31/10/10

Pedofilia com sacristia e água benta

Na manifestação realizada hoje em Roma contra a pedofilia que emporcalha a Igreja Católica, as mensagens foram claras e certeiras: “Tirem as mãos de cima das crianças”, “Uma Igreja sem abusos” e “O Papa protege os pedófilos”. Ler notícia aqui.

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Precariedade: modos de usar


Fala-se agora, com uma frequência que chega a ser suspeita, da questão da precariedade, espécie de flagelo social que se abateu sobre a sociedade, qual praga do Egipto, para a fazer expiar os seus inconfessáveis pecados. Não há economista liberal que não aponte o dedo à “excessiva rigidez” da legislação laboral enquanto refere, com uma lágrima no canto do olho, o infortúnio de uma nova geração de trabalhadores desprovidos de qualquer direito ou protecção legal. Narrativa que se converte frequentemente em trabalhos de imprensa com títulos imaginativos como “A geração dos 600 euros” ou “Jovens a prazo”, nos quais jornalistas surpreendem os seus leitores, informando-os da existência de “trabalhadores independentes” que ocupam há 10 anos o mesmo posto de trabalho.
A precariedade fica assim confortavelmente arrumada: como uma desgraça cujas vítimas são objecto de compaixão; como um problema social a resolver reduzindo direitos laborais que eram inquestionáveis algumas décadas atrás. Embrulhe-se tudo isto em nebulosas alusões ao espírito do tempo, à globalização e à competitividade, para se obter uma operação de engenharia social disfarçada de imperativo categórico, recomendada pelos melhores manuais de gestão. Será possível ouvir, a algumas das pessoas que trabalham neste sentido, afirmações que demonstram o seu profundo conhecimento histórico. Repetirão, tantas vezes quanto for necessário, que a contratação colectiva, a proibição dos despedimentos sem justa causa ou as férias pagas são coisas do passado, antiguidades ou meras recordações de um tempo longínquo. O século XXI, garantem-nos, será algo completamente diferente e extremamente moderno. Os mais atentos não deixarão de encontrar, em tão radiante projecção, um regresso às relações laborais do século XIX, mas agora com banda larga, televisão digital e comunicações móveis à mistura. 

Hernández, 100 e muito mais

Provavelmente, nunca os faria. Mas se a biologia o protegesse com muitas doses de cumplicidade, Miguel Hernández teria feito ontem 100 anos de idade. Não seria nada de especial para um poeta tão grande, daqueles que, sem favor, merecem a imortalidade. No entanto, o franquismo, essa moléstia que gostava mais de morte que de cultura, não só não permitiu que Miguel Hernández tivesse obra e vida longas, como se encarregou de o encarcerar e levá-lo ao encontro da morte aos 32 anos de idade. Miguel Hernández viveu, espalhou poesia, combateu e morreu como um valente. Tanto que conhecia bem os cobardes. Como demonstrou e assim:

LOS COBARDES

Hombres veo que de hombres
sólo tienen, sólo gastan
el parecer y el cigarro,
el pantalón y la barba.

En el corazón son liebres,
gallinas en las entrañas,
galgos de rápido vientre,
que en épocas de paz ladran
y en épocas de cañones
desaparecen del mapa.

Estos hombres, estas liebres,
comisarios de la alarma,
cuando escuchan a cien leguas
el estruendo de las balas,
con singular heroísmo
a la carrera se lanzan,
se les alborota el ano,
el pelo se les espanta.
Valientemente se esconden,
gallardamente se escapan
del campo de los peligros
estas fugitivas cacas,
que me duelen hace tiempo
en los cojones del alma.

¿Dónde iréis que no vayáis
a la muerte, liebres pálidas,
podencos de poca fe
y de demasiadas patas?
¿No os averguenza mirar
en tanto lugar de España
a tanta mujer serena
bajo tantas amenazas?
Un tiro por cada diente
vuestra existencia reclama,
cobardes de piel cobarde
y de corazón de caña.
Tembláis como poseídos
de todo un siglo de escarcha
y vais del sol a la sombra
llenos de desconfianza.
Halláis los sótanos poco
defendidos por las casas.
Vuestro miedo exige al mundo
batallones de murallas,
barreras de plomo a orillas
de precipicios y zanjas
para vuestra pobre vida,
mezquina de sangre y ansias.
No os basta estar defendidos
por lluvias de sangre hidalga,
que no cesa de caer,
generosamente cálida,
un día tras otro día
a la gleba castellana.
No sentís el llamamiento
de las vidas derramadas.
Para salvar vuestra piel
las madrigueras no os bastan,
no os bastan los agujeros,
ni los retretes, ni nada.
Huis y huis, dando al pueblo,
mientras bebéis la distancia,
motivos para mataros
por las corridas espaldas.

Solos se quedan los hombres
al calor de las batallas,
y vosotros, lejos de ellas,
queréis ocultar la infamia,
pero el color de cobardes
no se os irá de la cara.

Ocupad los tristes puestos
de la triste telaraña.
Sustituid a la escoba,
y barred con vuestras nalgas
la mierda que vais dejando
donde colocáis la planta.

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Hipócritas de sotaina, basta de tanta cumplicidade!





Nunca me atraiu ir a Roma para ver o Papa. Mas, hoje, gostaria de marchar, em solidariedade, até à Praça de São Pedro.

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30/10/10

El Diego

Acordo – 500 = Vigarice



Afinal, Cavaco convocou o Conselho de Estado para este pressionar a concretização de um embuste, o de um “acordo orçamental” com 500 milhões que ficam de fora, a pagar (pelos contribuintes) “à parte”, não se sabendo como nem quando. Olha se em Belém não morasse um notável professor de finanças.

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Hoje, às 11h00, dizem que no parlamento


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29/10/10

Mensagem

Enviada pela CGTP-IN às CC.OO:

“Estimados companheiros,
Foi com profunda emoção que tomámos conhecimento do falecimento do companheiro Marcelino Camacho.
Neste momento de tristeza, recordamos o seu papel inesquecível na luta contra a ditadura franquista, o seu contributo determinante para a constituição das CC.OO. e a sua sábia liderança da vossa confederação, o seu elevado nível intelectual que pôs ao serviço dos trabalhadores e do povo espanhol.
Mas não foram só os trabalhadores espanhóis que perderam um líder esclarecido. Todo o sindicalismo internacional está de luto.
Pedimos-vos que transmitam à família de Marcelino Camacho os nossos mais profundos sentimentos de pesar.
Recebam, uma vez mais, as nossas sinceras condolências.”


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Para o infinito e mais além!

Homemade Spacecraft from Luke Geissbuhler on Vimeo.

Trambolhão

Rui Namorado alerta (sobretudo “os seus”):

(…) o PS perde eleitorado para a direita e para a esquerda, mas o que perde para a direita é suficiente para esta chegar à maioria; o que perde para a oposição de esquerda não é suficiente para que esta se aproxime sequer da possibilidade de se constituir, por si só, como alternativa de Governo.
(…) seria pura cegueira política desconsiderar a sondagem ontem saída. Ela sublinha o risco de uma futura hecatombe eleitoral para o PS, de uma cisão entre o PS e uma parte do seu eleitorado que pode ser duradoura.
O contexto sócio-económico nacional e internacional, a anemia política dos partidos europeus da Internacional Socialista, a sofreguidão com que os poderes fácticos dominantes e a direita política europeia sugam a riqueza produzida pelos povos que dominam, tornam a luta política cada vez mais árdua. E fazem-no em tal grau que vai ficando claro que, sem mudanças estratégicas radicais, sem um sobressalto de unidade e de inteligência colectiva do povo de esquerda e dos partidos que nele têm raízes, corremos o risco de uma prolongada agonia política sob a égide institucional dos autómatos neoliberais que os poderes financeiros internacionais irão teleguiar com bonomia e cinismo.


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Realmente, as nossas exportações andam abaixo de cão

De repente, comei a perceber melhor algumas coisas: «Armando Vara é o novo PCA da Camargo Corrêa África»; «Vara acusado de três crimes de tráfico de influência».
E, já agora, como é que andam os acordos de extradição com Angola?

Esta malta já anda a preparar os tapetes vermelhos para receber o FMI

Então agora, depois de lá ter ido parar o ex-candidato a D. Sebastião laranja, António Borges, o êxtase é total. Que o senhor tenha feito grande parte da sua carreira recente a soldo de entidades grandemente responsáveis pela actual crise internacional – dos hedge funds à Goldman Sachs – é coisa de somenos. Giro, giro é termos lá um dos nossos.

Há quem não acerte nem quando teve razão

«Não podemos permitir que outros tomem conta do nosso destino», brada o bardo Alegre. «Aceitamos ou não que se esteja a subverter os tratados, nomeadamente o Tratado de Lisboa?»
Estranho parece-me que e candidato atribua as presentes tribulações europeias à subversão de um tratado que, quando foi ratificado em Portugal, já lhe parecia fadado a diminuir a nossa soberania e o nosso peso na Europa. É no que dá não querer indispor ainda mais o chefe.

As coisas que é preciso inventar para fazer de conta que o PS é de esquerda

A direita mais acéfala está feliz: pode por fim atribuir culpas pelo estado das nossas coisas ao PCP e ao Bloco. Exulta Henrique Raposo com as palavras de André Freire:«… a direita (psd e csd) é capaz de cooperar; a esquerda (ps, be, pcp) não, nunca foi (…) o sistema eleitoral permite que os partidos pequenos cultivem nichos sem se preocuparem com a cooperação.»
Fantástico. Em vez de aceitar que é mesmo o voto popular que permite a continuada existência desses antipáticos não-colaboracionistas, coloca-se a culpa na lei que lhes dá representação parlamentar. Os tais nichos são assim fruto de uma aberração legislativa, não de valor próprio nem da vontade de uns largos milhares de eleitores.
Claro que seria tudo mais simples e limpo sem malta que não colabora a complicar tudo. E a tentativa de arrumar o PS na prateleira à esquerda é apenas cómica: eles colaboram sim, mas com os seus: o PSD e o PP.

Medidas cautelares, pois claro

Manuel António Pina volta, e bem, à carga sobre a esquadra-stripper da PSP:

A PSP considera naturalíssimo e "decorre[nte] das medidas cautelares de polícia" que duas das jovens detidas (menores, tudo o indica) tenham sido obrigadas a despir-se completamente na esquadra. Porque tudo terá tido, pelos vistos, a maior pureza de propósitos: fazer-lhes uma "revista sumária" (imagine-se o que será uma "revista completa") à procura de "armas, de fogo ou brancas" ou "produtos cujo transporte pode ser considerado crime, nomeadamente drogas".

Dir-se-ia, pois, que é rotina da PSP, de modo a pôr a nu todas as suspeitas possíveis sobre comuns cidadãos "conduzidos à esquadra", pedir-lhes o BI e mandá-los logo pôr-se em pelota. Talvez seja, mas, a crer no que se passou, será só com jovens raparigas, já que, no caso, os agentes se dispensaram de qualquer actividade por assim dizer investigatória no corpo do rapaz. Aparentemente, nem as mochilas do grupo terão sido revistadas. Só os corpos das jovens.

Há-de ter havido um bom motivo para isso. Talvez até mais do que um.

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Honra à memória de Marcelino Camacho


Deixou-nos Marcelino Camacho, resistente e prisioneiro do franquismo, dirigente do PCE pelo qual foi deputado, fundador e dirigente histórico das CC.OO. O sindicalismo espanhol acaba de perder uma das suas figuras maiores. Mas não sai da memória da luta social e pela democracia em Espanha. Até sempre, Marcelino Camacho.
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28/10/10

Ficar sem casa, ficar sem vida

Até o New York Times se escandaliza com a situação de inúmeros espanhóis, que deixaram de pagar os seus créditos imobiliários, ficando sem casa mas mantendo as dívidas – até acrescidas de enormes alcavalas legais. O partido socialista lá do sítio já manifestou a sua oposição a uma proposta de lei que iria reduzir as proporções deste drama. Lá como cá, a estabilidade dos sistemas financeiros vem antes dessa incómoda minudência que são as pessoas.

Livrai-nos das surpresas



Diogo Feio, CDS/PP, no JN:

Foi com entusiasmo que assisti à apresentação da candidatura presidencial de Cavaco Silva. (…) Numa altura em que a desilusão dos portugueses vai aumentando, é muito conveniente ter em Belém alguém que não surpreende.

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Detenções e revistas

Será que os tais advogados ligados ao BPN que foram detidos anteontem tiveram que se despir na esquadra para ver se não tinham armas nem droga?

Notícias do novo mundo

O Estado é gordo, os mercados estão nervosos e as pessoas são números.

Uma nova raça de bestas céleres?

Um livro auto-editado, de autores desconhecidos fora do mundo dos webzines, chegou a n.º1 de vendas da Amazon.

Expliquem-me (mas devagarinho, para ver se lá chego)



- A UGT entregou, juntamente com a CGTP, um pré-aviso de greve geral para protestar contra as medidas previstas no Orçamento e as suas consequências laborais.
- O secretário-geral da UGT defende a aprovação do Orçamento (já depois de assinar o pré-aviso de greve contra ele).

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Orçamento e mercados

Ricardo Araújo Pereira, hoje na “Visão”:

Ainda sou do tempo em que os orçamentos tinham por objectivo facilitar a vida dos cidadãos. Agora, trata-se de facilitar a vida a essa entidade misteriosa que se chama «os mercados». Antigamente, os eleitores votavam nos seus representantes e estes, em retribuição, definiam um orçamento que servisse as aspirações dos eleitores. Agora, há que agradar aos mercados, o que torna o trabalho dos deputados mais complexo, até porque os mercados são mais exigentes que os eleitores. E mais poderosos. Os mercados são uma espécie de bicho feroz cujo aspecto ninguém conhece ao certo. A única coisa que sabemos acerca dos mercados é que levam a mal se os portugueses não passarem a pagar mais pelo leite.

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Há quem fique no Restelo e quem avance mar afora

Já ouvimos e lemos mil vezes a litania do nosso monstruoso sistema de ensino, que persiste em empurrar Portugal para o abismo da estupidez e da falta terminal de competitividade. Por isso, sabe especialmente bem deparar com quem não tem pejo em proclamar que «As pessoas cá não têm padrões, é inacreditável. Os exames de matemática em Portugal são mais difíceis que no MIT.»
Agora, adivinhem qual destas posturas tem origem em alguém que está habituado a exportar ideias, inovações e tecnologia, sem complexos nem ataques de niilismo auto-flagelador.

Desalienação do trabalho ou abolição do trabalho?

No 5 Dias, Nuno Ramos de Almeida escreve que "[a] reivindicação de um trabalho liberto da alienação, em que o produtor é dono inteligente do seu esforço, é um objectivo político essêncial. Mas isso não se confunde com a liquidação do trabalho".

Isto que vou escrever agora é largamente a reedição de algo que pensei no século XX, quando li "As Origens do Esquerdismo" de Richard Gombim; nesse livro (ou seria noutro que tenha lido na mesma altura?) a dada altura fazia-se o contraste entre a ideologia anti-trabalho da "Internacional Situacionista" e a posição dos comunistas de conselhos tradicionais, como Pannekoek, que consideravam o trabalho como o que realizava plenamente o homem.

O que me parece é que a diferença entre os "abolidores do trabalho" e os "entusiastas do trabalho" talvez seja mais semântica que outra coisa qualquer.

Basicamente, há duas grandes visões em confronto: A - "O objectivo do ser humano é consumir, e a actividade humana é um meio para atingir esse objectivo" e B - "A actividade humana deve ser em primeiro lugar uma fonte de satisfação intrínseca, não apenas um meio de obter bens materiais"; no fundo, tanto os "abolidores do trabalho" como os "entusiastas do trabalho" seguem a visão B (enquanto a teoria económica convencional foi construída largamente à volta da visão A), sendo a diferença apenas no significada que dão à palavra "trabalho" - uns usam "trabalho" como sinónimo de "actividade produtiva", e consideram que o ideal é as pessoas sentirem prazer no seu trabalho; outros usam trabalho como sinónimo de "actividade que fazemos não por gostarmos mas por termos que fazer" e por isso consideram que o ideal é não existir "trabalho" mas sim "jogo" (ou outro nome qualquer), definido como "actividade que fazemos porque gostamos".

Mas, como disse acima, creio que é uma diferença largamente semântica.

A esquerda e o "nacionalismo económico"

No "Ladrões de Bicicletas", Nuno Teles escreve:
sabemos, pela experiência histórica e sem ilusões sobre as motivações idealistas e nacionalistas de List, que este estava certo na sua análise do desenvolvimento industrial, nomeadamente na existência de economias crescentes à escala na indústria (uma ideia recusada pela economia clássica e neo-clássica) e na necessidade de protecção para o desenvolvimento industrial.
Eu tendo a concordar que (da perspectiva de um país, não necessariamente na da humanidade no seu todo) que as politicas proteccionistas fazem sobretudo sentido quando aplicadas a sectores com economias crescentes à escala (e, já agora, acrescento que, quanto mais tecnologia-intensiva for uma economia, maior peso terão as economias de escala - o custo de desenvolver o iPad é o mesmo quer se venda 1000 ou um milhão de unidades).

Mas isso levanta uma questão, que acho que sobretudo a esquerda não pode descurar - quase por definição, os sectores da economia onde há mais economias de escala são os sectores dominados pelo "grande capital" (não é obrigatório que assim o seja - em teoria podemos ter um grande capitalista possuindo uma porção de micro-empresas, e também podemos ter uma grande empresa dividida entre uma multidão de pequenos accionistas, sem nenhum ser "accionista de referência"; mas na prática a primeira situação é quase inexistente e a segunda também não é muito vulgar).

Portanto, se uma "politica industrial" em principio será uma politica dirigida aos sectores com economias de escala, isso não implicará que essa tal "politica industrial" (se for feita no contexto de uma economia capitalista) acabe forçosamente por ser uma politica que, em primeiro lugar, beneficiará sobretudo os grandes capitalistas?

Aliás, os exemplos de países que mais activamente fizeram essas "politicas industriais", como o Japão ou a Coreia do Sul, são exactamente exemplos de economias (pelo menos até há pouco tempo) dominadas por poderosos grupos económicos em aliança com os escalões superiores do aparelho de estado. Será também grande exemplo?

[uma observação final em semi-defesa da economia clássica e neo-clássica: creio que nunca estes ramos da economia recusaram a ideia de economias de escala; é verdade que os neo-clássicos têm uma característica que os levaram na prática a "esquecerem-se" das economias de escala: a economia neo-clássica assenta na formalização matemática, e até há pouco tempo era difícil fazer cálculos e sistemas de equações com economias de escala, pelo que a tendência era evitar essa área - só com o desenvolvimento e acessibilidade dos computadores começaram a aparecer modelos neo-clássicos com economias de escala; mas na teoria desde há muito tempo que os neo-clássicos conhecem as economias de escala]

Indústria e pós-indústria

A respeito desta conversa entre o Zé Neves e o Nuno Teles, da sociedade industrial e pós-industrial e da "rotina e ritmo" que são/eram impostas ao trabalhador manual: será que os actuais trabalhadores dos serviços (como caixas de supermercado, bancários, etc.) não estarão pior? Afinal, não me parece que tenham mais espaço para pôr em prática e sua inteligência, criatividade e iniciativa que o operário tradicional, com a agravante que estão muito mais sujeitos a exigências do estilo "sorri para os clientes", "veste-te de forma apresentável", "não uses um brinco" (ou "usa um brinco", se se achar que isso corresponde à imagem que a empresa quer transmitir), ou mesmo "tens que ser elegante" (p.ex., é quase impossível uma mulher com peso algo acima da média conseguir emprego numa loja de roupas). Ou seja, nos "serviços" (ou pelo menos os serviços com contacto directo com o público - note-se que não incluí os empregados de escritório lá acima) o trabalhador está submetido ao patrão não apenas na sua qualidade profissional, mas também naquelas coisas a que agora se chama o "saber estar".

Aliás, por regra geral podemos considerar que a substituição da indústria pelos serviços como sector principal da actividade económica vem associada a uma desvalorização das "hard skills"* (saber fazer um trabalho específico) face às "soft skills"  (coisas como motivação, sociabilidade, "personalidade", etc.) como qualidade profissional fundamental; mas na prática as "soft skills" não serão uma mistura de "hábitos de classe média" e de "submissão" (a esse respeito, recomendo o artigo Good dress sense - and poor pay - are in fashion)?

Agora um ponto acerca das "rotinas" no trabalho - quando se fala do "trabalho repetitivo", por vezes não é muito claro o que se quer dizer; ou melhor, o que não é claro é o que é suposto ser o oposto de "trabalho repetitivo". É que" trabalho diversificado" pode significar pelo menos duas coisas - a) o trabalhador ter diferentes tarefas para fazer, em vez de estar sempre a fazer a mesma coisa; ou  b) o trabalhador poder fazer as suas tarefas de diferentes maneiras, em vez de ter um método de trabalho padronizado. Não são duas coisas exclusivas, mas são distintas - podemos perfeitamente ter uma situação em que o trabalhador está sujeito a exigências e solicitações diversificadas, mas cada uma das várias coisas que tem que fazer já tem uma maneira predefinida de ser feita, sem grande espaço para ele "inventar" (no fundo, é a diferença entre "acontecerem-me coisas diferentes" e "eu fazer acontecer coisas diferentes"). Bem, e o que isso tem a ver com a questão da indústria e dos serviços? É que me dá a ideia que o trabalho nos serviços talvez seja mais diversificado no sentido a), mas não me parece que muitas vezes seja particularmente diversificado no sentido b) (a mim a diversificação no trabalho que acho importante é a b), mas admito que pode ser apenas uma questão de gosto pessoa).

Outra questão que ponho, que aqui já não terá tanto a ver com a dicotomia indústria/serviços, mas mais com a dicotomia operários/empregados (um operário pode trabalhar nos serviços...), é que dá-me a ideia que muitas vezes é muito mais fácil a um "operário qualificado" (p.ex., um electricista, ou um serralheiro mecânico) do que a um "empregado qualificado" pegar nas suas qualificações profissionais para se por a trabalhar por conta própria se se zangar com o patrão (ou o patrão com ele...), enquanto as qualificações de um "empregado" são normalmente muito mais "organizacionais" e menos viradas para a produção directa de algo que possa ser directamente vendido aos clientes sem intermediários pelo meio. Ou seja, talvez os operários (ou pelo menos alguns operários) estejam menos dependentes da "organização" que os empregados.


Um último ponto, mas este é mais o que poderíamos chamar uma impressão impressionista - tenho a vaga percepção (mas não fiz nenhum estudo sobre o assunto...) que os operários são mais dados a ocupar os seus tempos livres com actividades auto-organizadas (desde ir à pesca a ir jogar às cartas para o café da esquina) enquanto os empregados tendem a ocupar o seu tempo de forma mais passiva, como ir às compras. Mas provavelmente estou a fazer uma confusão entre correlação e causa, já que não encontro nenhuma razão lógica para isto que penso ter constatado.

E onde é que eu quero chegar com esta conversa toda? É que talvez a substituição da indústria pelos serviços e dos operários por empregados "colarinho-branco" não tenha melhorado em nada o problema da "alienação" do trabalho, ou o tenha mesmo agravado.

*peço desculpa pelos anglicismos que vou usar neste post, mas algumas coisas não têm palavra portuguesa correspondente (ou se têm eu não a conheço)

27/10/10

E ainda por cima querem subsidiá-los!

Sobre a entrevista de um sacerdote católico romano posta a circular na Internet, mal fará quem não der ouvidos ao alerta do Alfredo Barroso no Traço Grosso:

(…)
Foi com discursos como este que a (extrema) direita católica e os militares reaccionários deram o golpe do 28 de Maio, em 1926, acabaram com a I República, foram buscar Salazar e implantaram o Estado Novo, que oprimiu o País durante quase meio século.
(…)
Não admira que, no ambiente tão deletério em que estamos a viver, tenha aparecido agora outro padre (nos telejornais) a celebrar a missa numa igreja cheia de devotos (fregueses) com capacetes na cabeça (tal como ele) e a proclamar que a I República «roubou» aquele templo à Igreja, faz agora 100 anos.
O padre Ventura chega mesmo a sugerir que os políticos sejam levados a tribunal. Mas ainda não vai ao ponto de propor – como ouvi um «popular» dizer, num fórum da SIC Notícias – que os militares deviam prender estes governantes e julgá-los em tribunal marcial.
Nada disto acontece por acaso. E é vergonhoso que a Igreja esteja, insidiosamente, a aproveitar-se da situação de gravíssima crise que o País atravessa, para pôr as garras de fora e atacar brutalmente a democracia.
É evidente que isto não me dispensa de criticar duramente José Sócrates e Pedro Passos Coelho - políticos de plástico que rivalizam na demagogia, na irresponsabilidade e na incompetência políticas - nem de desejar a demissão de um dos mais patéticos Ministros das Finanças que já tivemos desde o 25 de Abril: Teixeira dos Santos.
Mas julgo que os democratas devem ter o cuidado de saber distinguir entre a crítica política necessária - e contundente – ao poder do dia, e este discurso reaccionário, «neo-clericalista» e antidemocrático de um padre que é, manifestamente, oriundo da direita mais reaccionária.

Se calhar, estamos a perder a paciência com a bandidagem

Pelo menos, a fazer fé nisto.

Jugular a reivindicação de cidadania democrática, precarizar a liberdade, reforçar a oligarquia

Sobre o caso dos jovens da JCP detidos por agentes da PSP, levados para uma esquadra, injuriados e forçados a despirem-se, que já aqui referi, Fernanda Câncio — em vez de exigir a responsabilização dos agentes, de denunciar a repetição dos atropelos e sevícias que as forças de segurança têm vindo a protagonizar em diversos teatros de acção, de propor, por exemplo, a instalação de câmaras de vídeo nas esquadras, permitindo o controle permanente de advogados e comissões de defesa dos direitos e liberdades, etc., etc. —   interroga-se sobre a legalidade da acção de pintura mural a que os jovens se dedicavam, tece considerações sobre a a gestão da informação pelo PCP, desculpa o silêncio observado pelos grandes meios de comunicação social sobre o assunto, repete duas ou três coisas sobre a natureza tirânica (indubitável) de regimes que gozam das simpatias do PCP, tudo isto para atenuar a gravidade do crime policial e desviar a atenção do que realmente conta no caso em apreço.
Pouco antes, também no Jugular, Rui Herbon, pelo seu lado, defendia, num post pedante e confuso, a necessidade de continuar a punir os pobres, fazendo-os pagar o grosso das medidas de austeridade, para salvar, para uma estreita camada de privilegiados, o Estado-Providência.
Aproximando os dois textos e procedendo à sua leitura cruzada, obtemos uma ilustração particularmente expressiva do credo e directivas programáticas da oligarquia dominante: reforçar as prerrogativas penais e dos agentes do monopólio da violência legítima contra os direitos e liberdades dos cidadãos que constituam obstáculos ou pareçam incompatíveis  com a optimização do funcionamento da economia estabelecida por afectarem a sua "iniciativa" ou contestarem a ordem política e formas de governo que o livre exercício dessa iniciativa dirigente requer. Não é fácil encontrar propósitos mais firmes do que os destes dois ideólogos de jugular a reivindicação de cidadania democrática ou de absolutizar os poderes da oligarquia.

Eu cá lamento ainda mais a violação da Justiça propriamente dita

Ana Paula Vitorino implica Mário Lino no 'Face Oculta'

Advogado de Manuel Godinho lamenta violação do segredo de Justiça

Agora é que o Renato vai a correr para o Afeganistão de Kalashnikov às costas

Ao que parece, os americanos estão a facilitar conversações entre os Taliban e o governo afegão. A ideia seria isolar a Al Qaeda. Com estas modernices, já nem se pode confiar na brava resistência islâmica!

A música do dia



Quem é o chato das barbas?

Via Carla Luís

O sidonismo cavernícola de VGM

Cavaco Silva entendeu exercer o seu mandato no mais estrito respeito das normas constitucionais. No estado de esfarrapamento e depauperação em que Portugal se encontra, eu teria preferido mais voluntarismo da sua parte, isto é, que ele varresse a testada pondo essa gente no meio da rua sem demora. Mas reconheço que, constitucionalmente, não seria fácil despachar assim, sem mais nem para quê, um governo saído de eleições e com uma maioria a seu favor.
Por outro lado, nas últimas semanas, o seu magistério de influência e a sua capacidade de intervenção vêm-se mostrando decisivos para se chegar a uma solução de viabilização orçamental. Por via dela o País ganhará ainda um precário balão de oxigénio, e este Governo há-de seguir em funções até ser integralmente responsabilizado.
É claro que poderia ser desfiado aqui um ror de razões para apoiar Cavaco Silva. Mas entendo que para já basta uma só: Cavaco Silva é, neste momento, o único garante de que Portugal não vai a pique!
Se o país não pudesse contar com ele na chefia do Estado, lugar em que a sua autoridade, a sua experiência e o seu saber, quer no plano político, quer no plano profissional, lhe permitirão assumir um papel absolutamente fulcral, o resultado seria pior do que o de qualquer intervenção externa devida à bancarrota, viesse ela de Bruxelas, do BCE ou do FMI.

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fdp!... desculpem o desabafo. Mas, num encontro do Fórum para a Competividade, que está hoje a decorrer, foi proposto reduzir os custos laborais duma empresa através da diminuição da taxa social única, que estas pagam por cada trabalhador. Para manter as receitas fiscais inalteradas, sugere-se que deixe de existir produtos ou serviços com taxa reduzida (seis por cento) ou intermédia (13 por cento) de IVA, passando todos os bens a serem taxados a 23 por cento, o valor previsto na proposta do Orçamento do Estado para 2011. Ou seja, propõem pôr os mais pobres, que proporcionalmente mais gastam do seu rendimento em bens de primeira necessidade, como alimentos e medicamentos, a pagar o que hoje as suas empresas desembolsam. E que tal em vez de quadruplicar o IVA sobre o pão e o leite, quadruplicassem antes o IVA sobre rolexs e iates?!

Sobre



a lista do Lopes.

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O poderoso ora purgado

Yoani Sánchez sobre um vice-presidente que foi purgado (Carlos Lage):

Senti compaixão por Carlos Lage ao vê-lo com seu gorro cobrindo o rosto, com seu passo apertado para que não o reparassem. Tive o impulso de chamá-lo para dizer que ao expulsá-lo lhe evitaram o escárnio futuro e o haviam convertido em homem livre. Porém passou tão de pressa ao meu lado, o asfalto irradiava tanto calor e aquela mulher o olhava com tanto escárnio, que só pensei em cruzar a calçada. Deixei o defenestrado em sua solidão, mesmo que, creiam-me, ter tido vontade de me aproximar e sussurrar-lhe que não ficasse triste: ao despedi-lo na realidade o salvaram.

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26/10/10

Cavaco com pele de cordeiro

Na apresentação da sua candidatura à Presidência da República, Cavaco Silva anunciou que não terá outdoors e que a despesa total da sua campanha não vai ultrapassar metade do valor permitido por lei (ou seja, rondará 2,09 milhões de euros, segundo a Lusa). Na pequena e abarrotada sala Fernando Pessoa irromperam aplausos. “Sei que isso me pode prejudicar face aos outros candidatos”, assumiu Cavaco, “mas quando tantos sacrifícios são exigidos aos portugueses, os agentes políticos devem dar o exemplo. Não me sentiria bem com a minha consciência gastando centenas de milhares de euros com a afixação de cartazes.”

Não terá ocorrido ao santo homem e ascético hierarca que a poupança e o exemplo de austeridade seriam mais eficazes se, pura e simplesmente, para aliviar os efeitos da crise, tivesse renunciado a candidatar-se?

Hoje foi notícia...


... a PJ e o Ministério Público andarem a investigar fraudes do BPN.

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A pobreza da ambição erótica de ser centopeia


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Vamos todos emigrar!

A mandatária de Cavaco para a juventude quer "inspirar" os jovens com o seu exemplo. Tendo em vista que Joana Carneiro trabalha essencialmente no estrangeiro, percebe-se melhor o exemplo.

O susto contra-revolucionário com uma porrada de anos de retroactividade

Ou o sindroma Herbon:



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Cavaco recandidato


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Cavaco e o desígnio penoso

O anúncio da recandidatura de Cavaco foi um longo bocejo. Em redor, a câmara dava-nos imagens das figuras cimeiras do PSD e do cavaquismo, gente que o acompanhou nas suas diferentes reencarnações, todos com ar de quem espera que a próxima frase seja empolgante. O elenco de banalidades sem chama foi entrecortado pelo anúncio de que não seremos brindados com outdoors da sua figura porque "neste momento ninguém compreenderia esse gasto". Dias Loureiro, antigo conselheiro de Estado e velho protegido de Cavaco, não estava lá para aplaudir. Já mais para o final ainda houve tempo para revelar o providencialismo de que se acha imbuído. A situação é difícil, disse, mas seria pior "sem os alertas que fiz, sem os futuros que apontei". E informou que a sua recandidatura é movida pelo "apelo do dever", já que se olhasse para os seus "interesses particulares não se candidatava". Cá fora, esclareceu que não responderá a quaisquer críticas dos seus adversários. No fundo, Cavaco entrou numas eleições fazendo questão de mostrar que acha uma chatice a disputa eleitoral e o debate democrático. Manuela Ferreira Leite estava lá e aplaudiu. Pode ser que o país esteja sintonizado com os interesses particulares de Cavaco e o ilibe em Janeiro desse desígnio penoso.

Por falar em cefalópodes...

Uma entrevista de Ferreira Gullar, por Alexandra Lucas Coelho. Nada recomendável a fãs de Lula. Alguns aperitivos: «O Lula é a fome do poder. Transparece nele. É a arrogância. Como toda a pessoa ignorante, chega a um ponto e não tem autocrítica, não tem medida. Ele disse várias vezes que é o único presidente do Brasil em 500 anos. Porque veio do povo. Do povo veio também Fernandinho Beira-Mar, do povo vem qualquer coisa. Um bandido, homicida, dos mais cruéis. Veio do povo. Mais povo que o Lula. Então, tem de ver o que o cara fez. Ele nunca leu um livro. Acha que uma pessoa que nunca leu um livro pode conhecer o Brasil? Sabe do Brasil como? De orelha?»
«Aquela luta dos palestinos lá, tem mais de 60 anos. Todos os estadistas do mundo tentaram resolver e não conseguiram. E o Lula vai conseguir, sem ter lido um livro? Realmente! Alguém acredita nisso? O Lula, que mal sabe quem é. Chega lá no Oriente, quando o Brasil não tem nada a ver com aquilo lá.»

Mais um tiro de alerta roubado ao Manuel António Pina: No centro do alvo (2)

"Mas temo, sobretudo, o que pode significar o facto de um caso destes já não ser hoje notícia entre nós" - assim conclui esta crónica de Manuel António Pina — este seu novo tiro de alerta disparado contra o medo e, como o ontem aqui roubado pelo camarada João Tunes, acertando no centro do alvo.

"Militantes da JCP viram, mais uma vez, ser impedida a pintura de um mural junto à Rotunda das Olaias, em Lisboa, tendo sido identificadas duas pessoas e apreendido o material usado (...).
A pintura mural (...) já tinha sido impedida dois dias antes chegando os agentes da PSP a deterem e insultarem os jovens comunistas, obrigando-os a despir-se e retendo-os durante várias horas na esquadra".
A notícia vem no "Avante!" e em numerosos blogues (alguns particularizam que eram quatro raparigas e um rapaz) e, a confirmar-se, não é surpreendente para quem conheça o que se passa hoje em certas esquadras da PSP e relatórios internacionais regularmente vêm denunciando.
Como não surpreende que a notícia tenha singularmente "escapado" à generalidade da imprensa e das TV, mesmo àquelas que fazem dos "faits-divers" o pão nosso noticioso de cada dia e que nem aquele afrontoso "obrigando-os a despir-se" parece ter sido capaz de interessar.
Gostaria de estar certo, eu que sou um ingénuo, que o comportamento a vários títulos abusivo da PSP (a pintura de murais em locais públicos é um direito reconhecido por lei e um parecer do Tribunal Constitucional condena impedimentos ao seu exercício) e o silêncio dos media não se deve ao facto de os cinco jovens serem militantes de uma organização comunista.
Mas temo, sobretudo, o que pode significar o facto de um caso destes já não ser hoje notícia entre nós.

Desta é que não estavas à espera


O polvo Paul faleceu tranquilamente, de causas naturais.

A remuneração da independência

O juiz Mouraz Lopes explicou hoje que o facto de a remuneração dos magistrados ser superior à média salarial, como consta no relatório do Conselho da Europa, insere-se numa tendência europeia para proteger o princípio da independência.

Caso para dizer: que grande lata, senhor doutor juiz sindicalista para esfarrapar assim uma justificação do arco da velha em defesa de um pico de desigualdade. Como se os "parecidos", ou "aproximados", não pudessem ser independentes. Um juiz é independente porque sim, tendo de o ser pela sua condição profissional livremente optada, ou porque é bem remunerado? Uma coisa parece-me indiscutível: - Mouraz Lopes pode ser um excelente sindicalista mas enquanto juiz e cidadão não passa de um paladino do mérito automático dos mercenários. Livrem-nos, pois, dos seus acordãos.

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Adenda: Leia-se este post.

Sobre o Outubro Húngaro de 1956

À laia de comemoração de mais um aniversário da Revolução Húngara de 1956, recomenda-se aqui a leitura deste texto de Thomas Feixa, publicado por Le Monde diplomatique, em 2006 - aqui, na versão brasileira de Márcia Macedo -, que poderá ser uma boa introdução à importância do debate sobre a experiência do Outubro Húngaro, na perspectiva daquilo a que Amador Fernández-Savater, na esteira de Castoriadis, chama "reconstrução das pontes queimadas" da "exigência revolucionária" e da sua actualidade histórica.

Budapeste, 23 de outubro de 1956. Organizada pelo Círculo Petofi, um grupo de estudantes e intelectuais húngaros, uma manifestação em solidariedade aos poloneses põe fogo no barril de pólvora. Quem são os insurgentes? Segundo o jornal Le Figaro, militantes cuja intenção era a de restaurar uma "democracia" à moda ocidental, seguindo as leis do capitalismo. A máquina de propaganda do Partido Comunista Francês não tinha a intenção de mostrar o contrário, pois para ela os instigadores do levante de Budapeste eram agitadores contra-revolucionários. Os crimes do stalinismo certamente já haviam sido reconhecidos, mas eram atribuídos a uma personalidade perturbada. O Pravda também explicara que "o culto da personalidade é um abscesso superficial no órgão perfeitamente são do partido", o proletariado e a revolução permanecem no poder, não apenas na União Soviética, mas também em todas as "democracias populares". Como o proletariado na Hungria poderia, então, voltar-se contra si mesmo?
Vejamos agora a originalidade das análises feitas por
Socialismo ou Barbárie, um periódico comunista tido como marginal, mas cuja influência estará, por exemplo, fortemente presente em maio de 1968. "Órgão crítico de orientação revolucionária" (é o sub-título do periódico), Socialismo ou Barbárie foi co-fundado em 1949 por dois dissidentes do trotskismo, Claude Lefort e Cornélius Castoriadis. A partir de dezembro de 1956, ele dedicou quatro edições à elucidação do evento húngaro, utilizando textos, convocatórias e palavras de ordem difundidas por insurgentes, estudantes e operários.
Para Castoriadis, é antes de tudo imprescindível "dissipar o nevoeiro da propaganda (que utiliza de todos os meios para dissimular a realidade sobre a revolução húngara), para mostrar as verdadeiras tendências proletárias e socialistas dessa revolução". As análises áridas e confidenciais de Socialismo ou Barbárie parecem partilhar dos objetivos e práticas dos insurgentes húngaros. A revolução dos conselhos operários, que toma forma em Budapeste, Györ, Miskolc ou Pecs parece confirmar a pertinência de um projeto revolucionário ao mesmo tempo radical e igualitário. Os acontecimentos de Budapeste, modelos para o desencadeamento de uma revolução democrática, constituem, segundo Lefort, a primeira revolução anti-totalitária e abrem a perspectiva de um socialismo que se opõe à ideologia leninista e todas a suas variantes.

Revolução sem vanguardas

Assim como a revolução russa de fevereiro de 1917, a insurreição húngara opera espontaneamente. O poder monolítico do partido-Estado decompõe-se em poucos dias, diante de um conjunto de movimentos rebeldes, "centrífugos" e autônomos. Essa revolução socialista, "de múltiplos focos", segundo Castoriadis e Lefort, desenvolve-se distante de qualquer vanguarda revolucionária, e contra a própria idéia de uma subordinação a eventuais "profisisionais" da revolução. Sendo assim, ela reabilita as formas políticas de luta radical: a greve geral e a criação de conselhos autônomos operam sobre uma plataforma de democracia direta.
Ela também se choca contra a fórmula do partido revolucionário defendida por Lênin e por Trótski: a de uma organização autoritária e centralizadora, na qual as decisões são tomadas por uma elite sábia e restrita. A insurreição húngara ilustra a autonomia dos movimentos revolucionários, fazendo jus à auto-emancipação do proletariado, idéia preciosa a Karl Marx. E é aqui onde se encontra o coração do marxismo heterodoxo de Socialismo ou Barbárie. A despeito do que pensaria o autor de Que fazer?, a "consciência socialista", longe de nascer de uma sabedoria exclusiva a uma elite ou vanguarda, é produto de uma experiência coletiva de combate em prol da inversão da ordem estabelecida.
A partir do dia 25 de outubro de 1956, a estimativa de Lefort é de que "a Hungria está povoada de conselhos, cujo poder passa a ser o único, além do exército vermelho". Em suma, a atividade espontânea e radical dos insurgentes ilustra sua criatividade política e resulta na instituição de conselhos operários. Esses conselhos não constituem formas políticas transitórias: ao contrário, eles tendem a substituir a lógica centralizadora do Estado pela sua lógica democrática.

O "socialismo dos conselhos"

Quem fala de socialismo de conselho refere-se, simultaneamente, ao controle dos representantes, à vontade de repudiar toda tendência oligárquica, à esperança de impedir toda autonomização do poder. A adoção do mandato imperativo – que foi considerado inútil por todas as consitutições republicanas francesas e cujo princípio não é aceito por nenhuma grande formação política, inclusive em seu funcionamento interno – constitui um dos pilares do conselhismo. Ele visa impedir a dissociação entre uma minoria dirigente e uma maioria executante. Em oposição ao mandato representativo, ele instaura a revogabilidade permanente de todo mandatário: o representante é encarregado de aplicar as instruções daqueles que o elegeram. Já o sistema de mandato representativo lhe concede uma independência total: uma vez eleito, ele torna-se a voz da Nação, e não mais a de seus mandatários.
No dia 28 de outubro, o Conselho de Szegel passa a reinvidicar a autogestão operária. Outros conselhos ou comitês de fábrica (que continuam a proliferar) seguem a mesma trajetória. Em 2 de novembro, a Federação da Juventude proclama: "Nós não devolveremos a terra aos grandes proprietários, nem as fábricas aos capitalistas". Para Castoriadis, a revolução húngara assemelha-se a um anti-capitalismo real, que atinge as próprias relações de produção e não se satifaz, por meio do socialismo, com a abolição do regime de propriedade privada. De acordo com Lefort, o regime stalinista permitiu que os operários húngaros compreendessem algo essencial: "a exploração não é resultado da presença de capitalistas privados, mas da divisão, feita nas próprias fábricas, entre aqueles que decidem tudo e aqueles que apenas obedecem". A estatização dos meios de produção – ou sua nacionalização – não conseguiria conferir uma característica socialista à produção. Tal erro acabaria por encobrir a realidade de um sistema de exploração nunca antes visto, que em 1956 foi desmantelado pelos insurgentes húngaros.
A revolução de Budapeste provocou fissuras em uma construção tida como invulnerável. Ela proporcionou uma invenção democrática sem precedentes e sem relação alguma com o que Castoriadis chamava de nossas "oligarquias liberais". Contra o totalitarismo, a revolução. Tal oposição põe em xeque toda uma historiografia conservadora. Aquela que, de François Furet a René Rémond, confunde "gulag"  com fenômeno revolucionário.

25/10/10

O miserável discurso da miséria resignada e agradecida

O Abominável César das Neves, no seu pior:

Antes de mais é bom perguntar: para quê criticar o sistema? Este é o mundo que temos e ninguém nos vai dar outro. Já era mau quando cá chegámos e continuará a sê-lo depois de partirmos. Não seria mais sensato entretanto contentar-nos com o que temos?
É verdade que o conformismo é um dos vícios mais abominados neste tempo, e todos pensam que estes protestos nos desinstalam, contribuindo para melhorar a situação. Mas será mesmo assim? É indispensável que cada um tente deixar o mundo o melhor possível. Mas isso é uma actividade humilde e atenta, ao nosso nível local, amando e ajudando o próximo. Nada tem que ver com bramar contra males remotos e genéricos, nos quais a nossa influência é nula. Tal lisonjeia o nosso ego, mas não passa de vacuidade ociosa. Quando não é mesmo prejudicial, como as próximas greves, nada resolvendo, pois não há mesmo dinheiro, apenas servem para diminuir o pouco que ainda existe.
Suponhamos, no entanto, que as nossas queixas eram ouvidas. Iriam mesmo melhorar alguma coisa? A verdade é que os problemas globais são muito complexos, e as soluções têm inesperadas consequências nocivas. Basta lembrar como a ingénua confiança dos nossos avós nas virtudes do progresso industrial criou os actuais pesadelos ambientais, ou como o desenvolvimento das regiões pobres, tão ansiosamente desejado, começa a suscitar perigosos desequilíbrios globais que irão assombrar o futuro.
Por outro lado, será a situação assim tão má? Não há dúvida de que, persistindo muitos e graves problemas, o mundo progrediu nos últimos tempos muito mais do que seria de esperar há uma ou duas gerações. A percentagem de pessoas a viver no planeta com menos de dois dólares por dia é ainda de quase 50%. Mas era de 63% em 2002 e de 75% em 1980. Mesmo a actual crise e desemprego, se significam graves sofrimentos para muitos, não têm comparação com a miséria que se vivia por cá há 20 ou 30 anos, em crises menos profundas que esta.
O aspecto mais grave deste clima de descontentamento e queixume é, no entanto, a ingratidão. Tudo aquilo que somos e temos devemo-lo ao sistema que nos sustenta. É este mundo que tanto desprezamos que nos alimenta todos os dias, nos veste, abriga, educa e orienta. Podemos protestar, mas é graças a ele que todos sobrevivemos. Aliás, os críticos só conseguem atacar com tanta eficácia o regime usando os largos meios que o mesmo lhes fornece.
Esta é hoje a suprema posição incorrecta, mas quero dizer uma palavra a favor deste nosso horroroso sistema. Não porque é bom, justo ou agradável, mas porque é nosso. Tem muitos defeitos, mas a grande vantagem de existir.

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Fariñas e o Prémio, desde Cuba

Da cubana Yoani Sánchez:

É difícil imaginar que dentro do corpo fraco de Guillermo Fariñas, sob seu rosto sem sobrancelhas, exista uma vontade à prova de desânimos. Também surpreende que nos momentos de maior gravidade para a sua saúde não tenha deixado de estar atento aos problemas e dificuldades dos que o rodeiam. Inclusive agora, com a vesícula extirpada e uns dolorosos pontos cirúrgicos que lhe atravessam o abdômen, sempre que o chamo, em lugar de se queixar, pergunta-me pela família, pela minha saúde e sobre a escola do meu filho. Que maneira de viver para os outros tem este homem! Não foi por nada que fechou a boca aos alimentos para conseguir que 52 presos políticos – dos quais muitos não conhecia – foram libertados.

Há prémios que prestigiam uma pessoa, que jogam luz sobre o valor de seres desconhecidos até ontem. Mas também há nomes que dão brilho e gratificação e neste caso, o Sakharov outorgado a Fariñas. Depois deste Outubro os próximos homenageados com o laurel máximo do Parlamento Europeu terão um motivo a mais para se sentirem orgulhosos. Porque agora tem realce maior graças ao que este villaclarenho obteve, entregando aos demais, este ex-militar que renunciou às armas para voltar-se à luta pacífica.

Quem melhor que ele, que se propôs uma meta imensa e a conseguiu, que deu a todos uma lição de inteireza e submeteu seu corpo a dores e privações que lhe deixaram sequela por toda a vida. Nenhum nome mais adequado para ser incluído na mesma lista onde estão Nelson Mandela, Aung San Suu Kyi e as Damas de Branco do que o deste jornalista e psicólogo cuja principal característica é a humildade. Uma lhaneza que nem os microfones de todos os jornalistas que o entrevistaram neste dias, nem as luzes das câmaras conseguiram mudar. Com essa simplicidade que seus amigos tanto admiramos nele, Coco – porque até seu apelido é humilde – conseguiu que o prémio Sakharov pareça muito mais importante.


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Regresso a Fariñas e ao "Sakharov", com boleia

A propósito deste post, o caro companheiro Pedro Viana levantou questões já discutidas na respectiva “caixa de comentários”. Independentemente daquilo que a discussão tenha apurado, gostaria, ainda e a propósito, transcrever um post do Rui Bebiano sobre o Prémio Sakharov deste ano, o qual (homem prevenido sabe o que “as casas gastam”…) adiantou logo uma prevenção quanto às habituais prioridades em sensibilidades e repulsas.

Pela terceira vez em apenas oito anos, o Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento foi para alguém que nasceu em Cuba. Não vou fazer aqui de ingénuo e dizer que a atribuição do galardão não depende de uma agenda política. Claro que depende. Mas isso não será em si um mal, sobretudo quando as razões invocadas para as escolhas não se prendem com as convicções pessoais dos premiados mas sim com a sua luta pelo direito de todos a poderem proclamá-las, sejam elas quais forem. Como anuncia o site do Prémio, este recompensa, tão-somente, «personalidades excepcionais que lutam contra a intolerância, o fanatismo e a opressão».
Em 2002 foi Oswaldo Payá Sardiñas, fundador e organizador do Projecto Varela, destinado a reunir, baseado na própria constituição cubana, as assinaturas necessárias para sugerir ao governo algumas mudanças legislativas. Em 2005 foram as Damas de Blanco, o grupo de mulheres que luta diariamente pela libertação dos seus familiares presos por motivos estritamente políticos. Agora foi a vez de Guillermo Fariñas, o activista, psicólogo e jornalista independente que se tornou um dos mais conhecidos dissidentes cubanos, quando, com apenas 23 anos, iniciou greves de fome para protestar contra os excessos do sistema monopartidário. Aquilo que impressiona nestes casos é o facto de nenhuma das figuras premiadas se constituírem como opositores declarados do regime, nenhuma delas exigir o fim do «socialismo» cubano, limitando-se a pedir que ninguém seja punido por proclamar aquilo que pensa.
Tão simples quanto isto. E, no entanto, tão difícil de aceitar por um regime violento mas inseguro, que só pode ter medo do seu próprio povo para o manter assim amordaçado. Arruinando por isso os vestígios de prestígio e de simpatia – no passado recolhidos nos mais diversos quadrantes de opinião dispersos pelo planeta, e não associados apenas, como hoje, a grupos bem identificados de indefectíveis – vindos ainda daquele tempo em que representava um sinal de esperança na construção de uma ordem mais justa, mais solidária e mais democrática. Outro tempo.

Oligarcas, aristocratas e plutocratas


Vivemos num país dominado por um punhado de famílias (ie. oligarquia), que ao longo do tempo (ie. aristocracia) têm usado a sua riqueza (ie. plutocracia) para manter o seu estatuto, efectivamente ditando o que sucessivos governos podem ou não fazer. Com a notável excepção dum (muito) pequeno período iniciado com o 25 de Abril de 1974 e terminado a 25 de Novembro de 1975.

A árvore geneológica dos oligarcas, aristocratas e plutocratas nacionais está em cima reproduzida, e pode ser consultada em maior detalhe aqui. Foi criada com base num excelente trabalho de pesquisa histórica, publicado sob a forma de livro: "Os Donos de Portugal". Mas há alternativa.

No centro do alvo (o dos contabilistas inchados de hipocrisia)

Manuel António Pina no JN:

Perder uma votação é (deve ser, mas que sei eu?) frustrante. Mas daí a contabilizar o sofrimento e a humilhação individual para concluir que "o meu violador de direitos humanos é pior que o teu" vai um precipício moral que, como diz Steiner, constitui "uma obscenidade adicional ao acto de despersonalizar a desumanidade".

Foi o que fizeram Ana Gomes, do PS, e Miguel Portas, do BE, proponentes da etíope Birtukan Mideksa, que entendem que, em Cuba, as violações dos direitos humanos, enfim, como dizer?, "não têm a gravidade que noutros regimes têm" e que, na Etiópia, essas violações (tortura, indignidades, prisões arbitrárias) é que são "gritantes". E o que igualmente fez Ilda Figueiredo, do PCP, que patrocinava a ONG "Breaking the silence", que tem denunciado as atrocidades de Israel na Palestina, e acusou o PE de não querer "enfrentar Israel" e se virar para Cuba, que é "mais fácil". Há algo de facto obsceno no espectáculo desta gente sentada nas suas poltronas a fazer contas, de máquina de calcular na mão, ao sofrimento alheio e a decidir quem sofre mais e quem sofre menos.

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Fascismo em ascensão


A Alternet é um dos mais importantes agregadores de notícias e opiniões da Esquerda norte-americana. Nos últimos dias publicou três textos arrepiantes sobre o modo como o fascismo está a expandir-se a uma velocidade estonteante nos EUA, Europa e Israel, frequentemente com o apoio duma fracção significativa do poder económico, receoso da crescente instabilidade económico-social. A História pode repetir-se.

Fascist America: Is This Election the Next Turn?

Islamaphobia Rapidly Spreads Through Europe

Is Israel on the Verge of a Fascist Takeover?

O país da pobre figura

Claudi Perez, no “El Pais” de hoje:

Sobre os últimos dez anos:

Entre los que más crecen desde 2001 a 2010 aparecen países recién salidos de conflictos bélicos o con grandes riquezas en recursos naturales, además de economías que han disfrutado de una recuperación natural tras las crisis financieras previas, como en América Latina o Asia. Pero sobre todo ahí están China, con un avance acumulado del 170%, e India, que ha duplicado el tamaño de su economía de 2001 a 2010. En general, los emergentes asiáticos se destacan. Europa Central y del Este, América Latina, Oriente Medio e incluso África registran también avances formidables. En el furgón de cola, países golpeados por el infortunio (Haití), por guerras (Liberia) y décadas perdidas en Alemania, Dinamarca, Japón o Portugal, pero sobre todo en Italia, que aparecen en los últimos puestos por avance del PIB, los que permiten usar la manida fórmula de la década perdida sin más explicación que la anemia de sus economías.

E quanto aos próximos cinco:

El rápido crecimiento económico que comenzó en algunos países asiáticos en los años sesenta se ha extendido hoy a lo largo de un amplio arco del este de Asia, de América Latina y en menor medida de Europa del Este. Y en el próximo lustro seguirá ocurriendo algo parecido: un vistazo a las previsiones del FMI hasta 2015 deja a China creciendo a un ritmo asombroso del 57% -más del 10% anual- e India rozando el 50%. Junto a esas dos puntas de lanza, un nutrido grupo de países en vías de desarrollo impulsará la economía mundial en los próximos años; serán su principal motor.
Justo al otro lado, Portugal (4,1%), Grecia (5,4%) y Venezuela (5,8%) son los tres países que menos crecerán en el próximo lustro. Italia (6,5%) y España (9,08%) están también entre los 10 peores. Y no mucho mejor les irá a Alemania, Japón, Holanda y Francia, que presentan también avances inferiores al 10% en cinco años. La primera potencia del mundo, EE UU, crecerá menos del 15%, siempre según las previsiones del FMI. El mundo sigue girando: China e India están en otra dimensión.


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Do regresso do nacionalismo económico - resposta ao Nuno Teles

O Nuno Teles respondeu ao post onde eu dava conta da minha preocupação com o que me parece ser uma clara sobrevalorização à esquerda de soluções económicas nacionalistas e industrialistas. A resposta do Teles não diminuiu as minhas preocupações, mas permite ir esclarecendo os nossos desentendimentos e possivelmente agudizar as desavenças.

O primeiro desentendimento tem que ver com o modo como relacionamos a análise económica e a vontade política, a ciência e a crítica. Para o Nuno Teles, parece-me, qualquer vontade política crítica que não esteja apoiada em análise científica económica corre o risco de ser voluntarista e ineficaz. Para mim, também. Agora, e aqui parece-me que eu vou para um lado e o Teles segue para outro, isto implica, igualmente, assumir o reverso. De tal modo que: qualquer análise científica económica que não se apoie numa vontade política crítica corre o risco de meramente confirmar o que é evidente (e o que é evidente não só não é inequivocamente apurável como, se o é e quando é, está longe de esgotar o campo das possibilidades).

É nesta separação – primeiro a análise económica, depois a vontade política, primeiro a ciência, depois a crítica – que o Nuno Teles incorre quando se posiciona face à questão nacional.

Simplificando (ele corrigirá se entender), a sua posição, e de boa parte dos Ladrões de Bicicletas, é esta: seria ideal movermo-nos politicamente (seja a nível institucional, seja a nível de movimento) a uma escala global, mas a realidade é ainda nacional e por isso essa unidade de poder deve continuar a ser utilizada, sem prejuízo de tentativas pontuais de internacionalizar as questões. Ora, aqui, neste modo de ver as coisas, detecto um problema: há no modo de pensar do Nuno uma barreira entre o que se toma por ideal e o que se toma por material. Repito: as nossas propostas políticas devem derivar da análise da realidade económica mas também o contrário e seria revelador de um insuportável economicismo considerar que a realidade económica tal como a analisamos é mais “real” do que as propostas políticas que formulamos. Entre a realidade e a realidade dos nossos desejos não existe nenhuma muralha da babilónia. Isto mesmo tem sido exemplarmente exposto pelos ladrões na crítica a que submetem as análises económicas dominantes: essas análises pretendem dar conta da realidade tal como ela é, dizem-se despidas de ideologia, mas os ladrões mostram bem que ninguém é virgem e que as análises económicas estão impregnadas de vontade política. Há que ser fiel a este princípio e não usá-lo apenas para desconstruir o que é dito pelos nossos adversários; ou melhor, essa desconstrução não deve servir parar mostrar que eles estão cientificamente errados (é insuportável ouvir os economistas críticos dizerem que qualquer manual de economia política ensina que em tempos de crise o Estado não deve ter orçamentos restritivos) mas que é antes de mais no terreno das diferenças políticas e morais que as suas ideias devem ser escrutinadas.

A insaciável criatividade dos privatizadores compulsivos





Se esta malta não malucou de todo com a crise, anda disso muito perto:

O Governo do Reino Unido avalia vender parte das florestas do país, actualmente propriedade do Estado, como parte do plano para reduzir a despesa pública e combater o enorme défice.

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24/10/10

Quando os senhores Puntilas diluem os rostos em papeis de acções, como bem podia ser em aguardente



Neste tempo de redesenho social à vista em que o clássico parece gasto, nem todo o Brecht ajudará à missa a inventar, mas, seguramente, este “O Senhor Puntila …” (*) não só resiste ao questionar brutal dos estereótipos como é ponte para a reinvenção, seja ela qual vier a ser, da luta de classes. Em primeiro lugar, porque a bipolaridade do homem da propriedade (no caso, pelo álcool, mas podia bem ter sido utilizado um outro pretexto), uma abstracção em tempos em que o capitalismo perdeu os rostos, corta as vazas às simplificações dogmáticas e sectárias de uma banda só e prefere a magia do delírio. Depois, porque nos alerta e instrui sobre o quão difícil, mas possível, é não perder o sentido de orientação sobre enganos e encomendas, em que a batuta tem uma mão e “não é possível misturar o azeite e o vinagre”. Pois não, mesmo na aparência do hedonismo mais desbragado.

Como se não bastassem a oportunidade desta reposição de uma das mais legíveis, divertidas e um eficaz convite à cumplicidade (coisa rara com Brecht, o homem da distanciação feita teatro) no prazer da descoberta da fábula sobre a exploração entre as peças de Brecht, sendo assim uma das peças do universo brechtiano que melhor resiste ao tempo, ela, nesta encenação, está entregue ao maior especialista português na representação de Brecht (João Lourenço). Que faz aqui o que é costume nele – trabalho asseado, suado e inspirado. Com um Senhor Puntila “de encomenda” (e faltando-nos Mário Viegas, dificilmente se poderia pensar noutro), o Miguel Guilherme. A não perder, pois, um salto ao Teatro Aberto, Sala Azul.

(*) “O Senhor Puntila e o seu Criado Matti”, Bertolt Brecht (com dramaturgia de Vera San Payo de Lemos), Teatro Aberto (Praça de Espanha, Lisboa), com Miguel Guilherme à frente de um elenco homogéneo e de muito aceitável performance, incluindo um excelente e interventivo trio musical.

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Pré-entendidos





O ministro das Finanças fez uma curta declaração após uma segunda reunião de três horas com a equipa do PSD. "Continuamos com o mesmo espírito, empenhados em chegar a um entendimento", disse Teixeira dos Santos.

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Semelhança eucuménica


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