24/01/16

Um desastre anunciado.

Marcelo Rebelo de Sousa ganhou, com facilidade, as eleições presidenciais. A esquerda, no seu conjunto,  regista uma derrota colossal. Sampaio da Nóvoa - com o apoio oficioso do PS -teve menos de metade dos votos de Marcelo. Um desastre.
Maria de Belém foi na enxurrada das subvenções vitalícias e ninguém apareceu para a salvar.
Como é da praxe, dentro da derrota registam-se sempre enormes vitórias. A do BE, que reagiu euforicamente ao resultado obtido por Marisa Matias,  e a do PCP, que, pela voz de Jerónimo de Sousa, fez uma leitura, digna dos momentos mais criativos do  "realismo fantástico", dos méritos da candidatura de Edgar Silva.
A divisão à esquerda não foi bem aceite pelo eleitorado. Uma abstenção enorme e uma derrota das esquerdas mostram que, contrariamente ao que muitos previram, esta divisão não fez a força.
O "Tempo Novo" sofre uma colossal derrota. E a sua estabilidade/continuidade fica seriamente ameaçada. O PCP começa a olhar "para isto tudo" com uma enorme desconfiança. A disparatada referência à "candidata engraçadinha e populista" é apenas  um sinal. Talvez Costa tenha encontrado neste resultado a base para um "Novo Tempo", que lhe permita gerir melhor a continuidade da relação com Bruxelas. Com Marcelo a "consensualizar". Vamos a ver.

5 comentários:

Miguel Serras Pereira disse...

Caro José Guinote,
creio que, perante as eleições presidenciais, a tarefa dos que defendem a democratização das instituições através da exigência e extensão de uma participação igualitária dos cidadãos no exercício do poder político efectivo (ostente este o rótulo "política" ou "economia") passaria por, em primeiro lugar, denunciar as soluções que passam pela aclamação de um "chefe de Estado" salvador ou outros "bons pastores" de rebanhos, combatendo a ideia de que uma república fundada na participação governante dos cidadãos deva ou possa ser presidida por um "chefe de Estado".
Dito isto, com a parcial excepção de Marisa Matias, cuja candidatura por momentos formulou as velhas reivindicações e propostas da social-democracia do pós-guerra, os candidatos que disputaram esta eleição apostaram sobretudo na despolitização de massa através da promoção de temáticas supra-confltuais. E, no fundo, como os observadores mais perspicazes fizeram notar, na perspectiva de defesa do regime (caso de Pacheco Pereira, por exemplo), a verdade é que nada houve que distinguisse substancialmente o vencedor do seu rival mais próximo ou de Maria de Belém (o que, aliás, a declaração final de Sampaio da Nóvoa deixou bem claro). É, por isso, que, ao contrário da conclusão de Marisa Matias, creio que, longe de ter sido a democracia a vencedora da eleição, foi esta, uma vez mais, a grande derrotada, uma vez que nenhuma intervenção tangível durante a campanha, através das candidaturas ou sob outras formas, pôs minimamente em causa a lógica hierárquica e antidemocrática do establishment.

Abraço

miguel(sp)

jose guinote disse...

Concordo no essencial com a tua análise meu caro Miguel. A distinção entre Marcelo e Nóvoa ou ainda mais entre Marcelo e Belém, é do domínio do superficial. Julga-se que haverá uma diferença significativa num menor apoio ao Governo numa suposta agenda anti-austeritária. Estamos no puro domínio do wishful thinking.
A declaração de Marisa Matías compreende-se no contexto da euforia provocada pelo resultado do Bloco. Embora eu não partilhe integralmente das tuas posições sobre a "estrutura do Estado" e a importância desta eleição, compreendo o que defendes. Não tenho dificuldade em concluir que a democracia não ganhou, quer porque a participação foi o que se viu, quer porque a campanha foi paupérrima - ainda que considerada apenas do ponto de vista do debate político - quer, ainda, porque nenhuma candidatura da sociedade civil teve qualquer expressão e relevância. A partidocracia e a bolha mediática estão bem e recomendam-se.

Libertário disse...

Mais uma vez, mesmo ignorado, o voto de protesto e a abstenção são os dados mais significativos destas eleições sobre que a a esquerda anti-capitalista evita falar. Quando fala usa os mesmos lugares comuns dos comentadores políticos do sistema: é a chuva ou o sol que são os responsáveis, junto com a "alienação" e o comodismo dos eleitores, em último caso são os mortos que continuam nos cadernos eleitorais…
Não deixa de ser curioso que a explicação para a vitória do grande comentador Marcelo, o peso da televisão, não seja vista como contraditória com a incapacidade dessa televisão, e dos meios de alienação de massas, na mobilização de 50% dos eleitores!
Já há muitos anos Jacques Ellul lucidamente falava da "ilusão política", só que essa ilusão cada vez é menos mobilizadora e o sistema democrático-representativo, saído das revoluções burguesas, está no momento mais baixo da sua história. Sobre isto, e sobre reais alternativas a este Sistema, poucos querem falar.

Beppe Grillo disse...


Beppe Grillo, líder do 5 Estrelas, movimento que em 2013 conseguiu entrar no Parlamento e no Senado de Itália .
Comediante e líder do Movimento 5 Estrelas, de 68 anos, tenciona agora regressar aos seus espetáculos:

"A política deve ser analisada como uma doença mental porque se baseia no nada", disse Beppe Grillo, numa entrevista hoje divulgada pelo jornal italiano 'Corriere della Sera', na qual o comediante justifica a decisão de deixar de fazer parte da vida política em Itália.

"Também os votos nos candidatos se baseiam na popularidade, na gestualidade, na simpatia. É uma representação do nada. É o nada que preenche o vazio", constatou, referindo que, por isso, prefere afastar-se para "recuperar" a sua "liberdade".

http://www.dn.pt/mundo/interior/beppe-grillo-abandona-a-politica-e-uma-como-uma-doenca-mental-4998010.html

Niet disse...

A eleição de Marcelo pode consolidar,facilitar e fortalecer o mainstream inquietante das perversas ilusões social-democratas...E não é por acaso que a tónica central do discurso de vitória do novo PR se tenha rendido a um ditirâmbico arrazoado sobre a fatalidade da colaboração de classes e do famigerado compromisso social e económico ;programa que, como assinalou António Gramsci antes do periodo negro da ofensiva nazi-fascista de Mussolini e Hitler,gera uma dinâmica inevitável de desarme e oportunismo eleitoralista colaboracionista fatal e conduzindo a um beco sem saida:" Um partido operário que ,face à ofensiva capitalista, não sabe sugerir aos seus militantes e simpatizantes senão a fatalidade da aliança com a burguesia, mesmo se faz parte do governo, não poderá que ser fraco e submisso à vontade dos outros ",in Ecrits Politiques,vol.II,1920/23. Niet