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(publicado também aqui)
sabemos, pela experiência histórica e sem ilusões sobre as motivações idealistas e nacionalistas de List, que este estava certo na sua análise do desenvolvimento industrial, nomeadamente na existência de economias crescentes à escala na indústria (uma ideia recusada pela economia clássica e neo-clássica) e na necessidade de protecção para o desenvolvimento industrial.Eu tendo a concordar que (da perspectiva de um país, não necessariamente na da humanidade no seu todo) que as politicas proteccionistas fazem sobretudo sentido quando aplicadas a sectores com economias crescentes à escala (e, já agora, acrescento que, quanto mais tecnologia-intensiva for uma economia, maior peso terão as economias de escala - o custo de desenvolver o iPad é o mesmo quer se venda 1000 ou um milhão de unidades).
O Nuno Teles respondeu ao post onde eu dava conta da minha preocupação com o que me parece ser uma clara sobrevalorização à esquerda de soluções económicas nacionalistas e industrialistas. A resposta do Teles não diminuiu as minhas preocupações, mas permite ir esclarecendo os nossos desentendimentos e possivelmente agudizar as desavenças.
O primeiro desentendimento tem que ver com o modo como relacionamos a análise económica e a vontade política, a ciência e a crítica. Para o Nuno Teles, parece-me, qualquer vontade política crítica que não esteja apoiada em análise científica económica corre o risco de ser voluntarista e ineficaz. Para mim, também. Agora, e aqui parece-me que eu vou para um lado e o Teles segue para outro, isto implica, igualmente, assumir o reverso. De tal modo que: qualquer análise científica económica que não se apoie numa vontade política crítica corre o risco de meramente confirmar o que é evidente (e o que é evidente não só não é inequivocamente apurável como, se o é e quando é, está longe de esgotar o campo das possibilidades).
É nesta separação – primeiro a análise económica, depois a vontade política, primeiro a ciência, depois a crítica – que o Nuno Teles incorre quando se posiciona face à questão nacional.
Simplificando (ele corrigirá se entender), a sua posição, e de boa parte dos Ladrões de Bicicletas, é esta: seria ideal movermo-nos politicamente (seja a nível institucional, seja a nível de movimento) a uma escala global, mas a realidade é ainda nacional e por isso essa unidade de poder deve continuar a ser utilizada, sem prejuízo de tentativas pontuais de internacionalizar as questões. Ora, aqui, neste modo de ver as coisas, detecto um problema: há no modo de pensar do Nuno uma barreira entre o que se toma por ideal e o que se toma por material. Repito: as nossas propostas políticas devem derivar da análise da realidade económica mas também o contrário e seria revelador de um insuportável economicismo considerar que a realidade económica tal como a analisamos é mais “real” do que as propostas políticas que formulamos. Entre a realidade e a realidade dos nossos desejos não existe nenhuma muralha da babilónia. Isto mesmo tem sido exemplarmente exposto pelos ladrões na crítica a que submetem as análises económicas dominantes: essas análises pretendem dar conta da realidade tal como ela é, dizem-se despidas de ideologia, mas os ladrões mostram bem que ninguém é virgem e que as análises económicas estão impregnadas de vontade política. Há que ser fiel a este princípio e não usá-lo apenas para desconstruir o que é dito pelos nossos adversários; ou melhor, essa desconstrução não deve servir parar mostrar que eles estão cientificamente errados (é insuportável ouvir os economistas críticos dizerem que qualquer manual de economia política ensina que em tempos de crise o Estado não deve ter orçamentos restritivos) mas que é antes de mais no terreno das diferenças políticas e morais que as suas ideias devem ser escrutinadas.
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Lewis Carroll
Alice do outro lado do espelho, cap. IV
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