30/01/12

Contra o Estado-nação - pela defesa da liberdade política e a conquista da democracia

1. Verosimilmente, a desagregação da UE, longe de representar um regresso ao statu quo ante — cuja dinâmica, de resto, alguns distraídos melhor fariam em reconhecer que teve desde o pós-guerra uma ou outra forma de "construção europeia" como horizonte, e também combustível —, assemelhar-se-ia mais a uma "balcanização", cujo potencial regressivo de belicismo, nacionalismo e crispação autoritária poderá ser fatal subestimarmos.

2. A construção de uma União Europeia, que mantenha os Estados-nação e as "independências nacionais", por outro ldo, parece só poder redundar — a menos que dê lugar à balcanização acabada de referir — num quadro em que só um desses Estados (eventualmente alargado por meio de anexações formalmente "voluntárias") disporá, de facto, de poder propriamente soberano, reduzindo os outros à condição de Estados-vassalos. É a solução Merkel. E as suas consequências sociais e políticas imediatas estão à vista: os cidadãos dos Estados-vassalos verão ainda mais corroída e enfraquecida a sua capacidade de controle defensivo sobre as instâncias de decisão que os governam. Os cidadãos gregos ou portugueses não elegem o governo alemão…

3. A alternativa aos dois cenários anteriores — sobretudo do ponto de vista de quem aposta na democratização profunda das formas oligárquicas institucionais (políticas stricto sensu ou exercidas através da direcção da economia) que hoje governam esta região do mundo — só poderá ser de tipo federal, submetendo constitucionalmente um governo europeu ao controle dos cidadãos da UE e abrindo, assim, caminho a uma reorganização radical das instituições governantes, cuja legitimidade e reconhecimento passariam a ter por condição a participação activa e igualitária dos cidadãos no seu funcionamento regular. E, no plano imediato, salta aos olhos que os cidadãos da região grega, ou portuguesa, etc. — e sem excluir os cidadãos alemães — teriam maiores possibilidades de dizer uma palavra sobre o seu destino, melhores perspectivas de defesa e extensão das liberdades e direitos fundamentais, se fossem já, todos por igual, cidadãos europeus. Substituindo a defesa do Estado-nação e das "independências nacionais" pela defesa da liberdade política e a conquista da democracia.

5 comentários:

Anónimo disse...

Há um artigo do Jacques Sapir muito interessante sobre os custos e o mecanismo do bluff político e eleitoral encenado pela chancelerina Merkel para tentar inpôr à Grécia um comissário fiscalista, no semanário fundado por J-F. Khan, na versão On Line de hoje. A hipótese parece gorada, segundo o Libé desta noite. De realçar que a Internacional Socialista ( Europa) apoiou essa (in)cartada de Merkel. Sapir bem sublinha a delicadeza das finanças teutónicas e os imperativos do calendário eleitoral interno na Alemanha, a " obrigarem " os agentes da coligação de centro-direita no poder ao maior dos cuidados...Urge olhar para o frenesim e loucura que se apoderou de Sarko, a três meses das Presidenciais gaulesas :superactivo e a debitar frenéticamente promessas e miragens, ocupa diariamente o prime-time dos telejornais, que têm 45 a 60 minutos cada... Atenção: um dos leitores do artigo de Jacques Sapir foca o caso de Portugal, cerca das 22:37 horas de hoje. E diz: " Enquanto todo o mundo observa a Grécia, Portugal agoniza. As taxas de juros dos empréstimos a Portugal atingem niveis insustentáveis: a 2 anos, 21,008 %; a 3 anos- 24,478 %...A escola dos " economistas " radicais norte-americanos tenta vender a tese da queda tendencial do valor do dólar e o corte de 20% nos salários como fórmulas para combater o desemprego e a crise económica, e Krugman retoma essa ideia do corte dos salários para casos desesperados como o de Portugal...Salut! Niet

joão viegas disse...

Ola,

Ninguém tem mais do que nos a obrigação de saber o que significa a Europa das Nações. Foi a que existiu até ao 25 de Abril e funcionava lindamente :

Os labregos iam para as Franças e as Alemanhas fazer pela vida e recambiavam para ca uma pequena parte do dinheiro para construir maisons e organizar a procissão anual necessaria para se precaverem contra o risco de que os filhos deles permanecidos no pais fossem utilizados num qualquer "ballet rose".

Os mais felizes, percebiam que o melhor ainda era criar os filhos nas Franças onde, apesar do seu destino de franceses de segunda, tinham hipoteses de uma vida melhor, como capatazes e distintos membros dos partidos de extrema direita...

A revolução é para a frente, não para tras...

Proletarios de todos os paises...

Boas

António Geraldo Dias disse...

Miguel,denunciar os estados e os governos que deixam a linha de defesa da liberdade política entregue à oligarquia capitalista,o que faz deles,aliás, governos pouco nacionais,de acordo,já fazer do "contra o Estado-nação" o combustível,só poderá servir para alimentar o nacionalismo,não acha?

Miguel Serras Pereira disse...

Caro João,
nem mais. Obrigado pela corroboração expressiva do meu argumento.
Abraço

Caro António,
estou inteiramente de acordo. Só que a sua objecção ao "combustível" decorre ou de um contra-senso da sua leitura ou da falta de jeito da minha formulação.
Abraço

msp

Anónimo disse...

OH, MS Pereira: Não estamos todos- todos mesmo- a correr o risco de se estar a privilegiar a economia política tout court e os sortilégios atrabiliários da " ciência económica ", quando a alternativa se joga na desmontagem do imaginário de progresso do " sistema " e no combate à falta de verdadeira igualdade perante a propriedade e as leis? Salut! Niet