22/02/13

Horrorizados ma non troppo


Já os havia antes de 1974. Execravam a ditadura, a censura, os métodos da PIDE, a guerra colonial e outros erros do regime vigente. Mas não queriam cair na ilegalidade nem nos abusos de sinal contrário — leia-se na greve, na imprensa clandestina, no recurso à acção violenta ou insurreccional, na subversão da disciplina militar.

Em 1974 e depois, honra lhes seja, continuavam fiéis a si próprios. Tinham execrado Salazar, a destruição da "Primavera marcelista", o isolamento internacional do país, o subdesenvolvimento e o atraso portugueses, sempre tinham sido da oposição, mas não podiam aprovar o 25 de Abril, essa "violência incompatível com a afirmação do primado da liberdade", o recurso às armas para acabar com o regime e com a guerra, as greves selvagens, as comissões de trabalhadores e moradores, a quebra das cadeias de comando nos quartéis ou nas empresas e nos bairros,  todos esses métodos, em suma, que tornavam quem deles se valia igual aos defensores da ditadura, portador da culpa de atropelos mais graves do que os do regime deposto.

Hoje, sempre equidistantes e em consciência, execram, horrorizados ma non troppo, os abusos e prepotências do governo, não deixando por isso de pensar que a sua correcção e a restauração do equilíbrio e do bom senso competem às autoridades competentes do Estado de direito, e nunca, nunca, ao anarquismo, esse mal maior, que seria a generalização do exercício pelos cidadãos comuns da defesa e instituição da democracia.

6 comentários:

Joana Lopes disse...

Excelente, Miguel!

Anónimo disse...

Muito bem. Infelizmente não se deu uma PASOKização do PS. Talvez se Pedro Nuno Santos se chegasse à frente...

Libertário disse...

O facto dos políticos e comentadores do PS saírem em defesa dos Relvas, contra os manifestantes incontrolados diz tudo sobre os sistemas democrático-representativos se basearem num partido único, com diversas facções em competição, mas solidárias no essencial...

Quanto ao estalinista arrependido Vital Moreira não pára de tentar demonstrar, tal como a sua camarada Zita, como é grande a fé dos cristãos-novos.

Ana Cristina Leonardo disse...

A ouvi-los, histéricos, clamarem pela liberdade de expressão do ministro, dir-se-ia que o homem fora enviado para o frio da Sibéria!
Pacheco Pereira, com uma sensatez que talvez lhe venha da literatura, pôs o dedo na ferida e regressou ao real: o homem acobardou-se e fugiu. Porque, na realidade, ninguém o impediu de falar. É ele que já nem isso consegue.

Miguel Serras Pereira disse...

Ana,
"…ninguém o impediu de falar. É ele que já nem isso consegue". Hum, mas achas que conseguiu alguma vez?

miguel(sp)

David da Bernarda disse...

Muita sorte tem os poderosos enquanto só lhes cantam uma música ou não os deixarem falar...
Pior vai ser se chegarmos ao momento em que perdem a cabeça como já conteceu em muitas revoltas e revoluções ao longo da história. Por mim não lamentarei, nem irei ao funeral.