Finalmente, António Costa foi indicado/indigitado para liderar o próximo Governo e, neste momento, são já conhecidos os ministros que dele farão parte.
A Assembleia da República, que teve já oportunidade de aprovar importante legislação com base na maioria de esquerda aí existente, irá aprovar o programa do Governo e o Orçamento para 2016.
Este novo Governo é um Governo do PS, como aqui referi, apoiado pela esquerda parlamentar. Não é um Governo de coligação dos partidos que na AR asseguram uma maioria de esquerda.
A sua próxima tomada de posse põe um ponto final numa das mais antigas impossibilidades da política portuguesa: os partidos à esquerda do PS não integram o arco da governação. Mas, o acordo não foi capaz de acabar com outra impossibilidade tão velha como a primeira: os partidos à esquerda do PS não integram os Governos. Mesmo aqueles que apoiam politicamente, sabemo-lo agora.
Parece-me mal a permanência desta impossibilidade. Parece-me ainda pior, porque não duvido que isso resulta da mais difícil de ultrapassar de todas as barreiras: aquelas que nós colocamos a nós próprios. Ora, não precisava de ler a seguinte frase da deputada Mariana Mortágua para saber que os partidos à esquerda não aceitaram integrar o Governo.
"(...)Aquilo que permite um acordo com estas características, mas não permite uma coligação de Governo diz respeito àquilo que nos diferencia. Estou a falar das questões europeias, do Tratado Orçamental, da dívida(...)"
Esta frase consagra a impossibilidade de o BE - o PCP é mais imprevisível - participar num Governo, a menos que seja o "seu Governo", ou um Governo liderado pelo PCP, porque não se percebe outra forma de ultrapassar estes "constrangimentos". Parece-me que a opção mais inteligente seria integrar um Governo, o actual, trabalhando para a correção destes instrumentos de controlo orçamental que a nível Europeu determinam muito do que se faz internamente. Embora o constrangimento europeu implique muitas e diferentes "lutas" que importará travar. Há aqui uma clara demissão que aparece disfarçada de fidelidade aos princípios ou de intransigência.
Há ao mesmo tempo uma ilusão política grave. Dá-se a entender que há duas dimensões separadas na governação: a europeia e a nacional. Um erro político grave, que representa uma cedência àqueles que dentro do BE digeriram com dificuldades o acordo e desde sempre se opuseram à participação no Governo.
As consequências prácticas da permanência desta impossibilidade são várias. Em primeiro lugar quer isto dizer que o acordo conseguido se organiza em torno de um programa mínimo e que a forma como a governação se irá desenrolar dependerá, exclusivamente, da forma como o PS irá gerir as relações com os seus apoiantes e com as restantes entidades que, nacional e internacionalmente, interferem com a Governação. O que significa que se António Costa quiser conferir um teor mais centrista à Governação, apesar do rigoroso cumprimento do Programa Mínimo, isso não será impedido pelos que suportam o Governo a nível parlamentar.
Como refere a deputada bloquista na entrevista já aqui citada :Uma solução contra o empobrecimento é muito importante. Legitima, por si só, o acordo. Mas, é uma solução pobre, já que ignora as restantes dimensões da política e da acção governativa. Ora, há muitas áreas em que a participação da esquerda bloquista e comunista poderia trazer vantagens ao Governo e à governação. Um reforço da transparência, um combate ao tráfico de influências e à corrupção. Uma despartidirização da máquina e do aparelho de Estado. Uma gestão mais transparente do Quadro Comunitário. Um maior controlo dos fundos comunitários investidos, com combate à corrupção que se organiza à sua sombra. Uma revisão da Contratação Pública, eliminando as novas formas de promoção da corrupção e do nepotismo. Essas vantagens -resultantes da participação directa no Governo - não são substituíveis por Grupos de Trabalho, por muito que os temas a tratar sejam relevantes e devam ser discutidos. Mas, sinceramente, é necessário fazer um grupo de trabalho para analisar as questões da Política de Habitação? E será possível continuar a ignorar uma abordagem da política de ordenamento do território, que ignore a política de solos e de habitação e que ignore uma política das cidades ? Pelos vistos sim, embora isso vá ser estudado.
Bom, estas criticas não são apagadas pela existência de um Governo que coloque um ponto final nos aspectos mais nefastos da austeridade e acabe com um dos Governos mais sinistros da democracia. Mas esperemos pelo programa e pelo Orçamento para vermos melhor o que aí vem.
Há pelo menos uma sensação de alívio na sociedade e o renascer da convicção de que a esperança é possível, outra vez. A TINA recolheu aos bastidores de onde nunca devia ter saído. Saiu de cena.
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