Jeremy Corbyn reforçou a sua liderança e derrotou os seus opositores internos, liderados por Owen Smith, que constituem a maioria do grupo parlamentar. Numa eleição em que votaram mais de meio-milhão de pessoas, obteve 61,8 % dos votos, cima dos 59,5% que obtivera em 2015 quando da sua ascensão à liderança do Labour. Caiu assim por terra a primeira fase de sabotagem da sua liderança, desencadeada pelos deputados e pela direcção executiva da partido, logo após a derrota no referendo do Brexit.
Nesta disputa utilizaram-se todos os golpes baixos, inimagináveis na politica partidária, como fomos referindo em sucessivos posts. Churchill nunca terá sido tão lembrado, como agora, a propósito da correcção que fez a um jovem deputado do seu partido que lhe perguntara, apontando para a bancada dos trabalhistas: "então além sentam-se os nossos inimigos?". Churchill, como se sabe, corrigiu-o esclarecendo-o: "não além sentam-se os nossos adversários, os nossos inimigos sentam-se aqui do nosso lado".
Tentaram em primeiro lugar evitar que Corbyn pudesse candidatar-se às eleições, ele que era o líder do partido, eleito numas democráticas e concorridas eleições internas, que ninguém questionara. Essa primeira tentativa falhou. Seguiu-se a rábula de evitar que grande parte dos apoiantes de Corbyn pudessem votar. O NEC criou a fórmula de que os militantes inscritos depois de Janeiro não poderiam votar. Essa situação foi parar a Tribunal e, depois de ter sido derrotada numa primeira instância, esta posição foi validada pelo Tribunal de Recurso. Cerca de 130 mil militantes ficaram impedidos de votar (aqui).
O problema é que sob a liderança de Corbyn o partido tornou-se o maior partido inglês, um dos maiores partidos políticos da Europa, com um número crescente de militantes, e uma adesão popular às suas iniciativas, bem evidenciada pela campanha do agora reconfirmado líder. Esse facto permite-lhe não só ganhar qualquer eleição interna, como reforçar a sua possibilidade de conduzir o partido ao Governo do país.
A candidatura de Owen, ou de qualquer um dos opositores parlamentares, que são muitos, sabendo que seria muito impopular criticar as orientações politicas conferidas por Corbyn ao partido, apostaram todas as cartas numa suposta inelegibilidade do líder. Muitos artigos de opinião, muitas intervenções, os jornais matraqeando esta tecla, dia após dia, não deram resultado. Os militantes do Labour querem Corbyn, acreditam em Corbyn e nas suas ideias. Porque será que isso acontece?
Em primeiro lugar Corbyn defende uma politica construída pelas pessoas, a começar pelos militantes e pelos simpatizantes. Defende a unidade mas construída a partir de um funcionamento democrático do partido. Não haverá os que decidem e os que votam. A construção da politica é uma tarefa de todos e um direito e um dever de todos. AS pessoas, mostra-nos o que se passou no Labour ao longo do último ano, estão ávidas da politica, da participação, querem mais democracia e melhor democracia. Estavam saturadas de austeridade sem futuro.
Como foi possível ter eleito tão perigoso esquerdista, um tipo que atreve a pensar uma coisa destas -alguns chamam-lhe trotskista, embora esquerdista seja consensual - depois de Tony Blair ter dado o seu contributo insuperável para conduzir o Labour onde Corbyn o encontrou: responsavelmente paralisado na oposição amorfa e inconsequente. Um partido que em cada dia de conformismo homenageava Blair, o fundador da terceira via, que recorreu à despolitização da vida partidária e do dia a dia dos cidadãos, sendo um dos mais destacados coveiros da social-democracia europeia. O que Blair fez foi terraplanar o caminho para que a velha social-democracia sucumbisse e o neoliberalismo pudesse reinar durante décadas, destruindo os alicerces do Estado Social. Foi muito bem sucedido nessa tarefa. Mas não foi capaz de acabar o trabalho. Corbyn é a prova disso.
Em segundo lugar o Reino Unido tornou-se um dos países mais desiguais do planeta. Essa desigualdade é sentida pela maioria dos cidadãos com os salários cada vez mais baixos e o trabalho cada vez mais precário. A omnipresença do Mercado na economia em detrimento do Estado fazem-se sentir de forma impiedosa para a generalidade dos cidadãos em sectores como a Educação, a Habitação, a Saúde e os transportes.
A desigualdade cresceu de forma chocante. Corbyn elegeu o combate à desigualdade como a questão central. Defende a nacionalização de sectores, como os transportes, particularmente o ferroviário, e o sector da energia, que excluem os cidadãos do acesso à mobilidade urbana e lhes impõem o pagamento de faustosas rendas aos concessionários. Defende uma politica de investimento público na industria, em sectores em que ocorreu uma forte deslocalização com comunidades severamente tocadas pelo desemprego. Defende uma politica pública da habitação. Defende uma nova economia com o upgrade tecnológico, as novas energias, a inovação, ao serviço do interesse comum. Para quem o cataloga de esquerdista, por ignorância e sectarismo, seria melhor dedicarem um pouco de tempo ao estudo do que está a acontecer no Labour. Esta é talvez a mais importante mudança politica em curso na Europa. Como referiu Ken Loach, num vídeo promocional da candidatura de Corbyn: ‘There is something extraordinary happening in politics.
24/09/16
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