26/01/11

Problemas de sair do euro e/ou de renunciar à divida

Lá em baixo, o leitor Fernando pergunta "que mecanismos podem impedir o próximo governo [irlandês], caso fosse maioria de esquerda, de sair do euro recusando o pagamento da ajuda do FMI?". Vamos analisar cada questão separadamente:

1) Que mecanismos poderiam impedir uma saída do euro? Do ponto de vista formal, creio que as normas da UE impedem que, a partir do momento entra no euro, se volte atrás e se saia do euros; no entanto, não há nada que impeça um país de sair do euro E DA UE - o que não se pode é sair do euro permanecendo na UE. O grande problema da saída do euro não é jurídico mas prático - se um pais anunciar que vai sair do euro, imediatamente toda a gente vai tentar transferir o seu dinheiro, contas bancárias, etc para outros países, provavelmente levando o sistema financeiro nacional à falência (obrigando a que a decisão de sair do euro tenha que ser anunciada de surpresa, de preferência num sábado à noite, e acompanhada de um congelamento prolongado das contas bancárias). No entanto, no caso de um país em que o sistema financeiro já está falido e com as contas bancárias já a serem transferidas, como na Irlanda, este custo reduz-se substancialmente.

2) O que pode impedir um país de não pagar a dívida ao FMI? Do ponto de vista legal, sinceramente não sei; é possivel que um Estado em incumprimento veja os seus bens no estrangeiro congelados, ou coisa assim. Do ponto de vista prático, o grande problema de um incumprimento é que dificilmente, durante alguns anos, alguém voltará a emprestar dinheiro a esse pais. Ou seja, um Estado em incumprimento seria obrigado a ter um deficit orçamental zero, o que obrigaria a uma austeridade ainda mais dura no curto-prazo (embora provavelmente menos duradoura) - bem, haveria uma alternativa, que era apelar à pequena poupança nacional (em vez de à banca e ao ao FMI) e tentar financiar o deficit com com "certificados de aforro" e afins (com uns apelos patrióticos à mistura, estilo "vamos todos contribuir para salvarmos a nossa independência! Lembrem-se da Páscoa de 1916!"), mas é uma opção de desfecho incerto (prever esse desfecho dependeria mais da psicologia do que da economia).

A excepção ao descrito acima será um Estado que tenha um superavit primário, isto é, cuja receita em impostos seja maior que a despesa pública interna, e que só tenha deficit devido ao pagamento dos juros (e é possivel que as politicas de austeridade levem a uma situação dessas daqui a algum tempo); aí o incumprimento da dívida já não implicaria um agravamento da austeridade.

1 comentários:

Anónimo disse...

E se considerar que 2) ocorre depois de 1), o Estado não pode simplesmente imprimir moeda para compensar o facto de não conseguir obter empréstimos? (nestas condições pode até considerar pagar a dívida, que se torna mais "leve"...)