Soares foi o politico português que marcou, como nenhum outro, de forma indelével, o último século português. É aquele cuja influência mais perdurará nos tempos que virão.
Podemos enunciar cada um dos grandes acontecimentos em que se envolveu e salientar o lado solar e o lado negro que lhe estão associados. Dar voz aos que o apoiaram nessas medidas e àqueles que as detestaram e dessa forma detestaram/odiaram e ainda detestam/odeiam aquele a quem atribuem a sua autoria. Não vale, no entanto, a pena ir por aí.
Basta falar da oposição à ditadura e da defesa da liberdade, com sacrificio da sua e dos seus. Basta falar da descolonização. Basta falar da defesa da democracia pluripartidária e do combate pela sua implantação no pós-25 de Abril. Basta falar da adesão à União Europeia e do ponto final no Portugal salazarento do orgulhosamente sós. Basta falar do combate de sempre contra o domínio da economia sobre a politica, contra o neoliberalismo, contra a austeridade, contra as politicas seguidas nas últimas décadas na UE e globalmente. Basta falar das críticas à Terceira Via de Blair e da sua simpatia pelo papel de partidos como o Syriza ou o Podemos. Basta falar no apoio à unidade das esquerdas no apoio ao Governo liderado por Costa. Basta falar da visão de Portugal no mundo e da recusa do nacionalismo português ou de qualquer outro nacionalismo. Basta falar da dessacralização do lugar de Senador da República, fazendo prevalecer o cidadão-politico, o homem que fez da actividade politica de todos os dias, de todas as causas, o razão maior da existência, até ao fim da vida.
Um homem extraordinário, por todas as suas qualidades e por todos os seus defeitos. Pela sua humanidade.
8 comentários:
Até no Vias de Facto predomina, a propósito da morte de Mário Soares, esse impulso idólatra quando se esperava algum espírito iconoclasta…Lendo o que se escreve parece haver muitos Mários Soares, o que se explica pela cultura nacional ser dada aos heterónimos. Mas só se evocam alguns dos heterónimos.
O Mário Soares de que me recordo, se não me falha a memória, é esse homem de mão de Carlucci (o homem da CIA que já havia passado pelo golpe militar no Brasil), articulador da contra-revolução preventiva, o demagogo do socialismo marxizante, do punho erguido cantando a Internacional mas metendo o socialismo na gaveta, devolvendo as terras e as fábricas aos patrões, pedindo pessoalmente os grandes capitalistas fugidos em Espanha e no Brasil para voltarem para Portugal.
Em resumo, o restaurador do capitalismo em Portugal após o abalo revolucionário de 74 e 75. Um político obcecado pelo Poder capaz de passar por cima dos seus aliados, como Eanes, ou dos seus companheiros de partido, de Manuel Serra a Zenha e Manuel Alegre.
Mas é fundamental recordar que depois da morte em Portugal todos viram santos, do Afonso Costa a Salazar e Cunhal, pelo menos nos discursos públicos e nos artigos dos jornais. Não é cinismo é mera hipocrisia, uma verdadeira virtude do rebanho nacional.
E das duas bancarrotas, não falamos?
A esquerda neurótica passa o tempo a divinizar as qualidades do artista Mário Soares quando jovem cão, mas já passaram mais de 40 anos sobre o 25 de Abril.
O que interessa é o País das bancarrotas. E aqui Mário Soares teve larga responsabilidade.
PS Embarcamos no mito? Nem uma referência aos grandes negócios de Macau, ao silenciamento de Rui Mateus, etc
Meu caro Aníbal Duarte Corrécio faço-lhe uma proposta: da esquerda neurótica trata o senhor, que me parece estar bem qualificado para o objectivo. Se tiver vagar leia o meu post mais uma vez, porque de divindades e divinizações deve ter colhido noutras paragens.
Meu caro Libertário o que eu escrevi e penso não coincidem com a sua visão. Eu não falei de santos nem tão pouco de um santo específico. Sou pouco dado a beatices. Mas, acho eu, que a sua é uma das visões possíveis sobre a vida politica de Mário Soares.
Aníbal Duarte Corrécio: "E das duas bancarrotas, não falamos?"
Quais *duas* bancarrotas? Eu só conto uma - a de 1978, após dois anos de governo Soares/Medina Carreira (a 2ª vinda do FMI, a 18 de julho de 1983, foi logo a seguir a Soares ter tomado posse como primeiro-ministro, a 9 de junho - não me venham dizer que foi o governo PS/PSD que, ainda sem tempo para ter tomado medidas, gastou num mês o dinheiro)?
O "lado negro" não é comentado porque "não vale, no entanto, a pena ir por aí.", conclui José Guinote.
Não valerá?
Só valerá a pena enaltecer o "lado solar" ?
E pensava eu que os libertários abordariam tudo. Os lados todos.
José Guinote vai-me desculpar, mas, tal como o texto está elaborado, o companheiro à semelhança de tantos outros, caiu na esparrela da idealização.
E, deste modo, o 'luto' está necessariamente incompleto, por fazer.
Teria havido o receio de dar 'o flanco ideológico' à direita?
A par do lado solar - bem descrito, por sinal - ficou por elaborar o lado negro.
Nós libertários, temos o dever e a obrigação, de não nos escusarmos a esse lado.
Assim, tal como está, o texto está muito reverenciado à figura de Mário Soares.
Cumprimentos
Meu caro "A Verdade a que temos direito" se ler bem o que escrevi verá que eu disse coisas diferentes do que me atribui. Quanto à sua conclusão final sobre o pequeno post - terei escrito centenas sobre Soares e as suas decisões, umas boas outras más, mas não entenda isto como justificação de coisa alguma- determinado pela situação concreta, mas ao qual não acho que deva retirar ou acrescentar uma vírgula, eu dir-lhe-ei em homenagem a um célebre momento histórico: olhe que não, olhe que não.
Bastava o funeral de Estado de Mário Soares para desmentir o mito do «republicano, laico e socialista», essa pompa imperial está mais para imperadores, autocratas e reis. Distante da visão do socialismo histórico e dos republicanos laicos que exigiam funerais simples sem rituais...
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