04/06/15

Comunicado do Estacionamento Vegetal

O João Bernardo acaba de me fazer chegar às mãos o seguinte comunicado do Estacionamento Vegetal cujas concepções radicalmente fracturantes seria uma animalidade não tentar divulgar o mais amplamente possível. Aqui fica, pois.


ESTACIONAMENTO VEGETAL

Em nome da protecção aos animais tem havido muitas pessoas, e em número crescente, que apelam para o genocídio dos vegetais. Apresentam-se com orgulho sob o título de vegetarianos e pretendem estar na vanguarda dos bons sentimentos, quando na realidade se divertem a sacrificar os mais débeis de entre nós, aqueles que não podem fugir.

Para cúmulo do sarcasmo, essa gente funda «movimentos». «Movimento» dos direitos dos animais, «movimento» de defesa dos cães, «movimento» de protecção aos caracóis, «movimento» disto e mais daquilo, quando na verdade a própria noção de movimento carrega consigo toda a agressividade e petulância do reino animal.

Por isso nós, os defensores dos vegetais, decidimos fundar não um movimento mas um estacionamento. Um estacionamento porque pretendemos aprender com os vegetais a ter raízes. Pretendemos aprender com as flores a fazer amor à distância e sem sair do lugar, soprando o nosso pólen. Pretendemos aprender com as árvores a lançar a sombra em nosso redor, sem a impor mais longe. O estacionamento vegetal é uma escola de respeito pela tradição e de respeito mútuo. Por isso o estacionamento vegetal corresponde ao leque de ambições do multiculturalismo.

Chegou a hora de dizermos: Basta! Chegou a hora de pôr fim às atrocidades de um reino animal que, directa ou indirectamente, sustenta o seu parasitismo à custa dos vegetais. Numa primeira fase, trata-se de eliminar os animais que se alimentam de vegetais. Numa segunda fase, bastarão os animais carnívoros para resolver o resto do problema.

Vivam as saladas!

Estacionamento Vegetal




16 comentários:

joão viegas disse...

Delicioso. Mas repara que as tentativas de conferir personalidade juridica aos animais também podem ter algumas virtudes. Por exemplo, tornariam possiveis acções judiciais contra os cães que mijam em cima das flores, por atentado à dignidade...

Abraço

Xa2 disse...

. A favor do reequilíbrio da Natureza e Vida de "baixa intensidade", da Harmonia (e desarmonia pontual, limitada), do Humanismo, da Justiça, da Liberdade e da Paz;

. A favor de menos Consumo (vegetal, animal, mineral, industrial, serviçal, ... e temporal/ pressa/stress);

. A favor do 'Devagar' (slow food, slow dance, ...) para errar menos gravemente;

. A favor do Sorriso e ...

Se fazem favor ...
(se não, .... vão fazer tijolo!)

Anónimo disse...

É incontornável: a opção ecológica lastra hoje qualquer tipo de politica alternativa consequente ao capitalismo energúmeno e sanguinário. Mesmo um marxista flamboyant como o Mélenchon- "sócio" do Lafontaine & Cia -, acabou por se render à evidência !. Ele bem o sublinha no seu " panfleto "O hareng de Bismarck- o veneno alemão", catalinária suprema( mas didactica e documentada, como referiu Minc...) contra o ordroliberalismo de madame Merkel. N.

Anónimo disse...

Decerto os fundamentos do movimento ecológico merecem críticas profundas, sistémicas, mas isto — assim — cheira a reaccionarismo fedorento. É deveras decepcionante que não consigam ver além do feiticismo ideológico duma utopia homeostática da Mãe Natureza (ou lá como queiram descrever a coisa). É que parece que os bichos sofrem, vejam lá!

Miguel Serras Pereira disse...

Anónimo de 8.06.2015, 00.23
interrogo-me, também eu, sobre o que o levará a interpretar este post nos termos em que o faz. É pena que o seu exercício do direito à preguiça no campo da leitura não tenha por consequência o exercício do mesmo direito no campo da emissão de opiniões sobre o que não se leu bem. É que isso causa-lhe sofrimento desnecessário e incomoda desnecessariamente terceiros. Saudações preocupadas

msp

Anónimo disse...

Bom, peço desculpa se interpretei mal o texto, mas não é a primeira vez que uma posta do Vias, bem como os comentários, se prestam à leitura que fiz. Reli-o e continua a escapar-me a finura da análise (sem sarcasmo ou acinte em geral). Sigo-vos desde uns anos e não me lembro de um único texto que deixasse clara uma efectiva consideração ou dos direitos dos animais não-humanos (ou dos nossos deveres para com eles, como queiram) ou, meramente, do tema. É algo que leria com agrado (pela explicitude, talvez não pela(s) tese(s)) e que deixaria nos is os necessários pontos.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Anónimo,
não me parece que o Vias tenha uma plataforma sobre as questões que levanta — ou se prepare para a adoptar. O que me chocou no seu comentário anterior foi o facto de você ter tirado conclusões apressadas de um texto que, lido atentamente, nada de semelhante autorizava. Só isso e já é bastante. Quanto ao resto, o que lhe posso dizer é que, pessoalmente, tive em miúdo cães e gatos, ainda hoje tenho animais, cuido deles como sei e não os maltrato. Ao mesmo tempo, crispo-me um pouco quando ouço falar de direitos dos animais não-humanos e/ou dos nossos deveres para com eles em termos que sugerem que coisas como a caça ou a pesca deveriam ser proibidas e punidas, etc., etc. Enfim, não me parece que esta minha posição o satisfaça, mas é o que é — e não creio que acrescentar umas quantas precisões mudasse grande coisa.
Saudações democráticas

msp

joão viegas disse...

Caro anonimo,

Em complemento do que diz o Miguel, queira considerar o seguinte. Nem a causa da defesa dos animais se confunde com a ecologia politica (ou é implicada, directamente ou indirectamente por ela), nem o texto do post pode ser interpretado como uma critica das teses essenciais dos ecologistas. Sejamos ou não ecologistas, não podemos negar que o reconhecimento de "direitos" dos animais no pleno sentido da palavra levanta dificuldades. Por outro lado, o simples facto de se reconhecer que temos deveres em relação aos animais, e mesmo deveres sancionados penalmente, não equivale de maneira nenhuma a reconhecer-lhes "direitos" (exercidos como ?). Portanto as questões são realmente distintas.

Quanto ao texto do post, não o leio como uma agressão, mas como uma maneira inteligente e eficaz de nos alertar para as contradições insanaveis em que corremos o risco de nos meter, quando começamos a reclamar "direitos" para os animais em nome da "natureza". E, por tabela, como uma forma de sublinhar que, antes de enchermos a boca com a palavra "natureza", seria bom reflectir um pouco sobre o que o conceito significa. Portanto não vejo nada de anti-ecologico no texto, a não ser para quem considere que ser ecologista implica abdicar de reflectir sobre o que entendemos por "natureza".

Abraço

Anónimo disse...

Acontece que o João Bernardo tem há longos anos um problema sério com o ecologismo, os ecologistas, e todas as críticas que questionem o «crescimento» e o «progresso», por isso mesmo este texto pretensamente humorado vai na mesma direcção de sempre...

Miguel Serras Pereira disse...

Se a ideia é discutir a crítica do ecologismo, nos termos em que o define o João Bernardo, em múltiplos escritos deste último, então seria preferível jogar limpo desde o início, citar esses textos e debatê-los. Agora, voltando ao texto do "Estacionamento Vegetal", creio que os pontos fundamentais referidos pelo João Viegas esclarecem o que deve ser esclarecido. Se há uma tese no texto parece-me ser a seguinte: ainda que sustentemos que a insuficiência ou a incapacidade normativa da "natureza humana" torne necessários o direito, a instituição e a lei enquanto tais, não dita as suas formas nem os seus conteúdos enquanto criações históricas que são, excedendo qualquer natureza. É disso que precisamos de assumir politicamente as consequências. Que não são poucas. Enfim, penso eu de que…

msp

João Bernardo disse...

Eu já sabia que o politicamente correcto é contrário ao humor. E neste caso entende-se, pois se o riso é exclusivo dos seres humanos, os críticos do antropocentrismo animalizam-se prescindindo da ironia. Uma noite, depois de um curso, numa cidade do Brasil, estava numa cervejaria com um grupo de alunos e alunas e disse a um deles, que era vegetariano e libertário, que a minha crítica aos vegetarianos é de substitucionismo leninista, porque lutam em nome das vacas em vez de as organizarem para elas se autodefenderem. Acrescento agora que, entre os críticos do antropocentrismo, o vanguardismo antropomórfico parece-me uma contradição ideológica de todo o tamanho. Pelo menos, nós, os vegetais (digo nós os vegetais com a mesma legitimidade com que os partidos leninistas dizem nós os trabalhadores) mantemos uma atitude spinozista, sem chorar nem rir, observando o mundo com os olhos das couves e das alcachofras.

Libertário disse...

João Bernardo, criativo como sempre, com o seu fino humor descreve uma situação real:

«estava numa cervejaria com um grupo de alunos e alunas e disse a um deles, que era vegetariano e libertário, que a minha crítica aos vegetarianos é de substitucionismo leninista, porque lutam em nome das vacas em vez de as organizarem para elas se autodefenderem»

Fica, no entanto, uma dúvida: qual é o problema do João Bernardo com os vegetarianos, principalmente se forem libertários?

Anónimo disse...

Algo não bate certo. Um "estacionamento vegetal" a dar vivas às saladas? Que cabrão de paradoxo. Se o dito desse vivas às alfaces e ao resto, ainda vá que não vá. Agora, às saladas, o manjar dos vegetarianos? É mais uma "bernardada"!

Anónimo disse...

http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/nao-e-mais-possivel-dizer-que-nao-sabiamos-diz-philip-low

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Anónimo de 16 de Junho às 16:15

o problema não é o grau de consciência que tem este ou aquele animal não-humano. O que devia ser evidente é que por mais "direitos" que se lhes concedam, os cães ou os gatos, etc. não podem ser "sujeitos de direito", como explicou o João Viegas, e não são iguais dos animais humanos que social-historicamente se fizeram tais. Um exemplo bastante infantil pode ajudar: podemos votar leis que protejam os animais e as plantas, mas os cães e os gatos não podem votar nem reivindicar contra os animais humanos ou a favor deles.

Cumprimentos

msp

Libertário disse...

Só não compreendo a ideia fixa de criticar o vegetarianismo e as alternativas alimentares que por razões éticas, ou de saúde, dispensam o consumo de carne.
O vegetarianismo, e a crítica do consumo de carnes, já foi corrente no movimento operário do passado quando os anarquistas estavam presentes nos movimentos sociais. A pseudo-ironia ao que dizem ser o actual discurso "politicamente correcto" esquece tudo isso na sua caricatura. Pode também ser que á falta de sangue na luta social se satisfaçam com a mortandade de animais...