apenas adiando-os. E os esforços de contenção das tensões centrífugas, normalmente com enormes custos para responder às chantagens de ameaça de rompimento, desviam e corrompem as energias saudáveis dos povos, sempre insuficientes para os bons fins. O chauvinismo flamengo sempre chantageou a ficção da nação belga. Como fazem, noutras partes, os chauvinismos basco, catalão e madeirense. Ameaçam para sacar fundos, convictos que nunca arcarão com os custos independentistas. E o chauvinismo flamengo tem uma história de tradição repugnante. Germanófilo, colaboracionista com o nazismo durante a ocupação, refugia-se na beatice católica quando decide adormecer, depois irrompe belicoso, com maus modos e fanatismo, sempre que acorda. Agora despertou com os pesadelos que lhe proporcionaram a vaga migratória e a islamofobia. Querem zarpar para dentro de um castelo flamengo isolacionista? Boa sorte. Olá Valónia!
(publicado também aqui)
14/06/10
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13 comentários:
Também temos que ver que o nacionalismo flamengo que ganhou não foi a versão abertamente xenófoba e fascizanta (muito pelo contrário - o partido que mais representa essa tradição, o Vlams Blook/Vlams Belang, baixou de 12 para 7%)
Eu classificaria a "Nova Aliança Flamenga" como um partido parecido à CiU catalã.
Pois é, muito caro amigo e camarada: bem cantava o Brel, no último disco que gravou, pouco antes de morrer, sobre os nacionalistas flamengos ("flamingants"): "nazis pendant les guerres / et catholiques entre elles / vous oscillez sancesse / du fusil au missel".
Mas também gostaria de dizer o seguinte, se a Europa existisse politicamente, o mínimo que poderia fazer em casos como este era dizer: a UE não admitirá um Estado "flamingant", ou nacionalista lombardo, ou nacionalista basco, etc. no seu interior. E o mesmo se diga de uma intervenção democrática europeia organizada, à falta da qual o melhor da Europa vai definhando ou tende a inverter-se na lógica de uma potência-fortaleza ensimesmada e cega, sob o governo de uma oligarquia imbecil e cobarde.
O carácter grotesco das reivindicaçõeds nacionalistas e dos seus argumentários não as torna infelizmente impotentes. A taberna que tomou o poder na Alemanha nazi ou na Itália fascista não invocava uma ideologia menos ridícula do que ados flamingants, esse misto de taberna xenófoba e de sacristia antidemocrática, com cujos porta-vozes os "socialistas" belgas querem agora entender-se com a ajuda da Coroa.
Abrç
miguel sp
"Mas também gostaria de dizer o seguinte, se a Europa existisse politicamente, o mínimo que poderia fazer em casos como este era dizer: a UE não admitirá um Estado "flamingant", ou nacionalista lombardo, ou nacionalista basco, etc. no seu interior. "
Isso não seria um pouco, em versão macro, uma repetição do hábito de toda a gente da aldeia deixar de falar com alguém porque se divorciou?
Sim, Miguel Madeira, há sempre um pior ao lado do mau. No caso, será demonstração da mobilidade interna dentro do nacionalismo flamengo. Que, com estes resultados, vai naturalmente radicalizar-se.
Não, Miguel Serras Pereira, não partilho contigo a repulsa automática pelos nacionalismos. E um nacionalismo mal resolvido é o principal alimento de mais e pior nacionalismo. Aliás, quem chora hoje pelo desmanchar da Checoslováquia? Ou quem se lembra sequer que ela, não há muito, existia?
Pois, João (e, em parte, Miguel SP): «pas d'accord», desta vez... Não é tudo assim a preto e branco, na Bélgica, quando se fala de flamengos e não flamengos. Lá mais para a noite, tentarei responder.
A verdade é que não tinha lido o comentário do Miguel Madeira quando escrevi o meu.
Considero que o caso da Península Ibérica é diferente: sou partidário de uma federação de repúblicas ibéricas, que inclua Portugal, a Catalunha, o País Basco, a Galiza, etc.
Mas não entendo esta federação como uma federação de nacionalismos - pelo contrário, entendo-a como uma arma contra o nacionalissmo.
Por isso, João, quer-me parecer que não atribuímos à palavra o mesmo sentido. O nacionalismo afirma que aquilo a que chama a Nação é a fonte suprema de todos os valores - pelo menos humanos - e um valor ao qual todos os outros devem ser subordinados. Nomeadamente, põe o bem da nação, tal como o interpretam os governantes legitimados pela fidelidade à tradição nacional, acima de valores, que quando muito reduz a um papel meramente instrumental, como a república ou a democracia.
No caso belga, o que se passa é que o nacionalismo da Flandres "rica", "industriosa", "católica", "ariana", pretende livrar-se dos encargos do que resta de um "Estado social" que inclui a Wallonie "afrancesada", "desindustrializada", "socialista", "devoradora de subsídios", ou seja, "anti-económica". O reaccionarismo dos flamingants é tão notório que, pelo menos até uma data recente e provavelmente ainda hoje, a grande maioria dos holandeses entendia demarcar-se claramente dele. Legitimar esta cisão nacionalista das regiões ricas na Europa é legitimar todos os entraves à integração num mesmo modelo social de todos os países já existentes e deitar achas na fogueira, por exemplo, das ambições hegemónicas alemãs e da política de solidariedade limitada que implicam.
Mas é provável, repito, que não entendamos por nacionalismo a mesma coisa. Eu não chamaria "nacionalismo" à reivindicação do direito a usar uma língua, ao apego à cozinha ou à paisagem local, ou até, dentro de certos limites, ao entusiasmo pela "selecção" (curiosamente, o futebol é quase a única, senão a única, que subsiste da unidade naciona belga…). Insistiria apenas em que a ideia de democracia implica a possibilidade e até mesmo a exigência de pormos em causa qualquer identidade cultural, sem a sacralizarmos nem lhe conferirmos um estatuto privilegiado. Somos portugueses por nascimento, nisso não temos mérito nem culpa. Mas somos democratas por convicção e vontade, e são as convicções e a vontade que nos vinculam, são elas que nos responsabilizam e é por elas que devemos governar-nos, contra, se for caso disso, os "interesses nacionais".
A discussão continua - e seria interessante que, além de nós os três, outros viandantes e frequentadores desta casa dissessem também de sua justiça.
Abrç para o Miguel e para ti
miguel sp
João
Então, em jeito de comentário (e não só) aqui.
Uma vez que a Joana comenta este post do João e a discussão a que está a dar lugar no seu Brumas (ver o link no seu comentário anterior), depois de comentar a sua intervenção no Brumas, reproduzo-a também aqui:
"De acordo, camarada Joana, com tudo o que dizes sobre as humilhações e a subalternidade historicamente infligidas aos flamengos - atenção: os flamengos, não são os "flamingants". Até podias ter acrescentado que, na Primeira Grande Guerra, os camponeses flamengos mobilizados morriam sob o comando de oficiais cujo francês não compreendiam, etc. etc.
Et pourtant. Nada de tudo isso, que é muito, JUSTIFICA politicamente a ideologia e a prática do nacionalismo flamengo: o seu ódio ao francês, por exemplo, atinge extremos demenciais, e já estivemos mais longe de ver o seu uso multado em certas cidades e comunas flamengas. O seu racismo e a sua xenofobia são desmesurados. O seu egoísmo nacional e a sanha que põem no desmantelamento dos direitos sociais e da igualdade dos francófonos desafia a descrição. Têm justificados motivos de agravo, mas as exigências que fazem a partir desses motivos são injustificáveis. Também os naziz invocavam reais injustiças decorrentes do Tratado de Versailles. E nem por isso tinham razão. Como não teria quem - exacerbando a lógica nacionalista anti-Wallonie dos flamingants e aplicando-a ao pós-guerra - tivesse justificado represálias sobre os alemães tratando-os como nazis.
Quanto ao Brel, seria preciso ver que ele sempre assumiu as suas origens flamengas, e até as invocou mais do que uma vez como "autorizando-o" a dizer o que dizia do nacionalismo ou nacional-catolicismo flamengo.
Mas obrigado pela canção!
msp"
Miguel,
Há mais de 6 milhões de flamengos. O que dizes no segundo parágrafo do teu comentário aplica-se certamente a uma parte deles (que não sei quantificar), mas não é generalizável como o fazes. O partido flamengo verdadeiramente xenófobo teve menor percentagem de votos nestas eleições do que nas anteriores. Confundir flamengos com flamingantes é um erro.
E, quanto a xenofobia, ela existia – e bem forte – dos valões em relação aos flamengos, quando o jogo de forças era o oposto do que é hoje.
Com tudo isto quero apenas sublinhar que o «filme» belga é muito complexo e que não pode ser visto a preto e branco. E não, de modo algum, elogiar extremismos nacionalistas, como é óbvio.
Joana,
nunca duvidei que assim fosse. E eu próprio chamei a atenção para a necessidade de não confundir os nacionalistas "flamingants" com a população flamenga. A única eventual discordância é que creio demasiado optimista a tua ideia segundo a qual os tipos que ganharam as eleições são mais do que a máscara ou frente ampla dos extremistas. Além de que penso que, de qualquer modo, a reivindicação de "independências nacionais" no interior da Europa, pelo menos, é particularmente reaccionária e representa a negação grosseira de qualquer perspectiva de democratização do(s) regime(s) europeu(s). E disto não me parece, à partida, que discordes… Engano-me muito?
Muito sinceramente, Miguel, não sei responder à tua pergunta. Ou seja, não tenho opinião definida sobre o carácter necessariamente reaccionário de qualquer possível independência na Europa.
Confederação "belga" sem rei? O mito do Estado-Nação- neste caso "belga"- a dissolver-se perante uma U.Europeia sem rumo nem coesão política de espécie nenhuma? O que quer tudo isto dizer? Sepultada a teoria de Kautsky e escamoteando os exemplos de Marx a comentar a guerra entre os EUA e o México para a conquista da Califórnia, só nos resta a hipotese muito complexa e arriscada de tentar descortinar neste " full de ases " da Direita Flamenga- que averbou 44 por cento de votos no total das Legislativas antecipadas- um golpe de asa para antecipar a reconstituição política e económica do espaço central, o " núcleo duro ", da União Europeia, que Sarkozy ainda hoje propôs a Ângela Merkel. A gravidade dos problemas económicos comunitários agudizou-se pela fraqueza da liderança da Comissão Europeia, reflexo das diferenças estratégicas agudas entre Sarkozy e Merkel sobre o futuro da U.E. Por isso, como a direita alemã faz um " forcing " para diluir os objectivos do Tratado de Lisboa à sua porção mais ineficaz e inoperante, os " parceiros regionais " da Alemanha - como a Holanda, a Flândria, a Aústria, a Polónia, o Luxemburgo, principalmente-não perdem pitada para se postarem unos na perseguição de um círculo privado de desenvolvimento económico e ofensiva política que marginalize, de facto, a prazo os outros 21 Estados que não conseguem acompanhar a passada veloz do universo empresarial multinacional controlado pelo poder político de Berlim. PS: A Vlams Belang, o antigo grande pólo da direita flamanga, desceu de 20,5 para 12,5 por cento dos votantes. A que se juntam ainda 4 por cento de um grupúsculo neo-nazi, a Liste Dedecker. Juntem-se os 28,2 por cento do N- VA, e aí estão os signos do terror...Niet
Já agora, uma visão mais geral dos resultados flamengos:
NAF (direita separatista)...29%...27 deputados
democratas cristãos...18%...17
socialistas...15%...13
liberais....14%...13
VB (extrema-direita separatista)...13%...12
Lista Dedecker (liberal-conservador, simpatias separatistas)...4%...1
[para o resultado nacional, dividir as percentagens por 1,65]
Não me parece que essa vitória separatista seja assim tão grande como se tem dito(55% dos votos e dos deputados para os partidos "unionistas")
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