Os resultados das eleições autonómicas e municipais do passado domingo agitam a política espanhola. A política de alianças para assegurar lideranças maioritárias nos parlamentos regionais e nas autarquias está no centro dos debates. A expressão mais visivel dessa agitação é a decisão política sobre quem irá liderar a autarquia de Madrid. A candidata do PP lançou um convite ao candidato socialista oferecendo-lhe o lugar de alcaide. Trata-se de evitar, a qualquer preço, que a capital seja liderada por alguém que utilize a sua importância política para "romper el sistema democrático occidental tal y como lo conocemos", disse ela. O candidato socialista recusou este convite inquinado. Resta-lhe aliar-se à candidata do "Ahora Madrid", a comunista Manuela Carmena, e possibilitar ao movimento apoiado pelo Podemos a governação da capital. Ou, em alternativa, possibilitar através da abstenção colaborante o governo minoritário do PP. Noutras regiões -Castilla-La Mancha, Extremadura e Asturias - o Podemos parece disponível para permitir a governação ao PSOE. O PSOE fez entetanto saber que dá liberdade aos líderes regionais para estabelecer alianças progressistas, excluindo alianças com o PP.
Vamos ver com que linhas se cozerão essas alianças, Os melhores resultados da esquerda nestas eleições foram alcançados quando as candidaturas tinham uma base social de apoio, construída nas lutas sociais(*). Sobretudo na luta contra as execuções das hipotecas pela banca e os consequentes despejos dos moradores que por força do desemprego ou da redução do salário se viram impedidos de pagar os empréstimos,. mas também na luta contra a corrupção que mina a sociedade espanhola ainda mais do que a portuguesa. Por cá o tema da luta contra a corrupção é pouco estimado pela esquerda, incapaz de compreender a importância desse combate. Incaapz sobretudo de perceber a correlação que há entre corrupção e desigualdade. Esses resultados foram obtidos nos grandes centros urbanos, com uma maior concentração de massa crítica e nos quais as consequências da crise austeritária foram mais dolorosas.
Depois das eleições parece haver uma exacta noção do mais importante que deve ser feito: criar condições políticas para melhorar a vida das pessoas, diminuindo a desigualdade e a injustiça, democratizando a política. Criar condições para serem os cidadãos a decidir, politizando o dia a dia, tornando a cidade o lugar da política. Para que isso seja possível é necessário exercer o poder conquistado pelos votos. Para isso é necessário fazer alianças? Então que se façam alianças. Para negociar são necessários dois lados e vontade de construir um compromisso. Em Barcelona e em Madrid quer Alda Colau quer Carmena anunciaram desde logo que irão estabelecer uma política de habitação que impeça que as pessoas sejam despejadas e colocadas a viver na rua, como acontecia até aqui. A banca vai ser convidada a rever os seus comportamentos impiedosos e especulativos. O parque habitacional municipal vai ser colocado ao serviço das necessidades dos cidadãos. Começar pela política de habitação diz bem de onde esta gente vem e para onde quer ir. Percebe-se que participaram nas lutas sociais e que sabem o que significa o direito á cidade e o que significou e como se construiu e que consequências teve, ao longo de anos, a negação desse direito.
Por cá a esquerda permanece discreta quanto a estes resultados. Aqui a tradição dominante é a da divisão e dos movimentos top-to-bottom, inventados por iluminados tocados por um chamamento irrecusável de base mais ou menos divina. As alianças são consideradas fatais a menos que os partidos mais centristas abjurem dos seus programas e reneguem na praça pública os tratados europeus, os pactos de estabilidade e tudo o resto. A discussão política nunca baixa ao nível das políticas urbanas porque as questões urbanas em Portugal são um não lugar do ponto de vista do debate politico. Quando não percebemos o essencial é mais fácil valorizarmos o acessório.
(*) - Para perceber melhor a natureza das diversas candidaturas à esquerda ler aqui.
27/05/15
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