10/04/11

Primeira Declaração de Voto

O discurso de Alegre no congresso do PS é muito interessante. Alegre disse que não há soluções governativas de esquerda sem o PS. Disse-o de um modo relativamente afável e lamentou a exclusão do PS da reunião entre PCP e BE. O mais interessante é que, até àquele momento, só a Alegre é que tinha passado pela cabeça que o PS fora excluído dessa reunião. Porque a sua inclusão não parece ter sido presumida por quem quer que fosse com excepção de Alegre. O discurso de Alegre, nesse sentido, é o discurso de quem narra a sua própria morte política. Com efeito, o que estes dois últimos meses assinalam é a crise do discurso dominante em torno da possibilidade de uma coligação governamental entre PS, PCP e BE, ou apenas e só entre PS e PCP ou entre PS e BE. Este discurso, diga-se, era o de Alegre, mas também - embora com diferenças muito importantes, sublinho - o de alguns dirigentes da Renovação Comunista e de dois ou três membros do BE com mais projecção mediática. Significa isto que o espaço do PS é um espaço irremediavelmente perdido para uma tal estratégia? Não. Mas a parte da esquerda que sempre insistiu com a tal coligação entre o PS e a sua esquerda deveria hoje repensar os termos da sua conversa. Porque insistiram sempre em falar de uma fórmula aliada desse género e só raramente falaram das políticas que poderiam ser ponto comum a um tal programa. Essa parte da esquerda preferiu sempre resumir a questão à má-vontade dos estalinistas do PCP ou dos extremistas do BE. Como se o problema estivesse em ser Jerónimo Sousa o líder do PCP e não Cipriano Justo; ou ser Francisco Louçã o líder do BE e não Daniel Oliveira. Não há solução governativa de esquerda sem o PS? Admitamos que não. Mas o problema, porém, é este: é que também não há solução governativa de esquerda com o PS. E esta hipótese tem a seu favor a história. As críticas de socialistas como Alegre e Ana Gomes ao centrismo - ou até ao neoliberalismo - de Sócrates não perderam razão de ser. Como sair desta quadratura do círculo? A minha resposta seria: se não há solução governativa de esquerda sem o PS, é igualmente certo que não há solução governativa de esquerda enquanto o PS tiver mais votos do que PCP e BE juntos. É preciso uma maioria de esquerda que inclua o centro-esquerda, isto é, o PS? Sim. Mas é tão necessário isso como uma alteração de correlação de forças à esquerda que coloque o PS numa posição minoritária face à soma de votos entre PCP e BE. Será para já? Possivelmente, não. Mas alguém acha, por exemplo, que Lula da Silva algum dia teria obtido uma maioria sem que antes tivesse obtido tantas minorias? Esse foi (o que se passou durante o governo Lula é, em parte, outra discussão) um caminho de urgência mas também de esperança. Por isso a minha primeira declaração de voto é simples: votar à esquerda do PS.

9 comentários:

Anónimo disse...

A questão é se o BE está à esquerda do PS...

Se já está há muito tempo o BE se encontra entre o PCP e o PS, ao apoiar Alegre colocou-se definitivamente em sobreposição ao PS, e portanto "muito pouco à esquerda deste"...

E se para alguns, como eu, votar no PCP nunca foi opção, não vislumbro nada mais à esquerda do PS que um enorme vazio... :-(

Anónimo disse...

A questão é se o BE está à esquerda do PS...

E se há já muito tempo o BE se encontra entre o PCP e o PS, ao apoiar Alegre colocou-se definitivamente em sobreposição ao PS, e portanto "muito pouco à esquerda deste"...

E se para alguns, como eu, votar no PCP nunca foi opção, não vislumbro nada mais à esquerda do PS que um enorme vazio... :-(

Anónimo disse...

Anónimo (13:39):

"Querer" votar à esquerda do PS, sendo ao mesmo tempo um anticomunista primário... realmente não é fácil. :-)))

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Disseste por palavras claras, tudo aquilo que eu tenho vindo a insinuar.
Um abraço

Anónimo disse...

De Discussão em discussão sobre as eleições se tece a nossa alienação e a nossa impotência!
Olhem para as ruas.

Anónimo disse...

Segunda Declaração de Voto:

Abstenho-me!

Anónimo disse...

O Vias de Facto tem de encabeçar um abaixo-assinado nacional para que seja atribuído ao seu distinto colaborador, e comentador «imérito», José Neves o direito a ter dois votos nas próximas eleições. Assim poderá satisfazer o seu grande desejo de votar simultaneamente no PCP e no Bloco de Esquerda, sem necessitar de anular o voto.

LAM disse...

Muito bom texto. Uma boa e lúcida resposta à quase eterna questão da extensão e mecânica da esquerda partidária parlamentar.

João disse...

também quero essa de votar nos dois, mas basta-me 1/2 voto em cada. ou então nem lá vou, que ando farto de punhetices...