30/05/15

A Grécia, o euro e a dívida

José Manuel Fernandes apresenta, no Observador, o que considera serem "Sete razões para a Grécia sair do euro".

Mas há algo que me parece faltar no artigo de JMF e, no geral, nos artigos de autores de direita a defender a saída da Grécia do euro - o que, nesse caso, fazer da dívida grega? Manté-la em euros ou redenominá-la em "novos dracmas"?

Se a dívida se mantiver em euros, a saída da Grécia do euro representará uma explosão de dívida - com a moeda grega a desvalorizar e a dívida a manter-se em euros, a dívida ficará cada vez maior face ao rendimento e ao produto gregos.

Se a dívida for convertida para dracmas, então isso será uma variante da tão falada "reestruturação da dívida" - os autores de esquerda que defendem a saída do euro (no caso destes, tanto da Grécia como de Portugal) tendem a fazer abertamente a ligação entre as duas coisas; mas, como escrevi atrás, os de direita parecem mais reticentes em pôr nos seus textos alguma referência a essa reestruturação (que me parece praticamente inevitável no caso de uma saída do euro - seja da Grécia ou hipoteticamente de Portugal).

Um aparte final acerca do artigo de JMF; a dada altura ele escreve:
De resto, até fortíssimos opositores às políticas seguidas pela União Europeia nos últimos anos parecem comecar a defender, ou pelo menos a aceitar, essa ideia, como sucede com Paul Krugman.
Lendo isto, fico a pensar em que estranho universo mental vive JMF - "até fortíssimos opositores às políticas seguidas pela União Europeia" defendem a saída da Grécia do euro? A mim parece-me que (infelizmente) desde sempre que é exatamente entre os críticos radicais da política da UE que é mais popular a ideia de os países em crise saírem do euro; quem está numa posição "excêntrica" e minoritária são os que combinam a crítica à política da UE com a defesa da manutenção no euro (posição que, em Portugal, é capaz de ser só defendida  por partes do Bloco, do Livre e deste blogue...). Quanto ao Krugman, acho que há décadas (ainda nem o euro existia) que ele é, de forma mais ou menos aberta, contra o euro (teve uma fase em que se rendeu ao argumento de que, depois de entrar, sair do euro era impossível por causa da crise financeira que isso iria originar, mas pelo menos desde a crise cipriota parece-me que abandonou essa preocupação).

4 comentários:

Anónimo disse...

Grande lutador, Miguel Madeira, enfrenta os efeitos de uma " cortina de fumo " criada pelo inefável e famigerado JMF1957,coriféu patenteado de tão agitadas gramáticas neo-conservatives. A hipocrisia trabalhada em espiral pelo publisher de o Observador visa, no entanto,forçar o alinhamento da Mediocracia lusitana do centro-direita à campanha da oligarquia financeira e(e politica) euro-americana destinada a afastar o Syrisa do poder. E tentar aplacar e reduzir as perspectivas eleitorais de Podemos e Ciudadanos em Espanha, por ricochete adicional. Tudo o mais são efeitos de retórica de saldo para distrair o pagode.De uma forma geral e incisiva, como nos explicam E. Todd ou JL Mélenchon, a crise económica e financeira que varre os dois lados do Atlântico colocou a Oligarquia a descoberto, isto é, a nú.E todos os problemas derivam em grande parte da impunidade e autonomia crescentes do poder económico multinacional em agravar os desiquilibrios e assimetrias sociais gerados por um excesso de concentração e sobreexploração económica. Salut! Niet

José Guinote disse...

Miguel, julgo que o JMF distorce o que o Krugman defende no seu artigo. Nada de novo. Krugman não defende a saída dos gregos do euro como a melhor solução. Acha que isso vai provavelmente acontecer face às posições inflexíveis da Troika sobre as reformas do mercado de trabalho e das pensões - "But now the IMF is playing bad cop, declaring that it cannot release funds until Syriza toes the line on pensions and labor market reform. The latter is dubious economics — the IMF’s own research doesn’t support enthusiasm about structural reforms, especially in the labor market. The former probably recognizes a real problem — Greece probably can’t deliver what it has promised pensioners — but why should this be an issue over and above the general question of the primary surpluse". O que ele diz é que caso saia do euro a Grécia vai defrontar dois anos péssimos e depois as coisas podem começar a compor-se com a possibilidade de o país ter uma política monetária própria e dessa forma poder estimular a economia. Um eventual sucesso da Grécia representa um risco enorme para a austeridade e para o euro, defende Krugman, que aliás começa o seu artigo questionando a Troika sobre se tinham percebido o significado dos resultados eleitorais em Espanha. JMF não se dá ao trabalho de tentar perceber o artigo. O que ele quer é apenas e só difundir a ideia, na qual acredita piamente, que países sob resgate não são países soberanos e por isso as escolhas dos cidadãos em eleições livres não valem absolutamente nada. Isto que repugna qualquer democrata é para JMF a pura normalidade dos factos.

Anónimo disse...

Há divergências politicas rampantes no interior do Syrisa sobre o modus operandi com a BCE, o FMI e o Eurogrupo...Vafourakis tem à ilharga um marxista " ortodoxo ", capaz de lhe baralhar os palpites, e blogues radicais norteamericanos dão conta de um processo de nepotismo crescente no aparelho de Estado, com um primo do PM Tsiras a ser colocado como secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, para lá de outras " nomeações " discutiveis de membros das famílias dos principais ministros. Niet

Miguel Madeira disse...

Acho que se JMF distorce o pensamento de Krugman até é em sentido contrário - ele apresenta a posição de Krugman com uma novidade, e algo a que K. talvez tenha chegado a contragosto, quando lendo as colunas dele ao longo dos anos, parece-me claro que ele sempre foi contra o euro (até costumava dar o exemplo do Canadá e dos EUA, que tinham uma economia mais integrada entre si dos que os países europeus, mas que nunca tinha tido a ideia de criar uma moeda única), só não advogando a sua dissolução porque, a partir do momento em que o euro existia, os custos da transição iriam ser muito altos.