16/05/15

A possível vitória do movimento "Barcelona en Cómu"

Depois das eleições municipais espanholas do próximo dia 24 Barcelona pode passar a ter como Presidente da Câmara uma mulher, Ada Colau, que se candidata pela Plataforma Cidadã, "Barcelona en Cómu". Esta Plataforma reune diversas  organizações populares de base e conta com o apoio do Podemos e da Izquierda Unida. As sondagens apontam nesse sentido.  O que mais me entusiasma nesta possibilidade releva dos objectivos programáticos desta Plataforma. Objectivos que incluem a luta contra a corrupção e a desigualdade - há fortes correlações entre os dois fenómenos que são construções sociais de base marcadamente local/regional, como por cá sabemos - e  que, sobretudo, aspiram a transformar Barcelona numa cidade justa. Este é um debate apaixonante que por cá está por fazer ou melhor está por iniciar. Barcelona é uma cidade de referência no domínio do urbanismo. Uma cidade sempre percorrida por um debate ininterrupto sobre o modelo de cidade, sobre a relação entre a cidade e a cidadania, sobre os direitos urbanos dos cidadãos, sobre a relação entre o espaço público e esses direitos. Isso não quer dizer que a cidade tenha sido capaz de resisitir às dinâmicas da globalização e não tenha assisitido à transformação dos cidadãos em consumidores e da cidade num objecto de consumo. Zaida Muxi no seu livro "La arquitectura de la ciudad global" descreveu o processo como a globalização afecta a vida urbana recorrendo a três aspectos:
             "1) Domínio de la fuerza del mercado y de las decisiones empresariales en un mundo
               -red con nodos principales, generando áreas de privilégio fragmentadas en todo el
                 planeta.
              2) Descompromisso politico con la realidad social, derivado de un convencimiento
              de que la estrategia de mercado resuelve los problemas urbanos, enmascarando las
              diferencias sociales y la lucha de classes.
               3) Cambio produtivo que deriva en la primacia de la producción de servicios ter-
              ciarios como fuente primordial de recursos urbanos y en la festivalización de la vida
              urbana.
Este "Projecto" da cidade da globalização é por cá glorificado a cada dia que passa, como sabemos. A cidade como objecto de consumo bate sucessivos recordes de procura - o turismo é um indicador sempre utilizado -  sendo as questões dos direitos urbanos e da desigualdade, convenientemente varridas para as periferias distantes e isoladas. A esquerda responsável e credível que temos tido, na sua gestão concreta das cidades que (des)governa, nunca esquece  estes príncipios fundamentais da globalização.      
Que em Barcelona uma candidatura cidadã possa aspirar a governar a cidade para lhe devolver a justiça perdida, para a tornar uma cidade justa,  diz bem do caminho percorrido pelos espanhóis por comparação com a nossa apagada e vil tristeza.

3 comentários:

Miguel Serras Pereira disse...

Caro,
um pouco à margem do teu post, mas de acordo com um dos seus propósitos centrais, gostaria de dizer aqui que, com efeito, o primado atribuído à transformação da cidade e da vida quotidiana equivale à reafirmação "aristotélica" da política como a mais arquitectónica das artes e é condição necessária tanto de uma recriação democrática da política como de uma repolitização democrática da economia política. Não é à economia que cabe governar os cidadãos comuns, mas a estes que cabe como iguais e em comum o governo da cidade, subordinando-lhe a direcção da economia.

Abraço

msp

António Geraldo Dias disse...

Una herida la atraviesa, a veces larvada, a veces aguda(...)La ciudad ha vuelto a reaccionar, lo ha hecho ocupando las plazas, parando desalojos, enfrentándose y denunciando la represión, soñando con la posibilidad de refundarse de nuevo (La Ciudad de los Prodigios en Comú,Sin Permisso)Barcelona a cidade europeia que mais lutas operárias e revoltas populares conheceu nos dois últimos séculos.

José Guinote disse...

Subscrevo sem reservas meu caro Miguel. É na recusa dessa visão aristotélica da política que entronca a visão neoliberal da cidade que partidos de esquerda e de direita têm alimentado, com as suas particularidades. É por isso que tanto se glorifica a arquitectura em oposição ao urbanismo ou aos projectos urbanos. Trata-se de valorizar o poder económico - o poder de construir, o domínio da iniciaitva privada, a importância da competitividade - em detrimento do poder político - o poder de planear, de decidir democraticamente, de promover a participação dos cidadãos na decisão política sobre a cidade que querem. O "poder local democrático", que por cá tanto se glorifica, é desse ponto de vista uma aberração, tese que eu defendo há anos.