23/08/14

Nota sobre o "Dossiê: Lutas contra a Austeridade" proposto pelo Passa Palavra

São em grande parte os mesmos os que propõem como alternativa ao austeritarismo da oligarquia governante da UE uma (neo- e forçosamente mais musculada) austeridade (boa porque nacional e soberana — ou boa porque patrioticamente solidária em termos geoestratégicos de potências emergentes ou nem tanto, contanto que anti-"ocidentais") e os que procuram canalizar e instrumentalizar o descontentamento e a revolta dos cidadãos política e economicamente expropriados em benefício de uma solução de "governo à esquerda", que deixa intacta ou consolida e revigora a lei classista por excelência da distinção estrutural e permanente entre governantes e governados e da redução da cidadania comum à versão passiva que o monopólio da representação pelos legítimos superiores e seu aparelhos partidários hierarquizados implica sempre.  Os contornos e as premissas da solução podem variar muito entre o Livre e o PCP ou o seu satelitizado BE, mas a conclusão é sempre a mesma: os subordinados que elejam ou imponham chefes e comandos competentes, e estes resolverão os problemas que os subordinados, por definição, não têm por destino resolver eles próprios.

De momento, estas considerações têm o propósito simples de chamar a atenção para o Dossiê: Lutas contra a Austeridade organizado pelo Passa Palavra, recolhendo vários textos que difundiu nestes últimos anos. A colectânea, cuja actualidade é a cada dia que passa, e até ver, mais premente, mostra, de passagem, como o cosmopolitismo democrático do projecto de "uma terra sem amos" é indissoluvelmente anti-nacionalista e anti-soberanista, por um lado, e anti-austeritária, por outro — na medida exacta em que o único "governo à esquerda" que lhe interessa é o que sejamos capazes de construir através do exercício governante dos cidadãos comuns e em resposta aos seus problemas comuns.

1 comentários:

António Geraldo Dias disse...

Nação e soberania são questões que aparecem aqui ligadas a outras - austeridade,governo de esquerda-de forma quase automática a solidificar um solo comum anti-oligárquico que sublinha a necessidade de uma decidida acção cidadã,parece-me haver um desequilíbrio arqueológico entre o abalo produzido e o que se constrói.