31/07/11

João Bernardo e as "Atribulações da Esquerda em Portugal"

O João Bernardo acaba de publicar, no Passa Palavra, um importante texto de reflexão, que parte da observação recente "crise de identidade" do BE, dos impasses dos Acampados locais e outros fenómenos, como a recrudescência nacionalista e anti-europeia da "esquerda", etc. O texto, intitulado Atribulações da Esquerda em Portugal, pode — e deve — ser lido na íntegra.

Pelo meu lado, se, de um modo geral, concordo com a análise proposta — a "condenação" a uma evolução para a direita do BE, tanto mais forte quanto mais as questões se centrarem na análise do desaire eleitoral recente e nas perspectivas de superação disponíveis, e a impossibilidade da extensão da participação de uma "base" que, até ver, pouco a reivindica, tendendo a adoptar sobretudo a busca resignada de soluções que passam por governantes mais competentes ou menos incompetentes —, gostaria que o João Bernardo tornasse mais explícito também que, do quadro traçado, não deve deduzir-se a apologia da inacção e de atitudes de simples expectativa.  É que, parece-me, o Pedro Viana — independentemente das reservas que possamos pôr à sua leitura talvez excessivamente generosa da crise do BE — não deixa de ter igualmente razão — e uma razão que, para mim, só pode sê-lo se solidária das razões do JB — quando escreve: Acho que todas as ideias minimamente apelativas [trata-se daquilo a que o PV chama a via subversiva da democraciatêm o seu momento histórico, quando, por vezes repentinamente, recebem apoio suficiente para a sua implementação se tornar possível. Isto ocorre tanto à escala dum país, como no interior dum movimento ou partido. Não sei se vivemos esse momento histórico no que respeita às ideias que apresentei. Mesmo que não seja ainda o tempo certo para uma ideia, antes dele chegar tem de haver quem a mantenha viva no imaginário. Tento fazer por isso.

6 comentários:

Joana Lopes disse...

Miguel,
Fiz uma leitura rápida do texto do João Bernardo e vou relê-lo mais tarde. Mas excepto opinião contrária, parece-me nos antípodas daquele que o Pedro Viana publicou ontem.

Miguel Serras Pereira disse...

Joana,
relê o texto do JB, que vale a pena, sim. Mas, quanto à objecção que me pões, vamos ver se, prestando-lhe embora justiça, me consigo explicar melhor.
A meu ver, o que se passa é o seguinte: o PV fala de um BE que não existe, mas o que diz vale para qualquer organização que venha a existir, resulte esta ou não de uma "subversão democrática" do BE (cuja área, parte da área, é mais sensível à "via subservia da democracia, do que as áreas, ou fracções de área, dos outros partidos).
O JB, pelo seu lado, procede a uma descrição extremamente penetrante do estado das coisas - deixando um pouco na sombra, neste texto, que, se os factos sociais são coisas, como dizia o outro, essas coisas são resultados da acção social-histórica, cristalizações e relações de força institucionais da acção humana. O meu ponto é que as duas perspectivas não podem nem devem excluir-se: daí o "desafio" que, de certo modo, lanço ao JB sobre uma questão fundamental. Ou seja, se as coisas são - e, em grande medida, creio que sim - como ele diz, como traduzir em proposta e interpelação, dirigidas a uma maioria da população que, visivelmente, está noutra, a nossa vontade democrática de autogoverno e autonomia, que é a perspectiva a partir da qual a própria análise do JB ganha sentido e coerência?
Espero ter-te respondido, ainda que levantando novas questões. Mas, como escreveu o Ruy Belo há já muitos anos: "perguntar será para ti responder". E não vejo como, nestas matérias sobretudo, possa ser de outro modo.

Abraço

miguel (sp)

Anónimo disse...

O texto de João Bernardo, acutilante como sempre, toca na questão fundamental: sem movimentos sociais autónomos e portadores de uma prática libertária nada feito.
Esse é o problema central em Portugal.
Não é da política dos partidos da Situação, nem daqueles que a eles se querem juntar, que pode vir a nossa esperança de uma mudança profunda da sociedade.
Se é isso que queremos, pois caso contrário os "pragmáticos" podem ir a Rato preencher a ficha do PS e deixarem-se de meias tintas.

Atribulações de uma coisa disse...

Que tem mais tentáculos que uma hidra?

Das Esquerdas que são mais diversificadas que as direitas

Os que estão a fazere tijolo dizem que bossa senhoria benceu.... disse...

Acho que não há ideias minimamente apelativas no contexto histórico corrente

mas aproveitem para comprar bifes e pôr no congelador

que a carne de vaca barata vai deixar de andar por ai nos próximos 4 a 6 meses

a não ser que comece a chover

e infelizmente só vai chover por aqui e no Japão onde não há vacas e onde há vacas radioactivas

assassinado

Vacas de Carvalho

Pedro Viana disse...

Concordo genericamente com o que diz o João Bernardo. Acho que a maior diferença ente nós reside no meu maior optimismo sobre a possibilidade da mudança radical mesmo em tempo de crise económico-social.

Sei pouco sobre como funciona o BE. Suspeito que o que se passa por lá não é muito diferente do que, quase inevitavelmente, se acaba por acontecer em qualquer organização. Acho que quando queremos que alguém mude de hábitos é melhor mostra-lhe o caminho à sua frente do que relembrar-lhe, em tom crítico, o caminho que precorreu.