No i, o presidente do Instituto Sá Carneiro (e da Câmara de Cascais) Carlos Carreiras exarou a sentença final: “O país já perdeu demasiado tempo a discutir ideias e ideologias. Agora chegou a altura das soluções.”
Que a ideologia começa a ser vista por muitos espíritos práticos como um empecilho ao progresso já o José Neves demonstrou há uns dias. Mas agora até as ideias tout court surgem como um estorvo aos urgentes desígnios do crescimento. Estamos numa corrida de cavalos e só importa correr mais que os outros, não interessando para onde, ou se somos capazes de semelhantes galopes.
Assim sendo, que propostas expurgadas das daninhas ideologias nos oferece Carlos Carreiras? Um bucólico regresso ao passado das “indústrias tradicionais, como as pescas, a indústria naval, a agricultura e as florestas” (quase se suspeita que uma tal busca de “desígnios” isentos de ideologia serve sim para camuflar a proximidade destas propostas às que o PCP actualmente defende). E depois uma pitada do mirífico futuro: dos lugares exóticos que serão umas tais “smart cities” ao lugar mais que comum do “empreendedorismo”. Muito vago. Muito curto.
Não deixa de ser irónico relembrar que até Salazar tinha, em 1965, os olhos bem abertos quanto à natureza abismal deste realismo técnico que se acha capaz de tudo resolver sem reflexões demasiado complicadas:"É sobretudo pernicioso que se tenda a converter o homem em engrenagem da própria técnica, que é para onde se caminha. Até aqui a política definia o que devia fazer-se; a técnica ensinava como se devia fazer"; “Tem de salvar-se o homem, da tentação do abismo (...), o que significa haver outro mundo, dever haver outro mundo para além daquele que a técnica e a economia podem criar.”
Sabemos bem que o ogre de Santa Comba tinha um outro abismo em mente para nós, mais aconchegado, tradicional e sombrio; mas tinha também inteligência suficiente para reconhecer que um país sem ideologia é apenas um grande formigueiro, tão organizado quanto inumano.
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