Antes de tudo, convêm lembrar que o Sérgio Lavos escreveu (e que deu origem à conversa toda):
Contudo, se é verdade que não devemos ser ingénuos em relação ao gesto de quem mata Khadafi, também não deveríamos ser no que diz respeito à natureza do acontecimento: ao longo da História, as mudanças de regime raramente acabaram no julgamento dos antigos governantes. A diferença entre passado e presente reside apenas nos meios de registo à disposição. Não há imagens da cabeça de Robespierre nem do corpo de Hitler envenenado, mas de Mussolini resiste no imaginário colectivo...Aqui, a comparação de Robespierre com Hitler, Mussolini e Khadafi é na categoria "antigo governante cuja morte sem julgamento ocorre na queda do regime"; e a comparação mais especifico com Hitler foi na categoria "não há retratos do corpo". Alguém contesta que há efectivamente isso em comum entre esses personagens? (Para falar a verdade, acho a inclusão do Hitler não muito rigorosa, não pelo que fizeram em vida, mas pela morte: o suicídio de Hitler torna-o um caso à parte nessa galeria de assassinados/executados).
[editado - bem parece que a comparação foi mais longe que isso; reparo feito nos comentários pelo Jorge Nascimento Fernandes]
Mas agora vamos lá analisar os feitos de Robespierre:
Robespierre ter sido líder de uma revolução que “só” terminou com um regime absolutista profundamente opressor de milhões e milhões de camponeses. Uma revolução que solapou o poder a uma aristocracia absolutamente opressora e beneficiária de um sistema de extorsão servil. Uma revolução que não apenas destruiu o feudalismo em França como ajudou a implantar democracias um pouco por todo o mundo, especialmente na Europa.Isso que JVA apresenta são sobretudo feitos da revolução de 1789, num momento em que Robespierre era pouco mais do que um aspirante a politico; mas pronto, podemos argumentar que, embora Robespierre não tenha liderado o inicio da Revolução (nem tido um papel decisivo nas transformações sociais associadas), liderou a sua defesa contra as tentativas restauracionistas.
Mas agora outra questão, sobre JVA considerar "um revolucionário que merece todo o meu respeito, independentemente de não ter sido tão audaz e avançado como os sans-culottes". Interrogo-me o que ele teria escrito sobre Kerensky se este tivesse sido derrubado por Kornilov em vez de por Lenin.
É que Robespierre não deixou de ser audaz e avançado - na verdade foi provavelmente o mais audaz e avançado que um revolucionário burguês poderia ser; o governo jacobino foi exactamente isso - um governo da burguesia revolucionária, que reprimiu a contra-revolução e as facções burguesas que queriam capitular (os girondinos e os dantonistas), mas também qualquer tentativa de organização independente das classes populares parisienses, nomeadamente a expressada por facções como os Enragés e (ainda que de forma mais equivoca) os Hebertistas.
Ou seja, dizer que Robespierre não foi tão avançado como os sans-culottes é um duplo equivoco: é assumir que o programa dos jacobinos correspondia ao dos sectores populares, apenas com alguma diferença de grau (ignorando as diferenças fundamentais que - apesar das convergências - há, e já havia, entre os interesses da burguesia e os do proletariado nascente); e é esquecer o papel activo de Robespierre na repressão (por vezes sangrenta) sobre os sectores radicais (não se tratou apenas de "não ser tão audaz").
Bem, e mais de 200 anos depois, o que é que isso interessa? Interessa por (pelo menos) uma razão: em muitos aspectos, o conflito entre a direcção jacobina e a "oposição de esquerda" era largamente um conflito entre o poder central "forte" e o poder das unidades locais com elementos de democracia directa (como a Comuna de Paris - estou a falar desta, não desta - e as "secções", que era onde Enragés e Hebertistas tinham mais poder). Ora, cruzar isto com uma análise das classes em conflito dentro do campo revolucionário permite ver qual o tipo de regime politico que mais convém à burguesia e qual mais convém ao proletariado.
Dito de outra maneira - a tendência para querer fazer de Robespierre uma espécie de avô adoptivo da revolução operária (em vez de mais um protagonista da revolução burguesa) vem associada à tendência para querer manter (ou até reforçar) a estrutura hierárquica e centralizada do Estado "burguês", pondo-lhe apenas uma direcção "proletária" no topo. Pelo contrário, para alguém que veja a revolução socialista como algo tendente ao desaparecimento ou pelo menos ao deperecimento do Estado (nas versões anarquista e marxista ortodoxa, respectivamente), a luta de classes nos tempos da Convenção e a forma como essa luta se expressava na tensão entre o poder estatal oficial e o "poder popular de base" é um elemento histórico fundamental.
26 comentários:
Não tenho nada a comentar sobre o texto em si, até porque me considero totalmente ignorante na matéria, mas aplaudo a forma civilizada como apela ao debate utilizando mais argumentos e menos emoção.
1º a revolução francesa foi uma revolução urbana
apesar de libertAr os camponeses do jugo senhorial, tirou-lhes mais em requisições do que a nobreza e o clero
os Chouans não se levantaram só por questões religiosas até porque os campesinos ainda conservam muitos ritos pagãos
levantaram-se pelas requisições de trigo para alimentar as massas urbanas e pela fome generalizada nos campos
Mais ou menos o que aconteceu com os cossacos do don e do volga e com
os ucranianos
2º fica para amanhã
Mas Robespierre não é um líder no verdadeiro termo do culto de personalidade
ele não se moldou a si como líder
foi conduzido à liderança por outros que o utilizaram como testa de ferro
de resto a sobrevivência de alguns jacobinos no império e na restauração provam a plasticidade de alguns desses verdadeiros líderes atrás do Tirano
No caso Kadahfiano um dos militares atrás do trono levou um balázio ao passar-se para o outro lado
é uma questão complexa num período conturbado
Herrison escreveu umas coisas giras em 1848 sobre Robespierre
Tournemine 1828 é melhor infelizmente acho que nunca foi reeditado
tem histórias picarescas sobre gauthier Royer et Jagot deputados do departamento de l'Ain
e de Baille assassinado em Toulon
Moisés-Bayle membro da junta de segurança pública no tempo de Robespierre e do qual foi passada ordem de prisão a dezasseis do germinal do ano 3º (4 de Abril de 94) foi passada ordem de execução que foi perdida algures diz este cronista
e finalmente foi amnistiado por saber demais
Duperret e FAUCHET( BISPO constitucional de Calvados por defenderem o degredo do rei (quando houver paz) foram guilhotinados como federalistas em 1 de Novembro de 93 (dez de brumário
Doulcet (ex-marquês ex-constituinte foi preso em 3 de Outubro de 93 mas tornou a entrar para a convenção e ficou membro do conselho de 500 até ao primeiro prairal do ano 6º dizia de Robespierre
segundo Tournemine
(era necessário que alguém pagasse pelo terror é melhor cortar a cabeça folle para que le bon corpo subribiba
compris?
non?
atão veja Merlin da Moselle por alcunha o bigode e famigerado pelas missões na Vendé e em Mayence
responsável pela carta mais verrinosa no processo de Luis xvi
A MORTE DO TIRANO pode assegurar a liberdade e servir de exemplo a outros reis e aos supostos senhores do mundo voto pela morte do capeto
Assinado Hossmann REwbell e Merlin (de Thionville)
pronto já vê paralelismos quanto a quem pensa que pode destruir eixos do mal ou personificações do mal
(como dizia Steinbeck quem acredite nessas falácias que lute contra elas o homem tem instintos mais básicos
leia as binhas que s'apercebe do material que faz revoluções
e dos acasos que elevam tiranetes carismáticos e pais tiranos e mães da democracia
o papel de Izoard que não votou a morte de Luiz XVI saiu sem um arranhão do terror (e com mais cabedais) passou pelo império e restauração e era cônsul em Cagliari na Sardenha quase 40 anos depois
é um período curioso muito discutido mas pouco analisado por falta de psicólogos e analistas políticos contemporâneos
se mesmo agora ainda ninguém percebe o problema demográfico nacional
como se quer entrar na psique dos jacobinos ou da gironda da época
yo nem a boçês bos percebo...
mas tento y tento y tento
tenhão tento
Judgment and execution of Louis XVI. King of France;: with a list of the ...
Por Henry Goudemetz,France. Convention nationale
Voeux de J.F. Auguste Izoard ... sur les questions, Le jugement qui sera rendu par la Convention nationale sur Louis, sera-t-il soumis à la sanction du peuple, quelle peine infligera-t-on à Louis?: précédés de fragmens d'opinions, prononcés les 17 et 18 janvier, l'an 2 de la République
Volume 3 of Opinions des députés sur Louis XVI
Authors Jean François Auguste Izoard, France. Convention nationale
Publisher l'Imprimerie nationale, 1793
Length 7 pages
Biographie extraite du dictionnaire des parlementaires français de 1789 à 1889 (A.Robert et G.Cougny)
membre de la Convention, député au Conseil des Cinq-Cents, né à Embrun (Hautes-Alpes) le 2 novembre 1765, mort à Embrun le 13 juillet 1840, « fils de monsieur Jean-Baptiste Izoard, conseiller procureur du roy au bailliage d'Embrun, et de dame Agnès Lambert, » était avocat lors de la Révolution. Il devint procureur syndic du district d'Embrun, fut élu député suppléant des Hautes-Alpes à l'Assemblée législative, sans être appelé a y siéger, et, le 4 septembre 1792, membre de la Convention par le même département, le 3e sur 5, « à la pluralité des voix » sur 223 votants. Izoard siégea parmi les modérés, et, dans le procès du roi, répondit au 2e appel nominal: « Je vote pour que la Convention fasse juger Louis par le tribunal criminel des départements. Le décret qu'elle porte ne peut pas m'imposer un devoir que jo ne crois pas être dans le cercle de la représentation, ainsi je n'opine pas plus comme juge que comme représentant; et, dans cette position, je crois qu'il importe au salut de la république française que Louis demeure, quant à présent, en état de détention; et dans le cas où la majorité de la Convention croirait devoir le condamner à mort, comme je ne pense pas que nous en ayons le droit, je vote, dans ce cas, pour la ratification du peuple. »
Et au 3e appel nominal: « En décrétant que vous, Convention nationale, jugeriez Louis, vous n'avez pu vouloir le juger de la même manière que les tribunaux ordinaires; vous ne vous êtes constitués juges dans cette affaire que parce qu'il devait y entrer des considérations qu'un tribunal ordinaire n'aurait pas pu admettre. Ainsi, je fais abstraction du code pénal, puisque vous vous êtes vous-mêmes éloignés des formes ordinaires de la procédure criminelle. J'écarte également les idées de vengeance comme celles de pitié. Une nation ne peut que vouloir son intérêt suivant les règles de la justice. Or l'intérêt de la nation n'est point ici pour la mort. Le mot de ci-devant roi est plus humiliant pour les despotes que celui de roi tué, et bien plus propre à faire impression sur les peuples, parce qu'il ne blesse aucune idée de moralité. Je vote pour la réclusion pendant la guerre, et pour le bannissement à la paix. » Après le 9 thermidor, il appuya les mesures de réaction. Le 21 vendémiaire an IV, Izoard fut réélu député des Hautes-Alpes au Conseil des Cinq-Cents. Il y présenta un rapport sur les élections de la Guyane française, et quitta l'assemblée en l'an VI. Il devint plus tard « inspecteur du trésor public » à Embrun
falta parte da carreira mas enfin
O Facto de ser advogado tal como Robespierre e por conhecerem pessoas em comum (como Salgado Zenha e Jorge Sampayo e outros similares ) levaram Izoard a apoiar Mário Só do campo d'ares y Mário Só du champ de Marte
(acho que estou a confundir as histórias de advogados tiranos-rex mas incorruptíveis)
deve ser da hora
comparar o acaso de um funcionário pseudo-líder revolucionário
com líderes que construiram mythos em torno de si próprios para permanecerem no phoder
comparar um pequeno peão com outros lançados em revoluções várias a quem o acaso e a falta de pontaria dos adversários pôs no phoder é...
enfim
por favor impeçam este poeta pseudo-coiso de comentar na blogosfera
O que está aqui em causa é a comparação, assumida por Sérgio Lavos, no seu segundo post, entre Robespierre e Hitler (ver o meu post http://trix-nitrix.blogspot.com/2011/10/robespierre-e-hitler-uma-critica.html) que é uma ideia francamente de direita. Quanto à sua discussão com João Valente Aguiar parece-me de uma infantilidade esquerdista. É do senso comum, entre a esquerda, que Robespierre era um radical jacobino (versão de um burguês radical) e que Graccus Babeuf, com a sua Conspiração dos Iguais, foi quem tentou levar mais longe a Revolução (foi também guilhotinado), mas isso não invalida que a posição adoptada por Robespierre não fosse progressista para a época.
por atenção, é o puxar do rabo de cavalo da menina da frente, olha eu que estou aqui, o nosso partido grémio, ong é o macho alfa desta alcateia de cães que ladram mais do que mordem
Obviamente estas lutas estéreis e questinúnculas servem como ritualizações de lutas para o acasalamento político
a utilização de antepassados políticos em cerimónias de transferência de mana (e não de maná) político são normais nestes universos ficcionais
A revolução tem que recomeçar! Foi assim que P.Kropotkine -para quem" sem muita desordem ,sem muita desordem social não havia mudança..."- comentou o periodo mais importante no seu livro-epopeia monumental e superlativa," A Grande Revolução 1789/93", onde escalpeliza a trama funesta que se joga na Convenção de Outubro 1792 a Junho 1793, onde o triunvirato- Danton, Marat e Robespierre- enfrenta os Girondinos-já-sem rei e abrem as portas à Comuna revolucionária,dirigida por Paché, Chaumette e Hébert. Como Mabbly,Mailard ou Desmoulins, esses poetas fantásticos da mais generosa de todas as grandes Revoluções,secundam a sintese-relâmpago de Proudhon: " A Comuna será tudo ou nada ! ". A que Kropotkine acrescenta com entusiasmo limpido: " É a desconfiança,como o disse bem Foubert, que inspira as secções: a desconfiança em relação a todo o poder executivo. O que executa, sendo depositário da força, deve, necessariamente, abusar disso. É a ideia de Montesquieu e de Rousseau, acrescenta Foubert; é também a nossa ".Foram as secções de bairro que despertaram Paris em 1792 e prepararam a Comuna revolucionária a 10 de Agosto... E não se esqueça também - sublinha P.Kropotkine- que na " véspera de uma insurreição, não se sabe jamais se a massa do povo se levantará ou não..." À suivre. Niet
Ou enforquem-nos tanto faz.
não tem princípios
e só quando acaba é que começa
A que Kropotkine acrescenta com entusiasmo limpido: " É a desconfiança,como o disse bem Foubert, que inspira as secções: a desconfiança em relação a todo o poder executivo. O que executa,
secções -sovietes -células revolucionárias
é a revolução dos pequenos pacotes
isso e a desconfiança (outra palavra seria a paranóia
secções de unabombers e de teóricos da con's pira-te são
são de facto o material de choque da revolução
paranóicos hebefrénicos e joanas d'arc de todo o mundo uni-vos
felizmente o século XXI vai ser prenhe em malucos
a demografia manda (mais malucos indignados mais fogueiras revolucionárias alinhavadas em secções
como dizia o tocque VILLE
e era mêmo um toque vil
o mal da europa são as suas organizações políticas, cujo objectivo é combater e não convencer e por isso adoptam formas de organização que nada têm de civil
e introduz no seu meio máximas militares-secção coluna etc
os membros destas associações aceitam o dogma da obediência passiva quando em secções desistem do seu livre-arbítrio e da sua capacidade de julgar
Jorge Nascimento Fernandes,
esses juízos sobre o progressismo fazem-no correr o risco de fazer uma espécie de divindade uma certa "necessidade histórica". Robespierre era progressista apesar de reprimir as secções, as reivindicações dos sans-culottes, etc. Nesse caso, os sans-culottes ou, se quiser, Babeuf e os que se lhe opunham defendendo os sans-culottes, eram o quê? Progressistas que tornavam caduco - logo, retrógado - o progressismo de Robespierre? Ou adversários retrógados do progresso "possível" cuja repressão era uma exigência da "necessidade histórica" e que encontraria em Robespierre um seu agente objectivo, movido por uma ideologia da virtude que, por seu turno, era uma "astúcia da razão"?
Não estará V., neste caso preciso, a incorrer num esquematismo sumário que, justificadamente, tem combatido a propósito de outros problemas?
Saudações democráticas
msp
Miguel Madeira,
Penso poder responder com maior detalhe no fim-de-semana (mas não lhe dou certeza porque ando cheio de tralhas para tratar) por isso deixo aqui apenas duas notas.
1- é evidente que Robespierre era o mais lídimo representante da burguesia. Mas de que burguesia estamos a falar? Da burguesia que se tinha vindo a desenvolver já no Antigo Regime e que depois de assassinar Robespierre mostrou ao resto das burguesias europeias o caminho a seguir - ou seja, reprimir qualquer veleidade popular ou mesmo pequeno-burguesa que fosse e aliar-se à aristocracia mais reaccionária, inclusive contra sectores republicanos e democráticos da média burguesia? Ou precisamente de uma média burguesia embebida no espírito do Iluminismo e que, face à estrutura ossificada do regime até então vigente, não teve outra solução do que levar a revolução burguesa até ao fim. Coisa aliás que os girondinos não queriam de modo nenhum.
2- Você acha mesmo que se poderia ter saltado o capitalismo em 1789 para uma sociedade socialista? Podemos concordar no facto de Babeuf ter sido mais "comunista" do que Robespierre ou, reformulando, que Babeuf anunciou por escrito um mundo em devir mais emancipatório do Robespierre, mas este último, goste-se ou não, foi o dirigente de topo mais notável da Revolução Francesa. Achar que havia condições materiais e condições da própria consciência e organização das massas em 1789-94 para se saltar para um sociedade não-capitalista mas já não mais feudal e/ou absolutista parece-me precipitado. Aliás, como poderiam as massas populares fundar uma "República do Trabalho" como os communards consideraram a Comuna precisamente sem a criação da novidade histórica inapagável de 1871: precisamente a formação de conselhos operários. Sem estas estruturas operárias não sei como seria possível fazer de 1789 uma revolução popular.
P.S. o texto de Jorge Nascimento Fernandes no seu blogue é mto instrutivo sobre o carácter progressista de Robespierre.
P.S. 2 - eu comentei o segundo texto de Lavos quando ele assume que Robespierre era similar a Hitler, e não o primeiro texto dele sobre a questão dos cadáveres. Creio que o que levou Lavos a escrever aquilo foi o ódio idiota que ele tem ao Carlos Vidal, mas se, posteriormente, achasse que a minha leitura das teses políticas que ele enformou no post (repito de novo, o facto de pretensamente Robespierre ser similar a Hitler), parece-me razoável que ele as procurasse ter defendido. Ou remodelado a questão. O silêncio de Sérgio Lavos relativamente ao que realmente interessa (o conteúdo substantivo) e não sobre o acessório (a linguagem) é todo um programa político de aceitação das teses mais reaccionárias da direita actual de colar toda e qualquer mobilização popular (do grau mais embrionário e dependente das teses da média burguesia iluminista de 1789-94 até 1871, 1917, 1949, 1974, etc. etc. etc.) a um pretenso instinto totalitário. E sobre uma possível desvinculação disto, Lavos nada disse.
Castoriadis sobre Robespierre o o Comité da Salvação Pública- "O Terror é o falhanço por excelência da Revolução.(...) Mas não existem quaisquer dúvidas sobre uma política que, proclamando-se revolucionária e democrática, mas que só se pode impôr pelo Terror perde o lance antes que ele tenha lugar, deixou de ser o que pretendia. Não podemos salvar a humanidade contra a sua própria vontade, e ainda menos contra ela ". Estes são alguns dos pontos essenciais de uma análise comparativa de Castoriadis entre a Revolução Francesa e a Revolução Russa." A Revolu. Francesa não é um putsch de um pequeno partido( como Outubro 1917). Ela foi obra desenvolvida pelo movimento de uma grande parte da sociedade, de 1789 a 1792. O povo retira-se de cena, por volta de 1792, e abandona-a aos lideres,aos clubes e aos activistas. E é a partir desse momento que o Terror se instala. O falhanço da Revolução não é só o falhanço( ou o crime) dos revolucionários ou dos jacobinos. É o falhanço do povo no seu conjunto. ( ...) numa primeira fase da R.Francesa, os revolucionários não foram nada, se o povo não se manifestasse. Numa segunda fase, os revolucionários não tinham sido ninguém se o povo estivesse nas ruas. Isto não é querer desculpar os manobradores do Terror; é dar conta que a condição do Terror foi a passagem " à reserva " do povo ", C.Castoriadis, in CL. III," O Mundo fragmentado". À suivre. Niet
Para Miguel Serras Pereira
Não quero entrar na sua discussão filosófica do que escrevi, mas pelo que li, no livro que encontrei mais à mão, “Rousseau, Mirabeau, Robespierre”, de Albert Manfred (1986, Editorial Avante), Babeuf apoiou a reacção termidoriana (27 de Julho de 1794, 9 do Termidor), que depôs Robespierre e Saint-Just e os guilhotinou. Eram o que o autor chama os termidorianos de esquerda, que rapidamente foram ultrapassados pela direita. Babeuf numa carta de 29 de Fevereiro de 1796 diz: “Confesso hoje de boa-fé que me arrependo de ter outrora visto com cores negras tanto o Governo Revolucionário como Robespierre e Saint-Just”. “Creio que esses homens valiam mais, sozinhos, que todos os revolucionários juntos, e que o Governo Revolucionário era soberbamente bem imaginado”. “…o robespierrismo é a democracia e as duas palavras são perfeitamente idênticas”. Em 1797, Babeuf é julgado e condenado à morte pelo Directório por ser um dos chefes da “Conspiração dos Iguais”. Como se conclui desta história Babeuf foi um continuador, mais consequente nas suas ideias, de Robespierre. O que não significa que toda a política de Robespierre mereça aceitação. Assim, segundo o autor que vimos citando: “Manteve em vigor a lei anti-operária de Le Chapellier, apoiou a extensão dos máximos aos salários operários; deu provas de incompreensão relativamente aos interesses e às necessidades dos operários e foi indiferente às suas reivindicações; mostrou de resto a mesma indiferença em relação aos camponeses pobres; nunca fez nada para melhorar a sua condição; não se limitou a golpear os inimigos da Revolução, golpeou também a esquerda: primeiro os enraivecidos e depois Chaumette”. No entanto, foi odiado pela direita durante todo o século XIX e ainda hoje desperta o seu ódio, não pelas medidas acima descritas, mas por ter levado a Revolução ao seu limite mais à esquerda. Diga-se de passagem que Robespierre é guilhotinado com 36 anos, um ditador nunca morre tão cedo.
Jorge Nascimento Fernandes,
não era tanto a questão complexa de avaliar Robespierre ou Saint-Just - e porque não Marat? - que me preocupava, mas justamente a concepção que de algum modo corre o risco de entronizar a necessidade histórica, hipostasiada em razao, que me pareceu aflorar no que escreveu.
Por mim, não subscreveria tão piamente uma obra como a de Manfred - embora não vá contestar os passos que V. aqui cita -, que justamente incorre, no conjunto, num reducionismo meta-histórico, sempre incómodo num historiador. Mas isso já é outra discussão.
Obrigado pela resposta, seja como for.
Com as minhas saudações republicanas, ainda que não jacobinas
msp
MS Pereira e todos, claro: Marat e Danton viram-se alvo de cabalas de corrupção e tráfego de influências, no periodo antes da entrada do Terror, no Outono de 1793. A trama foi urdida pelos Girondinos, claro, e faz-nos lembrar aquelas histórias " negras " da direita francesa do séc.XIX e XX... O que é certo, é que Robespierre " travou " a inculpação " de Marat, mas não evitou passados poucos meses o seu assassinato por uma escrava da burguesia...Já agora, rompendo toda a blindagem erguida por J.N. Fernandes no seu comentário, parece-me incrivel citar um livro de um sovietológo para, em 2011, tentar perceber alguns aspectos da Revolução Francesa.Niet
mas justamente a concepção que de algum modo corre o risco de entronizar a necessidade histórica, hipostasiada em razao, que me pareceu aflorar no que escreveu.....
meterialismos dialéticos que afloram
e necessidades históricas erosionadas pelos tempos
O século XXI ainda não chegou
Adenda: Tinha-me esquecido de referir este facto: Os escritos e documentação de François Nöel Babeuf estão em Moscovo depositados.Só essa narrativa dá um romance à Le Carré. Niet
Calma, Niet.
Que eu saiba Alʹbert Zakharovich Manfred foi um historiador soviético, muito difundido pelas edições em línguas estrangeiras de Moscovo, e não um sovietólogo. O livro que o JNF circulava em Portugal muito antes do 25 de Abril, salvo erro numa edição da Arcádia (mas também poderia ser da Estúdios Cor ou outra chancela). Nos meus tempos de faculdade, os marxistas com quem me dava talvez fossem mais exigentes do que hoje, mas o certo é que não ligavam bóia ao Manfred, chatevam quem o utilizava como sebenta ideológica (fácil mas pouco estimulante) e recomendavam. no mínimo, o Soboul - os mais críticos, enquanto não se rendiam ao maoísmo, alvitravam como alternativa a leitura de Daniel Guérin, embora só a conhecessem em segunda mão, ou… através da crítica, bastante injusta e excessiva, de que fora alvo por parte do patron dos Annales, Lucien Febvre.
Enfim, falta acrescentar que, nesses tempos, se podia concluir o curso de História sem saber nada da Revolução Francesa, que nunca chegava a ser "dada" na cadeira de História Moderna e Contemporânea…
Mas já chega de recherche du temps perdu…
Salut
msp
Os historiadores e afins das épocas "DEmocráticas" além de serem levados a replicar cada facto através de uma (grande ou pequena)causa geral, procuram ligar ainda os factos entre si e deduzir uma theoria
há muitas vezes movimentos que parecem ter um motor são o produto do kaos que é a liberdade humana
a importância dos actos de um homem
nos movimentos dos grupos e das multidões só existe nos grupos militarizados
resumindo pensamento histórico aristocrático
falta acrescentar que, nesses tempos, se podia concluir o curso de História sem saber nada da Revolução Francesa ou sabendo-se muito não se compreendia a dita cuja na mesma
e há tantos historiadores-funcionários
desde os por-hipatia-bibliotecaria
(que quando eram novos eram cheios de si e das suas crenças ideológicas
e depois de velhos incharam-se de crenças e abortaram a capacidade de análise
(se alguma vez a tiveram claro)
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