Sobre as nossas cabeças, aqui mesmo, a corrosão e esvaziamento — progressivos, mas persistentes e até ver sem reversão significativa a partir pelo menos de meados da década de 1970 — das liberdades políticas e dos direitos sociais conquistados por lutas seculares dos trabalhadores e movimentos radicais configuram a ameaça de sofrermos, a prazo e fatia após fatia, condições como as que sofrem já os ciganos em França, os palestinianos no Médio Oriente ou o povo iraniano sob a ditadura "islâmica" de uma oligarquia burocrático-clerical implacável. Literalmente, por muito que nos seja difícil concebê-lo, somos todos potenciais ciganos deportados, todos potenciais iranianos ou sauditas sentenciados à lapidação, à forca ou à mutilação legal, todos potenciais palestinianos sem terra ou, se se quiser também, potenciais judeus deste ou daquele ghetto reinstaurado. É por isso que a nossa solidariedade com os súbditos do piedoso Führer de Teerão, com os sectores da população que Sarkozy deporta, com os palestinianos que vêem a sua cidadania brutalmente esmagada pelo governo de Israel, com os precários e suspeitos por definição no bairro ao lado ou quase ao lado dos condomínios entremeados de não-lugares estratégicos que humilham e carcomem o que resta de espaço público - essa nossa solidariedade deve ser assumida, não só como dever de assistência em situação de perigo, mas também, ou talvez sobretudo, como legítima defesa e vontade de democracia.
Por outras palavras, como aqui escreveu há pouco o Zé Neves: não se trata (…) de lutar "por quem" vai ser lapidado. Mas de lutar ao lado de quem vai ser lapidado. A distância física, nesse sentido, só o é porque há uma filtragem nacional que a assinala. E essa filtragem, que não deve ser ignorada, não pode, porém, ser um critério táctico. Devemos agir como se não existissem nações (até porque sabemos que elas existem) e como se a lapidação que acontece no Irão fosse uma lapidação que acontece no Irão como poderia acontecer em qualquer outro lado. Ou seja, o combate é o mesmo contra os campos de trabalho e a legislação laboral penitenciária dos mandarins vermelhos da "sociedade harmoniosa" do PC chinês, contra a ditadura religiosa e sexista da oligarquia iraniana, contra os expropriadores dos palestinianos que governam Israel ou o regime policial-criminoso que se instalou na Rússia "liberalizada", etc., etc., e contra os que localmente — no sentido lato: o bloco ocidental — não só combatem todas as tentativas de democratização da ordem política instituída, como visam reformar autoritariamente os actuais regimes em benefício do punhado dos oligarcas de topo da política e da economia governantes.
27/08/10
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2 comentários:
Houvesse mais gente capaz de olhar para o seu lado das trincheiras e descobrir lá monstros iguais aos do inimigo...
Em termos de Médio Oriente, falta referir os trabalhadores migrantes na Arábia (Saudita, Emiratos, Qatar,etc...)explorados, sem direitos, tratados como escravos, sem qqer respeito pela sua cultura.
Ignorados pela paranóica comunicação social pró islâmica que domina o Ocidente. Há poucos meses, uma emigrante filipina católica na Arábia Saudita foi violada e, claro, presa, engravidou, abortou na prisão devido aos maus tratos, e sendo as mulheres tratadas como animais pelo islão(trocadas por camelos no magreb...), considerada culpada da violação e condenada a ser chicotada em público. Obviamente, os valores de pedra lascada dos "media" nem sequer umas linhas dedicam a esta selvajaria. Mas há "sites" que felizmente defendem a civilização humana!!! E os defensores da barbárie islâmica (casamentos forçados de noivas de oito anos, como fez Maomé, organizados pelo HAMAS...) serão envergonhados a pouco e pouco...
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