07/01/17

Soares. Um homem livre




Soares foi o politico português que marcou, como nenhum outro, de forma indelével, o último século português. É aquele cuja influência mais perdurará nos tempos que virão.
Podemos enunciar cada um dos grandes acontecimentos em que se envolveu  e salientar o lado solar e o lado negro que lhe estão associados. Dar voz aos que o apoiaram nessas medidas e àqueles que as detestaram e dessa forma detestaram/odiaram e ainda detestam/odeiam aquele a quem atribuem a sua autoria. Não vale, no entanto, a pena ir por aí.
Basta falar da oposição à ditadura e da defesa da liberdade, com sacrificio da sua e dos seus.  Basta falar da descolonização. Basta falar da defesa da democracia pluripartidária e do combate pela sua implantação no pós-25 de Abril. Basta falar da adesão à União Europeia e do ponto final no Portugal salazarento do orgulhosamente sós. Basta falar do combate de sempre contra o domínio da economia sobre a politica, contra o neoliberalismo, contra a austeridade, contra as politicas seguidas nas últimas décadas na UE e globalmente. Basta falar das críticas à Terceira Via de Blair e da sua simpatia pelo papel de partidos como o Syriza ou o Podemos. Basta falar no apoio à unidade das esquerdas no apoio ao Governo liderado por Costa. Basta falar da visão de Portugal no mundo e da recusa do nacionalismo português ou de qualquer outro nacionalismo. Basta falar da dessacralização do lugar de Senador da República, fazendo prevalecer o cidadão-politico, o homem que fez da actividade politica de todos os dias, de todas as causas, o razão maior da existência, até ao fim da vida.
Um homem extraordinário, por todas as suas qualidades e por todos os seus defeitos. Pela sua humanidade.


8 comentários:

Libertário disse...

Até no Vias de Facto predomina, a propósito da morte de Mário Soares, esse impulso idólatra quando se esperava algum espírito iconoclasta…Lendo o que se escreve parece haver muitos Mários Soares, o que se explica pela cultura nacional ser dada aos heterónimos. Mas só se evocam alguns dos heterónimos.

O Mário Soares de que me recordo, se não me falha a memória, é esse homem de mão de Carlucci (o homem da CIA que já havia passado pelo golpe militar no Brasil), articulador da contra-revolução preventiva, o demagogo do socialismo marxizante, do punho erguido cantando a Internacional mas metendo o socialismo na gaveta, devolvendo as terras e as fábricas aos patrões, pedindo pessoalmente os grandes capitalistas fugidos em Espanha e no Brasil para voltarem para Portugal.
Em resumo, o restaurador do capitalismo em Portugal após o abalo revolucionário de 74 e 75. Um político obcecado pelo Poder capaz de passar por cima dos seus aliados, como Eanes, ou dos seus companheiros de partido, de Manuel Serra a Zenha e Manuel Alegre.

Mas é fundamental recordar que depois da morte em Portugal todos viram santos, do Afonso Costa a Salazar e Cunhal, pelo menos nos discursos públicos e nos artigos dos jornais. Não é cinismo é mera hipocrisia, uma verdadeira virtude do rebanho nacional.

Aníbal Duarte Corrécio disse...

E das duas bancarrotas, não falamos?

A esquerda neurótica passa o tempo a divinizar as qualidades do artista Mário Soares quando jovem cão, mas já passaram mais de 40 anos sobre o 25 de Abril.

O que interessa é o País das bancarrotas. E aqui Mário Soares teve larga responsabilidade.

PS Embarcamos no mito? Nem uma referência aos grandes negócios de Macau, ao silenciamento de Rui Mateus, etc

José Guinote disse...

Meu caro Aníbal Duarte Corrécio faço-lhe uma proposta: da esquerda neurótica trata o senhor, que me parece estar bem qualificado para o objectivo. Se tiver vagar leia o meu post mais uma vez, porque de divindades e divinizações deve ter colhido noutras paragens.

José Guinote disse...

Meu caro Libertário o que eu escrevi e penso não coincidem com a sua visão. Eu não falei de santos nem tão pouco de um santo específico. Sou pouco dado a beatices. Mas, acho eu, que a sua é uma das visões possíveis sobre a vida politica de Mário Soares.

Miguel Madeira disse...

Aníbal Duarte Corrécio: "E das duas bancarrotas, não falamos?"

Quais *duas* bancarrotas? Eu só conto uma - a de 1978, após dois anos de governo Soares/Medina Carreira (a 2ª vinda do FMI, a 18 de julho de 1983, foi logo a seguir a Soares ter tomado posse como primeiro-ministro, a 9 de junho - não me venham dizer que foi o governo PS/PSD que, ainda sem tempo para ter tomado medidas, gastou num mês o dinheiro)?

A verdade a que temos direito disse...

O "lado negro" não é comentado porque "não vale, no entanto, a pena ir por aí.", conclui José Guinote.

Não valerá?

Só valerá a pena enaltecer o "lado solar" ?

E pensava eu que os libertários abordariam tudo. Os lados todos.

José Guinote vai-me desculpar, mas, tal como o texto está elaborado, o companheiro à semelhança de tantos outros, caiu na esparrela da idealização.

E, deste modo, o 'luto' está necessariamente incompleto, por fazer.

Teria havido o receio de dar 'o flanco ideológico' à direita?

A par do lado solar - bem descrito, por sinal - ficou por elaborar o lado negro.

Nós libertários, temos o dever e a obrigação, de não nos escusarmos a esse lado.

Assim, tal como está, o texto está muito reverenciado à figura de Mário Soares.

Cumprimentos

José Guinote disse...

Meu caro "A Verdade a que temos direito" se ler bem o que escrevi verá que eu disse coisas diferentes do que me atribui. Quanto à sua conclusão final sobre o pequeno post - terei escrito centenas sobre Soares e as suas decisões, umas boas outras más, mas não entenda isto como justificação de coisa alguma- determinado pela situação concreta, mas ao qual não acho que deva retirar ou acrescentar uma vírgula, eu dir-lhe-ei em homenagem a um célebre momento histórico: olhe que não, olhe que não.

Ateu disse...

Bastava o funeral de Estado de Mário Soares para desmentir o mito do «republicano, laico e socialista», essa pompa imperial está mais para imperadores, autocratas e reis. Distante da visão do socialismo histórico e dos republicanos laicos que exigiam funerais simples sem rituais...