A propósito do Congresso do Livre e da chave que Rui Tavares propõe para a uma "esquerda a governar junta", recordo aqui o que o segundo ainda recentemente escreveu, falando da necessidade de superar uma situação em que "metade da esquerda só quer goveernar", enquanto a outra metade "só quer não governar", acrescentando que a solução passa por uma esquerda que "queira saber porquê governar e sobretudo para quê governar".
O "porquê" e o "para quê" estão muito bem, mas o Rui Tavares esqueceu-se do "como". Como parece ter esquecido, na circunstância, que os grandes objectivos históricos da "esquerda" e da própria democracia requerem igual liberdade para todos, o que significa que requerem igualmente, para todos os cidadãos, igualdade de poder. Se se tivesse lembrado daquilo que esqueceu, o Rui teria de dizer que o "como" de um governo democrático implica não a eleição de um governo da "esquerda junta" maioritária, mas o exercício pelos cidadãos do poder de governar — ou seja, a sua participação igualitária nas deliberações e decisões dos "porquês" e "para quês" comuns, enquanto condição da igual liberdade de todos.
05/10/14
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3 comentários:
Acho que essa avaliação só pode ser feita dependendo do programa do LIVRE e do quanto ele for respeitado ou comprometido.
Ele está a ser feito neste momento, e estou certo que vai defender alterações no sentido de aumentar a participação popular nas decisões colectivas nacionais (democratizando ILCs e referendos populares, quiçá podendo fazer o análogo de uma "moção de censura" por esta via, procurando fortalecer o sector cooperativo e mutualista, removendo as actuais restrições a que se crie uma "banca ética" em Portugal, etc..) e europeias (elegendo representantes portugueses no Conselho que hoje são nomeados pelo Governo, etc.).
Se uma esquerda junta aumentar o poder dos cidadãos, então o "como" não foi esquecido. Pelo contrário.
A ver vamos como fica o programa do LIVRE.
Caro João Vasco,
a ver vamos, claro. As minhas objecções, todavia, não resultam menos da omissão do "como", ou da "via", do que dos indícios de que o "como" privilegiado, na prática, será o eleitoral, e a "via" a da "representação". A meu ver uma plataforma que vise a democratização efectiva das relações de poder governantes deverá ter por critério não a "esquerda junta", mas o desenvolvimento do exercícoo do poder político (quer dizer, também económico, etc.) pelos cidadãos. Se é nessa via que o Livre aposta, tanto melhor. Só que terá de explicitá-lo em termos mais claros do que até agora tem feito.
Um abraço
miguel(sp)
Felizmente não precisamos de esperar pelo programa de um partido para sabermos como pretende governar caso ganhe eleições, porque a sua organização interna (com dirigentes e dirigidos), actuação política (a via mediática e eleitoralista em vez da implantação social de baixo para cima) e aquilo a que se propõe (tomar o poder numa democracia representativa e capitalista) já nos dizem o que precisamos saber. Tudo o que vier a seguir à tomada do poder só pode ser para piorar o que já existia, porque começam as dificuldades de governação, a corrupção pelo poder e a necessidade imperiosa da manutenção da ordem política, económica e social.
De resto, internacionalmente tem havido uma onda de surgimento de partidos a acenar com mecanismos supostamente mais democráticos mas que não mudam nada no equilíbrio de forças, porque os dirigentes partidários não entenderam ou não lhes interessa tocar realmente nesse equilíbrio e colocar em causa a forma como o poder é exercído através da hierarquização de todos os aspectos da vida social, dos média, da economia, da educação, etc. Por seu lado, os partidos do poder também vão aderindo a essa onda democratizante, como vimos com as primárias do PS, em que não descortino diferenças no que pretendem atingir em relação a ILCs, referendos e afins.
cumprimentos,
Luis Ferreira
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