10/10/17

O pecado original da esquerda à esquerda do PS - I

Depois do pequeno cataclismo eleitoral que abanou os alicerces da Geringonça, sucederam-se as declarações políticas mais ou menos imprudentes, para dizer o mínimo.
A turbulência deslocou-se para o interior da CDU, ou melhor dizendo, do PCP. Confrontado com a maior perda de autarquias num só acto eleitoral, o PCP começou por reagir de forma moderada. O apoio ao Governo,  esclareceu desde logo Jerónimo de Sousa, manter-se-ia enquanto as políticas que são fundamentais para o PCP se mantivessem. No entanto, uma certeza o secretário-geral do PCP deixou: não haveria qualquer forma de Geringonça, a nível autárquico.

Na semana seguinte o PCP realizou uma série de comícios e as declarações foram-se sucedendo. As mais inesperadas elegeram o PS e o BE como principais responsáveis pela perdas da CDU. Jerónimo de Sousa afirmou mesmo que

 "Vimos uma intervenção do PS a desenvolver uma ação a partir dos seus candidatos e alguns dirigentes partidários, particularmente concentrada em municípios de maioria da CDU, de ataque à gestão da CDU baseada em argumentos falsos e muitas vezes ofensivos"  

para de seguida, referindo-se ao BE afirmar  que 

"a opção do BE de fazer da redução da influência da CDU o seu objetivo principal, não olhando a meios para, por via da falsificação e mesmo da calúnia, denegrir a CDU e o poder local"

Na verdade, nove em dez autarquias, que os comunistas perderam,  foram conquistadas pelo PS à CDU. Entre essas  destaca-se Almada como  a mais dificil de aceitar, até porque a candidatura socialista, liderada por Inês Medeiros, parecia ser apenas para cumprir calendário. A candidata, agora eleita, não se cansou de mostrar a sua surpresa, louve-se a sinceridade. Na verdade o PS não subiu assim tanto. Limitou-se a conquistar um vereador e beneficiou da subida do BE que elegeu um vereador pela primeira vez. A CDU passou de maioria absoluta - com 6 vereadores - para a segunda força política do concelho, atrás do PS. Haverá uma pequena consolação para a CDU: PS e BE, juntos, não conseguem a maioria absoluta.

O outro resultado que terá azedado ainda mais as relações com o BE, é o de Lisboa. Com o vereador do BE, Medina obtêm a maioria absoluta. Os dois vereadores da CDU são dispensáveis para que a Geringonça possa funcionar, ainda que uma Geringonça com dois apoios, que pode testar a solução pós-eleições legislativas de 2019. Medina, no entanto, já mostrou disponibilidade para partilhar as responsabilidades com a CDU, o que faz todo o sentido politicamente.


A CDU encontra-se prisioneira de um erro político que cometeu na fase inicial da negociação do apoio ao Governo: ter-se recusado a integrar o Executivo. O mesmo erro cometeu o BE, mas as consequências neste caso, só serão visíveis nas próximas eleições legislativas, dada a falta de expressão autárquica do partido.

Como escrevi então o alíbi para cometer esse erro, foi a União Europeia. Um péssimo alíbi. Integrando o Governo, a CDU e o BE, assumiam a responsabilidade plena pelas políticas, e reforçavam aqueles que, no Governo e fora dele, lutam pelas alterações da política europeia, que ambos os partidos também defendem. A opção tomada permitiu ao PS reforçar-se, como as sucessivas sondagens mostraram, e sabemos agora que não eram apenas sondagens. Mesmo velhos bastiões comunistas foam sensíveis ao canto dos socialistas, de nada valendo ao PCP clamar que quem garantiu o aumento das reformas foi o PCP. As pessoas "sabem" que foi o Governo, pouco lhes interessando quem os apoiou no Parlamento, ou que exigiu essas mudanças nas negociações. O PCP deveria saber que o povo injustiçado é justo.

O PS está, por esta altura, à beira da maioria absoluta. No limite bastar-lhe-á negociar com o BE para governar mais quatro anos. Tudo dependerá do caminho que o PSD decidir seguir. Depois de ter virado brutalmente à direita, com Passos, o PSD foi incapaz de mudar de rumo. Esse tempo terá cessado na declaração de não recandidatura do líder do PSD. Há um candidato - Rui Rio - que defende uma viragem à esquerda, para ocupar o famigerado centro, de que os socialistas não abdicaram. pese embora a Geringonça. Há os jovens turcos, que Passos ajudou a crescer, que não desistem de conduzir o partido para a um patamar de irrelevância política, apoiados num discurso supostamente liberal mas que na verdade é, em muitos casos, apenas e só libertariano.
Sobra a líder do CDS, que conseguiu afastar o fantasma de Portas e mostrou que, em hipocrisia política, não fica nada a dever ao saudoso líder. A campanha por Lisboa foi um fartote de promessas, todas elas apenas possíveis com um forte aumento da despesa pública e o aumento dos impostos. Para quem disse o que disse do actual Governo. Para quem fez o que fez no anterior Governo, vir defender obras públicas a torto e a direito e habitação em Lisboa para todos já prámanhã, é preciso ter muita lata.



1 comentários:

Leo disse...

Podera suceder que a CDU caia porque:
a) Os seus eleitores naturais estao a desaparecer, e os eleitores mais jovens e mais a esquerda, se reveem mais no BE
b) o BE nao tem estruturas autarquicas solidas

Com a+b, o PS torna-se a unica alternativa viavel.

Isto e, se calhar o problema da CDU e mais estrutural e ideologico, do que relativo a geringonca, afinal a CDU tem lentamente vindo a perder Camaras e votos...