O Zé Neves (aqui), e o Rick Dangerous (I, II, III), acabam de publicar textos muito relevantes para a compreensão da génese e impacto futuro dos acontecimentos frente à Assembleia da República que tiveram lugar no dia 14 de Novembro . No entanto, tal como outros textos que li, não aludem ao que me parece ter sido um dos objectivos mais importantes de quem delineou a estratégia de actuação das forças policiais para o período que culminou naquele dia: a re-agregação e radicalização quer das forças policiais quer do campo social que pode ajudar a sustentar este governo. Ou seja, tal estratégia terá tido como objectivo não tanto a intimidação daqueles que estão mais predispostos a manifestarem-se (não deixando de ser útil nesse sentido), seja porque razão for, mas principalmente (re-)criar uma divisão que parecia estar a esboroar-se entre as forças policiais e os manifestantes (vide a força crescente da contestação pública dos sindicatos da polícia às medidas do governo que afectam os seus membros, e a relativamente branda actuação das forças policiais na manifestação do 15 de Setembro) e entre diferentes classes sociais (patente na manifestação do 15 de Setembro, nas sondagens de opinião e no re-posicionamento de vários comentadores políticos e económicos perante a actuação deste governo). Era preciso criar um momento polarizador, que não permitisse ambiguidades de posicionamento. Ao endurecimento e crescente popularidade da contestação, aqueles que o governo, e os interesses que serve, espera constituam obstáculos à sua queda respondiam com sinais de cedência, até compreensão. Era preciso re-lembrar-lhes quão ameaçadores são os "outros". Daí, em particular, a decisão de permitir o apedrejamento durante algumas horas das forças policiais posicionadas ao fundo das escadarias da Assembleia da República. Tal também serviu para atiçar as próprias forças policiais, criando suficiente tensão para que se tornasse inevitável a violência exercida durante a carga policial. Esta tinha de ser suficiente forte para obrigar quem se pretendia radicalizar contra a contestação social às medidas governamentais, a (re-)aceitar o exercício da violência extrema como meio legítimo para a manutenção do sistema. O governo pretendeu embrutecer quem espera que o apoie em face dum endurecimento da contestação, porque sabe que mais e maior violência por parte das forças policiais será necessária em breve para impedir uma degradação das relações de subordinação económica e social que poderá ser fatal para o sistema vigente.
Mas, qualquer estratégia que assente no incentivo à polarização social e radicalização do confronto é extremamente arriscada, porque difícil de controlar e potenciadora de instabilidade política, económica e social. É por isso particularmente incompreensível quando patrocinada por um governo, que por definição é quem tem mais meios de controlo social, a não ser quando este se sente numa situação de extrema fragilidade, e desesperado por se manter no Poder. Veremos o que se passará no próximo dia 27 de Novembro, a quando das manifestações contra a aprovação final do orçamento de estado para 2013.
24/11/12
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1 comentários:
Sim, mas essa polarização não se fez através da sessão de pedrada, como, aliás, pôde ser deduzido da atitude diferente que a polícia adoptou perante as primeiras manifestações do dia. Essa polarização deu-se com o anúncio, tornado público nesse dia ou um dia ou dois antes, do aumento em 10% dos salários dos polícias. Esse aumento, num cenário de cortes, aumento de impostos, etc. etc., parece-me ser muito mais eficaz a demarcar uma linha do que qualquer outra coisa...
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