12/12/18

O Plano Nacional de Vacinação - decisão técnica ou política?

A decisão da Assembleia da República de incluir mais algumas vacinas no Plano Nacional de Vacinação levantou muitas objeções, de que o parlamento não teria nada que se meter em decisões técnicas. Será mesmo assim?

Vamos lá ver -  que razões técnicas poderão haver para não se incluir uma dada vacina no Plano Nacional de Vacinação? À primeira vista, poderá-se imaginar estas:

a) A dita vacina, pura e simplesmente, não fazer efeito

b) A vacina fazer pouco efeito (isto é, muita gente que toma a vacina acaba à mesma por desenvolver a doença)

c) O risco de apanhar a doença que a vacina em causa previne é muito baixo à partida

d) A vacina contra a doença A pode aumentar a probabilidade de contrair a doença B (p.ex., li algures que a vacinação contra a varicela nas crianças pode aumentar a probabilidade de infecções por herpes zoster nos adultos, ou coisa parecida)


Mas, se vermos bem, apenas o motivo a) e talvez o d) são motivos puramente "técnicos" para não incluir uma vacina no PNV - no caso de b) e c), incluir ou não incluir a vacina no PNV já implica fazer um juízo valorativo sobre se a redução de riscos compensa o dinheiro que se vai gastar com as vacinas, o que me parece uma decisão política e não puramente técnica (a função dos técnicos aí será sobretudo informar os decisores políticos - sejam eles o parlamento, o governo ou um hipotético referendo nacional cibernético - dizendo algo como "por um custo de X euros/anos, iremos ter menos Z pessoas doentes  por ano; agora decidam vocês se vale a pena"). Mesmo no caso d), de haver o risco de vacinar contra uma doença aumentar o risco de contrair outra, pode haver situações em que se imponha o tal juízo valorativo e não apenas técnico; p.ex, imagine-se que uma vacina reduzisse em 80% a probabilidade de contrair uma doença de risco mediano e aumenta em 30% a probabilidade de contrair uma doença grave - decidir se o risco ultrapassa o benefício nesse caso já me parece uma decisão mais política nesse caso.

Poderá perguntar-se se nessas questões que implicam fazer um juízo valorativo (vale a pena gastar muito dinheiro para prevenir um pequeno risco? vale a pena evitar a doença A mas aumentar o risco de contrair a doença B?) a decisão, mais do que técnica ou política não deveria ser individual (afinal, esses juízos têm muito de subjetivo) - estilo dar às famílias ou dinheiro que se gastaria com essas vacinas polémicas (p.ex., sob a forma de abono de família) e depois cada um decidiria se valia a pena pagar pela vacina ou gastar o dinheiro noutra coisa qualquer. Isso talvez faça sentido nalgumas situações, mas há pelo menos duas razões que justificam uma componente de decisão coletiva e não apenas individual nas vacinas: a principal é que a decisão de um individuo vacinar-se ou não por regra não o afeta só a ele - uma pessoa não vacinada representa um perigo também para as outras pessoas; e além disso, grande parte das decisões sobre vacinas são feitas numa idade em que o individuo a ser vacinado ainda não é autónomo (ou se calhar ainda nem fala ou anda), sendo tomadas pelos seus pais ou equivalentes e não pelo interessado principal.

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