27/08/10

A bondade do candidato a que temos direito

Um comentador deste post de Rafael Fortes, publicado no 5dias, João Pais, perde as papas na língua e explica que — ainda que aquilo de que o acusam (sectarismo, ensimesmamento partidário, culto burocrático da hierarquia, carreira de político profissional, etc.) "fosse verdade" — "o candidato do PCP é bom tão simplesmente por isso, é o do PCP".
Deslumbrado com esta formulação da "bondade do candidato a que temos direito", aqui confesso, cidadão João Pais, que me sinto tentado a acrescentar, à laia de recapitulação e revisão mental da matéria dada, algumas variantes auxiliares. Por exemplo: o PCP é bom porque é o PCP; o que o PCP faz é bem feito, ainda que seja mal feito, porque é feito pelo PCP; devemos votar no candidato do PCP porque o candidato do PCP é o melhor, ainda que o não seja, porque o melhor não pode deixar de ser o candidato do PCP, seja ele qual for…
Mas, assim como assim — e sem desvalorizar o alcance pedagógico da repetição ritual, tão cara ao saudoso camarada José Estaline, na apologética da verdade revolucionária —, não me parece necessário prosseguir. O princípio é simples e dele podemos deduzir tudo o resto. O que foi bom ontem,  é bom hoje e será bom amanhã. O supremo bem sempre idêntico a si próprio para além das aparências empíricas.  Ou não fossem eternas as verdades do socialismo científico, do mesmo modo que infalível o seu único partido verdadeiro. Pelos séculos dos séculos. Amén.

6 comentários:

brunopeixe disse...

Miguel,

Há um mundo de distância entre dizer que o candidato é bom porque é do PCP e dizer que o PCP é bom porque é o PCP, e acho que tu percebes bem a diferença.

E é uma diferença saudável, porque despersonalizante, na medida em que desloca o campo de avaliação do indivíduo para o projecto político - goste-se ou não dele. E se alguma coisa vale no PCP é essa resistência ao individualismo, à singularização na pessoa, em detrimento de um discurso colectivo.

Podemos ter as maiores desconfianças em relação à produção inigualitária desse discurso, e as maiores reservas em relação ao conteúdo desse discurso, mas parece-me eminentemente louvável a sua apresentação e defesa fora de um quadro de proposta e responsabilidade individual. Pode ser um passo errado, mas é-o no caminho certo.

Um abraço,
bruno

Nuno Ramos de Almeida disse...

Repara, Miguel, a tua argumentação é vagamente parecida com o tipo que contestas.Para ti, o candidato do PCP é mau porque é do PCP que é, obviamente, péssimo.
Ocuparás o teu tempo como te aprover, mas repara que mais de metade dos teus textos são sobre o PCP. Até parece que este partido está no poder em Portugal e no universo.

Abraço,
Nuno

Abraço,
Nuno

Miguel Serras Pereira disse...

Bruno,
a nossa divergência é irredutível: um passo errado no caminho certo - dizes tu -, mas, para mim, que sou ateu e não acredito na predestinação, o caminho, são os passos que o fazem; o caminho não preexiste a si próprio.
Falar em "resistência ao individualismo, à singularização na pessoa" ou em primado do "discurso colectivo", num partido que tem praticado como poucos a aclamação do líder e em cuja história a hagiografia do secretário-geral tem o peso que se sabe, desculpa, Bruno, mas é como diz o Luis Rainha: dá vontade de rir. E, por outro lado, gostaria de te fazer notar que opor o indivíduo e a sociedade, a "singularização da pessoa" e o colectivo ("despersonalizante" é um motivos centrais da ideologia dominante e da sua panóplia argumentativa (Marx é bastante claro sobre este ponto).
Podes dar as voltas dialécticas que quiseres ao círculo que nunca o tornarás quadrado: é a boa substância ou essência do Partido que faz com que o mau candidato seja bom, porque o partido é o supremo bem. Isto, de resto, vai muito mais longe do que o pobre comentário a que me referi: do Trotsky "governante", esquecido do que escrevera no Relatório da Delegação Siberiana e antes de se tornar autor de A Revolução Traída, que dizia que os operários empíricos não podiam, por definição, ter razão contra o seu Partido, passando pelo argumento sartreano de que certos críticos precoces de Estaline tinham incorrido no erro de ter razão antes de tempo, e desembocando no comentário que um dos militantes do PCP mais interessantes e inteligentes de entre os que visitam a blogosfera opôs há tempos ao Zé Neves, quando este lhe dizia recear ver o candidato do PCP adoptar um patriotismo não menos insistente do que o de Alegre, argumentando que "quando Alegre ou Nobre se declararem patriotas, nunca estarão a referir-se ao patriotismo a que se refere um comunista" (http://5dias.net/2010/04/16/um-comunista/) - a lógica e a exigência de infalibilidade são sempre as mesmas: não tanto que o Partido não cometa erros, mas que os erros, maus passos, desvios do Partido são sempre bons - ou preferíveis a qualquer outra alternativa - porque o Partido é, por definição, o melhor Partido possível.
Enfim, isto remete para - ou é uma exasperação e um avatar da - a concepção leninista da exterioridade da consciência "verdadeira ou "científica", que deve ser inculcada nos operários empíricos, os quais, pelos seus próprios meios, nunca irão, para Lenine, além do "trade-unionismo".

Um abraço

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Nuno,
creio que estás enganado. O PCP, como qualquer outro, é ou será, em última instância, aquilo que dele façam ou fizerem os seus militantes, entendidos como colectivo em acção.
Mas, até nova ordem, considero que o seu modo de organização, concepção e práticas actualizam ou prefiguram um tipo de sociedade e de governo que nada tem a ver, a não ser por antífrase, com a sociedade sem classes ou o governo dos produtores associados ou o exercício do poder, em pé de igualdade, pelo conjunto dos trabalhadores organizados.
Um abraço

msp

Niet disse...

Castoriadis ao diário L´Unitá:" O comunismo soviético é o oposto absoluto de uma política de emancipação!". Grandes momentos de diálogo e confrontação ideológica - a propósito da indigitação do candidato presidencial do PCP- se cruzam neste momento em três dinâmicos Blogues nacionais, com forte destaque para o Vias. Oportunamente,sinalizo um fortíssimo texto de Castoriadis, de 1991, que faz parte de uma entrevista ao quotidiano comunista do ex-PCI, L´Unitá,e que constitui uma das mais explosivas intervenções políticas no terreno, de sempre, do seu espólio sublime. " O comunismo realizado representou um monstruoso desvio do movimento operário internacional. Colocou no poder uma nova classe dominante, a burocracia do Partido-Estado, que explorou e oprimiu a população como nenhum outro regime da história o tinha feito; porque nenhum outro regime dispôs de meios técnicos e ideológicos semelhantes de terror, de intervenção na vida quotidiana das pessoas, e de manipulação ideológica. Destruiu o movimento operário dos outros países, subordinando-o à política imperialista da URSS. Corrompeu e prostituiu, de maneira irreversível, as ideias e o vocabulário do movimento revolucionário, desvalorizou a ideia de transformação social; fez crer às populações que o regime capitalista era como o paraíso realizado na Terra ".CC. " Sociedade à deriva",pág. 232, edit. francesa. Salut! Niet

Anónimo disse...

Mas, a questão é:
Será mesmo que os gays alcaçam o descanso contra o preconceito ???
homossexuais descansando???
É triste, mas, é verdade.
Somente pessoas que entregam suas vidas ao amor, alcançam de Deus o descanso. ♥