Caros amigos,
O Público, não só não publicou o meu pequeno texto (pelo menos até hoje) como arranjou espaço para um terceiro artigo elogioso de Veiga Simão, a duas colunas com foto, no verso da última página, que também nada diz sobre as zonas mais sombrias da sua actuação em vida.
Na realidade, não se trata da pessoa em si mas do que representa como exercício do poder e reescrita do passado.
Não quis invocar as minhas memórias pessoais mas, quando Veiga Simão era Ministro da Educação, em 70, 71 e 72, eu era estudante da Faculdade de Medicina e Dirigente da Associação Académica de Coimbra (AAC). Nessa condição, fui, com dezenas de outros colegas, preso em Caxias e torturado na sede da Pide e posteriormente (1972) julgado no Tribunal Plenário do Porto.
Nesse julgamento, houve cerca de 120 testemunhas de defesa, entre elas professores da Universidade de Coimbra e alguns dos mais brilhantes intelectuais, escritores, médicos, advogados e economistas do país.
Veiga Simão que tinha dado cobertura à brutal invasão da AAC pela polícia e ao seu imediato encerramento (em 1971) abriu as Faculdades, sob a sua jurisdição, à Pide e à Polícia de Choque que aí fizeram cargas e prisões, espancando estudantes e professores nos corredores.
Dos sete estudantes que foram julgados no Tribunal Plenário, um acabou por se suicidar como sequela da tortura (depois de uma primeira tentativa feita ainda em Caxias tendo estado em coma, nos cuidados intensivos, durante mais de uma semana) e uma outra querida companheira ficou com sequelas para toda a vida.
Veiga Simão, nunca mostrou qualquer arrependimento nem teve nenhuma palavra de desculpa. O 25 de Abril foi também para as pessoas mudarem (mas não demasiado depressa e com amnésias selectivas). Não podemos deixar que reescrevam a História e que apaguem a memória. E é isso que está a acontecer.
Obrigado pelo apoio
Abraço amigo
Jorge Seabra
PS - Faz amanhã, 9 de Maio, 43 anos que uma manifestação dos estudantes de Coimbra frente ao Teatro Gil Vicente (1970), foi reprimida a tiro. Um estudante, Fernando Seiça, foi alvejado à queima roupa , esteve à beira da morte e perdeu o baço e o rim. As paredes e vidros da Associação ficaram crivadas de balas - numas escadas as marcas estavam ao nível da cabeça - o que prova que só por sorte não houve mais vítimas.
Aqui, Maria de Lourdes Rodrigues confirma que não há limites para a infâmia:
Hoje, gostava de lembrar Veiga Simão como Ministro da Educação. Assumiu o cargo entre 1970 e 1974. Estávamos no final do Estado Novo e foi nesse contexto político improvável que Veiga Simão se afirmou como reformador progressista. Governou a educação com sentido de urgência e a noção de que não havia tempo a perder.
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