Manejo robusto da linguagem e uma construção cheia de piscadelas de olho ao leitor (as histórias lembram “bonequinhas russas” ou “caixinhas chinesas”, conforme — ideologicamente — se preferir) são qualidades evidentes deste primeiro livro.
Duas coisas a destacar, de caras: domínio alargado do português — contrariando a actual tendência para o encolhimento da língua, à imagem e semelhança do que já acontecia ao Deus de Bouvard e Pécuchet —, e desrespeito pelas fronteiras dos géneros, opção que me parece inevitável para quem queira fazer hoje literatura.
As histórias (ou contos, não há que ter medo das palavras...) doseiam com parcimónia imaginação e verosimilhança, construindo personagens e situações reconhecíveis e plausíveis mas, ao mesmo tempo, muito para lá do registo realista, visivelmente contaminado o seu autor pelo mal de Montano, enfermidade cuja sintomatologia foi brilhantemente descrita por Enrique Vila-Matas.
O filho de Campo de Ourique (1961-1986), o próprio (o que dá título ao livro), escritor genial embora tardio e, infelizmente, como Sócrates, o grego, sem herança escrita (não vou contar para não perder a graça...), foge, contudo, à categoria dos “escritores do não” tão querida ao escritor espanhol, espécimen português típico, ou seja, combinação explosiva de preguiça, arrebatamento e circunstâncias infelizes, cumpridor, pois, da máxima lusa: tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado.
E assim seria, se António Figueira não optasse pelo saudável distanciamento da ironia, enquanto se mostra/esconde nesta espécie de auto-ficção rés-vés Campo de Ourique cheia de saudáveis estrangeirismos.
As histórias (ou contos, não há que ter medo das palavras...) doseiam com parcimónia imaginação e verosimilhança, construindo personagens e situações reconhecíveis e plausíveis mas, ao mesmo tempo, muito para lá do registo realista, visivelmente contaminado o seu autor pelo mal de Montano, enfermidade cuja sintomatologia foi brilhantemente descrita por Enrique Vila-Matas.
O filho de Campo de Ourique (1961-1986), o próprio (o que dá título ao livro), escritor genial embora tardio e, infelizmente, como Sócrates, o grego, sem herança escrita (não vou contar para não perder a graça...), foge, contudo, à categoria dos “escritores do não” tão querida ao escritor espanhol, espécimen português típico, ou seja, combinação explosiva de preguiça, arrebatamento e circunstâncias infelizes, cumpridor, pois, da máxima lusa: tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado.
E assim seria, se António Figueira não optasse pelo saudável distanciamento da ironia, enquanto se mostra/esconde nesta espécie de auto-ficção rés-vés Campo de Ourique cheia de saudáveis estrangeirismos.
O Filho de Campo de Ourique e Outras Histórias, António Figueira, D. Quixote
6 comentários:
é a andropausa...
necessidades de provar existências
lê-se....é ligeiramente melhor do que o preço da borrega
do galopim de Carvalho
o que não quer dizer grande coisa
deixei ficar um volume na Remar devem vendê-lo por 50 cêntimos
A D.Quixote tornou-se uma espécie de editora similar à ex-tinta"ESCRITOR"?
pelas últimas publicações parece....
Dar graxa a um nicho de mercado é hoje fazer pela vida. O respeitinho é muito bonito e este tem que ver com a esquerda iconoclasta. O país já não é para velhos, mas eles cuidaram-se especialmente.
Homenagem ao Cormac, Sena e ACL
Anónimo e Pling a Lot,
quem é que julgam que intimidam ou dissuadem com os vossos exercícios de culturismo acéfalo e chalaço-arruaceiro.
Quem, como o António Figueira, publica um livro assume, sem dúvida, o risco de ser lido em voz alta e, de certo modo, pode dizer-se que talvez o procure.
Mas nestes comentários não há leitura nem voz (alta ou baixa): só obscurantismo militante e frustração urrada.
msp
Mas de baixo de que pedras é que esta malta sai, e que força estranha anima tais criaturas?
Miguel, não creio que o objectivo seja intimidar; a coisa é prévia à inteligência: tratar-se-á simplesmente de descarregar a bílis
Luís, não sei que força as anima, mas não me parecem muito animadas (tanto azedume só pode trazer-lhes mal ao fígado)
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