30/06/20

Propriedade privada versus liberdade de expressão e manifestação

De certa forma isto



é o equivalente virtual disto



(casal tentando impedir uma manifestação de atravessar a rua privada onde vivem)

25/06/20

Jogos de tabuleiro

Para quem ache que os mais tradicionais glorificam o capitalismo ou o imperialismo:

- Trot Wars (o site oficial do jogo já não está a funcionar, mas não parece difícil fazer-se o download das instruções e das cartas e fazer uma versão DIY)

- Commonspoly (outro que também se pode fazer simplesmente o download e imprimir)

- Anti-Monopoly (um clássico na verdade ainda mais antigo que o clássico)

- Bolo'Bolo

- A versão "Revolta Camponesa" do  xadrez (possíveis objecções a este - além dos rebeldes continuarem a ter um rei, provavelmente só ganham se alguns camponeses se tornarem nobres, pelo que no fundo pode ter um espírito de "meet the new boss, same as the old boss"; por outro lado, é muito provável que uma vitória rebelde agrade ao sector anti-JK Rowling)

15/06/20

"Racismo sistémico" e "discriminação estatística"

Uma coisa que tenho pensado é que aquilo que os anti-racistas chamam "racismo sistémico" e os anti-anti-racistas chamam de "não é racismo, é discriminação estatística" se calhar são dois nomes diferentes para a mesma coisa: um processo emergente em que os indivíduos, sem serem pessoalmente racistas, são levadas a tomar decisões que, no agregado da sociedade, produzem resultados que beneficiam uma raça face a outra.

[Sobre formas como o funcionamento da sociedade pode ser racista sem os indivíduos serem pessoalmente racistas, há dias Chris Dillow fez um post sobre o assunto - Racism as Emergence]

13/06/20

Sugestão para história de ficção científica

Há uns tempos que penso num possível enredo para uma história de ficção científica - um físico (politicamente de direita) desenha uma máquina do tempo e vai fazer uma viagem ao passado acompanhado de um historiador; no entanto, o historiador à ultima hora não pode ir, mas no departamento de ciências sociais, embora não haja historiadores disponíveis, arranja-se um sociólogo (politicamente de esquerda, como aliás o historiador) com alguns conhecimentos de história para o acompanhar na viagem.

Chegados ao passado,  o sociólogo passa grande parte do tempo criticando as instituições e costumes opressivos que encontram e o físico dizendo que não se pode julgar o passado pelas regras do presente; a dada altura começam a desconfiar que alguma coisa não bate certo e acabam por descobrir que a máquina não funciona como planeado: em vez de terem ido para o passado, foram para outro planeta (que por qualquer razão tem habitantes muito parecidos aos terrestres...). A partir dessa revelação, o físico passa a dizer que os habitantes desse planeta são uns selvagens e o sociólogo que não podemos julgar os outros povos e culturas pelos padrões ocidentalocentricos ou mesmo geocêntricos.

[A minha grande dúvida: se a máquina levasse as pessoas, não para outro lugar nem para outro época, mas sim para outra dimensão, numa espécie de universo paralelo, quem é que iria dizer "não podemos julgar outras dimensões pelos padrões da nossa"? O de direita (como a respeito de outra época) ou o de esquerda (como a respeito de outro lugar)?]

12/06/20

Fomes


["Proved by science: Winston Churchill, not nature, caused 1943 Bengal famine"]

A "neutralidade" das redes sociais

Há uns dias, o presidente dos EUA fez um decreto com a intenção de limitir a possibilidade das redes sociais bloquarem posts ou membros (ou, no caso dele, meterem um link para um factcheck abaixo do post).

Na sequência disso, em certos meios começou a circular a teoria de que as redes sociais, serviços de alojamento de blogs/sites, fóruns, etc. etc. só teriam imunidade legal face ao que é lá postado pelos utilizadores se não exercessem nenhum controlo editorial sobre isso (vi várias pessoas escrevendo isso).

No que diz respeito ao EUA (que é o país que deu origem a essa conversa) estão redondamente enganados.

Vejam a lei dos EUA sobre o assunto:
47 U.S. Code § 230. Protection for private blocking and screening of offensive material

(a) FindingsThe Congress finds the following:

(1) The rapidly developing array of Internet and other interactive computer services available to individual Americans represent an extraordinary advance in the availability of educational and informational resources to our citizens.

(2) These services offer users a great degree of control over the information that they receive, as well as the potential for even greater control in the future as technology develops.

(3) The Internet and other interactive computer services offer a forum for a true diversity of political discourse, unique opportunities for cultural development, and myriad avenues for intellectual activity.

(4) The Internet and other interactive computer services have flourished, to the benefit of all Americans, with a minimum of government regulation.

(5) Increasingly Americans are relying on interactive media for a variety of political, educational, cultural, and entertainment services.

(b) Policy It is the policy of the United States—

(1) to promote the continued development of the Internet and other interactive computer services and other interactive media;

(2) to preserve the vibrant and competitive free market that presently exists for the Internet and other interactive computer services, unfettered by Federal or State regulation;

(3) to encourage the development of technologies which maximize user control over what information is received by individuals, families, and schools who use the Internet and other interactive computer services;

(4) to remove disincentives for the development and utilization of blocking and filtering technologies that empower parents to restrict their children’s access to objectionable or inappropriate online material; and

(5) to ensure vigorous enforcement of Federal criminal laws to deter and punish trafficking in obscenity, stalking, and harassment by means of computer.

(c) Protection for “Good Samaritan” blocking and screening of offensive material

(1) Treatment of publisher or speaker

No provider or user of an interactive computer service shall be treated as the publisher or speaker of any information provided by another information content provider.

(2) Civil liability No provider or user of an interactive computer service shall be held liable on account of—

(A) any action voluntarily taken in good faith to restrict access to or availability of material that the provider or user considers to be obscene, lewd, lascivious, filthy, excessively violent, harassing, or otherwise objectionable, whether or not such material is constitutionally protected; or

(B) any action taken to enable or make available to information content providers or others the technical means to restrict access to material described in paragraph (1).[1]

(d) Obligations of interactive computer service

A provider of interactive computer service shall, at the time of entering an agreement with a customer for the provision of interactive computer service and in a manner deemed appropriate by the provider, notify such customer that parental control protections (such as computer hardware, software, or filtering services) are commercially available that may assist the customer in limiting access to material that is harmful to minors. Such notice shall identify, or provide the customer with access to information identifying, current providers of such protections.

(e) Effect on other laws

(1) No effect on criminal law

Nothing in this section shall be construed to impair the enforcement of section 223 or 231 of this title, chapter 71 (relating to obscenity) or 110 (relating to sexual exploitation of children) of title 18, or any other Federal criminal statute.

(2) No effect on intellectual property law

Nothing in this section shall be construed to limit or expand any law pertaining to intellectual property.

(3) State law

Nothing in this section shall be construed to prevent any State from enforcing any State law that is consistent with this section. No cause of action may be brought and no liability may be imposed under any State or local law that is inconsistent with this section.

(4) No effect on communications privacy law

Nothing in this section shall be construed to limit the application of the Electronic Communications Privacy Act of 1986 or any of the amendments made by such Act, or any similar State law.

(5) No effect on sex trafficking lawNothing in this section (other than subsection (c)(2)(A)) shall be construed to impair or limit—

(A) any claim in a civil action brought under section 1595 of title 18, if the conduct underlying the claim constitutes a violation of section 1591 of that title;

(B) any charge in a criminal prosecution brought under State law if the conduct underlying the charge would constitute a violation of section 1591 of title 18; or

(C) any charge in a criminal prosecution brought under State law if the conduct underlying the charge would constitute a violation of section 2421A of title 18, and promotion or facilitation of prostitution is illegal in the jurisdiction where the defendant’s promotion or facilitation of prostitution was targeted.

(f) Definitions As used in this section:

(1) Internet

The term “Internet” means the international computer network of both Federal and non-Federal interoperable packet switched data networks.

(2) Interactive computer service

The term “interactive computer service” means any information service, system, or access software provider that provides or enables computer access by multiple users to a computer server, including specifically a service or system that provides access to the Internet and such systems operated or services offered by libraries or educational institutions.

(3) Information content provider

The term “information content provider” means any person or entity that is responsible, in whole or in part, for the creation or development of information provided through the Internet or any other interactive computer service.

(4) Access software providerThe term “access software provider” means a provider of software (including client or server software), or enabling tools that do any one or more of the following:

(A) filter, screen, allow, or disallow content;

(B) pick, choose, analyze, or digest content; or

(C) transmit, receive, display, forward, cache, search, subset, organize, reorganize, or translate content.
Digam-me lá onde aí diz que, para estarem abrangidas pela tal regra do "No provider or user of an interactive computer service shall be treated as the publisher or speaker of any information provided by another information content provider.", as redes sociais, etc não podem execer controlo editorial; e ainda por cima o titulo da secção é "Protection for private blocking and screening of offensive material" e o título do da sub-secção é «Protection for “Good Samaritan” blocking and screening of offensive material».

A única obrigação que essa lei parece impor aos fornecedores de serviço é informarem os clientes que existe software e hardware que pode ser usado para controlo parental (o que me parece completamente irrelevante para o que está a ser discutido).

 Já agora, além do título da secção ser "Protection for private blocking and screening of offensive material" e o título do da sub-secção é «Protection for “Good Samaritan” blocking and screening of offensive material», o nome da lei onde isso aparece é Communications Decency Act"; digam lá - parece-lhes o nome de uma lei feita para a dizer que as empresas da internet não podem apagar conteúdos?

Não tenho certeza disto que vou dizer agora, mas até tenho a ideia que toda essa legislação foi feita por impulso conjunto da direita religiosa e da esquerda soccer moms, cheias de medo que a internet ficasse cheia de "sexo e violência" - como a primeira emenda não permite que o estado proibisse o "sexo e violência", fizeram uma lei que ao menos permitisse aos fornecedores de acesso e aos alojadores de conteúdos bloquear/apagar coisas sem perigo de consequências adversas.

Se o decreto de Trump tiver alguma relevância prática (por algumas coisas que tenho lido, é capaz de ter sido mais um exercício daquilo que noutro contexto os seus apoiantes chamariam de sinalização de virtude), o resultado é que só passaria a haver dois tipos de redes sociais:

- redes sociais em que se pode publicar tudo, sem qualquer restrição (além daquelas que vêm das leis gerais)

e

- redes sociais estilo Stasi, em que tudo o que é publicado é esmiuçado pela plataforma (e provavelmente sujeito a uma moderação prévia antes de ser publicado), para evitar qualquer coisa que possa eventualmente ser ilegal.

Redes sociais como as que existem atualmente, em que existe grande liberdade de se publicar o que se quer, mas em que de vez em quando os donos da rede apagam posts ou expulsam/suspendem comentadores seriam provavelmente impossíveis (mesmo a existência do famoso algoritmo seria problemática).

[dito de outra maneira, as redes sociais passariam, umas a ser anómicas, e outras totalitárias, sem espaço para a "ditabranda" que o Facebook ou o Twitter são atualmente]

Não digo que isso fosse necessariamente mau, mas iria provavelmente ser uma grande mudança face à ordem atual

 Sobre a neutralidade de redes sociais e afins: eu consigo imaginar o Facebook ou o Twitter a serem "neutrais" (e até tenho instalada uma extensão que "neutraliza" um pouco o Facebook, obrigando-o a mostrar os posts por ordem cronológica); já o Youtube parece-me impossível de tornar "neutral", sem passar a ser algo bastante diferente do Youtube (já que a existência de um algoritmo a recomendar vídeos é um aspeto importante do Youtube, e duvido muito que um algoritmo seja compatível com "neutralidade", no sentido de que tem que haver um critério qualquer para decidir que vídeos sugerir).

11/06/20

"E Tudo o Vento Levou"

A censura imaginária a "E tudo o vento levou" - uma entre o zilião de empresas que alugam e/ou vendem filmes deixou de o ter em catálogo (se querem um filme - ambientado no mesmo tempo e local - que consta que é mesmo quase impossível de arranjar, faria mais sentido falarem de "censura" a propósito de A Canção do Sul, p.ex.).

A censura real a "E tudo o vento levou" - um filme que era para ter entrado no domínio público em 2014 (75 anos após ter sido feito), o que significaria que qualquer pessoa poderia fazer cópias dele, exibi-lo quando e como quisesse, etc [não é que já não se possa...], continua a estar coberto por direitos de autor devido a alterações retroativas da lei dos direitos de autor (e aí nem vale o argumento que prolongar os direitos de autor incentiva os criadores - isso não funciona para obras que já foram feitas).

07/06/20

A Info Praia - contributo para a obsolescência planeada?

A aplicação Info Praia requer Android 6.0 ou superior - seria muito difícil ter feito uma aplicação que fosse compatível com as versões anteriores do Android?

Eu não percebo nada disso, mas quase que aposto que seria perfeitamente possível fazer uma app nas versões anteriores que desse essa informação (afinal, as apps da meteorologia e das marés correm nas versões antigas do Android, e duvido que uma app a informar se a praia está cheia seja muito mais complexa do que uma app a informar do estado tempo nessa praia ou a que horas a maré enche).

E ainda por cima acho que nem dá para reclamar na secção de críticas/reclamações do Google Play Store (já que só quem tenha a aplicação instalada pode escrever uma "review", logo quem não a consegue instalar por ter uma variante anterior do Android não não consegue fazer uma review a queixar-se disso).