10/09/21

Obrigado, Jorge Sampaio



Militante antifascista nos tempos duros da repressão Salazarista.  Defensor dos presos políticos nos tribunais plenários. Fundador do MES.  Secretário-geral do Partido Socialista.  Certamente o secretário geral mais à esquerda na historia do PS. Presidente da  Câmara de Lisboa em nome da unidade da esquerda. Verdadeiro responsável pela possibilidade de união das esquerdas num projecto de governação. O mais inovador e progressista presidente da Câmara de Lisboa. Foi ele que introduziu uma forma de governar a cidade em que o planeamento prevaleceu sobre o curto prazo, as obras faraónicas para iludir o pagode e ganhar eleições.  Um exemplo que não teve, infelizmente,  seguidores à altura. Presidente da República eleito pela união das esquerdas. Presidente da Câmara e da República por decisão política pessoal tomada sem acordo prévio do PS. Fundamental no combate pela independência de Timor. Defensor de uma Europa solidária com os refugiados, desde os sírios aos afegãos mais recentemente. Impossível sintetizar num pequeno texto a importância da sua obra política e as diferentes dimensões que ela revestiu.

Um grande português que deu um notável contributo para o derrube do fascismo e a construção de uma democracia comprometida com a promoção da justiça social. 

Presto-lhe a minha singela homenagem.  Fazem falta pessoas desta dimensão na vida política portuguesa.  

23/04/21

Se o CHEGA for ilegalizado...

Se o Tribunal Constitucional fizer o disparate de ilegalizar o CHEGA, imediatamente veremos colunistas do Observador e moções ao congresso do CDS-PP a defender a alteração do artigo 46º da constituição. E quase que aposto que grande parte das sugestões de alteração não serão para retirar a proibição de associações racistas ou fascistas, mas para alargar essa proibição a outras ideologias.

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15/04/21

Quotas para escolas em vez de para etnias (III)

Voltando à questão das quotas por escolas para a entrada na universidade, muito gente retorquiu que o que é preciso é "fazer um trabalho de base", ou que "as quotas são a fita preta do sistema", o que isso é "desistir e ir pelo caminho mais fácil", blá, blá, blá....

Talvez; ou talvez não. Regressando ao que já disse na publicação inicial, depende muito do que se considere ser o motivo para se selecionar, para a entrada na universidade, os alunos com melhores notas no ensino secundário (ou nos exames correspondentes). É que há pelo menos duas razões possíveis (ainda que não necessariamente incompativeis) para isso, mas, a meu ver, com implicações bastante diferentes no que diz respeito a este assunto.

Uma é assumir que no ensino secundário se aprendem "bases", que vão servir para se aprender melhor o que vai ser ensinado na universidade, logo fará sentido escolher os que têm melhores "bases", porque são esses que em principio vão aprender melhor na universidade. E aí, realmente as quotas para as piores escolas serão tentar tapas o sol com uma peneira, já que esses alunos provavelmente irão ter grandes dificuldades na universidade (por lhes faltarem as tais "bases").

Mas outra hipótese alternativa é achar que, na verdade, muito do que se aprende no ensino secundário pouco ou nada interessa verdadeiramente na universidade, ou talvez até seja contraproducente (p.ex., suspeito que seria mais fácil aos professores das faculdades de economia ensinarem a teoria da vantagem comparativa se os alunos não passassem o ensino secundário a aprender, em economia e história, modelos baseados na teoria da dependência e em sistemas "centro-periferia", ou que o Tratado de Methuen é a causa do atraso económico português) - e realmente já ouvi falar de professores universitário´rios que se queixam que passam os primeiros meses a ter que "des-ensinar" o que os alunos aprenderem no secundário). Para essa hipótese, o verdadeiramente interessa é escolher alunos com características pessoais intrínsecas (provavelmente uma mistura de inteligência, esforço e curiosidade intelectual) que levam a um bom desempenho académico, e escolher os com melhores notas no secundário ou nos exames é apenas porque é a melhor maneira de medir essas combinação de fatores - ou seja, o curso de Matemática Aplicada à Economia e à Gestão até poderia selecionar os seus alunos com um exame de aramaico (ou um exame em aramaico sobre formigas parasitas) que iria acabar à mesma por selecionar os melhores alunos. E, se formos por aí, as quotas já não são uma "fita preta", sem resolver o verdadeiro problema, ou uma espécie de adulteração dos resultados - será ao contrário: a existências de "boas" escolas é que é uma espécie de batota (parecida com tomar doping numa corrida), que distorce o sinal, porque aí as notas já não medem apenas aquilo que verdadeiramente se quer medir (o potencial de cada aluno), passando a estar contaminadas por um fator adicional (a qualidade da escola frequentada); e assim quotas por escola ou um mecanismo similar são uma forma de corrigir esse ruído e medir o que verdadeiramente se quer medir.

(Suponho que na realidade haja uma mistura dos dois efeitos)

E agora mais uma ideia que me ocorre (e com isto que vou escrever agora arrisco-me a ser expulso da esquerda sem sequer me fazer mais bem visto na direita): de vez em quando surgem noticias dizendo que os alunos das escolas públicas, tendo em média piores notas à entrada, depois têm melhores resultados na universidade que os oriundos das escolas privadas; uma possivel explicação para isso é que as escolas privadas sejam mesmo melhores (glup!) que as públicas, mas que o tal segundo efeito seja predominante (isto é, as características dos alunos interessem mais que as tais "bases"), o que leva a que, ceteris paribus, um aluno universitário vindo da escola pública seja mais inteligente/esforçado/interessado/etc. (já que precisou mais dessas qualidades para ter uma boa nota, exatamente por a escola não ser tão boa) que um vindo de uma privada, e por isso tenha naturalmente depois melhores resultados.

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09/04/21

Quotas para escolas em vez de para etnias (II)

Mas o que eu suspeito é que esta medida (que beneficia toda a gente que vive em zonas "problemáticas", seja qual for a sua raça) acaba por se tornar menos popular do que seria exatamente por ser apresentada como uma medida "contra o racismo".
 
O Matthew Yglesias tem falado muito disso no blogue dele: que a esquerda norte-americana moderna (e pelo vistos também a europeia), perante propostas que são boas para TODOS os desfavorecidos, tem o hábito de defendê-las enfatizando que beneficiam os negros e as minorias (e que, portanto, quem se opõe a elas é objetvamente racista); mas que provavelmente essas propostas seriam mais populares se os seus defensores NÃO enfatizassem o ângulo racial e falassem só de pobres e ricos (exemplo).
 
Afinal, por norma há mais pessoas nas classes "baixa" e "média-baixa" do que pessoas de minorias étnicas.
 
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Quotas para escolas em vez de para etnias (I)

Quando vi só o resumo ("Plano contra o racismo prevê quotas para acesso às universidades), pensei "péssima ideia - deveriam fazer quotas por escolas, não por raças", mas afinal parece que vão fazer as quotas da maneira correta (por escolas): "Plano contra o racismo prevê quotas para acesso de alunos de escolas desfavorecidas às universidades".

O que escrevi há uns anos sobre o assunto (Sugestão: quotas para escolas em vez de para etnias):

"De qualquer maneira, muita gente irá objetar a esta proposta com a conversa do "mérito", mas basta ver a atenção com que se olha para os rankings escolares divulgados anualmente ou as guerras para conseguir ter os filhos colocados em certas escolas para se concluir o desempenho escolar não depende apenas do mérito individual (aliás, as pessoas que estão sempre a falar do "mérito" parecem-me ser também as que mais importância dão aos rankings escolares, numa contradição aparente), ...

Ainda a respeito do "mérito", algo que implicaria uma reflexão é qual o porquê de atribuir as vagas na universidade aos alunos com melhores notas; parece óbvio e intuitivo, mas exatamente por isso se calhar ninguém pensa seriamente qual é o motivo para tal. Eu consigo imaginar pelo menos 3 motivos, que têm implicações diferentes:

a) Escolher os melhores alunos porque estes têm mais bases e portanto vão ter melhor desempenho no curso e na vida profissional posterior. Se o motivo for esse, aí faz efetivamente sentido escolher os alunos com melhores notas.

b) Escolher os melhores alunos porque estes provavelmente são mais inteligentes e/ou mais esforçados e/ou mais interessados e portanto vão ter melhor desempenho no curso e na vida profissional posterior. Esta explicação difere da anterior porque não requer que o que os alunos aprenderam no secundário tenha alguma utilidade real na licenciatura/mestrado/profissão, é apenas uma maneira de selecionar os mais inteligentes/esforçados/interessados (para medir inteligência ou esforço nem será necessário que a matéria do secundário tenha alguma coisa a ver com a matéria da licenciatura, mas acho que para medir interesse já o será). Se o motivo for esse (avaliar mais a personalidade do candidato do que os seus conhecimentos) aí faz todo o sentido um sistema de dê prioridade aos alunos de meios em que é mais difícil ter bons resultados escolares: quase por definição, para um aluno de uma "má" escola conseguir um 18 num exame, precisa de mais esforço/inteligência/motivação do que um de uma "boa" escola (e se não for assim, quer dizer que os pais que andam a pagar fortunas para os filhos ficarem numa "boa escola" privada ou a meter cunhas para eles ficarem numa "boa escola" pública estão a ser vítimas de uma burla em larga escala).

c) Escolher os melhores alunos é uma forma de levar os alunos no secundário a se esforçarem (e os país a obrigá-los a esforçarem-se) e a aprenderem o que lhes é ensinado - mesmo que grande parte não vá para a universidade, o que aprenderam vai ser útil tanto a eles como à sociedade em geral (e atenção que com "útil" não me estou a referir apenas ao aspeto económico). Mas aí também não vem mal ao mundo se se introduzir um sistema qualquer de compensação a quem venha de meios desfavorecidos, já que o entrar ou não na universidade continua, naquilo que o individuo pode controlar, a depender do seu esforço..."

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04/04/21

O Covid-19 e as outras patologias

 É um facto que praticamente toda a gente que morre com covid tem outras patologias; mas não é claro o que é que os que estão sempre a insistir nisso querem dizer:

a) que, para quem não tenha comorbidades, o perigo de morrer de covid é quase nulo e que só está em risco quem tenha também outras doencas?
ou

b) que para toda a gente o perigo de morrer de covid é quase nulo e mesmo os mortos com covid morreram por causa das outras doenças, não do covid?

É que são duas coisas completamente diferentes.

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07/03/21

O PCP combateu pela democracia ou para pôr no lugar outra ditadura?

A propósito dos 100 anos do PCP, surgem muitas discussão deste género, com uns a dizerem que o PCP foi quem mais lutou pela democracia e outras dizerem que queriam era pôr outra ditadura no lugar. Um problema que vejo nesta discussão é que há um vasto continuo de posições intermédias entre "derrubar o fascismo para implementar a ditadura do proletariado" e "derrubar o fascismo para implementar a democracia burguesa". Aliás, grande parte das divisões internas no PCP durante e ditadura (e no movimento comunista internacional nos anos 20/30) tinham a ver exatamente com que posição assumir nesse continuo.

Explicando melhor:

a) "O plano é derrubar o fascismo e implementar a ditadura do proletariado"

b) "O plano é derrubar o fascismo e implementar a ditadura do proletariado, mas se quando chegar a altura só for possível a democracia burguesa, mesmo assim já se ganhou qualquer coisa"

c) "Para já temos que derrubar o fascismo; depois na altura logo se vê se há condições para avançar para a ditadura do proletariado ou se devemos ficar pela democracia burguesa"

d) "O plano é derrubar o fascismo e implementar a democracia burguesa, porque para já não há condições para ir mais longe do que isso; depois, se as condições mudarem, poderemos mudar o plano"

e) "O que foi combinado em Yalta é para respeitar - nada de revoluções socialistas na Europa ocidental; o plano é implementar regimes de orientação socialista em Angola e Moçambique e mal isso esteja assegurado, aceitar a democracia burguesa em Portugal"

f) "O plano é derrubar o fascismo e implementar a democracia burguesa"

Isto é, as opções não são só a) e f), e há uma vasta área cinzenta entre lutar pela "ditadura do proletariado" e lutar pela "democracia burguesa".

O que causa esta área cinzenta é que a ordem de preferências dos comunistas ortodoxos (e mesmo de quase todos os heterodoxos, já agora) é "ditadura do proletariado" > "democracia burguesa" > "fascismo"/autoritarismo conservador, ou seja, preferem mesmo a "democracia burguesa" ao "fascismo", e por isso na prática não há uma distinção rígida entre  lutar pela "ditadura do proletariado" e lutar pela "democracia burguesa".

Diga-se que aí há um contraste entre os comunistas e alguns extremistas de direita - enquanto os comunistas (os ortodoxos e quase todos os heterodoxos) vêm a "democracia burguesa" como a segunda melhor opção, entre a extrema-direita há alguns (se calhar não tão poucos como isso) que parecem achar que a democracia liberal é pior que os regimes comunistas (e sobretudo os regimes comunistas tal como realmente existiram, já sem o internacionalismo e o progressismo cultural - e talvez mesmo a influência dos intelectuais judeus - do tal "verdadeiro socialismo") - compare-se a luta do PCP contra o Estado Novo com a apoio de muitos nacionalistas russos à linha dura do PCUS no final dos anos 80, ou dos nacionalistas sérvios a Milosevic.

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04/03/21

"O Triunfo dos Porcos" da CIA é mais "filo-trotskista" que o original de Orwell

Refiro-me ao filme de bonecos animados dos anos 50 que hoje em dia se sabe ter sido patrocinado pela CIA. Paradoxalmente, parece-me acabar por ter um tom mais "filo-trotskista" que a história original do socialista Orwell.

Para começar, digo que vi o filme deveria ser um pré-adolescente e nunca li o livro todo de seguida (li pedaços umas três vezes - acho que, em conjunto, acabei por o ler todo, mas não tenho certeza absoluta) - e antes de escrever este post, fiz uma revisão por alto do filme e do livro, mas é sempre possível que me tenha escapado alguma coisa.

Há sobretudo dois pontos em que o filme parece-me muito mais "o verdadeiro animalismo é uma maravilha, e tudo o que correu mal foi culpa de Napoleão que atraiçoou a revolução e os principio de Major":

No livro já começa a haver sinais de degeneração suína logo desde o principio - é dito explicitamente que os porcos não trabalhavam mas orientavam os outros animais, começam a ter uma sala só para eles e leite começa a ser utilizado para fazer uma mistura também destinada aos porcos.

No livro, também é decidido tirar os cachorrinhos aos pais e entregá-los à guarda de Napoleão, o que se vem a revelar decisivo para a narrativa

No filme, não se vê quase nada disso - efetivamente, não se vê os porcos a trabalharem (com uma exceção - ver mais à frente), mas a única coisa que é dita explicitamente é que os porcos conseguiam arranjar solução para qualquer problema que aparecia (o que é compatível tanto com serem administradores formais, como com serem simplesmente animais com os mesmo estatuto outros mas mais criativos na altura de solucionar problemas); quem veja o filme antes ou sem ler o livro provavelmente nem reparará que quase não se vê os porcos trabalhando; os porcos também não parecem ter qualquer privilégio económico: embora Napoleão e Squealer bebam o leite ordenhado das vacas, está subentendido que o fazem contra as regras da quinta, já que se vê eles a olharem cuidadosamente em volta antes de beberem o leite - e ainda por cima antes eles estiveram carregando os baldes de leite, pelo que até temos porcos fazendo trabalho físico (como digo, quem veja só o filme, simplesmente pensará que, tal como se vê as aves e o cavalo a apanhar trigo e duas ovelhas a reconhé-lo, também haverá porcos fazendo outros trabalhos algures na quinta).

Os cachorinhos também parecem ter caidos nos cascos de Napoleão de forma totalmente subrepticia - quando os animais visitam a casa de Mr. Jones, Napoleão encontra os canitos  e leva-os às escondidas para um armazem (provavelmente os outros animais nem sequer sabem que os cães existem).

Assim, no filme, o golpe de estado quinta dos 34 minutos e 20 segundos surge como algo completamente exógeno e como que caído do céu - a assembleia dos animais está em reunião, com Bola de Neve a falar, e de repente uma carrada de cães educados por Napoleão invade a assembleia, expulsa (e provavelmente mata) Bola de Neve, e Napoleão anuncia que a assembleia já não se vai mais reunir e que agora ele é que manda; no fundo não é muito diferente do que se fossem invadidos e conquistados por uma quinta vizinha e não por um dos próprios.

Ou seja, no filme os animais vivem no "verdadeiro animalismo" desde a revolução de 13:30 até ao golpe de 34:20, e de súbito é instalada a ditadura de Napoleão, como um processo completamente externo e sem raízes já na sociedade logo a seguir à revolução. O Velho Major e Bola de Neve são os heróis e Napoleão o mauzão que estragou tudo (leia-se "Lenine e Trotsky eram os bons, e Estaline estragou tudo").*

A outra grande diferença é o fim - enquanto o livro tem um fim pessimista, com os humanos e os porcos a se tornarem indistinguíveis e os outros animais a olharem para eles, o filme tem um happy end, aparentemente com o triunfo da "revolução política" (isto é, os outros animais a se revoltarem contra os porcos) e possivelmente com o regresso ao "verdadeiro animalismo" do principio do filme (a menos que desse origem a uma sequela "O Trunfo dos Equídeos"...). Ou seja, no livro a conclusão lógica seria que a revolução dos animais foi uma perda de tempo (e, aliás, há passagens em que o burro dá a entender isso logo, mesmo logo no principio); já no filme, a revolução acaba por ser vitoriosa, mesmo que com alguns contratempos pelo meio. Pondo de outra maneira - é muito mais provável que um espetador do filme venha a simpatizar com revoluções do que um leitor do livro (e nesse aspeto se calhar o filme até é mais fiel à intenção original do autor de que o livro).

Quando comecei a escrever este post, estava pensando algo como "a adaptação não correu muito bem aos objetivos da CIA", mas depois ocorreu-me que talvez não tenha corrido assim tão mau - afinal, o apoio da CIA à produção do filme foi no contexto da sua relação com o Congress for Cultural Freedom, uma organização de fachada que tinha como principais destinatários os intelectuais de esquerda não comunistas (um aspeto curioso é que o agente da CIA responsável por supervisionar o CCF veio, décadas mais tarde, a ser um dos apresentadores de um programa da CNN, com o papel de representar a "esquerda", em contraponto com Pat Buchanan representando a direita); assim, é fácil imaginar que o objetivo de divulgar o livro e o filme era sobretudo atacar a URSS e os PCs entre o público com simpatias de esquerda (mais suscetível a ser arregimentando pelos comunistas), e se calhar para isso um filme feito em tom de "a URSS não é o verdadeiro socialismo" até pode ter sido mais eficaz.

* E aqui alguém que seja ou tenha sido trotskista dirá que no trotskismo não há nada de exógeno ou de "a culpa foi de Estaline" na análise da degeneração da Revolução Russa; a teoria é que (até como marxistas que se prezem) foi o resultado das contradições internas derivadas do atraso económico e do isolamento internacional da União Soviética e que a vitória de Estaline foi mais o resultado do que a causa desse processo. Sim, mas eu estou pensado menos na ideologia formal conhecida por "trotskismo" e mais naquela espécie de radicalismo de esquerda em versão popularizada, que assenta em achar que a Revolução de Outubro foi boa e que o Estaline foi mau, mas não necessariamente com grandes sistematizações teóricas

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16/02/21

12/02/21

Há dinheiro para pagar às pessoas que estão impedidas de trabalhar?

 Claro que há.

Para perceber isso melhor, vamos por partes; temos basicamente 3 sectores económicos:

a) sectores que não necessitam de grande contacto interpessoal presencial, e que continuaram a trabalhar

b) sectores que foram considerados essenciais, e que continuaram a trabalhar

c) sectores que fecharam

O sectores a) e b) na prática são iguais, portanto não os vou distinguir mais ao longo do post; a grande questão aqui é o que fazer às pessoas dos sectores c).

Entre os defensores da "abertura" são frequente argumentos como "ir comer ao restaurante é uma despesa essencial - para quem trabalha no restaurante" ou "podiamos fazer ginástica em casa, mas os preparadores fisicos dos ginásios também precisam de viver"; um contra-argumento imediato que aparentemente poderia ser feito era dizer que as pessoas que iriam comer ao restaurante podem sempre de vez em quando mandar para o NIB do restaurante uma transferênca bancária no valor da refeição que iriam fazer, os clientes dos ginásios continuar a pagar as mensalidades, etc, etc. e em termos de distribuição do rendimento ficaria tudo na mesma - os trabalhadores dos sectores a)+b) deixavam de comprar produtos c), mas continuavam a mandar aos trabalhadores dos sectores c) o mesmo dinheiro que antes gastavam lá.

Claro que ninguém ou quase ninguém vai voluntariamente fazer isso - mas há dinheiro para se fazer isso: afinal, as pessoas dos sectores a)+b) estão provavelmente a poupar muito dinheiro, já que deixaram de fazer despesas nos sectores c) (e duvido muito que tenha havido grande redirecionamento de despesas para outros sectores) - como o aumento da poupança dos sectores a)+b) seria possível compensar parte da quebra do rendimento dos sectores c) (não toda - as receitas dos sectores "c" incluíam não apenas as despesas dos sectores "a+b" em produtos "c", mas também os "c" a comprarem coisas a outros "c" - mas grande parte). Agora, se as pessoas dos sectores "a+b" não contribuírem voluntariamente para sustentar as dos sectores "c", que medidas se podem tomar?

- lançar um imposto extraordinário aos "a+b" para financiar os "c" (como os "a+b" têm menos despesas do que tinham, teriam dinheiro para pagar esse imposto)

- o estado endividar-se para pagar o tal subsídio aos "c" (como os "a+b" aumentaram a sua poupança, em principio haverá dinheiro disponível nos mercados de crédito para financiar esse deficit)

- o BCE imprimir dinheiro para pagar o tal subsídio aos "c" (como muita gente está a acumular dinheiro sem o gastar, essa impressão de dinheiro - se fosse em valor correspondente ao aumento da poupança - não iria causar inflação)

[Note-se que no fundo, todas estas variantes seriam a mesma transferência de dinheiro que no caso da família que todos os sábados ordenasse uma transferência bancária de 80 euros para o seu restaurante de peixe grelhado favorito, apenas feita por meios coercivos e generalizados]

Outra questão seria como identificar as pessoas "c", que perderam rendimentos devido ao fecho da economia (o que inclui não apenas as que ficaram sem emprego mas também - e essas são mais dificeis de identificar - as que deixaram de arranjar emprego por causa da pandemia e/ou da quarentena) - mas na prática o melhor seria continuar com a natureza do que se tem feito (alargamento dos subsídios de desemprego, lay-offs, subsidios às empresas que pararam), mas com a dose reforçada (em termos de dinheiro e abrangência).

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07/02/21

"Myanmar" e "birmaneses"

 

Tenho estado a pensar - durante quanto tempo o mundo vai continuar a chamar ao país "Myanmar" e aos seus habitantes "birmaneses" (e a usar "birmanês" como adjetivo para "referente a Myanmar")?

Bem, por outro lado, também é que se passa com os Paises Baixos e os "holandeses", e de certa maneira também com os Estados Unidos e os "americanos" (e, regressando à antiga Índia britânica, nem sei bem que nome se dá coloquialmente as habitantes do Sri Lanka ou do Bangladesh).

03/02/21

UmPartidoUmLíderUmDestino

Parece que agora é a hashtag das publicações do Chega no Facebook.

Slogans em formato "Um... , um..., um Líder" (com variações na ordem nas palavras) caem sempre bem.   

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27/01/21

De onde vieram os votos de Ventura? (mais um contributo para a questão a juntar aos outros 536)

Tentei investigar também alguma coisa sobre o assunto - o que fiz foi tentar comparar as variações entre as votações nas legislativas de 2019 e nas presidenciais de 2021 (dados extraídos com isto). Resumo para quem não queira ler o post todo - tanto no conjunto do país, como sobretudo no tão falado Alentejo, os eleitores de Ventura parecem ter vindo sobretudo do PSD, do CDS e/ou do PS (suspeito que dos primeiros dois), e muito pouco do PCP/CDU.

26/01/21

O que os media não disseram em 85, 87, 91, etc, etc.

 "Temos que perceber porque é que grande parte dos alentejanos votou desta maneira"

21/01/21

O poder das redes sociais é orwelliano?

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