14/11/18

"Oligarquização" no Bloco de Esquerda?

Em primeiro lugar, declaro que apoiei a moção A para esta Convenção, já que, apesar de tudo, considerei que era a melhor linha no conjunto da estratégia do Bloco de Esquerda.

No entanto, há uma evolução que acho péssima - algumas alterações aos estatutos aprovadas, nomeadamente a revogação do artigo dos estatutos que determinava que: o "secretariado nacional e os secretariados das comissões coordenadoras concelhias, distritais e regionais que vierem a ser eleitos são sempre renovados em pelo menos um terço dos seus membros" e que "Nenhum dos seus membros exercerá funções por mais de dois mandatos consecutivos."

Isso é abrir a porta para o surgimento de uma casta de dirigentes que se perpetuem nos cargos, e ainda mais marcante no contexto de um partido que se destacou na luta contra os dinossauros autárquicos (e que portanto percebe bem a necessidade de regras a limitar a perpetuação em cargos, já que, por mais democrática que seja uma eleição, quem já está no poder tem sempre alguma vantagem). É verdade que em pequenos concelhos pode se difícil arranjar pessoas para ir rodando os membros dos secretariados, mas a nível distrital e sobretudo nacional duvido que esse problema exista (e em núcleos extremamente pequenos talvez fosse de equacionar em vez disso a possibilidade de não haver secretariado formal); e, além disso, é estranho que seja quando o partido parece estar a crescer (e portanto esse problema menos se colocaria) que se decide acabar com a limitação aos mandatos.

Há outra alteração que inicialmente me pareceu pior do que é, mas também não me tranquiliza - a substituição da regra que dizia que "A MN será composta, no momento da sua eleição, por um mínimo de 50% de membros que não sejam deputadas ou deputados, nacionais ou europeus, funcionárias ou funcionários do Bloco, ou exerçam cargos remunerados de assessoria a representantes eleitas e eleitos pelo Movimento." por "A MN será composta, no momento da sua eleição, por um mínimo de 60% de membros que não sejam  funcionárias ou funcionários do Bloco, ou exerçam cargos remunerados de assessoria a representantes eleitas e eleitos pelo Movimento"; inicialmente não reparei na mudança de 50% para 60% mas apenas na parte dos deputados deixarem de contar, e pareceu-me que serviria apenas para haver mais funcionários e assessores nos órgãos dirigentes (se há um limite para o número de deputados + funcionários + assessores, e os deputados deixam de contar, sobram mais lugares para funcionários + assessores); vendo melhor, não é necessariamente assim, já que por outro lado o máximo de funcionários+assessores baixou de 50% para 40%, portanto nesse ponto não é claro qual o efeito líquido dessa alteração - mas de qualquer maneira abre caminho a meter, se não mais funcionários, pelo menos mais deputados na Mesa Nacional. Isso provavelmente é feito a pensar na elevada probabilidade de eleger mais deputados nas próximas eleições, mas de qualquer maneira parece-me um passo para ter na Mesa mais profissionais da política e menos cidadãos comuns, com a sua vida e profissões, e que uma (?) vez por mês se metem no comboio para ir à reunião (e, aliás, talvez reforçando a tendência para o Bloco se concentrar no trabalho parlamentar e descurar a ação política nas ruas, bairros, locais de trabalho, etc.).

Uma nota final - poder-se-á perguntar porque é que eu só escrevo isso agora; afinal, antes da convenção o Bloco publicou dois cadernos de debates para onde os aderentes podiam mandar as suas contribuições; não teria feito melhor figura ter mandado este texto (adaptado ao momento) para lá antes da Convenção, para um sitio e numa altura em que ainda poderia influenciar alguma coisa em vez de escrever um post num blogue na semana a seguir, quando já não vai afetar nada? E realmente tinha feito melhor figura, mas só me lembrei que poderia ter apresentado um texto para os Debates agora, quando estava a escrever este.

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