22/01/12

Impeachment?

Claro que a destituição de Cavaco por iniciativa de um movimento cívico seria motivo de regozijo para a democracia e uma sua vitória. Poderia até vir a ser, com trabalho político q.b. a ajudar, um primeiro passo para a medida efectivamente democratizadora que seria, isso sim, a substituição da instituição do "Chefe de Estado" por uma magistratura — eminentemente "simbólica" — da presidência da república, cujo titular seria, por exemplo,  "escolhido" rotativamente e por meio de sorteio entre todos os cidadãos adultos e no pleno gozo dos seus direitos políticos.
No entanto, esta petição que circula por aí e recebeu o patrocínio de cabeças habitualmente mais sóbrias,  está tão indigente e atabalhoadamente redigida e é tão desastrada na formulação dos seus considerandos, que me parece que o melhor seria fazer outra, um pouco mais legível e mais consistentemente argumentada.
Deixando de lado a redacção do portugês, e a confusão mental que veicula e favorece, é, pelo menos, débil invocar, como motivo para a destituição do PR, "o medíocre desempenho do Sr. Presidente da República face à sua diminuta intervenção nos assuntos fundamentais e fracturantes da Sociedade Portuguesa", ainda que invocando a "grande falta de senso e de respeito para com a População Portuguesa" de Cavaco, em "recentes declarações enquanto Presidente da República Portuguesa".
Não seria mais simples, mais correcto e mais certeiro, se, apesar dos seus perigos, se quisesse jogar o jogo constitucional, reclamar a destituição de Cavaco tentando mostrar que as suas declaraçôes são contrárias aos princípios, ou ao espírito explícito do legislador, da Constituição da República, e fazendo o mesmo quanto a vários aspectos — sucintamente enumerados ou ilustrados — do seu desempenho das funções presidenciais que lhe foram cometidas?
Na alternativa, se é num processo instituinte ou constituinte, para além do jogo constitucional, que se aposta, então, a parada da destituição de Cavaco é muito baixa, a importância das suas declarações bastante menor excepto como sintoma, e há outras reivindicações ou alvos imediatos por onde continuar ou começar a abrir caminho à instauração do poder democrático dos cidadãos organizados.

15 comentários:

Joana Lopes disse...

Miguel,
Estou fundamentalmente de acordo contigo (vê o «post» que puliquei há uma hora ou duas), a Petição não tem pés nem cabeça.
Mas «Impeachment» como? Não está previsto na Consituição. Força de pressão para que o próprio se demita?

Miguel Serras Pereira disse...

Claro, Joana, tens toda a razão. O meu "impeachment" é acompanhado de um ponto mais de perplexidade do que de interrogação. Enfim, se queres saber tudo, quando ouvi falar da petição, julguei que era uma brincadeira - e, como tal, assumida, até não viria daí mal ao mundo. Depois, quando li a Petição e vi que era a sério e que gente habitualmente mais atinada a subscrevia - apesar dos termos caricaturais da redacção e da argumentação -, resolvi intervir. Suponho que por razões, no fundamental, solidárias das tuas.
Penso que, se o Cavaco se desacreditou um pouco mais e deu mais uma prova do espírito mesquinho/"respeitinho é que é preciso" com que - pelo menos politicamente - se vê a si próprio e aos outros, uma petição tão débil e caricata só desacredita politicamente quem nela embarca.

miguel(sp)

Carlos Vidal disse...

É sempre mais simples não assinar nada.
E voltar à diarreia da "cidadania governante" substituta da "presidência", um "poder de todos para todos". Em suma, é sempre mais simples ficar calado.
(Basta ver de quem vem o post.)

Miguel Serras Pereira disse...

AVISO À NAVEGAÇÃO:

Acabo de apagar um comentário anónimo que afirma - categoricamente e sem provas - que Cavaco tem certa doença e que é preciso destituí-lo por isso, e pedir contas aos membros que integraram a sua comissão de recandidatura, etc.
Apagarei todos os do mesmo género que apareçam.

Obrigado

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Sobre o comentário do CV:

há quem use métodos ainda mais simples, como censurar sempre e à partida os comentários dos comentadores que desagradam ao CV (e entre os quais me incluo), mas dar abrigo a comentários afascistados (para já não falarmos do que CV escreve em muitos dos seus próprios posts).
Um exemplo de comentário afascistado que o CV acolhe e, depois, expressamente subscreve:

"leonel says:
22 de Janeiro de 2012 at 23:34
quando é que o povo tem um pouco de dignidade e corre com estas carraças que bebem o sangue do povo e retiramos a sua nacionalidade portuguesa e os mandamos para fora de portugal por crimes contra o povo e a patria

Responder

Carlos Vidal says:
22 de Janeiro de 2012 at 23:41

Isso pergunto eu, também.

Responder"

Cada um tem a simplicidade de que é capaz.

msp

Carlos Vidal disse...

Apenas tenho reservas à palavra "pátria". De resto, o comentário de leonel não é nada mau.
Como não sou democrata, manteria por cá estes políticos e optaria ou pela sua eliminação física ou por uma espécie de gulag, que também não me incomoda nada, nem o lugar nem a sua "memória".

Miguel Serras Pereira disse...

No seu segundo comentário, CV deixa clara, para quem queira ver, a natureza das suas posições políticas. Mas seria curioso que ele - ou alguém por ele - explicasse de que modo se pode não ser irremediavelmente anticomunista - isto é, inimigo mortal do projecto instituinte sociedade igualitária, sem hierarquias de poder entre cidadãos responsáveis e indivíduos livres - deitando borda fora a democracia e tomando por vias tipo gulag. E não me venham com conversas fiadas sobre o primado da igualdade: a igualdade "social" só pode ser garantida pela liberdade política, e a participação organizada e não tutelada no exercício do governo, dos seus destinatários e/ou titulares.

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Luís Teixeira Neves,
como explico no "aviso à navegação" acima, não publico comentários como o seu, que especulam sobre eventuais enfermidades de Cavaco.
Mas deixe-me acrescentar que é sintoma de uma grande impotência política confiar à doença - em vez de a garantir pela acção política - o afastamento ou demissão dos representantes do regime.

msp

Joana Lopes disse...

O meu aplauso, Miguel, quanto ao teu Aviso à Navegação. Se frequentasses o Facebook, verias o entusiasmo de alguns por essa tese (nem sequer é hipótese!...) da doença de Cavaco e respectivo apelo para que entre na discussão pública.

Libertário disse...

Enquanto ficarmos a perder tempo com iniciativas do jogo e do espectáculo político como essa dos abaixo-assinados não iremos longe...
Se algumas coisas devem, e podem, ser feitas a curto prazo serão as que se relacionam com a contra-informação, para alargar a contestação social, e a organização das lutas de base contra as classes dominantes e o seu sistema político mafioso.

Carlos Vidal disse...

A questão é simples: a democracia colide sempre com a vontade geral. E eu estou do lado da segunda.
Entendido??

Miguel Serras Pereira disse...

O CV pode fazer os exercícios de prestidigitação que qiser, seguindo a tradição dos sacerdotes e apologistas das hierarquias sociais classistas.
É verdade que a "vontade geral" é mais e, sobretudo, diferente da soma das apetições individuais. Mas não é menos verdade que se a sua interpretação e execução empíricas não forem controladas pela generalidade dos cidadãos - sendo já cada um destes uma metamorfose social-historicamente criada que é condição da emergência de uma "vontade geral" e que emerge para além, neles próprios, da sua condição de "privados" ou "particulares" -, essa "vontade geral" ou a detenção da sua fixação e definição se tornará apanágio de uma camada hierárquica dominante que só pode reproduzir as instituições de uma sociedade de classes.
Aliás, é um traço bem conhecido de certas tendências conservadores e, ainda mais, dos movimentos contra-revolucionários a invocação da "vontade geral" contra a democracia e a confusão estabelecida entre democracia e anomia individualista. Não há, por definição, igualdade sem participação igual nas decisões governantes ou de direcção da vida colectiva. O que significa que, por definição, também não há igualdade - ou "comunismo" - sem democracia.

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Luís Teixeira Neves,
com o devido respeito e depois de reflexão atenta sobre o teor das suas razões, continuo a optar por não publicar os seus comentários sobre a saúde de Cavaco.
Com toda a consideração pela sua pessoa, apesar das nossas já antigas divergências - sinceramente

msp

Anónimo disse...

O sr. C.V. é um brincalhão de trazer por casa, escondendo-se nas fraldas dos seus mentores, Badiou e Heidegger. Tenta impingir-nos que igualdade, identidade e autonomia são pretextos e paradoxos políticos arbitrários, sonhando com o poder/castração...ou com a onanimização desse fantasma,claro. Ao heroísmo estetico do Mal(Sade) e face ao heroismo estetico da Transgressão( Foucault e Bataille), C.V. prefere e enfatiza o terror dos Goulags dos novos e velhos Estalines...Talvez a metafísica schizo - tão expressa na pintura religiosa multimilenar -conjuge os excessos e paradoxos numa forma de absoluto - como a necessidade absoluta de contingência... Mas,isso, como o lembrou agora S. Rudshie, será tão improvável e gritantemente dantesco como as invectivas escatológicas de C. Hitchens sobre J-L. Carré, a propósito da teodiceia dos déspostas.Niet

joão viegas disse...

Caro Miguel,

Isto é simplesmente patético.

Estamos a falar de protestos que emanam dos mesmos que se indignam com a ideia de que a constituição possa não estar a ser respeitada, ou ainda que possa vir a ser modificada.

Professores, jornalistas, enfim tudo clérigos que tinham a obrigação de saber ler, de saber escrever, de saber contar, e de serem capazes de remexer dois ou três segundos uma ideia que lhes venha, antes de a cuspirem para fora.

O grande iluminado Carlos Vidal pode explicar como é que ele faz para pugnar pelo respeito do direito constitucional que protege o trabalhador contra o despedimento sem justa causa, quando ao mesmo tempo limpa o traseiro à mesma constituição que define as regras da eleição e do mandato do PR ?

Assim não vamos la. Desculpem !

Boas