26/09/11

Das vantagens em ir envelhecendo

Há quem diga que a velhice traz sabedoria; outros que é mais rugas e reumático. Pontos de vista…
Por falar em pontos de vista – não confundir com o relativismo da razão: eu tenho um ponto de vista, tu tens um ponto de vista, ele tem um ponto de vista… porreiro, pá! –, veja-se como a Relatividade permite interpretações opostas. Se o tempo se torna mais lento quando a velocidade aumenta, com a idade devíamos poder ir adiando a morte já que a tendência é, facto incontestável, para perdermos mobilidade. Por outro lado, contudo, também podemos dizer que, à medida que o tempo que resta encurta, a velocidade de aproximação à meta dispara apesar do acréscimo exponencial das artroses.
Seja qual for a forma como olhemos a coisa, a grande vantagem da velhice não parece afastar-se muito da grande vantagem em ser-se rico: poder dizer o que nos vai na gana e o mundo que se lixe (o que não significa que a maioria dos velhos ou a maioria dos milionários tenha por hábito fazê-lo).
Martin Amis não é velho mas também não vai para mais novo (n. 1949). Não sei se no caso dele a idade virá ao caso, mas a forma como critica Saramago em O Segundo Avião faz prova de uma nonchalance só admissível a partir dos cinquenta e muitos.
Cita-o (“Ah, sim, os horrendos massacres de civis causados pelos chamados terroristas suicidas… Horrendos, sim, sem dúvida; condenáveis, sim, sem dúvida, mas Israel ainda tem muito a aprender se não é capaz de compreender as razões que podem levar um ser humano a transformar-se numa bomba.”), mas só para não o poupar: “E se formos ouvir a retórica do delírio e da auto-hipnose, então mais vale que a ouçamos de um laureado de Estocolmo (…) [cuja] linhagem da prosa (…) na verdade é a mais pura e empertigada grandiloquência (poderia chamar-se-lhe nobelês).”
O mais radical encolher de ombros à opinião alheia, vai, porém, para Francis Bacon que, quando interrogado sobre pintura abstracta, respondeu (cito de memória): “É assim como o padrão dos sofás. Fica bem na sala…”.

10 comentários:

Diogo disse...

(“Ah, sim, os horrendos massacres de civis causados pelos chamados terroristas suicidas… Horrendos, sim, sem dúvida; condenáveis, sim, sem dúvida, mas Israel ainda tem muito a aprender se não é capaz de compreender as razões que podem levar um ser humano a transformar-se numa bomba.”)


Nalguns aspectos claramente demarcados, o actual apoio dos Estados Unidos ao governo israelita corresponde aos interesses próprios americanos. Numa região onde o nacionalismo árabe pode ameaçar o controle de petróleo pelos americanos assim como outros interesses estratégicos, Israel tem desempenhado um papel fundamental evitando vitórias de movimentos árabes, não apenas na Palestina como também no Líbano e na Jordânia. Israel manteve a Síria, com o seu governo nacionalista que já foi aliado da União Soviética, sob controlo, e a força aérea israelita é preponderante na região.

Como foi descrito por um analista israelita durante o escândalo Irão-Contras, onde Israel teve um papel crucial como intermediário, "É como se Israel se tivesse tornado noutra agência federal [americana], uma que é conveniente utilizar quando se quer algo feito sem muito barulho." O ex-ministro de Estado americano, Alexander Haig, descreveu Israel como o maior e o único porta-aviões americano que é impossível afundar.

O alto nível continuado de ajuda dos EUA a Israel deriva menos da preocupação pela sobrevivência de Israel mas antes do desejo de que Israel continue o seu domínio político sobre os Palestinianos e que mantenha o seu domínio militar da região.

Na realidade, um Estado israelita em constante estado de guerra - tecnologicamente sofisticado e militarmente avançado, mas com uma economia dependente dos Estados Unidos, está muito mais disposto a executar operações que outros aliados considerariam inaceitáveis, do que um Estado Israelita que estivesse em paz com os seus vizinhos.

Israel recebe actualmente três mil milhões de dólares por ano em ajuda militar dos Estados Unidos.

Miguel Serras Pereira disse...

Olha, Ana, eu sei que são impressionantes os argumentos de vária ordem - dos naturalistas ao pesadelo que são os imortais de Borges - que procuram fazer virtude da necessidade da morte. Sou etremamente sensível a alguns deles, e creio, também eu que, mortais que somos, esquecê-lo ou denegá-lo empobrece radicalmente a nossa potência de recriação da vida.
Dito isto, todavia, a velhice e a morte são um fado que podemos reconhecer, sem termos de lhe dar o nosso amor. De resto, não são as justificações ou racionalizações que tentam tirar-se da enumeração dos prodígios de invenção dos quais, respondendo à morte ou à velhice, fomos ou poderemos ser capazes, que as movem ou demovem. É isso que as faz soar como as palavras da raposa da fábula que vê as uvas sem poder colhê-las. E creio que se a imortalidade nos fosse oferecida como alternativa não deixaríamos de encontrar razões e justificações mais do que abundantes em favor dessa opção. Se há um núcleo de verdade na ilusão, quando não impostura, religiosa é bem essa: a da nostalgia da eternidade, a da negação do para sempre e nunca mais da nossa condição mortal, a da tentação das satisfações, ainda que por procuração, com que um ou outro além-mundo acariciam o desejo de imortalidade que se confunde com o "conatus" que nos impele a persistir no próprio ser - ou a que nos representemos como parte de um ser que suspendesse o assombro que, apesar de tudo também nos habita, da presença real do tempo em todo o ser e tudo o que somos.

Abraço

miguel(sp)

Anónimo disse...

«Vantagens EM» ??!! Aprenda a escrever...

Miguel Serras Pereira disse...

Anónimo Preocupado com a Gramática,

suponho que V. não se deveria precipitar tanto no furor correctivo, antes de se dar com um pouco mais de ira e estudo ao trabalho de considerar o problema.

Acontece que não vejo qualquer incorrecção numa expressão verabl como "Das vantagens que há em ir envelhecendo" - e daí que me sinta tentado a crer que não é menos legítima a elipse da expressão usada pela minha camarada: "Das vantagens [que há] em ir envelhecendo".
Permita-me, pois, que lhe sugira ainda que aprecie bem a mestria com que a ACL evita os dois pequenos escolhos das duas formulações alternativas que ocorrem mais imediatamente ao leitor: "DAS vantagens DE ir envelhecendo" e "Da vantagEM EM ir envelhecendo"…

Saudações idiomáticas

msp

Ana Cristina Leonardo disse...

Miguel, eu até vinha cá dialogar com o leitor atento e anónimo, mas tu já disseste tudo. Quanto à imortalidade, estou com o Borges: espero morrer e que seja mesmo o fim (cito de memória). Claro que isso não quer dizer que seja capaz de imaginar o mundo sem mim...
:-)

Anónimo disse...

"DAS vantagens DE ir envelhecendo" é um pequeno escolho? Bolas, o furioso idiomático está ao seu melhor nível. Só pode ser dos malefícios EM envelhecer, ou seja, "dos malefícios [que há] EM envelhecer". O segredo está na elipse. ACL e MSP: a mesma luta.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Anónimo Idiomático,

receio que não tenha apreendido a intenção metafórica do "escolho". Já me inquiata um pouco mais a sua insistência na inaceitabilidade gramatical de uma frase como "haver vantagens no ir envelhecendo", "descobrir vantagens em ir envelhecendo" e, também, se quiser ser consequente, na exclusão do sintagma "o ir envelhecendo".
Todavia, creio discernir no que escreve serem motivações obscuras de ordem afectiva a causa das ressentidas insanidades gramaticais que o afligem.

Como adivinhará qualquer amigo das luzes da razão humana, não me parece que as caixas de comentários sejam divã que permita elucidá-lo, pelo que lhe rogo que tenha maneiras quando nelas quiser interpelar alguém. Faça-me esse favor que em seu, afinal, reverterá, em mo fazendo.

Com a atenta amenidade possível

msp

Ana Cristina Leonardo disse...

Anónimo, permita-me uma pergunta e não me leve a mal: que idade tem? Talvez o seu desagrado seja tão-só uma questão geracional, apesar de eu não acreditar demasiado em gerações. (estou a tentar perceber o "seu furor correctivo", para citar o Miguel, sem o dar apenas por parvo...)

Miguel, estiveste bem, ameno qb.

Anónimo disse...

ACL, deixe lá a minha idade, isso pouco importa. Mas, se quer insistir em falar disso, olhe primeiro para a sua e a seguir para a geração a que pertence. E diga lá então: o que escreve é ou não é tão fraquinho, tão mauzinho, tão ignorantinho? Incluindo as tão preclaras elipses, obviamente.
Boas elipses e bom fim-de-semana para si e para o seu amigo Fouchet elipsíco.

Ana Cristina Leonardo disse...

Anónimo, tem todo o direito a adjectivar os meus humildes posts como bem entender. Mas se era isso que queria dizer, porque não disse logo, homem? Ficava o assunto arrumado e escusava o Miguel de perder tempo a explicar-lhe a "tão preclara elipse". Mas bom-de-semana para si também.
(pelo uso da palavra preclara, aposto, generosamente, que já passou os 50...)