17/01/12

Sobre o Processo de Macaização em Curso

Não há conflito na alienação de capital da REN a uma empresa do Estado chinês, depois de 21,35% da EDP terem também sido vendidos a uma participada do mesmo accionista, a China Three Gorges, defendeu hoje o secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes.

Não é preciso ser-se um observador invulgarmente perspicaz para entender que o processo de macaização em curso, liderado pelo actual governo, conhece perspectivas de aceleração notáveis e já esteve mais longe de tornar esta região ibérica "território chinês sob administração portuguesa", justamente os termos que, antes da transferência da soberania para a RPC, definiam o estatuto de Macau. Aparentemente, o governo e outros altos responsáveis portugueses consideram estarem reunidas as condições para que, em breve, após uma fase de negociações com o governo alemão garantindo o reconhecimento oficial do processo pela UE, uma declaração conjunta luso-chinesa fixe o prazo da integração da nova região administrativa, eventualmente com o estatuto de zona económica especial, na RPC.

6 comentários:

jpm disse...

Nunca esperei ver o MSP, a quem a retórica nacionalista ou patriótica incomoda tanto, agitar o medo da dominação chinesa. Fosse de outra nacionalidade, a empresa, e problema nenhum surgiria. Afinal também não está imune ao patrioteirismo que por aí grassa. Ou no caso chinês, o anti-imperialismo já faz sentido?

Miguel Serras Pereira disse...

Caro jpm,
estou-me mais ou menos nas tintas para a "independência nacional", mas não para a democracia, ou para a salvaguarda e extensão do projecto de democratização do exercício governante do poder político. Dito isto, a subordinação a uma grande potência ou a um poder imperialista, que só pode ser antidemocrático, hierárquico e classista, é umas perspectiva que me importa combater.
Se quer saber tudo, penso que um processo de construção europeia democrático e federal seria um enorme passo em frente tanto no plano da defesa e aprofundamento das liberdades e direitos na Europa, como à escala internacional e mundial. Ora, é evidente que negócios como aqueles a que me refiro estariam absolutamente fora de causa num tal processo de construção/democratização.
Ou, por outras palavras, o imperialismo e o (neo)colonialismo não são armas do combate democrático contra o nacionalismo.

Saudações republicanas

msp

jpm disse...

Caro MSP,

O problema parece-me ser a importância que se dá à nacionalidade. Duvido muito que uma empresa alemã tivesse uma actuação muito diferente da chinesa. Nesse capítulo, as empresas têm mostrado a sua aptidão multicultural para se ambientarem aos ambientes onde operam. Continuo sem perceber a sua limitação a uma federação europeia, porque não uma mundial, já agora?

Miguel Serras Pereira disse...

Caro jpm,
parece-me um tanto artificial este nosso desacordo. Outros teremos talvez mais sérios. Pneso que, ibérica, europeia ou mundial, a federação (como processo) que me interessa e que defendo deve ter por via e objectivo a democratização das relações de poder e das instituições por que nos governamos. Nos antípodas do modelo chinês da "sociedade harmoniosa", com a sua sobre-exploração desenfreada, a sua ausência das liberdades e direitos sociais mais elementares, os seus propósitos de hegemonia à escala global. Não é com uma "invasão" chinesa que ponha em causa a nossa independência nacional que devemos preocupar-nos; a ameaça é antes a da imposição de importarmos - por via "económica" - os traços mais mosntruosos do seu modelo, em detrimento das já parcas perspectivas de democratização.
Se o meu post, que é uma brincadeira, se presta a leituras nacionalistas ou a outros equívocos, aqui fica a correcção possível. Agradeço-lhe o ensejo que me dá de a fazer. E, de momento, creio que é tudo.

Cordiais saudações democráticas

msp

jpm disse...

Teremos, certamente, várias divergências. Esta penso que é uma delas. Não me parece que a adopção de um modelo social desastroso se vá processar através de operações como esta que discutimos. Em relação ao resto, lá está, temos certamente muitas divergências. A primeira das quais é a de se assumir assim, à partida, que a RPC tem um projecto de hegemonia global. Do pouco que fui lendo, isso parece-me muito pouco provável. E não, eu não acho que a China seja um importante pólo de resistência anti-imperialista. Acho é que muito do barulho que se fez não teve grande razão de ser.
Também me fico por aqui agora.

Cumprimentos

jpm disse...

É verdade que devemos ter várias outras divergências. Quanto a esta, limito-me a insistir na ideia que não vejo grande diferença em ser uma empresa chinesa ou alemã. A ideia é esta, fora de portas os chineses comportam-se como os alemães, tal como na china, os alemães se comportam com os chineses. É aquela divisão muitas das vezes artificiais que os teóricos das relações internacionais estabelecem entre política interna e externa (com algumas variantes).
Permita-me ainda discordar da ideia de pretensão de hegemonia social por parte da China. Nada aponta nesse sentido, pelo pouco que fui lendo sobre a RPC. E não, não acho que a RPC seja um esteio do anti-imperialismo. Parece-me que no que toca a política externa são extremamente ciosos da sua soberania e não propriamente preocupados em projectar a sua força através da subjugação da soberania alheia, excepto nos casos muito particulares como o Tibete, Taiwan e por aí fora.