03/11/14

Venerandas instituições que são a base da sociedade


Têm alguns espíritos ávidos de inovação, ainda que no fundo sinceramente afeiçoados aos princípios conservadores, sustentado que o sistema da Sebenta (como na sua jovial linguagem lhe chama a mocidade estudiosa) é antiquado. Eu considero, porém, a Sebenta como a mais admirável disciplina para os espíritos moços. O estudante, habituando-se, durante cinco anos, a decorar todas as noites, palavra por palavra, parágrafos que há quarenta anos permanecem imutáveis, sem os criticar, sem os comentar, ganha o hábito salutar de aceitar sem discussão e com obediência as ideias preconcebidas, os princípios adoptados, os dogmas provados, as instituições reconhecidas. Perde a funesta tendência – que tanto mal produz – de querer indagar a razão das coisas, examinar a verdade dos factos; perde, enfim, o hábito deplorável de exercer o livre-exame, que não serve senão para ir fazer um processo científico a venerandas instituições, que são a base da sociedade. O livre-exame é o princípio da revolução. A ordem o que é? – A aceitação das ideias adoptadas. Se se acostuma a mocidade a não receber nenhuma ideia dos seus mestres sem verificar se é exacta, corre-se o perigo de a ver, mais tarde, não aceitar nenhuma instituição do seu país sem se certificar se é justa. Teríamos então o espírito da revolução, que termina pelas catástrofes sociais!
Hoje, destruído o regime absoluto, temos a feliz certeza de que a Carta liberal é justa, é sábia, é útil, é sã. Que necessidade há de a examinar, discutir, verificar, criticar, comparar, pôr em dúvida? O hábito de decorar a Sebenta produz mais tarde o hábito de aceitar a Carta. A Sebenta é a pedra angular da Carta! O Bacharel é o gérmen do.Constitucional.
Eça de Queiroz, O Conde de Abralho

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