12/01/15

Os limites da liberdade de expressão

Não, não estou a falar das caricaturas do Charlie-Hebdo, que estão claramente dentro desses limites.

Refiro-me aos imãs radicais (os casos mais falados são os do Reino Unido, mas provavelmente existirão em vários dos países europeus com população muçulmanas relevantes); até que ponto a liberdade de expressão cobre o direito de defender a "guerra santa" contra o Ocidente e a implantação da sharia?

Há aqui uma grande área cinzenta, acerca da fronteira entre o que é liberdade de expressão e o que é crime - p.ex., toda a gente considerará que, quando um chefe da Mafia diz aos seus capangas para matar alguém, não está simplesmente a exercitar uma "liberdade de expressão", está a cometer um crime e é tão ou mais culpado do assassínio como os executores materiais; no outro extremo, quase toda a gente considerará que um livro fazendo a apologia da insurreição operária estará coberto pela liberdade de expressão (mesmo que lá dentRo se faça a apologia de atos ilegais ou violentos). Mas qual deverá ser exatamente a linha? E de que lado da linha estão os tais imãs radicais?

Eu, à partida, tendo a achar que, por mais repugnantes que as suas ideias sejam, eles têm o direito de as defender (tal como acho que muita da moderna legislação contra "discurso de ódio" entra por caminhos perigosos); mas, por outro lado, pode ser argumentado que não há uma diferença assim tão grande entre um imã extremista numa mesquita improvisada a dizer aos fiéis para se juntarem à jihad e o chefe de uma célula terrorista a distribuir tarefas - "mata este", "põe uma bomba aqui", etc. - aos seus "combatentes" numa reunião.

3 comentários:

Carlos Duarte disse...

Existe, de facto, um fronteira algo indistinta entre a liberdade de expressão e o incitamento ao crime (entendendo o crime como uma limitação de liberdade de terceiros, em termos puramente formais).

A ideia que eu tenho do limite passa pela personalização da mensagem. Se alguém disser - e vamos pegar num tema sensível e muito debatido, o anti-semitismo, por ser mais fácil de criar empatia com a situação - que os Judeus são uma praga e que alguém deveria acabar com eles, não considero crime. Se a mesma pessoa disser para outrém (discurso, carta, etc) que esse outrém deveria acabar com os Judeus, então é criminoso, pois é uma incitação ao ódio.

Outro exemplo, com racismo. Chamar a alguém "preto" não deveria ser crime (salvo queixa do ofendido, em processo cívil). Dizer que estes deveriam "regressar para África" também não. Dizer a alguém que os deve fazer regressar a África, recorrendo à violência para tal, já sim.

Quando a mensagem deixa de ser uma ideia (por mais repugnante que seja) e passar a a configurar uma acção, é aí que a linha é ultrapassada (IMO).

joão viegas disse...

Ola,

Debate eterno, porque a unica resposta racional que conheço (dada alias no texto do post) não permite acalmar a nossa sede de soluções absolutas. Ei-la :

Nada que vise principalmente a debater ideias deve ser proibido, nem sequer a provocação que procura comover para chamar a atenção para o debate. Mas tudo o que ultrapasse a intenção clara de debater, e que se carcaterize ja como gesto, atitude ou apelo principalmente orientado no sentido de incentivar a acção, merece ser examinado por aquilo que é, ou seja como mais do que a simples expressão de uma ideia.

Raiz da dificuldade (e razão pela qual ela não é de facil solução) : não falamos exclusivamente, nem talvez principalmente, para expressar ideias.

Não sei se o que exponho acima consegue dar conta de todas as dificuldades, mas penso que ajuda bastante...

Abraços a todos

Libertário disse...

Escrever ou expressar publicamente opiniões, independentemente do que é dito, tem que estar sempre protegido pela liberdade. Isto vale para o fundamentalismo islâmico, cristão judeu; vale para anarquistas, estalinistas, fascistas, racistas.

A ideia de que se pode começar a escolher (e são os Estados que definem sempre isso) quem pode, ou não pode, expressar as suas opiniões por escrito ou oralmente é o caminho do autoritarismo e totalitarismo.

Concordo com Chomsky quando defendeu o direito de os revisionistas e anti-semitas de se expressarem, não há escolhas políticas, morais e éticas, que nos permitam definir limites neste campo. Concordemos ou não com o que é dito. Temos de defender a liberdade de se publicar a Bíblia, o Corão, Bakunin, Lenin ou Hitler e Salazar e Faurisson. Todos sabemos que há pessoas presas em todo o mundo, incluindo na França e Alemanha, por "delito de opinião".
Esta discussão, como sabemos já existiu no passado quando se implantaram leis anti-anarquistas, anti-comunistas ou anti-terroristas nos anos 70 na Europa.