27/02/15

O fascismo às portas da Europa com uma quinta coluna em vias de formação do lado de dentro…


Tienen 24, 27 y 28 años. Uno estaba en el paro, otro era portero de discoteca y el otro trabajaba para la compañía de coches Mercedes. Todos vivían en Madrid (Alcorcón, Vallecas y distrito Centro), pero se conocieron en el frente prorruso en Ucrania, en las Brigadas Internacionales de Donbass. Allí llegaron, después de tres días de viaje, por separado —uno directamente a Donetsk y dos de ellos previa escala en Moscú, donde les esperaba un funcionario ruso—, en verano del año pasado. Los tres utilizaron el mismo método de alistamiento autónomo: contactaron con combatientes del bando ruso a través de Twitter, siempre según fuentes de la investigación.

No les pagaron ni el viaje ni un sueldo, pero fueron recibidos con los brazos abiertos por los comandantes rusos que lideran el frente este ucranio, que les dieron aparte de su correspondiente AK-74 (el kalashnikov más moderno) y el uniforme de guerra, comida y alojamiento gratuito. Dejaron sus cómodos pisos en la capital para vivir en naves y acuartelamientos colectivos en los que, según sus declaraciones, hay aún más “brigadistas” españoles y muchos —“varios cientos”— de otros países, sobre todo serbios y franceses. “La mitad de ellos son comunistas y la otra mitad nazis”, han explicado los detenidos. “Combatíamos comunistas y nazis juntos”, han declarado, justificando esa contradicción ideológica argumentando que “todos queremos lo mismo, la justicia social y la liberación de Rusia de la invasión ucrania”.

(…)

En los registros de sus domicilios, realizados este viernes (…), la policía se ha incautado ropas militares rusas, cuchillos, machetes e insignias. Sólo uno de ellos tenía antecedentes policiales por participar en una reyerta política. Y alguno de ellos pertenecen a un partido comunista de nuevo cuño denominado Reconstrucción Comunista.

26/02/15

Alfredo Barroso sobre o PS: "Hoje tenho vergonha de escrever por extenso Partido Socialista"

Embora — depois de durante os últimos anos ter apelado ao voto nas suas listas — eu não tencione, ao contrário do Alfredo, continuar a recomendar o voto, ainda que simplesmente táctico ou útil, num BE cada vez mais subordinado à agenda do PCP e em cujas fileiras grassa cada vez mais fortemente um "antieuropeísmo geoestratégico", que é o contrário da oposição e a luta  democraticamente necessárias contra a actual direcção política e governação económica da UE,  creio ser de utilidade pública divulgar na íntegra os termos da sua declaração de guerra ao PS, do seu repúdio dos cálculos conformistas do Tempo de Avançar,  bem como de todos os outros considerandos — a debater, sem dúvida — que a fundamentam. Aqui fica o documento, pois, com um abraço autogestionário ao seu autor.



DEPOIS DA IGNÓBIL «CHINESICE» DE COSTA, ABANDONO O PS, E É JÁ!

Sou um dos fundadores do PS (em 1973) e sou, hoje, o militante número 15 do partido (com as quotas em dia). Mas já chega! Nunca me passou pela cabeça que um secretário-geral do PS se atrevesse a prestar vassalagem à ditadura comunista e neoliberal da República Popular da China, e se atrevesse a declarar, sem o menor respeito por centenas de milhares de desempregados e cerca de dois milhões de portugueses no limiar da pobreza, que Portugal está hoje melhor do que há quatro anos. A declaração de António Costa é uma vergonha!

Ainda esta semana, enviarei à direcção do PS (hoje tenho vergonha de escrever por extenso Partido Socialista) uma carta muito simples, sem considerandos ou justificações, solicitando, pura e simplesmente, a minha desfiliação do partido. Tenho 70 anos e quero acabar a minha vida com alguma dignidade e coerência. O que não é manifestamente possível continuando a militar no PS! Para além da inqualificável «chinesice» do actual secretário-geral do PS, não é difícil encontrar os fundamentos ideológicos e políticos da minha atitude no livro que publiquei em 2012, sobre «A Crise da Esquerda Europeia», assim como nas conferências que fui fazendo e nos ensaios que fui publicando.

Não, não vou aderir a qualquer outro partido. Mas vou apoiar e votar no Bloco de Esquerda, tentando contrariar o oportunismo daqueles que se tornaram dissidentes do BE aproximando-se do PS de António Costa, à espera de um «lugarzinho» na mesa do orçamento, ou seja, na distribuição de cargos num futuro governo. Sou dos que passaram pela política - pela Administração Pública, pelo Governo e pela Presidência da Repúiblica - sem qualquer propósito de se governarem. E é certo que não me governei. E ainda bem. Orgulho-me disso! Não duvido das miseráveis campanhas que a «ralé» que tomou conta do «aparelho» do PS é capaz de se atrever a desenvolver contra mim.

A «CHINESICE» DE COSTA É UM TIRO DE CANHÃO NO CORAÇÃO DO PS

Este foi o passo fatal que António Costa, secretário-geral do PS, nunca devia ter dado, por uma questão de coerência e dignidade, e por respeito pelas centenas de milhares de desempregados e pelos milhões de portugueses no limiar da pobreza, vítimas da brutal política de austeridade levada a cabo, com crueldade e enorme insensibilidade, pelo governo de extrema-direita neoliberal de Passos Coelho e Paulo Portas, com a conivência de Cavaco Silva.

António Costa admitiu que Portugal está numa situação «bastante diferente daquela em que estava há quatro anos», ou seja, para melhor. A afirmação do actual secretário-geral do PS (António José Seguro deve estar a rir de mim a bandeiras despregadas) foi proferida há poucos dias (em 19 de Fevereiro), no Casino da Póvoa, perante uma «plateia» de chineses radicados em Portugal, a pretexto da celebração do Ano Novo Chinês. O Ano da Cabra, caramba!

Segundo o EXPRESSO Diário, «depois de elogiar 'a relação e forma extraordinária como a comunidade chinesa se tem integrado' no nosso país, o actual presidente da Câmara Municipal de Lisboa reconheceu o 'apoio' que 'os chineses e os investidores chineses' deram nestes últimos anos a Portugal'». Disse ele: «Como nós dizemos em Portugal, os amigos são para as ocasiões. E numa ocasião difícil para o país, em que muitos não acreditaram que o país tinha condições para enfrentar e vencer a crise, a verdade é que os chineses, os investidores chineses, disseram 'presente', vieram e deram um grande contributo para que Portugal pudesse estar hoje na situação em que está, bastante diferente daquela em que estava há quatro anos atrás». E agradeceu «à China todo o apoio que nos deu». Prestou assim miserável vassalagem à ditadura simultâneamente comunista e neoliberal que impera na República Popular da China. Não admira que a direita portuguesa, por via de um dos extremistas mais reaccionários do CDS-PP, o eurodeputado não-cónego Nuno Melo, tenha aproveitado este agradecimento de António Costa à ditadura chinesa para reclamar que o actual secretário-geral do PS «agradecesse da mesma forma aos portugueses que o tornaram possível». Uma humilhação e uma vergonha para todos os socialistas (pelo menos os que o são mesmo!), através de um vídeo que, ao que parece, se tornou viral, graças a um dos mais populares blogues da direita portuguesa, o «Blasfémias» ,que o intitulou «Portugal está diferente». Depois disto, eu só desejo que António Costa vá para o raio que o parta, mais a canalha de direita que tomou conta do PS. Por mim, vou-me embora deste partido que ajudei a fundar, e é já! Agora só falta mesmo o PS apoiar como candidato a Belém o advogado de negócios António Vitorino, que vai ser o próximo presidente da assembleia geral da «chinesa» EDP e membro do respectivo conselho geral, presidido pelo ignóbil Eduardo Catroga. Ah, é verdade, e porque não, já agora, apoiar o inefável Jorge Coelho como candidato a primeiro- ministro?!

Os custos para a sociedade do combate ao tabagismo

O combate ao tabagismo costuma ser justificado em nome dos custos que os fumadores impõem ao resto da sociedade, nomeadamente o fumo passivo e os custos para o sistema de saúde (suportados por todos os contribuintes).

Eu até suspeito que esses custos sociais já estão largamente compensados: no caso do fumo passivo, porque tanto a legislação como sobretudo as normas sociais evoluiram no sentido do ato de fumar ser feito em zonas próprias (desdes bares e restaurantes com o simbolo azul até a alguma forma de pátio exterior em muitos locais de trabalho), onde os não-fumadores só vão se quiserem; no caso dos custos financeiros, porque os fumadores pagam pesados impostos sobre o tabaco e ainda por cima poupam dinheiro à segurança social (morrem suficientemente tarde para provavelmente descontarem os mesmos anos que o contribuinte médio, mas muitos suficientemente cedo para receberem menos de reformas).

Mas o que notícias como esta me fazem pensar é se neste momento as políticas de combate ao tabagismo já não terão mais custos para a sociedade do que o tabagismo propriamente dito.

24/02/15

David Mourão-Ferreira: "Certidão de Nascimento"

Um post da Joana Lopes veio lembrar-me que David Mourão-Ferreira faria hoje 88 anos. Em jeito de homenagem, eis como ele próprio celebrava a efeméride aos sessenta.


Certidão de nascimento

Tão regaço estas arcadas
Tão de brinquedo os eléctricos
Vejo a cidade parada
no ano de vinte e sete
Dela por vezes me evado
mas sempre a ela regresso
Bem sei eu que não desato
o cordão com que me aperta
Vejo seus gestos de grávida
medidos cautos emersos
nessa jovem gravidade
que só grávidas conhecem
Que frescor de madrugada
no terror com que me espera
Mas têm sempre a idade
que em sonho os filhos decretam
Recordo melhor a data
Até mesmo a atmosfera
É o dia vinte e quatro
de um mês a tremer de febre
com armas grades e o rasto
de um sangue que nunca seca
Só seis decénios passaram
rápidos como seis séculos
Tão pouco Mas neles cabem
cidades arcadas eléctricos
nesta imensa claridade
irmã gémea do mistério

A proposta de Grécia

Aqui (via O Insurgente).

Até não me parece muito mau; se "as Instituições" aprovarem, acho que, apesar de tudo, é uma espécie de vitória

23/02/15

Timeo Danaos



O acordo que saiu do Eurogrupo concedeu ao governo grego uma folga temporal preciosa num contexto difícil. É preciso relembrar que os principais detratores de Varoufakis et al. começaram por garantir que as suas promessas não chegariam ao fim de Fevereiro. Pois eis-nos no fim de Fevereiro e as medidas tomadas imediatamente a seguir às eleições parecem ter vindo para ficar (e que jeito nos dava um aumento do salário mínimo por estas bandas*), o dinheiro necessário para fazer face aos encargos da dívida aí está e as medidas que constavam do memorando da troika foram substituídas por um processo negocial no qual o governo Grego tem a iniciativa. Enquanto derrota, parece-me uma situação bastante mais favorável do que qualquer coisa que o governo Português tenha conseguido a partir da sua posição de obediência incondicional.  
Krugman considera que o acordo benficia o governo Grego e Norber Haering analisa aqui as diferenças entre o texto recusado por Varoufakis há uma semana e aquele que o Eurogrupo aprovou agora, sublinhando que as diferenças correspondem quase todas a exigências do governo Grego.
As análises de José Manuel Fernandes, Marcelo Rebelo de Sousa ou Bruno Faria Lopes têm o problema fundamental de corresponder mais aos seus desejos e fobias do que a uma qualquer amostra de rigor ou lógica. O caso de Bruno Faria Lopes é particularmente instrutivo por parecer um exercício de demonstração por absurdo. Quando alguém lê isto "The Eurogroup reiterates its appreciation for the remarkable adjustment efforts undertaken by Greece and the Greek people over the last years. During the last few weeks, we have, together with the institutions, engaged in an intensive and constructive dialogue with the new Greek authorities and reached common ground today"  e conclui que o seu significado é "Nós ganhámos", está simplesmente a transformar um parágrago introdutório desprovido de qualquer significado na reivindicação de uma vitória inexiste. E se um conjunto de  medidas de austeridade já decididas e impostas no programa de ajustamente que acaba de ser revogado passaram a constar de um processo negocial em que a iniciativa parte do governo Grego, Faria Lopes não hesita em concluir que "Nada está garantido". Parece-me uma lógica curiosa esta, a de concluir que nada está garantido agora que se conseguiu abrir uma discussão que constantemente nos garantiram não poder ser aberta... 

Não é menos bizarro o empenho colocado por um dirigente do SYRIZA e da 4ª Internacional em denunciar o espírito conciliatório de Varoufakis, num ostensivo esforço para obter por meio da intriga palaciana aquilo que foi até agora incapaz de conseguir através da argumentação política. Como se uma saída da Grécia da Zona Euro não implicasse severas e gravosas medidas de austeridade ou a necessidade de negociar com as autoridades europeias.
 Fico um pouco intrigado com as conclusões do João Rodrigues a este respeito, uma vez que não sendo irrazoável sustentar que o SYRIZA recuou relativamente ao seu programa eleitoral, parece-me inequívoco que avançou significativamente relativamente à situação que herdou. É um pouco caricato que seja eu a escrever isto, mas tenho para mim que nenhum governo nacional de um país periférico da zona euro tem margem para romper unilateralmente com os constrangimentos colocado pela sua dívida soberana, o que o força necessariamente a navegar nas águas tumultuosas do compromisso. E no meio de tantos elogios à firmeza do PCP, aproveito para relembrar que o partido da classe operária e todos os trabalhadores propõe uma saída negociada da zona Euro e uma conferência intergovernamental para a renegociação da dívida. Ora, uma vez que nenhuma destas coisas coloca quem as defende ao abrigo dos avanços e recuos que a correlação de forças impõe, percebo mal porque razão se acolhe com tamanha severidade os esforços de quem já enveredou precisamente por esse difícil caminho negocial a partir do espaço nacional. 
Não colocando eu as fichas todas em nenhuma solução específica que não tenha em conta a correlação de forças existente à escala europeia - que é como dizer que este difícil combate também se trava no interior da esfera pública francesa e alemã - e partindo de uma posição política que atribui mais importância ao conflito social do que à soberania e à representação parlamentar, parece-me que a estratégia do governo Grego tem o incontornável mérito de explorar a seu favor a questão temporal e, nomeadamente, ter bem presente os calendários eleitorais de outros países. Que se fale apenas e sobretudo de Espanha quando o assunto vem à baila, apesar de também aqui estarem agendadas eleições, é um aspecto que talvez devesse merecer mais atenção por parte de quem se tem empenhado no estudo e elaboração das alternativas. O que me leva a avançar a pergunta para um milhão de dracmas: afinal de contas, porque razão não está a esquerda portuguesa em condições de ajudar o governo do SYRIZA a defender com maior firmeza o seu programa eleitoral? 


* Como atempadamente me avisou o Miguel Madeira na caixa de comentário, fui induzido em erro pelas notícias que li sobre isto. O salário mínimo não foi aumentado (antes foi anunciado o seu aumento no ano que vem) e, na proposta entregue ontem à noite ao Eurogrupo, o seu aumento fica dependente de negociações com os outros governos da zona euro. Isto parece-me bastante relevante e significativo, pelo que não podia deixar de o corrigir. Na avaliação das cedências do SYRIZA, esta parece-me a mais relevante até agora. De resto, tudo permanece vago, como justamente sublinham Christine Lagarde e Mario Draghi.

Revisitando a "quebra tendencial da taxa de lucro"

Largamente sobre outro assunto, Krugman escreve "Corporate profits have soared as a share of national income, but there is no sign of a rise in the rate of return on investment. How is that possible? Well, it’s what you would expect if rising profits reflect monopoly power rather than returns to capital."

É possível; talvez até bastante provável. Mas também há outra maneira (e até mais simples) da proporção dos lucros no rendimento nacional aumentar sem a taxa de lucro aumentar (ou até diminuir):

lucros/capital = [lucros/produto]*[produto/capital]

Assim, se o stock de capital aumentar mais depressa que o produto (ou seja, se o rácio produto/capital diminuir), podemos ter ao mesmo tempo aumento da parte do capital no rendimento nacional e manutenção ou até redução na taxa de rentabilidade do capital.

Alterando ligeiramente a fórmula acima:

lucros/capital = [lucros/salários]*[salários/capital]

lucros/capital =[lucros/salários]/[capital/salários]

Transformando em linguagem fora de moda:

taxa de lucro = taxa de mais valia / composição orgânica do capital

Ou seja, com a substituição do trabalho por máquinas (ou talvez por imobilizado incorpóreo, como patentes e afins?) no processo de produção, aumentando o que alguém chamou "composição orgânica do capital", podemos ter ao mesmo tempo aumento da parte dos lucros no rendimento (por outras palavras: "aumento da taxa de mais-valia", "pauperização relativa dos trabalhadores") sem que a taxa de lucro aumente (ou até diminua?).

Não estou a dizer que seja exatamente este mecanismo a ocorrer, mas não me parece que possa ser excluido à partida.

22/02/15

Repost de um post de há 5 anos

Isto é um post que escrevi em 2010, acerca do referendo que houve então na Islândia. Acho que algumas partes podem ser atuais:

O referendo islandês

No sábado passado, cerca de 98% dos islandeses votaram contra o acordo de pagamento ao Reino Unido e aos Países Baixos acerca do banco Icesave.

Para começar, uma explicação preliminar: o Icesave era a "filial electrónica" de um banco islandês, que efectuava as suas operações essencialmente no Reino Unido e nos Países Baixos, oferecendo depósitos de alto rendimento (aparentemente, o volume de negócios desse banco era muito superior ao PIB islandês).

Quando o sistema financeiro da ilha faliu, os governos britânico e holandês indemnizaram os seus nacionais que tinham investido no Icesave, tendo depois entrado em negociações com a Islândia para reaver o dinheiro (embora seja duvidoso que a Islândia tenha uma obrigação legal de pagar esse valor).

Em Dezembro, o novo governo islandês assinou um acordo com britânicos e holandeses, prevendo pagamentos bastante elevados pela Islândia, que foi bastante contestado, tendo (em resposta a uma petição popular) o presidente vetado o acordo e convocado o tal referendo.

Ainda antes do referendo, o acordo já estava a ser renegociado, e mais cedo ou mais tarde há-de ser estabelecido definitivamente - inclusivamente há dias a primeira-ministra dizia que esse referendo já não fazia sentido porque ia-se referendar o acordo feito em Dezembro quando já foi assinado um acordo muito mais favorável para a Islândia.

No entanto, podem-se concluir duas coisas daí:

A primeira é que, se é assim, os cidadãos que se opuseram ao governo e se mobilizaram contra o acordo de Dezembro (e o presidente que convocou o referendo) prestaram um serviço ao país, mesmo de acordo com a primeira-ministra: afinal, parece já se conseguiu um acordo melhor (o que não aconteceria se o acordo original tivesse sido aprovado).

A segunda é uma questão mais importante, porque já não tem a ver com um problema concreto da Islândia mas com uma questão de politica geral - o tal acordo de Dezembro foi negociado por um governo de coligação entre a "Aliança Social Democrata" (centro-esquerda) e o "Movimento Esquerda Verde" (até há pouco tempo considerado "esquerda radical"), constituído após a queda do anterior governo de "bloco central.". O que dá que pensar é que a "Esquerda Verda" (que tem orgânica e historicamente muito mais a ver com partidos como o "nosso" BE, o Die Linke alemão ou o Synaspismos grego do que com os partidos "verdes" europeus), cujo líder é o novo Ministro da Economia, aceitou tão rapidamente impor pesados custos ao povo islandês para pagar os erros financeiros dos milionários locais; nos sites de noticias islandeses em inglês, era frequente os comentários do género "a Esquerda Verde, ansiosos por mostrar que sabiam «gerir o sistema», trairam tudo pelo que lutaram".

Tal mostra, por uma lado, que a participação de um partido de esquerda num governo dentro do sistema capitalista deve ser precedida de uma definição clara de que compromissos são aceitáveis ou não, para evitar a tendência para abandonar o programa mal entram para o governo; por outro, que tão ou mais importante que pôr a "esquerda radical" no governo, é haver lutas de movimentos de cidadãos suficientemente fortes para conseguirem alterar as decisões dos governos.

Eurodeputado do Syriza contra o acordo

Artigo do eurodeputado Manolis Glezos (que em 1941 substituiu a suástica pela bandeira grega sobre a Acrópole):
“Renaming the Troika into Institutions, the Memorandum of Understanding into Agreement and the lenders into partners, you do not change the previous situations as in the case renaming meat into fish.

Of course, you cannot change the vote of the Greek people at the elections of January 25, 2015.

The people voted in favor of what SYRIZA promised: to remove the austerity which is not the only strategy of the oligarchic Germany and the other EU countries, but also the strategy of the Greek oligarchy.

To remove the Memoranda and the Troika, abolish all laws of austerity.

The next day after the elections, we abolish per law the Troika and its consequences.

Now a month has passed and the promises have not turned into practice.

Pity. and pity, again.

On my part, I APOLOGIZE to the Greek people because I have contributed to this illusion. (...)

SYRIZA members, friends and supporters at all levels of organizations should decide in extraordinary meetings whether they accept this situation.

Some argue that to reach an agreement, you have to retreat. First: there can be no compromise between oppressor and oppressed. Between the slave and the occupier is the only solution is Freedom.

But even if we accept this absurdity, the concessions already made by the previous pro-austerity governments in terms of unemployment, austerity, poverty, suicides have gone beyond the limits.
[Tradução do Keep Talking Greece; original aqui]

Atenção que o facto de eu estar a postar este artigo não implica necessariamente uma concordância (confesso que não estou certo se o acordo é bom ou mau para a Grécia; muitos economistas e comentadores da imprensa económica acham que é bom, mas a análise deles é feita comparando apenas com as alternativas dentro do sistema, que eles consideram fundamentalmente imutável).

20/02/15

Uma reflexão sobre os acontecimentos de hoje sobre a Grécia

Pelos vistos haverá um acordo entre o governo grego e o Eurogrupo. Não se conhecendo muitos detalhes, sabe-se que haverá pelo menos quatro tópicos relativamente interessantes em favor do governo grego, se bem que ainda insuficientes para reverter a austeridade:

1) revisão das metas para os superavit's primários (actualmente estavam nos 4,5% ao ano até 2022), sendo que o de 3% para este ano de 2015 deverá ser revisto em baixa. Aparentemente está será uma medida muito positiva, dadas as circunstâncias que discutirei mais abaixo. Digamos que, de um modo grosseiro mas com um impacto assinalável nas vidas concretas dos trabalhadores, isto significa que serão menos uns largos milhares de milhões de euros de cortes em prestações sociais, salários e empregos. Se esta orientação se confirmar isso significa que o Syriza levará a cabo uma leitura do Tratado Orçamental que congregue controlo das contas públicas e uma travagem relativa da austeridade.

2) não serão legisladas novas medidas de corte nas pensões ou de aumento de impostos. Isto significa que algumas das exigências do Ministro das Finanças da Alemanha não avançarão.

3) o BCE admite aceitar a dívida grega como garantia para as operações de financiamento regulares. Basicamente os bancos gregos continuam a flutuar à tona e, no curto prazo, não haverá uma ruptura do sistema bancário daquele país.

4) Na sequência do primeiro ponto um jornalista terá perguntado a Varoufakis sobre qual seria o nível de aperto orçamental exigido à Grécia, ao que este terá dito algo do género: o governo grego terá de propor um nível e medidas para o cumprir, naturalmente com o acordo das instituições da UE e do FMI. Isto aparenta querer dizer que se o governo grego conseguir um equilíbrio orçamental sem corte de salários, de pensões e de emprego público e pela maior eficiência na colecta fiscal e no relançamento do crescimento económico real (que, por sua vez, atrairia uma maior colecta fiscal, sem aumentar as respectivas taxas), poderão estar criadas algumas condições para uma vida um pouco mais decente na Grécia.
Tudo o mais será negociado nos próximos 4 meses, período da extensão do actual empréstimo.

Em termos políticos, estas semanas demonstraram outros aspectos que deveriam merecer uma reflexão.

Em primeiro lugar, a obstinação de Estados como o alemão, o espanhol, o eslovaco ou o português para com as propostas gregas demonstra o instalar de interesses nacionais e estatais no coração da UE e estão a ser um factor de inércia na evolução da integração política, orçamental e fiscal do espaço europeu. A corrente mais conservadora e mais nacionalocêntrica da UE chegou a levar as negociações a um ponto que poderia ter ido ao caso extremo, apesar de improvável como sempre defendi, de expulsar a Grécia da zona euro. Se esta corrente conseguiu demonstrar que detém um peso muito relevante nas decisões da UE, também me parece que o facto de se vir a firmar um possível acordo demonstra que esta corrente tem um peso fundamentalmente político e ancorado na influência multilateral de sectores do Estado alemão sobre outros Estados-membros. Se o acordo entre o governo grego e as instituições europeias se concretizar nos moldes que apresentei nos pontos 1 a 4, então atrevo-me a dizer que Schauble e o Eurogrupo terão sofrido uma pequena derrota, sem que se possa dizer que o governo grego tenha propriamente ganho. Por outras palavras, a pequena derrota dos conservadores evidenciar-se-ia no facto de não terem conseguido implementar medidas altamente restritivas como os saldos primários orçamentais absolutamente inviáveis, ou unicamente viáveis à custa de uma austeridade criadora de um sofrimento social ainda mais atroz, e por mais uma década. Nesse sentido, esta pedra de toque do programa anterior, e a que Schauble se agarrou, ao ser redefinida representa uma pequena vitória sobre esta corrente conservadora. Neste plano, o que a imprensa internacional chamou de trabalho de intermediação entre os Estados grego e alemão por parte do BCE, do FMI e da Comissão Europeia parece demonstrar uma eventual papel de gradual supremacia da corrente tecnocrática mais europeísta sobre a conservadora. Se esta detém um poder de decisão relevante, parece-me que, perante o que se foi ouvido e lendo nos últimos quinze dias, se esta fosse hegemónica creio que, num caso extremo, a esta hora o Banco Central da Grécia estaria a imprimir dracmas. Mesmo que esta posição mais extrema não fosse tomada, como sempre fui dizendo nas caixas de comentários deste blog, o facto de se ter quebrado um dos pilares do programa de Novembro de 2012 (os saldos orçamentais primários incomportáveis) demonstra que a corrente conservadora não conseguiu o seu objectivo central desta ronda negocial: manter todas as características do programa da Troika vigente e impedir qualquer concessão ao governo grego.

Em segundo lugar, é interessante verificar que as dificuldades colossais para que o governo grego conseguisse pequenas concessões são demonstrativas de algo que os defensores de uma saída "negociada" do euro esquecem. Se, por causa de algumas pequenas concessões totalmente inscritas dentro do quadro do euro e da UE, o governo grego viu-se e desejou-se, como é que um governo de um país europeu periférico, fosse ele Portugal ou a Grécia, conseguiria negociar o que quer que fosse? Claro que há sempre os "anacletos" que acham que não é preciso negociar nada, seja em que situação for, mas desses nada interessa, já que nem se lembram que o próprio Lénine negociou acordos comerciais sem os quais o capitalismo de Estado soviético - a que chamam de socialismo - nunca teria sobrevivido. Em suma, o argumento  nacionalista de romper unilateralmente um país periférico com a Eurozona não passa de "conversa de garganta", como se diz na gíria popular, pois na hora de tentarem minorar as medidas de retaliação não conseguiriam nada.

Em terceiro lugar, se o isolamento grego no conjunto dos Estados da zona euro demonstra que o unilateralismo nacional não consegue  provocar mudanças estruturais na UE, também me parece verdade que se houvesse mais um ou dois Estados com uma postura similar ao Syriza, estou a pensar em Espanha, as concessões conseguidas não teriam sido pequenas mas bastante mais consideráveis. Assim, a esquerda portuguesa que oportunisticamente redescobriu uma mais aberta ou mais surda solidariedade com o Syriza faria bem em reflectir sobre os modos institucionais com que tal pode ou não ser feito. Ou seja, sem movimentações autónomas da classe trabalhadora no plano europeu, a esquerda só conseguirá melhorar alguma coisa dentro das instituições europeias, de um modo articulado e tendo em mente uma crescente integração política, orçamental e fiscal da UE - aspecto central das reivindicações e da prática do Syriza.

Em resumo, a solidariedade para com o Syriza não se prende com qualquer apoio irrestrito a essa força política, como não deve acontecer com nenhuma, mas com medidas específicas e concretas que, no plano do curto e médio prazo, possam auxiliar a um abrandamento da austeridade e que, no plano mais estratégico, auxiliem a uma eventual unificação futura dos trabalhadores europeus. Só no mundo irreal e voluntarista é que se acha que se resolve o que quer que seja com apelos ao irracionalismo, às medidas por decreto e à máquina de impressão de notas. Neste plano os resultados do Syriza, apesar de naturalmente curtos demonstram que uma mais forte e coesa organização da esquerda no e pelo espaço europeu poderia conseguir ganhos muito maiores. Aqui chegados é pena que a esquerda que até há dois ou três anos defendia o primado do nível europeu sobre o nacional hoje esteja perdida e não perceba que o modo de prestar a solidariedade possível e necessária ao Syriza é actuar para uma Europa mais coesa e menos dependente dos Estados nacionais. Os que apoiavam oportunisticamente o Syriza, sempre à espera que a Grécia fosse expulsa ou saísse pelo seu pé do euro, levaram hoje uma bofetada de luva branca. Nunca o Syriza actuou para conduzir a Grécia para o desastre nacionalista, bem pelo contrário, nem a UE expulsou ninguém, tal como sempre se previu. Quem à esquerda quiser uma Europa retalhada em nações independentes que se junte ao senhor Schauble e aos conservadores, como o governo português que hoje terá até sido mais veemente contrário a concessões ao Estado grego do que o próprio Ministro das Finanças alemão. Da austeridade dos neoliberais à austeridade ao cubo que resultaria das acções de certa esquerda defensora da dissolução da União Económica e Monetária, une-os um mesmo impulso autoritário e nacionalista. Hoje perderam uma pequena batalha.

Da vida nua à potência destituinte: o projecto 'Homo sacer' de Giorgio Agamben



21 de Fevereiro | 10h/18h | Salão do Atelier Re.al
 Com António Guerreiro, António Bento, José Tolentino Mendonça, André Dias, Luhuna Carvalho, Ana Isabel Cardoso Figueiredo, António Caselas, Alexandre Franco de Sá, Bruno Peixe Dias, Bruno Lamas, Luís Carneiro, José Caselas, João Duarte, Nuno Leão, Ricardo Noronha, Mariana Pinho, João Pedro Cachopo e Unipop.

Organização: Unipop [http://unipop.info/]
Entrada livre

Ao longo dos últimos vinte anos, o filósofo italiano Giorgio Agamben dedicou-se à publicação de uma série de nove volumes, agrupados pelo título homónimo do primeiro – Homo sacer (1995) –, que configura um dos mais radicais projectos da filosofia política contemporânea, enquanto genealogia das categorias políticas que dominam a nossa modernidade. Pese embora consista em arqueologias de natureza predominantemente filológica sobre domínios que raramente vemos conjugados e que ainda se tende a julgar excêntricos à actualidade da política, como o direito arcaico, a teologia medieval ou as comunidades monásticas, esta série mostrou-se, no seguimento de Foucault, decisiva para a configuração de problemas como a biopolítica e a governamentalidade. O seu carácter provocatório, bem como a sua recusa intransigente em oferecer quaisquer linhas de orientação ou programas para a acção política, não a manteve isenta de críticas àquela que seria uma dimensão estritamente negativa da sua teoria. Ainda assim, esta particular emergência de conceitos – de «vida nua» a «potência destituinte» –, recentemente concluída com L’uso dei corpi (2014) e aumentada com Stasis. La guerra civile come paradigma politico (2015), tem-se revelado – à justa medida da sua violência e paradoxalidade – indispensável para chegar a pensar hoje uma política por vir.
 Dar conta deste projecto agora findo requer uma espécie de passo atrás na leitura embrenhada (ou na apropriação desenvolta) para procurar colocá-lo num horizonte de inteligibilidade o mais abrangente possível. Assim, a Unipop propõe uma jornada composta por duas mesas-redondas alargadas com breves intervenções de investigadores convidados pela sua heterogeneidade e metodologias diversas, da teologia às ciências sociais e filosofia das práticas artísticas, entremeadas por discussões abertas a todos os presentes. Enquanto a primeira mesa-redonda (de manhã) será inteiramente dedicada à reavaliação da série ‘Homo sacer’, questionando a sua organização, alcance e âmbito propriamente filosófico, a segunda (de tarde) tentará cartografar algumas das consequências políticas, jurídicas e artísticas, bem como antecipar através das quais, com alguma probabilidade, este projecto continuará a ressoar.
  

19/02/15

Terrorismo anti-terrorista

A adopção e legitimação de medidas de terrorismo securitário em nome do combate ao terrorismo desarma os cidadãos comuns das suas remanescentes liberdades e direitos fundamentais, e só reforça a lógica do terror. Senão leia-se:

O Conselho de Ministros aprovou hoje oito propostas de lei que têm como objetivo "ajustar a legislação existente" à Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo, também hoje divulgada pelo Governo.
Uma das propostas passa pela criação de novos tipos de crimes de terrorismo, nomeadamente a criminalização da apologia pública do crime de terrorismo, viagens para adesão a organizações terroristas e o ato de aceder ou ter acesso aos sítios da internet onde se incita ao terrorismo.

Se deixarmos de lado as "viagens para adesão a organizações terroristas", a criminalização da "apologia pública do crime de terrorismo" e "do ato de aceder ou ter acesso aos sítios da internet onde se incita ao terrorismo (…) com a intenção de ser recrutado" abre justamente a porta ao terror policial e político mais arbitrário e mais extremo. Lamento não ser possível fazer um desenho a explicar porquê, pois os termos da definição são tão vagos que, como diria O'Neill, "o medo vai ter tudo" à sua disposição para nos meter medo. E se "perfilados de medo agradece[r]mos", é que, como explicava o mesmo O'Neill, da "decisão e coragem" da liberdade — e também "da vida [—] perdemos o sentido".

Entre o governo grego encostada à parede e a UE no fio da navalha


A Alemanha rejeita a proposta da Grécia para extensão do empréstimo por seis meses, por não satisfazer as condições exigidas pela zona euro nem as do programa de assistência financeira em curso. "A carta proveniente de Atenas não é uma proposta substancial para uma solução", disse o porta-voz do ministério alemão, Martin Jäger, num breve comunicado.
(…)
Um porta-voz do executivo comunitário, no briefing diário da Comissão Europeia, considerou hoje que o pedido de extensão da ajuda financeira enviado pela Grécia seria uma base para um compromisso em sede do Eurogrupo de sexta-feira. O pedido - uma carta com "duas páginas" - de Atenas "abre a possibilidade de um compromisso razoável", sublinhou, Margaritis Schinas.



É impossível saber neste momento se, ao nível da direcção da UE, e perante o governo grego, prevalecerão, nos termos de que se serviu o João Valente Aguiar no comentário a um dos meus posts anteriores, "as burocracias nacionais que actuam na esfera europeia" e os membros de "uma tecnocracia especificamente europeia" interessada em  "promover uma UE crescentemente desvinculada das burocracias nacionais" — tanto mais que, apesar da "conflitualidade profunda" que separa as suas linhas, não existe menos entre elas uma também profunda — ou ainda mais profunda — solidariedade oligárquica. O que é certo, em contrapartida, e deveria fazer toda a diferença para todos os que estão empenhados na salvaguarda e posterior extensão das condições de uma democratização efectiva à escala europeia — sem esquecer as suas consequências "globais" — é que encostar o governo grego à parede é, em todos os planos relevantes, colocar no fio de uma navalha particularmente cortante a própria UE, em benefício da intensificação dos nacionalismos, dos riscos de guerra e de uma regressão social que fara parecer a actual austeridade o simples aperitivo de um veneno imensamente mais letal.


18/02/15

As propostas apresentadas pela Grécia na reunião do Eurogrupo

Um compacto da documentação apresentada na reunião do Eurogrupo[pdf], publicados pelo jornal Ekathimerini (via Frances Coppola).

Inclui as propostas gregas, e mais os dois rascunhos apresentados pela representantes da UE.

17/02/15

Já que se fala muito da República de Weimar

Article 48 (Weimar Constitution) e este post da Helena Matos.

O artigo 48º começou a ser usados bastante pelos governos alemães a partir de 1930, exatamente para aprovar medidas de austeridade que não tinham apoio parlamentar; depois foi também a base legal para a proclamação do Decreto Presidencial para a Proteção do Povo e do Estado, implantando de facto a ditadura nazi (ainda antes, recorde-se, das eleições que os nazis ganharam).

Vitória avassaladora da estupidez e da cobardia no âmbito do Eurogrupo

Recusar, como fez o Eurogrupo, um acordo com o governo grego, cujos termos seriam aproximadamente os deste "rascunho":


Hoje, o Eurogrupo fez um balanço da situação atual na Grécia, com base no diálogo aprofundado entre as novas autoridades Gregas e as Instituições.

As autoridades Gregas manifestaram o seu empenho para um processo de reformas mais amplo, forte e socialmente justo, destinado a melhorar as perspetivas de crescimento de forma duradoura. Em especial, o Governo Helénico compromete-se a implementar as reformas há muito esperadas para combater a corrupção e a fuga ao fisco e modernizar a administração pública. Anunciou a sua intenção de tomar medidas urgentes para assegurar um sistema fiscal mais justo e eficaz e para conter a crise humanitária. Irá assegurar que quaisquer medidas novas não contrariem os compromissos existentes e serão integralmente financiadas. Irá abster-se de ações unilaterais e trabalhar em estreita concordância com os seus parceiros Europeus e internacionais.

A Grécia respeitará por inteiro os seus compromissos com os parceiros de forma a garantir finanças públicas sólidas e sustentáveis, ao alcançar e depois manter saldos orçamentais primários importantes. A viabilidade de se atingir a meta fiscal para 2015 será considerada à luz da evolução das circunstâncias económicas. As medidas para reduzir o peso da dívida e conseguir uma redução mais credível e sustentável do rácio da dívida face ao PIB deverão ter em conta o compromisso do Eurogrupo em Novembro de 2012.

Ao mesmo tempo, as autoridades gregas reiteraram o seu compromisso inequívoco com as obrigações financeiras para todos os seus credores.

O acima exposto é a base para uma extensão do atual acordo de empréstimo, que pode tomar a forma de um programa intermediário [de quatro meses], como uma etapa transitória para um novo contrato de crescimento para a Grécia, que será discutida e concluída durante este período.

Quando se considerar útil, a Comissão Europeia irá fornecer assistência técnica à Grécia para fortalecer e acelerar a implementação das reformas.

O Eurogrupo convida as Instituições a prosseguirem o trabalho técnico com as autoridades Gregas, incluindo a identificação de necessidades financeiras intermédias, como serão cobertas e as condições apropriadas. As instituições prestarão contas ao Eurogrupo no dia 21 de Fevereiro.

— representa a vitória da estupidez mais avassaladora no âmbito do Eurogrupo, desafiando qualquer racionalidade estratégica por parte da actual direcção da UE, quando temos em conta os seguintes aspectos: o conflito em torno da questão ucraniana; a necessidade óbvia de reforçar a coesão da UE no contexto desse conflito; a existência na Grécia, no interior da coligação e até dentro do próprio Syriza,  de pulsões nacionalistas muito fortes, que a rejeição do acordo só poderá exarcebar, e que, caso viessem a prevalecer sobre as orientações europeístas e federalistas da linha hoje dominante no Syriza, exporiam a UE a riscos maiores no plano geoestratégico. Acresce que, a manterem-se os termos dachantagem do Eurogrupo (o virar-de-casaca de Pierre Moscovici, etc.), o próprio xadrez político da UE tenderá a alterar-se, no sentido da pasokização dos partidos social-democratas, sem que seja certo que isso beneficie mais novos Syriza do que novas forças nacionalistas do tipo Front national à direita, bem como a audiência das várias facções nacionalistas e anti-europeias que brandem bandeiras pseudo-radicais de "esquerda". Ora, como devia ser evidente, do reforço dos nacionalismos e da confluência prática das suas diversas componentes, só poderá resultar o pior, tanto para a grande maioria dos cidadãos europeus, como para uma UE enfraquecida e mais receosa das medidas "socializantes" que a sua coesão reclamaria do que da sua secundarização e capitulação à escala global. É que a estupidez e a cobardia potenciam-se mutuamente, e alimentam-se da ausência ambiente de um mais decidido exercício da cidadania e da razão.

A Grécia não fez reformas?

É frequente dizer-se que a Grécia "não fez reformas" (veja-se, por exemplo, este artigo do José Manuel Fernandes), frequentemente em contraponto com Portugal e a Irlanda (que supostamente terão cortado as gorduras do Estado, ou lá como lhe chamam hoje em dia).

A esse respeito temos aqui a evolução do saldo orçamental estrutural (isto é, o saldo que haveria se a economia não estivesse em recessão, com a queda dos impostos e aumento dos subsidios de desempregos e similares daí resultante) da Grécia e da Irlanda:


Uma comparação entre a evolução da despesas pública, sem contar com os juros da dívida, em vários países europeus:

E a opinião da OCDE sobre quais os países que mais fizeram reformas (entre 2007 e 2014):


Então de onde vem a conversa de que a Grécia não fez reformas? Basicamente em usarem como métrica a despesa pública (incluindo juros) em percentagem do PIB; desta forma, a crise económica grega conta como "despesismo" (o PIB desce, o rácio Despesa/PIB aumenta - por redução do denominador - e cá está: "despesistas", "aldrabões", "não fizeram reformas", "não cumpriram nada!")

16/02/15

A "proposta" que o Eurogrupo apresentou à Grécia

O rascunho da proposta que foi apresentada na reunião de hoje (após o qual Varoufakis declarou que não é possível um acordo).

Para se ver como essa proposta era inaceitável para a Grécia (e se calhar foi apresentada de propósito para ser recusada), olhe-se para o quarto parágrafo:
The Greek authorities commited to ensure appropriate primary fiscal surpluses and financing in order to guarantee debt sustainability in line with the targets agreed in November 2012 Eurogroup statement. Moreover, any new measures should be funded, and not endager financial stability
Repare-se sobretudo no "in line with the targets agreed in November 2012"; isto é, manter na mesma as metas para a redução do deficit (deixando tudo na mesma).

15/02/15

Mascarar cães com réplicas das barbas do Profeta não é fé na blasfémia, mas legítima defesa da descrença

Perante esta notícia:

Acredita-se que [Lars Vilks, o cartoonista sueco, de 68 anos, que vive sob proteção policial depois de ter desenhado Maomé como um cão] seria o alvo [do atentado de Copenhague]. Desde a exposição do polémico trabalho, em 2007, o artista está na mira da al-Qaeda e tem a cabeça a prémio, refere o El País. Os "fanáticos islâmicos" oferecem 74 mil euros a quem o matar. E se for "sacrificado como um cordeiro", isto é, degolado, o valor sobe para 100 mil euros, segundo o jornal espanhol

— é um triste sinal dos tempos que correm vemos hoje, não só alguns inconsoláveis órfãos, que procuram afogar as saudades dos bigodes de Estaline venerando as barbas de Mafoma, mas também multiculturalistas vários e interculturalistas abrangentes do tipo Boaventura Sousa Santos, ou interpretarem, mais ou menos sotto voce, o atentado como um acto de resistência anti-imperialista, ou proporem como meio de pôr fim a acções semelhantes a repressão da blasfémia, do livre-exame e dos excessos de liberdade de expressão, a criminalização da blasfémia e o combate à "laicidade total".

Já nos finais da década de 1980, por ocasião do caso Rushdie e de Os Versículos Satânicos foi assim, e o "cretinismo político" que, segundo Castoriadis, parece endémico, ainda que com excepções, entre os filósofos de métier, manifestou-se em todo o seu inquietante esplendor: vimos, por exemplo, um pensador por vezes tão sugestivo como Charles Taylor "compreender" com arrepiante generosidade hermenêutica a fatwa e denunciar o romance de Rushdie como atentado à identidade muçulmana e aos seus "suportes existenciais" (ou seja, argumentar que, a partir do momento em que alguém invista suficientemente a sua fé, a ponto de a tornar um "suporte existencial" da sua identidade, teremos de respeitar, não apenas os seus direitos individuais, mas também as suas "ideias"…). Uma pergunta inevitável subsiste, no entanto, sobre o tipo de sociedade e de regime político que opõem, afinal, à ordem oligárquica dominante, não só os anti-imperialistas nostálgicos do "socialismo realmente existente", mas também os multiculturalistas do "respeitinho é que é preciso" e a sua facção "bolivariana" ou mensageira do "socialismo do século XXI", que gosta de se proclamar "interculturalista"? Deveremos respeitar também a originalidade desse traço cultural distintivo que é a divisão do trabalho político, implicando a divisão política do trabalho, do capitalismo ocidental, ou continuar a lutar contra a sua economia e as suas relações de poder, bem como contra as "alternativas" que se propõem reciclar a sua dominação hierárquica, ressacralizando as leis e instituições e entaipando ainda mais o horizonte anti-classista da autonomia democrática ou da cidadania governante? E, no que se refere aos factos noticiados no início deste post, deveremos reforçar os mecanismos de censura, ou organizar cortejos de carnaval com muitos e visíveis cães mascarados com réplicas das barbas do Profeta? Não por fé na blasfémia, como já disse ontem, mas em legítima defesa da descrença, cujos direitos são condição necessária, ainda que não suficiente, da liberdade e de uma cidadania de "iguais". É verdade que mascarar assim os cães ofenderia não só a especificidade cultural dos muçulmanos piedosos, mas também as convicções profundas dos animalistas mais crentes — resta, em todo o caso, que poupar as cajadadas é um preceito de utilidade comprovada que todos os caçadores de coelhos conhecem bem.



14/02/15

Sobre o piedoso atentado muçulmano de Copenhague

Perante um facto como este:


Una persona ha muerto y al menos tres han resultado heridas este sábado en un tiroteo en Copenhague durante una conferencia sobre la libertad de expresión y la blasfemia. En el debate, que se celebraba en un café-centro cultural, participaban el historiador y caricaturista sueco, Lars Vilks, y el embajador de Francia en Dinamarca, François Zimeray. Ambos están ilesos, según ha informado la policía en un comunicado. Vilks se hizo famoso por retratar a Mahoma como un perro en 2007. Desde entonces había recibido multitud de amenazas de muerte y vivía con protección. 
(…)
Las autoridades aún no han dado a conocer la identidad del fallecido, un civil de unos 40 años. De los tres heridos uno es policía y los otros dos agentes del servicio de seguridad danés (PET), que protegían el exterior de Krudttønden, el centro cultural al norte de la ciudad donde se celebraba el debate, titulado El arte, la blasfemia y la libertad de expresión y organizado por el Lars Vilks Comite

— o mais provável é que a resposta dos governos e outras instâncias "responsáveis" da UE seja, uma vez mais, depois de repudiarem o "terrorismo", recomendarem prudência, limitarem a liberdade de expressão, e nomeadamente impossibilitarem ou sabotarem a realização de novos debates do mesmo teor, invocando a "segurança pública" e a necessidade de evitar "provocações" — como têm feito em diversos casos já no pós-Charlie. O que deveria ser, para os activistas e membros dos diversos colectivos de diversa natureza que se reclamam da defesa e da extensão desses "valores ocidentais" que são o livre-exame, os direitos fundamentais, a laicidade do espaço público, uma razão mais para passarem à acção promovendo, contra o terrorismo dos islamitas fanáticos e o "liberalismo do medo" das oligarquias da UE, um, dois, três, muitos debates públicos sobre o mesmo tema, um pouco por toda a Europa — e tanto em solidariedade com os promotores da iniciativa que foi alvo do atentado como em legítima defesa da sua ameaçada condição de cidadãos. Por mim, muito gostaria de participar e poder contribuir para a realização de um ou vários debates, em Lisboa ou noutros lugares, que se propusesse explicitamente retomar a discussão interrompida pelo atentado de Copenhague. É que, se creio que a blasfémia por si só é de alcance democrático limitado, a destruição do direito a ela só poderá ser um triunfo devastador do irracionalismo e da barbárie.

12/02/15

Um tiro no porta-aviões da demagogia do anti-casticismo profissional e centralista tecnocrático do pablismo

O Podemos é um fenómeno complexo, que exibe uma ambiguidade impossível de manter por muito tempo, e que o "pablismo-monederismo", a prevalecer, só poderá levar às piores soluções. Quanto a Luis García Montero, são muitos os pontos da sua posição política que seria necessario precisar, e muitos os pressupostos contestáveis. mas nem por isso deixa de ser certeira, quanto a Podemos e ao pablismo-monederismo (esse "leninismo amável"), a observação que hoje aqui quero propor como matéria de reflexão aos viandantes que por aqui passem:

Comprendo a Pablo Iglesias cuando critica a los aparatos de una izquierda tradicional que se conforma con el control interno y con la minoría bisagra. Izquierda Unida en Andalucía, por ejemplo, acaba de hacer de nuevo unas listas más propias del Partido Comunista que de Izquierda Unida. Pero no comprendo la teorización política de asumir en público que se prefiere ganar votos a conservar los valores o que se necesita abandonar los valores para ganar elecciones.

Contra a repressão policial

Invadidos por notícias de “invasões”, deixamos aqui (embora com mais actualizações para breve) o relato dos acontecimentos vividos no Bairro da Cova da Moura e na Esquadra da PSP de Alfragide na semana passada:
a) No início da tarde de dia 5 de Fevereiro, uma patrulha da PSP da esquadra de Alfragide invadiu o Bairro da Cova da Moura, numa acção de rotina que concluiu na detenção de uma pessoa;
b) Durante a acção, o detido – apesar de não ter oferecido resistência – foi agredido violentamente, de pé e depois no chão, pelos diversos elementos da PSP presentes;
c) Perante o elevado número de testemunhas (algumas talvez armadas com telemóveis que filmam) , a PSP tratou de “limpar” as redondezas com recurso a violência física. A todos aqueles que: pela distância, por estarem à janela ou em propriedade privada e por isso distantes do cassetete , a polícia optou pelo disparo de balas de borracha;
d) Entre as vítimas das balas contam-se: mãe e filho (de apenas três anos de idade) que foram encaminhadas para o hospital, a mãe foi sujeita a uma operação cirúrgica; uma mulher atingida na face que se encontrava à janela; dois deficientes físicos; e ainda um grupo de raparigas que se encontrava no espaço público;
e) Perante o caos instalado pela PSP, quatro cidadãos do Bairro, alguns colaboradores do Moinho da Juventude, cientes do seus direitos e preocupados com a situação criada, dirigiram-se à esquadra de Alfragide para apresentar queixa dos agentes e saber informações do detido na acção de Bairro;
f) Apesar da esquadra ser um espaço público com serviço de atendimento ao cidadão, isso não impediu que os quatro fossem agredidos por vários agentes, em franca maioria, e que recorreram inclusive, e novamente, a balas de borracha;
g) Um sexto indivíduo que se encontrava no espaço público da esquadra foi agregado pela PSP aos 5 previamente detidos;
h) Dada a natureza das agressões, os seis indivíduos foram assistidos durante várias horas no hospital Amadora-Sintra, e diga-se, estavam todos irreconhecíveis, tal a brutalidade da acção policial.
Durante todo o tempo de espera e desenvolvimento da situação dos detidos, a polícia apresentou-se nervosa, talvez consciente da dimensão do ocorrido. Vários polícias fardados e à paisana cobriam várias espaços do hospital de forma desconfiada, enquanto na esquadra faziam o possível por não exteriorizar, embora de forma infrutífera, a insegurança dos seus actos. Como se o cenário não fosse estranho o suficiente, ficamos a saber que um dos polícias da esquadra de Alfragide ostenta uma tatuagem nazi. É evidente que, por tudo o descrito e pelas notícias veiculadas pela PSP aos media, vão tentar acusar este grupo de cidadãos de um crime directamente proporcional ao erro grave cometido pela corporação. Temos de estar vigilantes e atentos. Afinal quem invade quem?

11/02/15

O vídeo de Ruslan Kotsaba

O vídeo pelo qual o jornalista Ruslan Kotsaba está preso na Ucrânia por o ter posto na internet:



Aqui (tradução via google... )a posição da Amnistia Internacional da Ucrânia sobre o assunto.

09/02/15

Indemnizações de guerra?

Sinceramente, acho ridículo (talvez com uma exceção), a respeito da questão da renegociação da dívida, vir invocar que a Alemanha ainda deve dinheiro das indemnizações da II (ou mesmo da I) Guerra Mundial.

Para começar essa dívida já foi perdoada pelos países supostamente credores, logo a Alemanha já não deve nada por aí (vir agora falar de dívidas que já foram perdoadas seria como se agora se conseguisse renegociar a dívida grega mas daqui a umas décadas voltassem a pedir o dinheiro).

Falar disso (das dívidas perdoadas) é relevante em abstrato, como defesa do principio que em certos momentos o melhor que há a fazer é perdoar (total ou parcialmente) dívidas (ou juros); mas falar nisso como se se quisesse vir agora buscar mesmo esse dinheiro acho que não tem grande lógica.

Além disso, "indemnizações de guerra" não são dívidas a sério - não passam de um tributo que os vencedores impunham aos vencidos no fim das guerras; e isso aplica-se sobretudo à suposta dívida da Alemanha a Portugal, resultante de "indemnizações" de uma guerra em que Portugal se meteu largamente porque quis.

Qual a exceção que referi acima? Durante a II Guerra Mundial, os alemães exigiram da Grécia um "empréstimo forçado", em que o Banco Central grego imprimiu uns milhares ou milhões de dracmas que "emprestou" ao exército alemão (creio que foi esse dinheiro que os soldados alemães gastaram durante a ocupação). Neste caso, haverá mesmo uma dívida - trata-se mesmo de um empréstimo que a Alemanha (quando estava na mó de cima) contraiu junto da Grécia (não de um valor que os vencedores decidiram que o vencido teria que pagar, como no caso das indemnizações propriamente ditas). De qualquer forma,  mesmo neste caso, se não se aplica a segunda objeção, continua a aplicar-se a primeira.

Porque a nossa luta é internacional


As eleições gregas vieram agitar as águas paradas do pântano europeu. A vitória do SYRIZA, que se propõe romper com as políticas da Troika, desafia a ideia dominante de que não existe alternativa ao empobrecimento generalizado e à austeridade infinita.
Os últimos dias revelaram a hostilidade de instituições e governos europeus relativamente à própria possibilidade de uma política que devolva um mínimo de esperança e dignidade a milhões de pessoas sem emprego e sem direitos, obrigadas a viver na rua ou às escuras, sujeitas à fome e privadas de cuidados médicos. Parece evidente que estão em jogo questões decisivas que ultrapassam o quadro nacional da Grécia.
O Governo português já se mostrou indisponível para qualquer esforço conjunto para reduzir o peso da dívida à escala europeia e encontrar soluções que permitam responder à catástrofe social em que vivemos. Orgulha-se mesmo de ter aplicado com sucesso medidas que empobreceram muitos e enriqueceram poucos, enquanto a dívida pública aumentou, o défice derrapou e o desemprego atingiu dimensões inéditas. Quando garante que Portugal não é a Grécia, espera que aceitemos com resignação o atual estado de coisas, como se fosse possível ignorar que acaba de se recusar na Grécia o que nos querem fazer engolir em Portugal.
Neste momento decisivo em que a resistência ganha novo alento, por toda a Europa se convocam manifestações em solidariedade com o povo grego e de repúdio pela arrogância e hostilidade reveladas pelas instituições europeias. É tempo de sair à rua e enviar um sinal claro de que estamos todos no mesmo barco e não aceitamos a miséria que nos querem impor. Porque a nossa luta é internacional, aqui e agora, somos todos gregos.
 

Liberdade de expressão?

Decisão de um tribunal ucraniano ordenando a detenção do jornalista Ruslan Kotsaba, por ter feito um video contra o serviço militar obrigatório e dizendo que o que se passa na Ucrânia é uma "guerra civil".

Grécia. Como é possível ganhar a guerra depois de se terem perdido todas as batalhas ?



A recente vitória eleitoral de Syriza alterou claramente o cenário político institucional na Europa. Propulsionou para o centro do debate político e económico a questão da dívida e do seu significado social. Nas sociedades da Europa periférica, os limites da austeridade e os limites da política e da economia revelam-se interdependentes. São os contornos do futuro que o sistema nos impõe. Cenário ao qual só escaparemos na eventualidade de um vasto, profundo e radical movimento de contestação da lógica económica actual, alternativa que de momento não parece visível mas que não é impossível. Com efeito, como o sugeriam há pouco uns “antipáticos” lisboetas, o desconhecido e o imprevisível são sempre possíveis. O resto são compromissos, é a Política, mar fechado, sem marés, no qual Syriza parece, desde já, navegar.
O texto que aqui se dá a conhecer foi escrito por um jovem grego que participou durante vários anos, entre 2010 e 2012, no movimento social contra a austeridade, movimento que foi finalmente vencido após ter ele próprio provocado a queda e a decomposição do Pasok (Partido socialista grego). Emigrado hoje nos Estados-Unidos, Cognord, expõe numa revista de New York (http://www.brooklynrail.org/2015/02/field-notes/is-it-possible-to-win-the-war-after-losing-all-the-battles) uma análise que nos parece pertinente, decerto discutível, sobre o sentido da vitória eleitoral de um partido que, de 2009 a 2015, passou de 3% dos votos a mais de 30 %.
Duas ideias principais do seu texto ajudam-nos a compreender melhor o que se passa, os limites e as perspectivas da situação actual.
1)     O Syriza nunca foi um partido explicitamente anticapitalista ou com propostas anticapitalistas. Será portanto fútil tentar fazer a sua crítica, presente ou futura, nesses termos ou mesmo em termos de um eventual abandono ou traição de posições radicais que o Syriza nunca defendeu.
2)    A subida ao poder de Syriza não é o resultado do movimento que o precedeu, das lutas sociais contra a austeridade capitalista. Pelo contrário, a vitória eleitoral de Syriza deve ser vista como o resultado da derrota do movimento que o precedeu, o qual este partido teve um papel reduzido. O seu crescimento eleitoral é mais a consequência da decomposição do partido socialista do que de um alargamento da sua pequena base de origem. Como diz C., «o Syriza representa para muita gente a última esperança de um corte nas medidas de austeridade».
O que virá a seguir terá, sem dúvida, uma relação com estes dois parâmetros.
O texto está em Inglês e, mais uma vez, aqui fica expressa a frustração de não o podermos dar a ler a toda(o)s. Faz-nos falta uma língua universal !

Is it Possible to Win the War After Losing All the Battles? 

Prehistory of a Success
The announcement of national elections in Greece, roughly two years before the coalition government of New Democracy and Pasok completed their term, immediately sparked a renewed interest in this southern and economically peripheral European country. The relative silence that preceded this novel attention for the last two years was, at least in media terms, understandable. If Greece enjoyed an earlier moment of fame, it was primarily due to the unprecedented austerity measures imposed by the troika—the European Commission, European Central Bank (E.C.B.), and International Monetary Fund (I.M.F.)—in exchange for new loans, designed to “assist” the Greek state after it officially announced, in April 2010, that it was unable to repay its existing, “non-viable” sovereign debt (120 percent of G.D.P. at the time). The reactions to the implementation of the austerity program were also pivotal in bringing Greece into the spotlight: general strikes, violent demonstrations, and the movement of the squares ensured, between 2010 and 2012, that the future of Greece’s “fiscal consolidation program” (to borrow the official economic jargon) was seriously threatened. Along with the memorandum imposed by the troika, what came under attack was the legitimacy of the political system,1 generating wild speculation about the future of Greece’s membership in the Eurozone, as well as the unpredictable consequences this could have for the E.U., not to mention the global economy.
However, the movement which tried to halt the austerity program failed. The reasons are varied, and it is not within the scope of this article to explain them in detail. Suffice it to say that, as in every other social movement, this failure should be traced to both the violent determination of the government(s) to proceed with austerity at all costs (for which the ruling factions have paid a price) and the inability of the movement to transform itself from a defensive mobilization to protect existing conditions into an offensive attack on the conditions that created the crisis.

08/02/15

Entrevista com o presidente da Confederação dos Sindicatos Alemães

The Way Forward For Greece And Europe, entrevista com Reiner Hoffmann, presidente da DGB:
The Syriza-led government is now putting forward proposals for a debt haircut and the rejection of a policy of spending cuts – which has unleashed occasionally vehement resistance in Germany. Do you think the demands of Syriza are reasonable?

Using a soccer expression: One game leads to another. That means, the Greek government will, after the election campaign, and you can detect the first signals, get its feet back on the ground. If you listen to the Greek finance minister, Varoufakis, the tone is different and you can definitely see the prospect of finding constructive solutions with this government for a better, more sustainable way of servicing debt. We think a haircut now would be wrong; it’s not even necessary. And it wouldn’t help either Greece or the EU. (...)

The key thing now is for Greek GDP to grow again and the interest rate repayment schedule to be more protracted. The country and its people need to breathe again. The moderate proposal of Varoufakis to reduce the EU demand for a primary budget surplus of currently 4% to 1.5% seems to me reasonable and justified. His proposal to couple the rate of interest payments to economic growth in future should be viewed non-prejudicially. Of course, we recognize that getting rid of debt cannot just take three or five years; we should assume a longer period. This is a long-distance race and not the sprint stipulated by the troika for the Greeks. The former ETUC General Secretary, John Monks, whose deputy I was, has already compared the demand for budget cuts with an economic Versailles Treaty and given warning that driving a country into ruin cannot possibly be a sustainable strategy.

So, the DGB (German Trade Union Federation) is demanding an overall solution for debtor countries. We want fresh negotiations within the framework of a European conference on debt for all countries in crisis in order to restore debt sustainability and, thereby, stabilize the Eurozone. We reject this false chatter about Grexit; it would be damaging if Greece quit the monetary union. That, too, wouldn’t be a lasting solution but would simply aggravate problems because of a potential domino effect.

Podemos, a "cidadania" e "la gente de a pie": Teresa Rodríguez contra o "leninismo amável" do secretário-geral e dos seus comissários

Que não se pode promover o poder da "gente de a pie" ou os direitos governantes da cidadania comum concentrando a direcção hierárquica de um partido ou movimento que se proponha representá-los e/ou organizá-los disciplinarmente a partir do "exterior", eis o que Teresa Rodríguez e outros opõem ao "leninismo amável" do secretário-geral e seus comissários de Podemos. Esperemos que as águas mornas do tacticismo não diluam a prioridade da exigência assim formulada em nome da "unicidade da alma" do partido ou da necessidade de cerrar fileiras em torno de um "estado-maior" contra o "inimigo comum". Com efeito, é difícil conjugar as recentes declarações de compromisso —El candidato a liderar Podemos en la Comunidad [de Madrid] ha cosechado varios aplausos con su discurso de este sábado en el Ateneo de Madrid, en el que ha insistido en que en Podemos "no hay dos almas", y que de resultar elegido secretario general del partido en esta autonomía tenderá su mano al instante a sus rivales en este proceso interno — de Miguel Urbán — o mesmo que,  en anteriores ocasiones (…)   ha pronunciado discursos más críticos con la dirección del partido — com as seguintes palavras de Teresa Rodríguez:


Quien no ha dudado en hacer un par de reproches directos a la dirección estatal ha sido Teresa Rodríguez, eurodiputada y candidata a las primarias con las que Podemos elegirá quién debe disputar la Junta de Andalucía a Susana Díaz.

En una intervención retransmitida por Skype, la europarlamentaria ha respondido a las palabras de Pablo Iglesias, que este miércoles defendía las virtudes de contar con una organización "disciplinada" y "cohesionada políticamente", en un discurso de apoyo a su candidata en Aragón, Violeta Barba. "¿Disciplinarnos con quién? Si no hay base social ordenando, ¿cómo saber a quiénes disciplinarnos?", ha esgrimido Rodríguez, antes de afirmar que "las organizaciones y las personas se corrompen porque no están controladas por la gente". "Sois parte de ese Podemos del que me siento parte", ha asegurado Rodríguez al público. 

07/02/15

Monedero contestado pela "gente de a pie" de Podemos

La confirmación de que el número tres de Podemos, Juan Carlos Monedero, presentó el 29 de enero una declaración complementaria de IRPF ante Hacienda para regularizar sus impuestos ha generado una amplia discusión en Plaza Podemos, la plataforma digital que la formación utiliza como lugar oficial de encuentro y debate. 

(…)


“¿Por qué ha presentado una complementaria? Eso sólo se hace si has defraudado y te han pillado, y no quieres que aumente la sanción”, escribió el usuario que inició el debate. “Yo lo tengo muy claro: O explicación o expulsión. No hay término medio”, escribió. Varios seguidores se mostraron a favor de que Monedero presente su “dimisión y punto”. Para algunos participantes, lo que ha hecho el dirigente de Podemos puede hacer “mucho daño” a esta formación política. Un forero sostenía que “solo resta pedir perdón a la gente por el daño moral causado y dimitir”. “Si [Monedero] no lo hace, va a ser un lastre para todo el partido y marcará un techo electoral”, añadía. Otro participante proponía: “Si realmente ha cometido alguna irregularidad y de verdad busca luchar por el cambio, lo mejor que puede hacer es dimitir. Es más, deberíamos echarle”. Algunos foreros señalaban la posibilidad de que se haya cometido una ilegalidad, pero otros apuntaban sobre todo a que la actuación es “éticamente reprochable” y daña la imagen y el discurso de Podemos.

A Grécia está a pedir mais dinheiro?

Imagine-se que eu devo 1000 euros a alguém (950 euros que pedi emprestados mais 50 euros de juros) e está a chegar o dia do pagamento.

Imagine-se então que eu digo ao meu credor "não tenho dinheiro para te pagar e vais ficar a arder com o dinheiro - é chato, mas é a vida".

Poderão ser feitas muitas objeções morais a este comportamento, mas acho que ninguém diria que estou a pedir mais dinheiro (só se diria isso se eu, além de dizer que não ia pagar os 1000 euros, ainda pedisse mais dinheiro adicional).

Mas agora vamos supor outras duas situações:

a) em vez de dizer que não pago, peço para só pagar os 1000 euros daqui a dois anos

b) ofereço-me para pagar já 3 euros e os outros 997 daqui a dois anos

Fará sentido agora, dizer que estou a pedir mais dinheiro? De novo, parece-me que não. O cenário a) é muito parecido com o cenário original - só que em vez de renunciar unilateralmente à dívida, estou a pedir a autorização do credor e a dar-lhe alguma esperança de vir, com sorte a recuperar o dinheiro. Quanto ao cenário b), é ainda mais soft que o a), já que estou efetivamente a pagar um bocadinho do que devo.

Ora o que a Grécia está a pedir é um acordo deste género (como a Grécia tem - ou pelo menos tinha - um ligeiro superavit primário, será mais a situação descrita em "b") - até é possível que formalmente esteja a pedir novos empréstimos, mas é para pagar empréstimos (ou juros) que vencem agora (o que o torna, em termos reais, idêntico aos casos que apresento).

É verdade que também há a questão dos empréstimos do BCE (ou do Banco da Grécia com a autorização do BCE) aos bancos (que o governo grego está a tentar que se mantenham), mas creio que aí é um caso diferente: por um lado, porque estamos a falar de empréstimos aos bancos e não ao Estado; e, por outro, porque aí trata-se do problema de tesouraria implícito ao negócio bancário com reservas fraccionais (seja na Grécia ou na Alemanha) - como os bancos concedem empréstimos a longo prazo mas os depositantes (os à ordem, mas também os a prazo) podem levantar o dinheiro quando quiserem, correm o risco de estarem sujeitos a "corridas ao banco" e insolvência se não tiverem alguém que lhes possa emprestar dinheiro vivo quando os depositantes querem levantar hoje dinheiro que o banco só vai receber daqui a uns anos (se, de repente, o BCE anunciasse que já não autorizaria cedências de liquidez aos bancos alemães, estes possivelmente também ficariam em maus lençóis, por mais poupados que os alemães sejam).

06/02/15

Uma “invasão a esquadra” inventada – Relatos da Cova da Moura e de Alfragide


Invadidos por notícias de “invasões”, deixamos aqui (embora com mais actualizações para breve) o relato dos acontecimentos vividos hoje no Bairro da Cova da Moura e na Esquadra da PSP de Alfragide:
a) No início da tarde uma patrulha da PSP da esquadra de Alfragide invadiu o Bairro da Cova da Moura, numa acção de rotina que concluiu na detenção de uma pessoa;
b) Durante a acção, o detido – apesar de não ter oferecido resistência – foi agredido violentamente, de pé e depois no chão, pelos diversos elementos da PSP presentes;
c) Perante o elevado número de testemunhas (algumas talvez armadas com telemóveis que filmam) , a PSP tratou de “limpar” as redondezas com recurso a violência física. A todos aqueles que: pela distância, por estarem à janela ou em propriedade privada e por isso distantes do cassetete , a polícia optou pelo disparo de balas de borracha;
d) Entre as vítimas das balas contam-se: mãe e filho (de apenas três anos de idade) que foram encaminhadas para o hospital, a mãe foi sujeita a uma operação cirúrgica; uma mulher atingida na face que se encontrava à janela; dois deficientes físicos; e ainda um grupo de raparigas que se encontrava no espaço público;
e) Perante o caos instalado pela PSP, quatro cidadãos do Bairro, alguns colaboradores do Moinho da Juventude, cientes do seus direitos e preocupados com a situação criada, dirigiram-se à esquadra de Alfragide para apresentar queixa dos agentes e saber informações do detido na acção de Bairro;
f) Apesar da esquadra ser um espaço público com serviço de atendimento ao cidadão, isso não impediu que os quatro fossem agredidos por vários agentes, em franca maioria, e que recorreram inclusive, e novamente, a balas de borracha;
g) Um sexto indivíduo que se encontrava no espaço público da esquadra foi agregado pela PSP aos 5 previamente detidos;
h) Dada a natureza das agressões, os seis indivíduos foram assistidos durante várias horas no hospital Amadora-Sintra, e diga-se, estavam todos irreconhecíveis, tal a brutalidade da acção policial.
Durante todo o tempo de espera e desenvolvimento da situação dos detidos, a polícia apresentou-se nervosa, talvez consciente da dimensão do ocorrido. Vários polícias fardados e à paisana cobriam várias espaços do hospital de forma desconfiada, enquanto na esquadra faziam o possível por não exteriorizar, embora de forma infrutífera, a insegurança dos seus actos. Como se o cenário não fosse estranho o suficiente, ficamos a saber que um dos polícias da esquadra de Alfragide ostenta uma tatuagem nazi. É evidente que, por tudo o descrito e pelas notícias veiculadas pela PSP aos media, vão tentar acusar este grupo de cidadãos de um crime directamente proporcional ao erro grave cometido pela corporação. Temos de estar vigilantes e atentos. Afinal quem invade quem?