29/10/12

Para continuar o debate sobre "os perigos da nação em cólera": o Passa Palavra contra "lugares-comuns e ideias feitas"

Neste blogue têm vindo a ser discutidas nas últimas semanas algumas questões fundamentais de que se ocupa mais um texto colectivo — A propósito de lugares-comuns e ideias feitas — que o Passa Palavra acaba de publicar. A sua leitura contribuirá decerto para precisar o debate. E mostra a meu ver como a reiteração de posições soberanistas e patrióticas leva a substituir a "questão nacional" à "questão social", a "independência nacional" à "emancipação dos trabalhadores", a "liberdade do Estado" (que Marx considerava inversamente proporcional à dos cidadãos) à do autogoverno dos iguais…

Aqui fica o link e um excerto do texto do Passa Palavra:

E como a saída da zona euro e a adopção de uma moeda de pechisbeque traria condições de vida ainda piores do que as que já sofremos, provocaria uma considerável desilusão dos trabalhadores, que tinham esperado salvar-se ou pelo menos emergir e ver-se-iam mais afundados. Daqui resultaria muito provavelmente uma agudização das reivindicações e das lutas, numa situação em que os patrões e os governantes teriam ainda menos margem de manobra do que hoje. A resposta só poderia ser o agravamento da repressão e a tentativa de pôr fim às greves sob o pretexto de que precisamos de defender a economia nacional. Os mais velhos de entre nós já ouviram esta música.

Ora, como escreveu Nuno Cardoso da Silva, um comentador que neste contexto citamos por excepção, já que destoa das futilidades e dos delírios, «não precisamos efectivamente de nenhum capitalismo de Estado para resolver os problemas do capitalismo privado».

Nada disto convence os comentadores histéricos, que repetem em todos os tons Não importa o que virá depois. Mas isto significa que se derruba a actual situação sem saber em benefício de quem. O Que se lixe! tem uma função exclusiva de ocultamento político.
(…)
Há quem nos acuse de «prostração perante a grande burguesia europeia e a oligarquia financeira europeia». (…) Aliás, alguns comentadores mais histéricos postulam a equivalência entre o internacionalismo do Passa Palalvra e o imperialismo dos Estados Unidos ou da Alemanha.
Mas aqueles que «por anticolonialismo» defendem «a saída imediata de Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha da União Europeia» será que há alguns anos atrás defenderam também que saíssem imediatamente da União Soviética a Ucrânia, a Bielo-Rússia, a Geórgia, a Arménia, o Azerbeijão, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, o Uzbequistão, o Turquemenistão e desculpem-nos os esquecimentos? Ou será que a balcanização, que é uma catástrofe visível no Leste da Europa, se transformará numa benção a Ocidente?



Será que imaginam que, saindo da zona euro, Portugal poria em causa os centros imperialistas? Ora, a economia portuguesa representa uma parcela ínfima do Produto Interno Bruto da zona euro e não é com estas migalhas que os centros capitalistas europeus enriquecem, mas com a exploração dos seus próprios trabalhadores.
(…)
[A] estes comentadores (…) [que] falam só de nações (…) nem lhes passa pela cabeça analisar as contradições sociais nos centros mais produtivos da União Europeia e confundem os «trabalhadores do centro e norte ricos da Europa» entre o saco sem fundo dos defensores da chanceler Merkel. Um dos comentadores evocou mesmo «uma União Europeia, comandada sobretudo pelos capitalistas do Norte e fortemente apoiada pela classe trabalhadora bem instalada nesses países e que não sente a crise». Voltámos assim à oposição entre nações proletárias e nações plutocráticas, típica da panóplia de conceitos dos fascismos.

Depois acham que não temos razão para estar preocupados?



3 comentários:

Zé_dopipo disse...

Acha mesmo que «a saída imediata de Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha da União Europeia» é o mesmo que da União Soviética saírem «a Ucrânia, a Bielo-Rússia, a Geórgia, a Arménia, o Azerbeijão, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, o Uzbequistão, o Turquemenistão e desculpem-nos os esquecimentos?»
Não será que uma comparação destas inquina a discussão?

Cumps

Miguel Serras Pereira disse...

Zé Lucas,
o texto não é meu, mas, embora ignore o que lhe responderia o colectivo do Passa Palavra, posso dizer-lhe o que penso.
Claro que estamos a falar de coisas diferentes. Mas é de supor que a balcanização resultante de uma eventual desagregação da UE e a situação interna dos países "desagregados" não seriam muito animadoras.

saudações democráticas

msp

Anónimo disse...

Não há animação possível. As forças do mercado estão para impor a regressão social e recompensar perdas dos fundos tóxicos. Em 2008, eram uns bandidos! Em quatro anos tornaram-se heróis. O passe de magica foi a decisão politica-intitucional de colocar os povos a pagar essas perdas.
O povo necessitado e os milhões que vão passar progressivamente passsar à miséria que se amanhem. Isto tudo, até que do estalo se passe à barbárie. Na verdade, causas e responsáveis continuam a beneficiar de grande compreensão! Será que existe consciência disso?