29/08/12

28/08/12

A minha homenagem à RTP2




































Algumas séries que eu vi na RTP2, ao longo da minha vida (é verdade que algumas também dão/derem em canais do cabo, mas esses não estão abertos a toda a gente).

Uma nota acerca da minha descoberta da RTP2 - quando eu tinha uns 6 anos, ouvia a minha irmã contar umas histórias de que existia um segundo canal. Um dia, não me lembro bem se o meu pai comprou uma televisão nova ou se se pôs a fazer sincronizações na que já tínhamos; o certo é que, após uns minutos de trabalho, lá nos aparece o tal famoso 2º canal - estava a dar o Sitio do Picapau Amarelo (a sub-série dos piratas).

Touradas de morte

Eu não consigo perceber qual o grande problema que a associação "Animal" tem com as touradas de morte em Barrancos. Isto é, eu percebo (e tendo a concordar) com a sua oposição às touradas, mas, havendo touradas, não percebo muito bem que diferença faz o touro ser morto em público ou umas horas depois.

Acho que os opositores das touradas, em vez de lutarem contra a excepção barranquenha (já agora, ainda alguém vai ver as touradas de Barrancos, ou isso perdeu toda a publicidade com a institucionalização da excepção?), fariam melhor em fazerem o caminho inverso e defenderem a excepção viana-castelense, propondo uma lei que tornasse a tourada algo a ser decidido a nível municipal.

27/08/12

Da "tradução como actividade democrática"


No seu comentário, que muito me honra e responsabiliza, a um meu post anterior sobre George Steiner, um leitor, que se identifica como Conservador e pelas iniciais GVRCS, elogia com excessiva generosidade a minha oficina, ao mesmo tempo que se declara adversário das minhas propostas políticas, sem adiantar, na circunstância, outras razões.

Ora, parece-me que a melhor maneira de corresponder à interpelação de GVRCS, é tentar explicitar aquilo a que poderia chamar, invocando o exemplo da leitura que João Barrento faz da produção de tradutor de Paulo Quintela, a minha própria concepção da "tradução como actividade democrática".

Assim retomo aqui os parágrafos finais de um breve ensaio publicado originalmente na Trajectos (nº3, Outono de 2003, Lisboa, Fim de Século, 2003), em resposta a um convite do seu director, e meu amigo, José Rebelo: texto no qual, ao fio de uma leitura de O Poço de Babel, de João Barrento, procuro elucidar algumas razões da democracia à luz de uma tradição "anti-nacionalista" da tradução, bem como as razões políticas da minha adesão a essa tradição —"estranhante" e "identificativa" —, na qual, a seu modo, se inscreve também a poética do pensamento de George Steiner.

Não precisarei de acrescentar grande coisa às razões que assistem à tradução estranhante ou identificativa, uma vez que implicitamente elas têm vindo a ser adiantadas desde o início destas linhas. No entanto, e na perspectiva da solidariedade entre a sua ideia e a da construção de um paradigma ou de uma poética democráticos no domínio das relações entre mundos culturais diferentes e no que se refere à ideia da mundialização de uma cidadania democrática governante, há alguns aspectos em que devo ainda insistir.

Uma reflexão de Antoine Berman descreve bem a operação paradoxal que a tradução identificativa ou estranhante leva a cabo. Com a leitura de uma tradução capaz de acolher a estranheza ou a alteridade essencial e singular do que o texto noutra língua fez, “encontramo-nos na presença não só de passagens visivelmente acabadas, mas também de uma escrita que é uma escrita-de-tradução (…), uma escrita de estrangeiro que se torna harmoniosamente francês sem choque algum (ou, se choque houver, será um choque benéfico). Estas ‘zonas textuais’ em que o tradutor escreveu-estrangeiro em francês, e, assim, produziu um francês novo, são as zonas de graça e de riqueza do texto traduzido” (A. Berman, Pour une critique des traductions: John Donne, Paris, Gallimard, 1995). Pois bem, há aqui dois níveis da “tarefa do tradutor”, em que vale a pena atentar para compreendermos melhor que “estranhamento” entra em jogo no diálogo sui generis que é a tradução que se propõe refazer noutra língua a não-equivalência do original, e a que aqui chamarei a não-equivalência da língua a traduzir e a não-equivalência nessa língua da voz única do original que — dentro dela e recorrendo ao sem-fundo metamórfico do seu fundo metafórico — o torna, como dizia Proust, “estrangeiro na sua própria língua.
Temos, em primeiro lugar, a não-equivalência das línguas ou culturas que se encontram, línguas ou culturas que não são pretendentes rivais ou termos de uma alternativa, mas criações singulares animadas igualmente pela potência de metamorfose ontológica da invenção da linguagem e/ou pela imaginação radical da actividade instituinte. Ora, será retomando a sua própria língua em estado nascente, retomando nela essa potência de metamorfose que habita a sua dimensão simbólica e metafórica em acto, que o tradutor poderá acolher, no seu fazer, o fazer(-se) da outra língua. Deparamos aqui com essa dimensão de uma “terceira voz” ou de uma “língua de ninguém” enquanto origem e estado nascente da linguagem através dos quais é em línguas que a espécie fala cada uma das suas línguas, e as línguas comunicam. Mas importa acrescentar, por um lado, que a origem não significa apenas nem privilegiadamente o passado, enquanto, por outro, embora a tradução tenda a revelar uma origem comum em que todas as línguas participam, este último horizonte não pressupõe necessariamente, nem atrás de nós nem à nossa frente, uma língua única. O alvo da “tarefa do tradutor” não é tanto a construção de uma língua única, que de resto falaria em línguas como todas as outras, como a intensificação em cada língua da potência de criação ontológica, comum a todas, que se revela na “invenção da linguagem”. E deparamos aqui com qualquer coisa que pode ajudar-nos a pensar melhor como se põe questão da multiplicidade cultural na perspectiva da mundialização da democracia. Com efeito, se esta pressupõe um horizonte comum e um movimento de unificação, estes serão previsivelmente inseparáveis de um movimento de pluralização no interior de cada matriz cultural e nas relações entre elas, que só poderá ser potenciado pelo reconhecimento explícito da auto-instituição da sociedade e pela afirmação da cidadania enquanto exercício da “política como actividade autónoma que interpela [e, em sendo caso disso, antecipa] a autonomia dos outros” (Castoriadis).

Para concluir, e a partir agora tanto do primeiro nível do reconhecimento e da tradução da não-equivalência como do segundo — a tradução da não-equivalência, ou singularidade dentro da singularidade, da voz única do original —, gostaria de sublinhar qualquer coisa que é da ordem das suas condições de possibilidade, ao mesmo tempo que incita a uma reflexão sobre o papel do reconhecimento da singularidade irredutível da voz do sujeito individual pressuposto pela figura  cultural emblemática da cidadania.

Pois bem, para poder acolher a estranheza do fazer e fazer-se da outra língua ou da outra cultura — tal como para poder  reconhecer plenamente a singularidade  que instila no acto da palavra o fazer(-se) de cada voz, irredutível à língua comum, ainda que quase indefinidamente silenciável pela sua situação de palavra instituída, ou do núcleo psíquico, irredutível à instituição, ainda que quase indefinidamente moldável por ela,  a partir do qual o indivíduo é formado por uma cultura e, no caso de uma cultura democrática, formado como indivíduo autónomo e capaz de cidadania —, é necessário que o tradutor e a sua tradição cultural tenham dessacralizado a sua língua e instituições e aceitem investir e recriar na “arena do sentido” o que lhes é “próprio”. Estamos, de facto, perante uma exigência que, referindo-se tanto ao interior do espaço literário propriamente dito como a esse seu montante e sua foz que é a linguagem comum, vincula a “tarefa do tradutor” do mesmo modo que vincula também o exercício da cidadania, não a pressupondo esta última menos — ao mesmo tempo no espaço público da deliberação e decisão políticas formais como aos diversos níveis da existência partilhada e na representação/relação que cada indivíduo mantém tanto dos outros e com os outros, como de si e consigo próprio. Tanto a tradução igualitária — que remete para a igualdade de direito do não-idêntico — entre duas línguas como a convivência democrática entre matrizes culturais diferentes, como ainda o reconhecimento da não-equivalência e singularidade última de cada ser humano individual que é ao mesmo tempo um dos pressupostos e fins distintivos do projecto de autonomia, implicam esta dessacralização pelas partes envolvidas das línguas e das significações encarnadas na instituição, tal sendo de resto a condição de possibilidade de um diálogo performativamente instituinte, isto é que faz qualquer coisa que nenhum dos participantes poderia fazer por si só e que transforma ou recria o fazer/ser dos participantes sem resolver a sua identidade em qualquer síntese ou momento superior, mas confirmando antes na transformação daquela a potência de criação do mais “próprio” de cada um deles.

24/08/12

Derrame sobre a RTP e que se lixe a etiqueta que eu não sou candidata ao corpo diplomático

Há duas coisas que me deixam doente: a estupidez é uma, que me tomem por estúpida é outra. A minha relativa saúde deve-se, obviamente, não à escassez no mercado dos itens referidos mas ao facto de passar largos períodos em hibernação.
Acordada para a realidade, vejo-me submergida (como os submarinos do Portas) pelo caso RTP, que o Borges  o mesmo Borges que há uns tempos tinha como urgência baixar salários (os dos outros, suponho, mas posso estar enganada…)  veio anunciar ir ser vendida aos privados: fechadas a RTP 2 e várias rádios, e o Estado a manter-se como parceiro contribuindo através da taxa que todos os meses nos aparece na conta da Luz.
Ora bem. Como no tempo do parisiense José Sócrates (a propaganda, desde Joseph Goebbels que não progride grande coisa…), as tropas já foram instruídas para fazer a defesa da solução proposta.
O argumentário é simples: a Constituição exige serviço público, mas não diz como concretizá-lo nem se é à borla ou a pagantes; o negócio assegura o serviço público delegando-o num privado; ficamos todos a ganhar porque o Estado poupa imenso dinheiro, já que a participação se resumirá à taxa do audiovisual.
Para que conste, eu não tenho televisão. Acho a televisão generalista uma merda e chateia-me andar a pagar o Baião, a Furtado, aquela senhora inenarrável que dá pelo nome de Fátima Campos Ferreira (que, agora reparo, também dará aulas na Lusófona…) e etc., como me chatearia, note-se, pagar pelo Slavoj Žižek.
Mas, também para que conste, enquanto pagar ao Estado um serviço da treta me chateia, pagar directamente para os bolsos dos privados não me chateia apenas: transforma-me numa espécie de Dexter de saias.
O mais demagógico de tudo, porém, é quererem-nos convencer que, agora sim, é que vamos ter um serviço público… de qualidade.
Façam-me o favor de ir foder longe, e pardon my french.

O futuro da televisão

Portanto, pelo que percebo, a ideia é passar a haver menos um canal de televisão em sinal aberto, é isso?

Há uns tempo, quando foi implementada a "tevesião digital terrestre" eu pensei "só vale a pena fazer as pessoas terem que gastar dinheiro numa caixa, e por uma carrada de gente sem televisão se viesse algum beneficio daí, como mais canais disponiveis" (e creio que realmente a TDT tornaria tecnicamente possivel haver mais canais - se houvesse público, claro). Mas afinal o caminho (se estou a perceber a bem a ideia do não-ministro com pasta) é exactamente ao contrário - menos canais.

22/08/12

George Steiner: A Poesia do Pensamento

Na linha de saída — revisão, retoques finais e últimos sobressaltos, impaciência ainda e nostalgia já — da minha tarefa impossível, apraz-me anunciar a esperança de ver a Relógio d'Água dentro em breve dar à estampa a minha tradução de The Poetry of Thought de George Steiner. E, já agora, também a esperança de, uma vez mais, poder ler a nossa camarada Ana on Steiner, navegando, de concerto com ele, no pensamento da poesia, a poesia do pensamento.

Aqui fica um excerto do início da coda:

O ponto que tentei elucidar é simples: a literatura e a filosofia, como as conhecemos, são produtos da linguagem. É esse, inalteravelmente, o seu solo comum, ontológico e substantivo. O pensamento na poesia, a poética do pensamento, são obras da gramática, da linguagem em movimento. Os seus meios, as imposições que os constrangem, são os do estilo. O indizível, no sentido imediato da palavra, circunscreve-os a ambos. A poesia visa reinventar a linguagem, fazê-la de novo. A filosofia esforça-se por tornar a linguagem rigorosamente transparente, purgá-la de ambiguidade e de confusão. Por vezes, esforça-se por superar as limitações lexicais e sintácticas e o conjunto das atrofias herdadas, recorrendo à lógica formal e aos algoritmos metamatemáticos, como no caso de Frege. Mas a matriz total continua a ser o discurso humano. Este aspecto tem uma ilustração soberba no Zibaldone de Leopardi. A seu ver, não havia poesia válida sem filosofia; nem, sem poesia, filosofia que valesse a pena aprender. O acesso generativo a uma e outra é uma filologia apaixonada. Leopardi examina, com uma erudição muitas vezes microscópica, as unidades lexicais, as ordens gramaticais e as aplicações pragmáticas. Deus — ou, por outras palavras, o milagre do sentido comunicável — reside no detalhe linguístico. Como vemos no cabalista que deriva da simples letra os próprios impulso e magia da criação. As letras estão escritas no fogo primordial. Da incandescência deste, vêm toda a filosofia, toda a poesia — e os paradoxos do seu uníssono autónomo.

21/08/12

Mais uma estalinada de Francisco Louçã


Já dei a entender — mas explicito-o agora — que considero as tomadas de posição de Daniel Oliveira acerca da liderança do BE tão confrangedoramente conformistas, e alinhadas pela lógica classista e hierárquica da divisão estrutural e permanente entre representantes e representados, como a tese "bicéfala" defendida por Francisco Louçã sobre a mesma questão.

Mas tal não me impede de dar razão a DO quando denuncia os métodos de intriga política do actual coordenador do BE. Esta nova estalinada de FL e a quase naturalidade com que é aceite, ignorada ou menorizada como questão política nas hostes bloquistas são indícios de uma degenerescência profunda ou, talvez e pior, a confirmação da incapacidade de democratização (interna e, logo, por maioria de razão, "externa") que, desde o início, ameaçou prevalecer no BE.

O BE na sua cortina de fumo — densa mas pouco idea(c)tiva

"Assim me inspire o Fado e Satanas me deixe (…) fumando, perseguir a nebulosa ideia", se tanta e tanta discussão em curso no BE sobre as vantagens, desvantagens, qualidades e defeitos da "direcção bicéfala" versus a monárquica, mas independente dos votos da comunicação social, não tem por efeito recalcar — ou mesmo "forcluir" — por meio de uma cortina de fumo, densa mas pouco idea(c)tiva, o debate que seria politicamente imperativo travar sobre o modo de organização de um movimento político que tem por objectivo final ou fim primeiro a democracia de uma sociedade de iguais, ou também sobre o modo como esse objectivo final ou fim primeiro deve informar desde o início os meios e as formas de organização que o visam — sendo que só, através da sua actualização permanente, o poderão visar com  um mínimo de verdade e eficácia.

20/08/12

Scott McKenzie (1939-2012)

Cristo Rei

O Cristo Rei — a concepção da realeza de Cristo e de Cristo como rei, da divindade como poder soberano do alto comando e do comando do alto — não glorifica Deus, senão na medida em que consagra primeiro a ordem "monárquica", a legitimidade de chefes e legítimos superiores. Do mesmo modo, o propósito da condenação à evolução na continuidade do gulag de uma banda de garinas russas, é a criminalização do desrespeito que a blasfémia acarreta pela legitimidade das relações de poder vigentes e pelos seus representantes e aparelhos institucionais. A criminalização da blasfémia é a sacralização ou divinização da hierarquia e da sua necessidade. É por isso, sem dúvida, que também as oligarquias ocidentais tentam reinstaurar o dever infame do respeito pelas "ideias dos outros" e pelo bom nome dos deuses contra a impiedade do livre-exame e da liberdade da sua expressão.

Sobre o massacre dos grevistas sul-africanos, uma "grande educadora" e a concepção leninista do partido e suas correias de transmissão


Aqui fica, só para chamar a atenção para dois importantes comentários — do Libertário e do João Valente Aguiar — ao post do Miguel Madeira sobre os acontecimentos na África do Sul, uma lança que fui tentar quebrar em defesa de posições solidárias das deles à caixa de comentários de um post da grande educadora Raquel Varela no 5dias , mas que a ilustre discípula do algoz de Cronstadt e ao tempo defensor da tese da prioridade do partido dos trabalhadores sobre os mesmos, não sei se por esquecimento, se por razões pedagógicas, ainda não publicou.



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Claro que isto está longe de ser tudo — mas talvez chegue, só para começar…

19/08/12

Ex-marine "9/11 truther" preso por post no Facebook?

Business Insider:
A former U.S. Marine who accused the government of lying about 9/11 and spoke of "The Revolution" on Facebook was detained on Friday night, reports Renee Nal of Gather.

According to Brandon Raub's mother, authorities from the FBI, Secret Service and Chesterfield County PD came to their door, questioned Raub about his Facebook posts – which are critical of the official story regarding 9/11 and refer to "starting a revolution" – then handcuffed him and placed him in a Chesterfield PD squad car before taking him directly to John Randolph Psychiatric Hospital in Hopewell, Va.

Raub's mother said he returned about a year ago after serving in Afghanistan (after serving in Iraq) and did not suffer from PTSD.

The Chesterfield PD told us that the situation "was an FBI matter and we were just there to assist them" so it could not provide us with an official reason why Raub was detained.

Raub's mother said that an FBI agent told her Raub was "arrested by the Chesterfield police department" because he "assaulted an officer and resisted arrest," then asked her if Raub "was having any issues relating to people" and told her that "the threats he was making were terrorist in nature."

When asked the Chesterfield PD said Raub has not been charged with resisting arrest and assaulting an officer.

The FBI and Secret Service will not be available for comment until Monday morning.

Here is the video of the arrest:


E, já agora, o perfil dele no Facebook (com os posts que terão levado à sua detenção).

[Diga-se que eu acho que as teorias que dizem que o 9/11 foi um inside job não fazem grande sentido - sobre isso deixo-vos este artigo de 2006 do falecido Alexander Cockburn]

Leituras complementares:

15/08/12

Os nossos buracos negros


Um buraco negro é uma estrela que se torna tão pesada que implode, passando a sua tremenda gravidade a impedir até a saída de luz. Assim, não pode ser observado directamente, tornando-se notório apenas pelo efeito das suas acções na vizinhança. Cada objecto que traga some-se num breve fogo-de-artifício. Para nunca mais ser visto. 
Também há pessoas assim. Gente em cuja órbita os fenómenos abundam: coisas desaparecem; portentos medram às escondidas; processos mergulham na escuridão; nem um raio de sol ilumina os seus subterrâneos. 
Sócrates, por exemplo, cresceu no lado negro. Desde a juventude, é acompanhado por uma densa sombra: obras esquisitas, projectos apócrifos, licenciatura inexplicada. Depois, quando amealhou mais massa, o buraco negro deu no que se sabe. Ao menos agora estacionou em galáxia alheia, mais próspera e calma. 
Paulo Portas é outra destas nigérrimas maravilhas. Os eventos miraculosos perseguem-no: na sua vida empresarial, no governo. Cada vez que se investe de maior magnitude, esta estrela malsã vê-se no centro de novo festival de bizarrias celestes: casinos, sobreiros, financiamentos partidários, submarinos, fotocópias em quantidades cósmicas... e agora umas resmas de documentos. Tudo desaparece, tudo se eclipsa em murmúrios insubstanciais, fantasmas emigrados algures para lá do universo conhecido. 
No nosso espaço próximo, estas anomalias cosmológicas não param de se multiplicar. Como o prova esse astro menor mas prometedor, de nome Relvas, eclodido na nebulosa de S. Bento... 


 Publicado também aqui.

O crime da Serra do Caldeirão


O Filipe Nunes estava a trabalhar na serra algarvia quando aconteceu o último incêndio. A serra e as gentes da serra, ele conhece-as bem. Este artigo foi publicado (10 de Agosto) no espaço de opinião do Diário do Alentejo, para o qual o Filipe Nunes escreve, de vez em quando, umas crónicas livres. Tão livres como o Gonçalves Correia, o amigo do passado que dá o nome ao grupo que publica o Alambique. Uma bela e inteligente (o que vem dar ao mesmo) revista Anarquista, «a partir do Baixo Alentejo», como diz o pessoal [Apartado 95; 7780 Castro Verde, http://revistaalambique.wordpress.com/], que aproveitamos para dar a conhecer. Novidades destas são raras e animadoras no país que vai ardendo enquanto o Zé povinho paga os juros da dívida.
 A Arder
No Baixo Alentejo fumegavam no ar, no final do mês passado, os incêndios vindos dos cerros algarvios do Caldeirão. A serra ardia e a gente da serra, que não é nem do Algarve, nem do Alentejo, mas da Serra, sentia que se lhes queimava a alma. Nos dias que foram passando, as chamas aumentavam na mesma medida criminosa que aumentava a descoordenação ao combate. Votados ao esquecimento do litoral turístico, as populações da serra colhiam a prova final de que a desertificação humana que os rodeia no dia a dia, fruto das mudanças de rumo na vida social e da subsistência económica que décadas antes as levaram a descer às praias betuminosas do desenvolvimento e do consumo fácil, resultava agora numa desertificação de terra queimada. Condenando uma paisagem, tida como desprovida de gente e de outros seres vivos, cuja milenar dinâmica e interação entre o homem e natureza não encaixa na lógica urgente do lucro imediato e na reapropriação desse imenso território pelas fileiras depredadoras da economia, como seja a reincidente indústria do eucalipto.
Da gente da serra, pois não é por ser montanheira que anda de olhos tapados, aflorava de imediato nas conversas nubladas pelo fogo e pela mágoa, as coincidências de arderem hectares e hectares de terras compradas pouco tempo antes pela Portucel, ou como a oportuna faísca que ardera a serra poderia iluminar o futuro da indústria da celulose perante a acalorada proposta do Governo que pretende que a área ardida deixe de ter que ser reflorestada com árvores da mesma espécie, podendo ser replantada com eucaliptos. Esse decreto-lei permitirá a arborização de pequenas parcelas até 5 hectares e a rearborização de parcelas até 10 hectares, «com qualquer espécie vegetal» mediante uma simples comunicação prévia ao Instituto da Conservação da Natureza e Floresta, cuja falta de resposta em 30 dias implica o seu deferimento tácito. Neste cenário e em terra queimada, entre a falta de forças em recomeçar tudo de novo, sentida naturalmente na maioria destas pessoas nos seus finais de vida, e na ausência dos filhos e herdeiros, a indústria do eucalipto poderá dar por fim o ultimo golpe onde vier a assentar.
Com este novo passo legislativo, em nome dessa retoma agrícola e florestal assente no princípio que condenou a paisagem do sul português – e de ruralidade no seu todo – que é a de servir o proprietário absentista e as monoproduções industrializadas, cairá por terra a herança e em boa parte a lição dessa gente da serra. Cairá por terra a evidente riqueza da cortiça – pé de meia dessas pessoas e da economia nacional – como dos recursos silvestres característicos do Baixo Alentejo e Serra Algarvia (alfarroba, cogumelos, ervas silvestres, medronho e plantas aromáticas e medicinais), anunciados em programas de desenvolvimento local e regional e que continuaremos a ouvir falar como promessas ou puxando o lustre a um jogo de forças económicas viciadas à partida. Da mesma forma perderá terreno o contraponto da oferta ao que chegam de fora em busca de um território natural e humano único, vivido nas diferentes escalas que oscilam entre o barranco de uma ribeira e a contemplação dos seus cerros enrugados, face à invasão massificada do turismo algarvio (como é exemplo a recente investida em Vale do Freixo, Loulé).
Antes que tudo arda, o que urge resgatar, é antes de mais a Serra e a milenar vida que a caracterizou, que como descreveu Cláudio Torres, se enredou em “todo um emaranhado de pequenas comunidades que escapam à dependência directa desses senhores e que conseguem refugiar-se num velho sistema autonómico de sobrevivência”.
 Filipe Nunes, Agosto 2012

11/08/12

Quarta e última parte dos "Dilemas da Liberdade" de João Bernardo no "Passa Palavra"

Nesta quarta parte do seu ensaio, que aqui tenho vindo a seguir, João Bernardo revisita, no Passa Palavra, os "dilemas da liberdade" como Marat os viveu e se esforçou por superar durante a Revolução Francesa. Trata-se de uma leitura a que conferem uma actualidade peculiar as "encruzilhadas do labirinto" (Castoriadis) com que hoje teremos de nos cometer, para além do "já sabido" decretado pelas conclusões dos "homens sábios" evocados por um poema de Sophia, se quisermos seguir, inventando por conta e risco próprios,  esta  fulgurante reactivação histórico-política de Marat por João Bernardo, bem como a aventura desses outros que a narradora das Navegações nomeia como os que "navegavam sem o mapa que faziam".

10/08/12

Impossibilidade epistemológica do socialismo?

Samuel de Paiva Pires argumento que o socialismo é impossível epistologicamente:
Uma economia socialista, ao acabar com o sistema de preços, impossibilita o processo que permite tornar explícito o conhecimento prático disperso, visto que os preços incorporam um conhecimento holístico, sistémico, “desconhecido e incognoscível por qualquer um dos elementos do sistema do mercado, mas dado a todos estes através da operação do próprio mercado”. Não existe qualquer outra forma de organização da economia que consiga rivalizar com o mercado enquanto gerador de conhecimento, já que é o único mecanismo que consegue utilizar eficazmente o conhecimento prático disperso tornando-o holístico – e é este conhecimento que é destruído quando se tenta planear ou corrigir os processos de funcionamento do mercado.
A respeito da parte do "acabar com o sistema de preços", creio que apenas duas ou três facções socialistas pretendem acabar com os preços (e substitui-los por um sistema de "racionamento igualitário para o que for escasso e «tira o que quiseres» para o que não for") - à primeira, só me ocorre os anarco-comunistas (atenção - não confundir com os anarco-colectivistas e os anarco-mutualistas) e e a facção do Socialist Party of Great Britain / Movimento Socialista Mundial; quase todas as outras, mesmo que não lhes chamem "preços" ou "dinheiro", acabam na prática por preconizar (pelo menos a curto/médio prazo) um sistema com preços e dinheiro. Imagino que o argumento do SPP seja a que ter preços sem um mercado para os estabelecer continua  a ser, de certa forma, não ter um verdadeiro "sistema de preços" (note-se que há tendências socialistas que pretendem combinar a colectivização dos meios de produção com a manutenção do mercado, mas admito que entrar por aí seria muito um exercício de "splitting hairs").

Mas em contraponto, vou agora postar um texto do comunista de conselhos Helmut Wagner (ou, mais exactamente, um excerto de um texto - trata-se de passagens do O Anarquismo e a Revolução Espanhola, um texto de 1937 dedicado a criticar a politica dos anarquistas espanhóis a partir do ponto de vista conselhista; no entanto, as passagens que vou postar mal referem esse assunto):
Suponhamos que os operários das principais zonas industriais, por exemplo, da Europa, tomam o poder e esmagam, assim, praticamente, o poder militar da burguesia. A ameaça exterior mais grave para a revolução estaria assim afastada. Mas como deveriam os operários, enquanto proprietários colectivos das oficinas, recolocar a produção em marcha a fim de satisfazerem as necessidades da sociedade? Para isso, há necessidade de matérias-primas; mas donde vem elas? Uma vez o produto fabricado, para onde deve ser enviado? E quem tem dele necessidade?

Não se poderia resolver nenhum desses problemas se cada fábrica funcionasse isoladamente. As matérias-primas destinadas às fábricas vêm de todas as partes do Mundo inteiro. Como irão os operários saber onde procurar as matérias-primas? Como encontrarão os consumidores para os seus produtos? Os produtos não podem ser fabricados ao acaso. Os operários não podem entregar produtos e matérias-primas sem saberem se ambos serão utilizados de modo apropriado. Para que a vida económica não pare imediatamente, é preciso utilizar um método para organizar a circulação das mercadorias.

É aí que reside a dificuldade. No capitalismo, esta tarefa é executada pelo mercado livre e através do dinheiro. No mercado, os capitalistas, enquanto que proprietários dos produtos, enfrentam-se; é aí que são determinadas as necessidades da sociedade: o dinheiro é a medida dessas necessidades. Os preços exprimem o valor aproximado dos produtos. No comunismo, essas formas económicas, que deveriam e estão ligadas à propriedade privada, desaparecerão. A questão que se coloca é pois: como se deve fixar, determinar sob o comunismo as necessidades da sociedade? (...)

É agora claro, que as necessidades reais das massas não podem ser determinadas por alguma espécie de aparelho burocrático, mas pelos próprios operários. A primeira pergunta que esta constatação levanta é, não a de saber se os operários são capazes de realizar esta tarefa, mas quem dispõe dos produtos da sociedade. Se se permite a um aparelho burocrático determinar as necessidades das massas, criar-se-á um novo instrumento de dominação da classe operária. Eis porque é essencial que os operários se unam em cooperativas de consumidores e criem assim o organismo que exprimirá as suas necessidades. O mesmo princípio vale para as fábricas; os operários, unidos nas organizações de fábrica, estabelecem a quantidade de matérias-primas de que têm necessidade para os produtos que devem fabricar. Não existe pois senão um meio, no comunismo, para estabelecer as necessidades das massas: a organização dos produtores e dos consumidores em conselhos de fábrica e conselhos de consumidores.

Contudo, não basta aos operários saber de que têm necessidade para a sua subsistência, nem às oficinas de conhecer a quantidade necessária de matérias-primas. As fábricas trocam os seus produtos; estes devem passar por diferentes fases, por várias fábricas, antes de entrarem na esfera do consumo. Para tornar possível esse processo, é necessário, não somente estabelecer quantidades, como também geri-las. Assim chegamos à segunda parte do mecanismo que deve substituir o mercado livre; quer dizer, a "contabilidade" social geral. Esta contabilidade deve incluir a situação de cada fábrica e conselho de consumidores, para dar um quadro claro que permita ter um conhecimento completo das necessidades e possibilidades da sociedade.

Se se não pode reunir e centralizar esses dados, então toda a produção será mergulhada no caos quando for abolida a propriedade privada e, como ela, o mercado livre. Apenas a organização da produção e da distribuição pelos conselhos de produtores e consumidores, e o estabelecimento de uma contabilidade centralizada permitirão abolir o mercado livre. (...)

O comunismo regula a produção segundo as necessidades das grandes massas. O problema do consumo individual e da repartição das matérias-primas e dos produtos semi-acabados entre as diversas empresas não pode ser resolvido graças ao dinheiro, como no sistema capitalista. O dinheiro é a expressão de certas relações de propriedade privada. O dinheiro assegura ao seu possuidor uma certa parte do produto social. Isto é tão válido para os indivíduos como para as empresas. Não existe propriedade privada dos meios de produção no comunismo; contudo cada indivíduo terá direito a uma certa parte da riqueza social para seu consumo, e cada fábrica deverá poder dispor das matérias primas e meios de produção necessários. Como deve isso ser feito? (...) Nós vemos aí um problema muito importante para a revolução proletária. Se os operários simplesmente se fiassem num "serviço estatístico" para determinarem a sua parte, criariam assim um poder que já não poderiam controlar.

Abordamos aqui a seguinte questão: como será possível unir ou acordar esses dois princípios que parecem à primeira vista contraditórios, a saber: todo o poder aos operários, o que implica um federalismo (concentrado) e a planificação da economia, que conduz a uma extrema centralização? Apenas poderemos resolver esse paradoxo se considerarmos os fundamentos reais da produção social na sua totalidade. Os trabalhadores apenas dão à sociedade a sua força de trabalho. Numa sociedade sem exploração, como a comunista, o único padrão para determinar o consumo individual será a força de trabalho fornecida por cada um à sociedade.

No processo de produção, as matérias primas estão convertidas em bens de consumo pela força de trabalho que se lhe acrescenta.

Um serviço estatístico seria completamente incapaz de determinar a quantidade de trabalho incorporada num dado produto. O produto passou por múltiplos estádios, isto é, um número imenso de máquinas, ferramentas, matérias-primas, e produtos semi-acabados serviram para sua fabricação. Se é possível a um serviço estatístico central reunir todos os dados necessários num quadro claro, compreendendo todos os níveis do processo de produção, as empresas ou as fábricas estão melhor colocadas para determinar a quantidade de trabalho cristalizado nos produtos acabados, calculando os tempos de trabalho incluídos nas matérias primas e o necessário à produção de novos produtos. A partir do momento em que todas as empresas estão ligadas entre si no processo produtivo, é fácil a uma delas determinar a quantidade total de tempo de trabalho necessário para um produto acabado, baseando-se nos dados disponíveis. Melhor ainda, é mais fácil calcular o tempo de trabalho social médio dividindo a quantidade de tempo de trabalho empregue pela quantidade de produtos. Esta média representa o factor final determinante para o consumidor. Para ter direito a um objecto de uso corrente, ele deverá simplesmente provar que deu à sociedade, sob uma forma diferente, a quantidade de tempo de trabalho cristalizado no objecto que deseja. Assim se encontra suprimida a exploração. Cada um recebe o que deu, cada um dá o que recebeu: isto é a mesma quantidade de tempo de trabalho social médio. Na sociedade comunista não há lugar para um serviço central de estatística, tendo o poder de estabelecer "a parte" atribuível às diferentes categorias de assalariados.

O consumo de cada trabalhador não é determinado "de cima"; cada um determina, pelo seu trabalho, quanto pode pedir à sociedade. Não há outra escolha na sociedade comunista, pelo menos durante o primeiro estádio. Os serviços estatísticos apenas podem servir para fins administrativos. Esses serviços podem, por exemplo, calcular os valores sociais médios de acordo com os dados obtidos nas fábricas; mas eles são empresas como as outras. Não detêm privilégios. É absurdo imaginar que uma sociedade comunista poderia tolerar um serviço central dotado de poder executivo; com efeito, em tais condições, apenas pode existir a exploração, opressão e capitalismo.
E onde é que eu quer chegar com esta citação? É que já temos aqui um exemplo de um sistema não-capitalista e não-mercantil que me parece mais ou menos capaz de unificar o "conhecimento prático disperso" - p.ex., quando as comissões de trabalhadores da pesca estimam o custo médio de produção de 1 kg de sardinhas (usando o seu conhecimento técnico sobre a sua indústria e mais a informação fornecida pelas comissões de trabalhadores dos estaleiros, dos combustíveis, etc., sobre o custo dos consumos intermédios) estão também a pegar em conhecimentos tácitos descentralizados e a traduzi-los num valor conhecível por toda a sociedade. E note-se que o sistema proposto aqui por Helmut Wagner é, com mais ou menos cambiantes, mais ou menos idêntico aos sistemas propostos por quase todos os críticos "pela esquerda" do comunismo soviético (todos eles andam à volta da "substituição do aparelho burocrático do Estado pela planificação democrática da economia pelos Conselhos Operários", mais coisa, menos coisa).

[Uma nota final - há uns anos, no contexto de uma discussão nos comentários d'O Insurgente, o BrainstormZ perguntou-me « como conseguem os “Conselhos Operários” fazer o cálculo económico dada a “propriedade estatal dos meios de produção”»; eu há muito que penso em fazer uma série de posts sobre o assunto - com a ressalva que as minhas simpatias, actualmente, vão mais para o lado dos anarquistas do que para o dos comunistas de conselhos, trotskystas e similares, logo seria em parte desenvolver argumentos que não são exactamente os meus; eu duvido que alguma vez ganhe energia para escrever essa série de posts, mas se alguma vez essa série vir a luz do dia, será uma espécie de versão revista e aumentada deste]

08/08/12

João Valente Aguiar no Passa Palavra: contra os mitos da "esquerda realista"

Aqui fica o link para um breve ensaio do João Valente Aguiar no Passa Palavra: "O especulador e o industrial. A esquerda do lado do mito contra a realidade". Esperemos que dê que falar como merece, e que faça pensar também aqueles que esquecem que a "financierização" da economia governante resulta, não de uma perversão do capitalismo, mas da sua dinâmica peculiar quando as relações de poder, no terreno da luta social e política, lhe são favoráveis. Pelo que a luta contra a financierização em causa tem como condição de avanço, não a consolidação das posições dos "capitalistas industriais" contra a influência dos "especuladores", mas o enfraquecimento da organização capitalista através de uma democratização das relações de poder que a reproduzem.

04/08/12

Um luminoso convite à reflexão sobre a juventude histórica de Marat…

… compõe o terceiro e penúltimo capítulo do denso e breve ensaio de João Bernardo, no Passa Palavra sobre os Dilemas da Liberdade com que a Revolução Francesa continua a confrontar-nos. Aqui fica, reiterando o link, um excerto comprovativo:

Em todas as páginas de Les Chaînes de l’esclavage o povo é soberano, mas Marat entendeu a soberania como uso da soberania. Contrariamente aos teóricos seguidores da tradição de Montesquieu, que viam a garantia da liberdade no equilíbrio recíproco que os representantes estabelecem entre eles, Marat radicou a liberdade no exercício do controlo. Da falta de controlo deriva a ascensão lenta do despotismo. É este o tema principal da obra, como foi o tema principal da vida — e da morte — de Marat. O essencial de Les Chaînes… é a descrição das formas lentas e subtis, imperceptíveis, como os representantes se emancipam do controlo popular e fundam a sua tirania; da forma como as instituições evoluem e dão origem ao seu contrário. O processo de evolução do Estado é, pois, o processo da diminuição ou da extinção do controlo. Por isso Marat pôde conceber a opressão como interna e não externa. Nesta perspectiva ele é um anti-Maquiavel, porque em O Príncipe o despotismo é imposto de fora ao povo, enquanto para Marat é o povo quem, pelo seu descuido, gera o Príncipe. São os cidadãos, eles próprios, a produzir os instrumentos da sua opressão. Parece que nesta obra Marat estava a responder às interrogações sobre O Príncipe que Spinoza formulara no § 7 do quinto capítulo do seu Tractatus Politicus.

Liberais-fascistas?

Talvez Vilfredo Pareto e Joseph Schumpeter contem.

02/08/12

OBRIGATÓRIO!

01/08/12

Ataque ao Irão?

Panetta tells Israel force is option on Iran (Al Jazeera):
US Defence Secretary Leon Panetta has warned that Iran must either negotiate acceptable limits on its nuclear programme or face the possibility of US military action to stop it from getting the bomb.

Panetta made his remarks Wednesday outside a city in southern Israel, with an "Iron Dome" anti-rocket defence system as a backdrop.

Panetta said repeatedly that "all options", including military force, are on the table to stop Iran, should sanctions and diplomacy, the preferred means of persuasion, ultimately fail.
Israeli Defence Minister Ehud Barak, standing beside Panetta, said he sees an "extremely low" probability that sanctions will ever compel Iran to give up its nuclear activities.

Gore Vidal (1925-2012)


Gore Vidal's United States of fury , em The Independent (2009)

In Russian, the phrase "gore vidal" means "he has seen grief". As Gore Vidal is wheeled towards me across an empty London hotel lobby, it seems for the first time like an apt translation. In the eight years since I saw him last, he has lost his partner of 50 years, most of his friends, most of his enemies, and the use of his legs. The man I met then – bristling with his own brilliance, scattering witticisms around like confetti – has withered. His skin is like parchment, but the famous cheekbones are still sharp beneath the crags. "It is so cold in here," he says, by way of introduction. "So fucking cold."

Gore Vidal is not only grieving for his own dead circle and his fading life, but for his country. At 83, he has lived through one third of the lifespan of the United States. If anyone incarnates the American century that has ended, it is him. He was America's greatest essayist, one of its best-selling novelists and the wit at every party. He holidayed with the Kennedys, cruised for men with Tennessee Williams, was urged to run for Congress by Eleanor Roosevelt, co-wrote some of the most iconic Hollywood films, damned US foreign policy from within, sued Truman Capote, got fellated by Jack Kerouac, watched his cousin Al Gore get elected President and still lose the White House, and – finally, bizarrely – befriended and championed the Oklahoma bomber, Timothy McVeigh.