Diga-se que este sistema de pôr dinheiro em circulação tem um potencial problema - no sistema tradicional, é fácil o banco central, se for necessário, reduzir a massa monetária em circulação: é só vender parte dos títulos acumulados, ou então conceder novos empréstimos a um ritmo inferior ao que os empréstimos anteriores vão sendo pagos; já num sistema em que o banco central emita dinheiro dando-o (em vez de emprestando-o ou comprando alguma coisa com ele) não é muito claro como se poderia reduzir a quantidade de dinheiro (diga-se que, na variante em que formalmente o banco central empresta ao estado, e que depois este distribui o dinheiro pelas pessoas, é mais fácil a redução - o banco central simplesmente empresta menos ao estado do que este devolve dos empréstimos passados, e nesse ano o estado lança um imposto em vez de distribuir o subsídio; a grande diferença aqui é que um estado tem autoridade para cobrar impostos e um banco central não).
Mas agora a questão é quanto isso representaria, esse dinheiro distribuído por cada pessoa?
Indo ao site do Banco Centra Europeu, temos as estatísticas, tanto da moeda em circulação (isto é, notas + moedas), como do chamado M1 (isto é, notas+moedas+depósitos à ordem). Estes são os valores em dezembro de cada ano (em billions de euros, o que eu presumo queira dizer milhares de milhões de euros):
moeda em circulação | M1 = moeda em circulação + depósitos à ordem | dif | dif M1 | ||
2016 | 1073 | 7189 | 38 | 591 | |
2015 | 1035 | 6598 | 68 | 690 | |
2014 | 967 | 5908 | 57 | 512 | |
2013 | 910 | 5396 | 46 | 310 | |
2012 | 864 | 5086 | 22 | 304 | |
2011 | 842 | 4782 | 46 | 98 | |
2010 | 796 | 4684 |
De dezembro de 2015 a dezembro de 2016, a quantidade de notas e moedas em circulação terá aumentado em 38 mil milhões de euros; se esse aumento fosse feito distribuindo esse dinheiro pelos 340 milhões de habitantes da zona euro, seria o equivalente a pagar a cada europeu um subsidio mensal de 9 euros (hum, não é lá muito impressivo...). De 2010 a 2016, o subsidio oscilaria entre cerca de 5 euros/mês (em 2012) e 16 euros/mês (em 2015).
No entanto, estes valores seriam muito maiores se o "QE para as pessoas" fosse conjugado com outra medida (que ultimamente tem sido defendida por muitos economistas, talvez até mais na direita do que na esquerda) - proibir os bancos de concederem empréstimos a partir dos depósitos à ordem; tal iria fazer com que o M1 fosse idêntico à moeda em circulação (já que seria exatamente igual ter o dinheiro na carteira ou num depósito à ordem), o que levaria a que o BCE tivesse que emitir muito mais dinheiro para compensar o facto de os bancos já não poderem eles criar moeda pelo método de emprestar dinheiro depositado à ordem. Isto é capaz de ser um pouco mais complicado, mas numa versão simplificada poderemos assumir que assim o BCE iria imprimir (e distribuir) dinheiro equivalente ao aumento do M1 - nesse caso, em 2016 equivaleria a um subsidio por pessoa de 144 euros/mês (oscilando entre 24 euros em 2011 e 169 euros em 2015).
1 comentários:
Miguel, os problemas práticos de implementação do 'Quantitative Easing para as pessoas' são um pouco mais vastos do que o que enuncia.
Porém, há uma forma alternativa de obter exactamente o mesmo efeito com o aparato operacional existente. O BCE pode comprar títulos de dívida pública de todos os países europeus (em proporção à respectiva chave de capital, por exemplo), mantê-los no seu balanço e absorver os respectivos juros. Esses juros podem depois ser devolvidos aos Estados europeus (enquanto accionistas do BCE), que usam as receitas para atribuir um subsídio aos cidadãos ou baixar generalizadamente os impostos.
O efeito final é exactamente o mesmo. A vantagem é que é mais fácil de operacionalizar. A desvantagem é que faz menos manchetes :)
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