21/09/11

Às vezes me espanto

O País das Pessoas de Pernas para o Ar é um título de Manuel António Pina com bonecos do João Botelho que eu li no já vetusto ano de 1973 quando a Regra do Jogo o editou. Dirigido à infância, reunia quatro histórias e foi a obra de estreia do poeta.
Os anos passaram, Manuel António Pina foi melhorando com a idade e, já este ano, viu ser-lhe atribuído o Prémio Camões. Quanto ao livro, desenterrei-o há uns tempos de uma pilha poeirenta, voltando a pensar nele ao tropeçar por acaso nas recentes declarações de Francisco Van Zeller, ex-presidente da CIP: “É ridículo o povo aceitar sacrifícios e não ir para a rua”. Estupefacta, recordei a frase de Belmiro de Azevedo proferida em 2010: “Quando o povo tem fome, tem direito a roubar”.
Dado que as duas afirmações me pareceram contaminadas por um radicalismo mais ajustado aos tempos do PREC – quando os ricos que pagassem a crise! – do que ao dos PEC – para o qual nem sequer conseguiram inventar um slogan de jeito – dei por mim a pensar que a coisa deve estar muito pior do que nos querem fazer crer.
Passos Coelho anunciou o fim da crise portuguesa para 2012 mas já Christine Lagarde preferiu avisar sobre a iminência da economia mundial entrar em recessão. Em quem acreditar?
Não será por falta de patriotismo mas, assim como assim, opto pela Christine (e eu até simpatizava mais com o Dominique). Afinal, cá pelo burgo andam a prometer-nos a salvação pelo menos desde 13 de Outubro de 2006, dia que ficará para a História pátria como aquele em que Manuel Pinho anunciou, não recordo já se com pompa e circunstância mas certamente com a costumada sapiência, que “a crise acabou”.
Segundo o novo governo falta-nos ainda e apenas um aninho. Só mais um esforço, pois, compatriotas. No entretanto, “ensinai aos vossos filhos o trabalho, ensinai às vossas filhas a modéstia, ensinai a todos a virtude da economia.”
Uma caixa de pílulas gratuitas ou, em alternativa, um broncodilatador à borla a quem adivinhar o autor da frase citada.

6 comentários:

Ricardo Noronha disse...

Salazar, Salazar, Salazar. Venha o broncodilatador sff.

Ana Cristina Leonardo disse...

Ricardo, ganhaste com todo o mérito. Temo, porém, se te enviar o broncodilatador via CTT, que este possa chegar até ti engatado no picotado. Que fazer (salvo seja)?

Anónimo disse...

Os únicos que ainda têm claro a existência de luta de classes nas sociedades são os grupos dominantes que não só fazem uma guerra social sem tréguas como ainda se dão ao luxo de desafiar os «de baixo». Quanto aos trabalhadores, desempregados, excluídos..., para já não falar nos intelectuais de «esquerda», convenceram-se - na sua grande maioria - que a luta de classes acabou e agora somos todos cidadãos, iguais em direitos e deveres! Só que uns tem mais sorte que os outros na vida...

Ana Cristina Leonardo disse...

Há classes com sorte...

Ricardo Noronha disse...

I'll take a rain check on that. Nao te preocupes Ana. Há-de haver bom uso para esse broncodilatador.

Ana Cristina Leonardo disse...

Ricardo, o próximo desafio que venceres, levas com o broncodilatador e a caixa de pílulas: 2 em 1
-:)