12/05/12
Lição de grego (4)
por
Miguel Serras Pereira
É extraordinário — bem mais do que os "porcos com asas" invocados por Lewis Carroll (e imortalizados pela citação em epígrafe que deles faz este blogue). Nos últimos dias, os núcleos de vanguarda dos simpatizantes lusitanos do KKE anteciparam, profetizara, denunciaram que o Syriza se preparava para demonstrar que não tinha princípios e para capitular perante a troika, pelo que se veria, então, que a única alternativa era o próprio KKE e a sua plataforma nacionalista, confiada à direcção exclusiva do próprio KKE. Agora, depois de o Syriza ter recusado como anunciara integrar qualquer governo que não assegurasse a ruptura com o anterior governo adoptando como base os cinco pontos formulados pelos seus porta-vozes assim que foram conhecidos os resultados eleitorais, é acusado de ter traído o veredicto popular e de ser um fantoche social-democrata ao serviço da troika por ter levado a cabo encontros com outras forças políticas para lhes comunicar as suas condições ou reiterar que recusava participar em qualquer governo que não as tomasse por base. Conclusão: como Mário Cesariny escreveu um dia que "há justos e réprobos porque o Senhor / quis vingar-se de nós porque sim", teríamos de admitir que, na Grécia, há os patriotas do KKE e os outros são traidores — porque o KKE assim o diz porque sim.
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7 comentários:
um pouco offtopic mas espreitem este post: http://blog.occupiedlondon.org/2012/05/11/1-in-2-police-members-voted-nazi-in-last-weeks-elections/
"the percentage of police who voted for Golden Dawn ranges between 45% and 59%"
E este, também algo relacionado: http://blog.occupiedlondon.org/2012/05/11/may-9-police-and-nazis-in-joint-operation-against-migrant-traders-and-anarchists-in-central-athens-in-broad-daylight/
Isso quer dizer que a haver um golpe de estado na Grécia, ou mergulhe esta no caos assim que sair da UE, as forças "revolucionárias" estarão muito mais inclinadas para o fascismo.
De um modo mais prosaico: preso por ter cão, preso por não ter...
Ainda há quem pense que o soberanismo resolve alguma coisa...
Sim, João "ainda há quem pense que o soberanismo resolve alguma coisa", e o pior é que muitos não se dão conta de que ao julgá-lo e a agir em conformidade correm o risco de estar a abrir a própria cova…
msp
Calma, Miguel, não se precipite, nem profetize, quando chegar a hora veremos.
Mas olhe que a conversa já começou a mudar.
Numa nova carta às autoridades europeias sobre os termos do resgate grego, o Syriza já não fala duma rejeição liminar do acordo, conforme declarações de Tsipras na noite das eleições, mas em "repensar o contexto de toda a estratégia existente." http://bit.ly/IMy3Av
Bem aparecido, Dédé. Agradeço penhoradamente o seu conselho, e permita-me que retribua.
Com efeito, não creio ter perdido a calma e não preciso de ter o Syriza por profeta ou guia para justificar a minha análise. São outros - e V. nem sempre os tem poupado - que precisam de afirmar a - e talvez crer cegamente na - infalibilidade do KKE como se, à falta dela, nada mais contasse.
A meu ver, um dos erros fundamentais das concepções e da prática do KKE consiste, para além das posições concretas que defende a determinado momento, no modo como se concebe a si próprio, o seu papel e a sua relação com o conjunto da sociedade. E o mesmo se diga dos lusos incondicionais - não é o seu caso, bem sei - do KKE, que, na maneira como se representam as relações entre um partido e as lutas sociais, são como aqueles dos quais o Alexandre O'Neil dizia acreditarem que a água nascia nas torneiras. Outro dos truques que tanto o KKE como os seus adeptos usam para terem sempre razão, para terem tido sempre razão, ainda quando não a tiveram, é o facto de se oporem a tudo o que mexa fora do seu controle e direcção. Coerência a toda a prova - à prova dos factos, para começar. Mas coerência delirante. E que, ainda que falhe na tentativa de se impor como poder absoluto, acima da sociedade ou da "classe" cuja verdade superior pretende representar, contribui activamente para dificultar qualquer alternativa que não seja a sua.
Seu leitor sempre atento
msp
"(...) contribui activamente para dificultar qualquer alternativa que não seja a sua."
Não é isso mesmo o que faz o Miguel Serras Pereira ou qualquer outro indivíduo que tenha em boa conta e por justas as convicções por que luta? Porque razão, Miguel Serras Pereira, dificulta alternativas que não sejam as suas?
Anónimo que Assina Miguel,
tem razão, a formulação é deficiente: deveria ser - ou subentender-se - "qualquer alternativa que não seja (da) sua iniciativa". É esse o sentido da frase, como decorre do contexto: "qualquer alternativa que não seja feita sob a sua direcção, sob o seu comando, com a sua organização ao leme", etc.. Aqui fica a precisão.
msp
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